Projeto: Memória Petrobras
Depoimento de Demarco Epifanio
Entrevistado Marcia de Paiva
Rio de Janeiro, 28 de março de 2007
Realização Museu da Pessoa
Entrevista TEINTER_13
Transcrito por: Maria Luiza Pereira
P/1 – Demarco, boa tarde.
R – Oi, boa tarde!
P/1 – Gostaria de começar a entrevista
R – Pois não.
P/1 - Pedindo que você no diga o seu nome completo, local e data de nascimento.
R – Eu sou Demarco Jorge Epifanio, nasci no Rio de Janeiro, filhos de pais italianos e nasci dia 15 de maio de 1957.
P/1 – Demarco, qual é a sua formação?
R – Eu me formei na Universidade Católica de Petrópolis no ano de 1979 e entrei na Petrobras em 80, me formei como engenheiro mecânico lá. Assim que eu entrei na Petrobras eu me tornei engenheiro de petróleo.
P/1 – A partir de um curso de especialização em engenharia de petróleo...
R – Isso.
P/1 – Você foi para que área?
R – Bom, assim que eu entrei na Petrobras, e aí eu quero até, se você me permitir fazer um link, eu entrei na Petrobras em 80, em janeiro, e já nesse primeiro ano eu estava entregando meu currículo na antiga Braspetro, área internacional da empresa. Eu sempre tive esse sonho de um dia trabalhar na área internacional. Então entrei na Petrobras, eu fiz o curso de engenharia de petróleo. Naquela época era um curso formatado para 6 meses, me tornei engenheiro de petróleo e trabalhei na E&P. Fiquei na E&P; na época era o antigo Deper – Departamento de Perfuração – depois é que ele veio se tornar o E&P, mas fiquei no Deper até 1990, quando então aquele meu sonho se realizou. Então eu vim para a área internacional em dezembro de 90.
P/1 – E durante esse período no Deper você ficou trabalhando aqui no Rio ou mudou...
R – É, eu sou um dos poucos cariocas, né? Quando eu entrei na Petrobras em 80 nós éramos 126 candidatos, né, e por incrível que pareça, eram só cinco do Rio de Janeiro, eu era um desses poucos cariocas, né, e tive a sorte de cair em Macaé. Eles distribuíram a gente pelas diversas unidades da Petrobras, então nós viemos para cá, uns 20 e poucos, 24 parece, aqui para a Bacia de Campos, então eu fiquei na Bacia de Campos até 82, quando então tinha um programa de convite a engenheiros para passarem 6 meses no Rio de Janeiro, para fazer algum tipo assim de refreshing, né, saía da área de operação, passava na sede, depois voltava para o campo. E aí quando me perguntaram se eu queria vir para o Rio, eu trabalhava embarcado, na época ainda era 14 por 14, né, eu falei “pôxa, tá do tamanho que eu calço, é óbvio, né, que eu quero ir para o Rio”.
P/1 – Estava em que plataforma?
R – Ih, eu trabalhei, a minha primeira plataforma foi a Marlim 7, a SS13, depois eu trabalhei na SS7...
P/1 – Marlim também?
R - Trabalhei Marlim. Na época, ainda não tinha as águas profundas, isso ainda eram os campos ali tradicionais de águas rasas e tudo. Aliás, eu até fiz parte do primeiro grupo que embarcou na plataforma que furou o primeiro poço em águas profundas. Mas eu passei pela S7, pela S13, pelo navio-sonda Cyclone, pelo Discovery, o próprio Tainarron, que era o NS4. E vim para o Rio para passar esse período, depois de ter esse tempo em Campos. Os seis meses acabaram ficando quase oito anos, porque como eu era do Rio, eu vim trabalhar no setor de operações marítimas, o antigo Seomar, e isso para agente deu assim uma visão bem abrangente do que que eram aquelas operações offshore, não só na Bacia de Campos, mas no Brasil todo, né?
P/1 – Hum, hum.
R – Então acabei ficando no Seomar, isso me deu uma cancha muito interessante, porque a gente interagia muito com o pessoal da exploração, da produção. Eram projetos que iam desde águas rasas, lá no nordeste, não eram águas profundas ainda, mas as águas até 400 metros na Bacia de Campo. E aí em 87 estava lá no Seomar, me chamaram para ser chefe de setor, né? Aí nós ficamos lá um ano e logo depois me chamaram para ser chefe da divisão, eu tomava conta do setor de operações marítimas, setor de operações terrestres. E seis meses depois dessa chefia de divisão, me chamaram para, teve aquela transição, saiu o antigo superintendente, assumiu um outro superintendente, fui para a divisão de contratos, quer dizer, saí mais dessa área operacional e aí teve aquela confusão, que na época o diretor da área de perfuração era o diretor Albérico Barroso ou general Albérico, e aí deu uma confusão, aí foi um período assim um pouco nebuloso, né, aí decidiram trocar um monte de pessoas e eu estava nesse, digamos assim, no meio dessa coisa. (riso) E, tudo bem, aí voltei de novo...
P/1 – Nessa leva de pessoas trocadas?
R – Nessa leva de pessoas. Então eu deixei uma função gerencial, voltei de novo para a chefia do setor que eu tinha, que era o setor de operações marítimas, né e aí, em 89, final de 90, foi interessante porque surgiu esse convite, porque eu tinha um grande amigo meu que estava na Braspetro, ele estava coordenando um projeto, uma tomada de preços no Irã e ele estava saindo de férias, ia passar 1 mês fora e queriam alguém com uma certa bagagem para durante esse período de férias tomar conta do projeto, porque podia surgir alguma coisa, alguma contato e tal e eu fui para passar 1 mês.
P/1 – No Irã?
R – Aqui no Rio, ainda na Braspetro.
P/1 – Tá.
R – Aqui na Braspetro, né? E conclusão, fui para lá para passar 1 mês e já se vão quase 16 anos, porque logo depois; imagina, né, aquilo para mim era o meu...
P/1 – O seu sonho.
R – O meu sonho, né? E eu me lembro que nós tínhamos operação; na verdade a área que eu fui era uma antiga área de serviços que a área internacional tinha. A área internacional ela tinha companhias de óleo, a Braspetro, uma companhia de óleo e uma companhia de serviço chamada Brasoil. Então eu fui para esse braço de serviço da área internacional. Então nós tínhamos sondas, equipamentos que furavam fora do Brasil. E nessa oportunidade a gente tinha sondas trabalhando em Angola e na Líbia. Aí eu me lembro que teve lá um problema qualquer na Líbia e normalmente nós tínhamos três expatriados lá, o gerente geral, o gerente de operações, gerente financeiro. Teve lá uma confusão qualquer envolvendo as pessoas, problemas mais de ordem pessoal...
P/1 – Na Líbia?
R – Na Líbia. Não questão de ordem administrativa. E o nosso gerente decidiu que era melhor trocar todo mundo, assim, de uma vez por todas, o que era algo pouco usual, né, você trocava o gerente de operações, enfim. Mas enfim, não sobrou nada. Aliás, não sobrou nada, eu gosto muito de uma; eu aprendi com esse meu chefe do Seomar, que ele uma vez pediu para um engenheiro que trabalhava com a gente fazer uma minuta de uma carta enquanto ele ia para uma reunião e quando ele voltou da reunião falou: “Deixa eu ver essa carta aí como é que já ficou”, ele foi olhando: “Não, isso aqui não está bom, isso eu não gostei, isso eu não gostei, isso eu não gostei”, falou assim: “ Pôxa, Fred dessa carta aqui só sobrou o atenciosamente”, né? Então, na Líbia só sobrou o “atenciosamente”, dessa equipe gerencial e aí esse gerente me chama e fala: “Olha, eu acho que você tem um perfil bom para ir para lá como gerente de operações. Você não quer pensar e tal?” Eu falei: “Onde é que eu assino?” “Mas você não quer nem falar com a tua esposa?” Eu falei:“Não, não precisa. Isso aqui sou eu, vamos lá e tal”.(riso) Aí, pôxa, eu já estava na minha cabeça já viajando, né? Isso era anos 90, e meus filhos tinham nessa época 10, oito e seis anos, e a minha esposa é uma pessoa muito, muito, muito, muito, muito legal, mas enfim, nunca tinha saído nem sequer de Botafogo, quanto mais no Brasil. E eu cheguei em casa, achando que estava dando uma excelente notícia, pôxa, “nós estamos indo morar no exterior...” Ela falou: “Nós?” Nós, quem? Porque eu e meus filhos não vamos, né?”Os filhos nessa hora eram só dela, né? Eu falei: “Mas olha, é uma oportunidade muito boa e tal.” Bom, passado esse primeiro momento..
P/1 – Choque.
R – Ela já estava assim: “Tá bom, para onde é que a gente vai?” Falei:“Vamos alii”, “Heim, não entendi.” “Ali, logo ali na Europa, depois desce, norte da África.”; “Heim?” “Líbia, nós vamos para a Líbia.”(riso) Ela falou: “Não, você deve estar de brincadeira?” Bom, isso obviamente levou seis meses até o convencimento, né? Então eu fui para lá em junho, eles chegaram em outubro e imagina: primeira viagem, minha esposa e meus filhos, sem falar nada de inglês nem nada. Por sorte a companhia nessa época fazia a gente passar por Paris. Então a gente passou uma semana lá antes de ir pra tipo um túnel do tempo, né, você vem aqui (espanto) e, bom, e aí caía na real. Bom, foram 16 malas, enfim, uma confusão danada.
P/1 – E o meninos, o que falaram?
R – Aí é que tá, foram pra lá. Bom, pra eles, imagina...
P/1 – É mais fácil.
R – Aquela idade que tu leva, né? Lá em Trípoli nós moramos num condomínio que tinha muitos estrangeiros e o que acontece é que lá tinha uma escola internacional canadense, então eles foram praticamente alfabetizados, com o idioma inglês; e pra quem não tinha inglês como língua, digamos assim, nativa, tinha uma turma que ficava dando reforço e a partir do que você se sentisse mais confiante, então ia para a turma normal. E a criança absorve idioma com uma facilidade tremenda. Mas aí...
P/1 – Tudo é novidade...
R – Novidade, porque primeiro que você precisa se comunicar, tem que falar com os amigos, então para eles aquilo não é aquela coisa massante de “where is the book e não sei o quê”, nada disso. Eles têm que falar, têm que se entender, têm que brincar, não é verdade? Então, é rapidinho. Não só eles ensinando português, como recebendo... Eu sei que o meu filho voltou da Líbia falando palavrão em uns 8 ou 9 idiomas diferentes, entendeu? Porque obviamente eles faziam trocas. E para a minha surpresa a minha mais nova que é bailarina, a Renata, ela sempre foi assim a rainha, ela sempre adorou criança e sempre teve uma personalidade muito forte. Olha, quando chegou lá deu uma ziquezira que ela começou a chorar, não queria ficar na sala, não sei o que e tal, pa pa pa pe pe pe. Bom, passou um mês e nada, né? E começamos a ficar preocupados porque não queria comer, não sei o que e tal. Aí teve um dia que ela saiu, o esquema lá era de oito às três da tarde, tipo escola americana e tal, né? Então ela chegou um dia chutando a porta, falou assim: “Olha, eu não quero nem saber” – falando para a Cida, minha esposa – “pode falar com meu pai, pode arrumar passagem, eu quero voltar para o Brasil, eu não quero ficar aqui. Nem a minha professora fala comigo, como é que eu posso falar se nem ela está falando comigo?” Não falava com ela no idioma dela, entendeu?
P/1 – Hum, hum.
R – Aí a Cida explicou direitinho que não ía dar por isso, por aquilo e aí ela chegou: “Tá bom, então não dá para ir para o Brasil? E para Paris?”Ela tinha passado (riso) Eu sei que nós fomos no médico, porque ela não estava comendo. Aí o médico examinou, falou: “Olha, isso é fase, né, então tá aqui um complexo vitamínico e tal e tal, você vê que isso aí...”, e olha, é impressionante, assim que deu click, ela começou pegar a coisa do idioma aí em dias, não foi nem questão de semanas não, em dias, né, não só ela voltou a ser a pessoa que era, como passou a dominar os alunos da classe, porque ela tem esse espírito. Então, realmente, a barreira, digamos assim, da comunicação é que fez com que ela ficasse assim, né, que caísse. Dois anos depois, a Petrobras tem um esquema no exterior que você fica no mínimo, né; é claro, a não ser que surja alguma condição assim extemporânea, mas normalmente você fica fora um período de 2 anos, então a companhia sempre faz o convite para saber se você quer voltar, se você quer continuar e tal. E aí tinha sido minha a decisão de ir eu achou que não era justo então na hora de voltar de... ou de permanecer de ser minha. Então cheguei para a Cida e ela decidiu que a gente tinha que ficar mais 1 ano porque realmente o ambiente lá foi um ambiente muito legal, demos muita sorte.
P/1 – Você gostou também.
R – Aí é que tá, demos muita sorte porque como eu te falei, como nós fomos três famílias novas para lá, para substituir aqueles três do “atenciosamente”, nós fomos os três novos para lá, demos sorte de estarmos com pessoas maravilhosas, o Mossoró que era o nosso gerente geral, Eduardo Almeida, o Trigo que era gerente financeiro que foi com a Eliane e eu com a Cida. E tínhamos filhos mais ou menos na mesma idade. Tinham mais duas famílias da Braspetro também, né, também com filhos nessa idade, então, conclusão: tivemos assim um clima, uma condição assim de comunidade muito gostosa, muito prazerosa. E, para mim, o grande apelo, o grande legado, digamos assim, que eu trago da Líbia e eu, minha família e meus filhos principalmente, porque os dois primeiros anos que nós passamos lá, dos três, não tinha televisão, sabe? E é aí que a gente percebe como isso desagrega, como isso afasta.
P/1 – Hum, hum.
R – Então para mim, com muito orgulho eu te digo, eu dei uma condição de infância, né, para os meus filhos, coisa que nós tínhamos na nossa época, né, de ficar na rua brincando, não sei o quê e hoje em dia você imagina, é computador, aquela coisa egoísta e cada um no seu quarto e tal. Então lá nós nunca conversamos tanto como a gente conversou lá, porque o que a gente tinha que fazer era a garotada brincar com os amigos, a gente ficava na varanda conversando com as pessoas, conversando, porque ninguém entendia árabe, televisão não pegava, então. E eu tenho até uma historinha muito marcante, dessa volta da gente. O Flávio, meu filho, estava com 8 anos quando foi, voltou com 11, ele desde pequeno ele faz natação e ele sai do Brasil, deixa aqui um amiguinho, né, o Rodrigo, muitos amigos, né, assim muito amigos, ele foi para lá e ele passou na Líbia 3 anos, né? Bom, quando o Flávio volta reencontra Rodrigo, que tinha ficado aqui no Brasil e aí Cida está levando os dois para a natação lá na Casa de Espanha, aí o Flávio diz para o Rodrigo assim: “Pô, Rodrigo, você precisava ter conhecido o RJ - que era um amiguinho filipino, né, lá – pô, ele joga beisebol, joga muito beisebol, joga futebol, num sei o que e tal, pa pa pa”, vira-se Rodrigo para o Flávio e fala assim: “ Pô, Fávio, tá me estranhando, gostar de homem, tá pensando que eu sou viado?” Aí, pô, aí eu... Cida me contando isso e eu falei assim: “Engraçado, você vê como é que é a cabeça de duas pessoas que passaram por circunstâncias diferentes, né?” Quer dizer, a mesma idade, um com oito, um com... Flávio quanto chegou lá tinha, em 91 ele tinha 8 anos, quando voltou tinha 11, Rodrigo também, né? Agora você vê, o Flávio levando para a coisa da amizade, de jogar bola, não sei o quê e a, digamos assim, a coisa da influência, da malícia, da maldade, o que eu repito que efetivamente é essa coisa de, sabe, de televisão, essa coisa que chega na sua casa sem te perguntar, coloca muita coisa antecipadamente para você, sabe?
P/1 – Hum, hum.
R – Então, isso para mim foi uma grande herança que nós trouxemos de lá. Bom, sem falar do idioma inglês, quer dizer, meus filhos hoje, graças a Deus, falam perfeitamente o inglês, falam espanhol, Carolina agora já tem o francês também, a mais velha. E aí voltamos para cá, voltamos, aí eu fiquei na divisão de que tomava conta na gerência, tomava das unidades fora do Brasil...
P/1 – Deixa só eu te perguntar, na Líbia você ficou na parte de operação...
R – Isso. Tomando conta de uma sonda de terra, nós tínhamos lá uma sonda de terra que furava poços até 5 mil, 6 mil metros, era uma sonda muito grande, nós tínhamos lá uma equipe de 100 pessoas, né, era uma equipe multicultural, porque nós tínhamos muita gente ali da África,então a gente tinha pessoal de Gana, gente da Mauritânia, gente da Argélia, da Tunisia, egípcio, líbio, enfim, aquele norte da África todo. Sudanês. De todo aquele norte da África, tínhamos malteses também trabalhando ali, filipinos, né? Sobre ess coisa de filipinos até tinha uma coisa que eu gostei, para mim foi um choque, porque quanto cheguei lá, pô, imagina, trabalhava aqui na Bacia de Campos trabalhando 14 por 14, trabalhava 14 e folgava 14 dias. Chego lá na Líbia, faço a passagem de serviço, né, com o colega que estava saindo, com o Emanuel e aí os filipinos trabalhavam 180 dias no deserto e folgavam 30, né, e eu falei: “Cara, você é desumano, isso é um absurdo, isso é, cadê direitos humanos”, aquela coisa toda, achando que estava, né? Pô, hum! Aí caí na onda de conversar com os filipinos para oferecer o contrário, tipo dois por um, três por um e tudo, muito pelo contrário, eles não queriam, eles queriam era passar onze meses lá e folgar 1 mês e essa passagem de avião que eu dava a cada 6 meses transformava em dinheiro para dar para eles, por quê? Primeiro que eles estão acostumados a ficar muito tempo fora de casa. Filipinas é um arquipélago lá, um país, vamos chamar assim, que tem um monte de problemas naturais, né, o cara que não tem um parente que morreu de vulcão, morreu de terremoto, que morreu de terremoto, morreu de não sei o que, então é tudo asssim, então eles ficam mudando constantemente. É o que ele dizia, eles ganhavam, sei lá, era 500 dólares por mês, uma coisa assim, então bastava eles passarem 1 ano fora trabalhando, quando eles chegavam lá de volta com sei lá, 6 mil, 6 mil e 500 dólares isso para eles era a possibilidade deles abrirem um negocinho, para botar um filho trabalhando, não sei o que. Então aquilo que para nós era uma coisa assim é, sabe, desumana, não sei o que... não, aí que comecei a ver que, caramba! Tem que ver o outro lado da moeda também, né, quer dizer, você tem que se ajustar algumas condições de mercado. Nós lá então, nós trabalhávamos para várias empresas de petróleo. Nos lá éramos prestadores de serviço. E isso eu também eu repito que foi um grande aprendizado para mim, sabe, porque eu acho que a Petrobras nós somos muito compradores, né, quer dizer, nós somos muito de comprar serviços, né, comprar produtos. Mas o outro lado da mesa, olha, te dá uma experiência fantástica, porque você começa a entender o pouco mais do que que é ser vendedor, né, você começa a entender um pouco mais como é que funciona essa “química” de atender um cliente, como é que isso vai acontecer, o que que está certo, o que que não está, aquela história, cliente está sempre certo, mas tem maneiras e maneiras, né, você tem um contrato, mas o contrato pode ser interpretado de várias formas também. Então para mim foi um grande aprendizado ter trabalhado do outro lado do balcão, quer dizer, prestando serviço. Então nós tivemos empresas, a própria Braspetro foi nossa cliente, quer dizer, alugou a nossa empresa, a nossa sonda para furar poços para ela.
P/1 – Isso pela Brasoil?
R – Pela Brasoleo, exatamente, que era a empresa de serviços. Então a gente prestava serviço para companhia de óleo que precisam de uma sonda de perfuração para furar poços no deserto. E falando em deserto, olha, o deserto é lindo!
P/1 – Pois é, isso que eu queria te perguntar. Essas operações elas conteciam...
R – Em terra.
P/1 – Em terra, mas era longe de Trípoli? Qual era a distância?
R – Bom, vamos lá! Se você mapear mais ou menos assim, como é que o mapinha da Líbia, né, você tem Trípoli aqui na extremidade oeste, né, e Benghazi aqui do outro lado. São as duas principais cidades da Líbia, né? 97% do território da Líbia é deserto, só tem praticamente alguma coisa verde aqui naquela tripinha do litoral. Então as nossas áreas de operação elas eram, por exemplo, bem ao sul de Trípoli, 600 quilômetros, mais ou menos, era uma província lá que tinha bastante óleo e tudo e pertinho do Egito. Então, quando eu cheguei a gente já estava mais
concentrado nesta área, né?
P/1 – Perto do Egito.
R – Perto do Egito. Então a gente pegava um carro, nós íamos até Benghazi, eram 1200 quilômetros, né, até Benghazi e de Benghazi então a gente descia mais uns 300 quilômetros mais ou menos aí, até onde estava. Mas era estrada, né, de Trípoli a Benghazi e depois era deserto. E era muito interessante, quer dizer, toda a minha atividade lá foi no deserto. Então você furava um poço, quando acabava; dependendo, eu tive o primeiro contrato lá com cliente que tinha 1 ano, então a gente ficou durante 1 ano fazendo poços para o mesmo cliente, depois a gente foi trocando, cada contrato era de um, dois poços, sabe? Mas era interessante...
P/1 – E como é que o deserto?
R – O deserto...
P/1 – Trabalhar no deserto?
R – Aí é que tá, trabalhar no deserto é interessante, o pessoal fala assim: “Ah, só tem um tipo de deserto”. Nada! Tem muitos tipos de deserto. O nosso lá, por exemplo, né, onde a gente ficava era um deserto assim: uma areia muito fina, mais muito fina que você, parecia que era um talco, na hora que você pisava, levantava assim aquela poeirinha. Mas, aqui pertinho da Argélia, por exemplo, aqui da Tunísia, desse lado, já era um deserto que tinha umas pedras lisinhas, redondinhas, pareciam uns discos, que aquilo para cortar pneu de carro era uma beleza, então a gente quando tinha que levar os nossos carros prá lá, tínhamos que botar corrente nos pneus para poder passar. Trabalhar no deserto, por exemplo... Ah! Tinha deserto de um areão que parecia um barro, uma coisa assim mais grossa, entendeu? Então você tem várias cores e matizes, né? Agora, todos eles, sem excessão, é muito quente. (riso) E aí é que eu passei a entender. Me lembro quando eu cheguei lá o pessoal: “-Ah, tem que mandar roupa de frio para o pessoal do deserto.” Eu falei: “Esses caras estão de sacanagem comigo. Pô, eu vou comprar roupa de frio para mandar para o deserto. Pô, isso aí é algum trote, é porque eu cheguei agora, tão querendo alguma coisa”. Eu falei: “Não, eu vou lá conversar pessoalmente.” Gente, assim que eu cheguei lá e passei umas duas noites lá no meio do deserto lá, sentindo um frio desgraçado. Aí mandei comprar roupa na Inglaterra, né? Porque o problema do deserto é exatamente esse, você tem uma variação brutal de temperatura ao longo do dia, então de dia aquilo pode chegar facilmente a 52 graus e de noite cai para zero grau, assim, fuuu, entendeu? Então aquela roupa toda é porque faz calor e faz frio. Primeiro, quando tá calor é porque aquilo segura a umidade do corpo e quando faz frio porque tem que se proteger. E uma coisa que era muito ruim também eram as famosas tempestades de areia. Então você, quando no deserto você começa a se familiarizar e andar no deserto é um barato, sabe? Primeiro porque não tem estrada, então são rotas, que você vai vendo que tem uma rota que de tanto passar carro e caminhão ali, você vê que fica mais ou menos assim uma trilha, né?
P/1 – Mas você vai seguindo só por esse desenho da própria areia, ou tem algum... qual é a sinalização?
R – A estrela, as estrelas.
P/1- As estrelas ou bússola?
R – É, a estrela e as bússolas que você tem no carro. Agora, nos nossos carros, por exemplo, apesar de ter bússola...
P/1 – Na época não tinha GPS...
R – Não, não tinha GPS. Mas, é aquela história... é impressionante! Eu aprendi, na época, né, hoje eu já esqueci, mas eu me lembro que nós tínhamos três motoristas fantásticos, sabe? E aí a gente, pô, imagina, cada viagem viagem dessa demorava 12, 15 horas, pô, né? Imagine o que é você andar no deserto, como a gente, uma vez que a gente foi numa locação da Braspetro, que era para assim, marcar a locação, e nós levamos 12 horas no deserto. Depois, chegando em Benghazi era 12 horas na areia. Então imagina o que que é você dirigir, tudo branco, tudo em volta de você tudo branco, de vez em quando você vê assim uma duna, não sei o que, e o deserto tem poucas regras, né, uma delas diz o seguinte: você nunca troca um caminho, uma rota, né, por algo que você acha que vai cortar caminho, porque você nunca sabe na hora que vai subir uma coisa daquelas, acho que é uma duna, vai chegar lá e vai descer, não, aquilo pode ser um paredão. Então você tem acidentes no deserto, apesar de você não ter tráfego, por quê? As pessoas às vezes abusam ou por não conhecer, ou por... e batida mesmo! O cara vem, às vezes, subindo assim vem dois carros, acontece de estarem frente a frente, sabe? Então você sempre tem que ter água dentro do carro, frutas, porque você pode se perder assim muito facilmente. Porque tudo para você é igual ali, né, imagina. E nós tivemos quase, perdemos um dia lá o nosso gerente da sonda, encarregado, da sonda, foi a 3 quilômetros do nosso poço, imagina, o cara que estava com a gente há vários anos, né? Foi lá, 3 quilômetros num poço d’água, porque normalmente quando você furar um poço em terra, um poço de óleo, você tem furar perto dali um poço de água para abastecer a sonda, né, porque você para furar o poço você tem que fabricar lama, você tem que fazer um monte de coisa. Então o poço d’água é algo fundamental. Então ele foi no poço d’água fazer lá uma inspeção qualquer, 3 quilômetros e ficou perdido dois dias. E a gente botando os carros... Enfim, acho que a bússola dele não estava funcionando, ou ele, por algum motivo, tinham tirado para reparo e ele não viu que o carro estava sem bússola, enfim, ele foi e quase ficou. E aí deu sorte que a gente conseguiu localizar ele depois de um tempinho, sabe?(riso)
P/1 – Imagina.
R – Mas tudo com água, com fruta. Teve também uma experiência muito...
P/1 – E vocês preferiam viajar de manhã ou não tem diferença?
R – Não tem, não tem, não tem...
P/1 – De noite, porque você falou das estrelas...
R – Olha, aí que tá. Durante o dia... Porque acontece o seguinte, o pessoal que trabalha o deserto começa a se acostumar com pequenos sinais, sabe? Então ele fala assim, ele está assim dirigindo com você de dia, né? De repente ele, pum! Dá uma guinada, aí muda assim, 45 graus, aí você fala assim: “Ô, Muhamed, que que houve?” “Não, olha só, tá vendo aquela fumacinha ali?” Aí você olha assim, aí, pô, coisa que só ele tinha visto, mas aí você tenta... “Ah, sim, tô!” “Pois é, aquilo ali é a cidade, é uma chaminé de um povoadinho, então agora a gente tem que pegar a direção daquela chaminé.” Então durante o dia eles vão pegando sinais, sabe...
P/1 – Mini sinais...
R –Mini sinais que eles conhecem, né? É um oásis ou passou por um acampamento e ele sabe que 32 quilômetros depois daquele acampamento ele tem que dobrar para a esquerda, sabe? Então ele tem, digamos assim, isso mapeando na cabeça. E à noite, obviamente, quando não tem luz, aí são as estrelas. E ai, um belo dia, a gente estava andando de noite, ele parou. Aí é legal, uma sensação muito gostosa, você no deserto, e quando você pára... “Você já fez algum exame de audiometria?” É como entrar numa câmara assim – como essa que a gente está aqui – à prova de som. E aí pôxa, a impressão que dá é que o teu ouvido começa a aumentar de tamanho, porque você não escuta nada. Mas aí você fala assim: “Não, como é que é?” A impressão que dá é exatamente essa, que você está tentando escutar alguma coisa que não está ali disponível. E eu me lembro que nós paramos nesse dia e saí do carro: a sensação nítida que eu tive é que eu estava escutando o meu coração, porque eu não escutava absolutamente nada. Aí eu comecei a escutar umas pulsações, sabe, tum! Eu falei: “Céus, o que pode ser isso, porra?” Sabe aquela ausência total de som? Aí eu falei: “Gente, esse silêncio é muito bonito, mas, pô!” Aí eu achei que estava escutando meu próprio coração. Aí deitamos um pouquinho para descansar e ficamos olhando para cima, e eu falei: “Pô, mas diz aí, como é esse negócio de constelação?” E ele foi mostrando, eu comecei a ver, quer dizer, comecei a ver depois que ele me deu as dicas, né? Algumas constelações que dava para ver da onde a gente estava, né?
P/1 – Bacana!
R – E é legal porque aí ele mostra para você: “Olha, nós agora vamos seguir aquelas três estrelas ali, nesse alinhamento, depois de tantos quilômetros a gente vai dobrar para a direita.” Eu falei: “Gente! Como é que pode, né?”
P/1 – Lindo!
R – Então isso é algo marcante em termos de experiência. Mais ou menos semelhante... Eu trabalhei muito pouco tempo na selva amazônica, fazendo lá um trabalho por 3, 4 meses, indo e vindo, e é também uma experiência marcante, porque é ao contrário: é o mar verde, né? Você está voando, e aí você vê aquela coisa verde para tudo quanto é lado. Hoje eu até estava comentando com os indianos, tinha uma foto da selva amazônica. E uma característica interessante que tem na selva amazônica é isso: são árvores com um caule bem fininho, bem cumprido, buscando o sol. A gente perdeu vários equipamentos, como sondas que eram transportadas por helicópteros e, às vezes, o piloto tinha que soltar aquele negócio e a selva, sem brincadeira, ela faz isso, ela abre e fecha, sabe? Então cada lugar tem a sua característica, né? Então a Líbia, para mim, teve essa coisa assim do ponto de vista profissional, foi uma coisa muito boa; primeiro, pela oportunidade de estar do lado de vender serviço, né?
P/1 – hum, hum.
R – Segundo, pelo lado do pessoal, porque foi um período muito gostoso, tirando a coisa de mundo árabe, né? Porque mundo árabe é outra história. Eu sempre digo para a minha mulher e para as minhas filhas, que todo dia elas têm que rezar uma Ave-Maria e um Pai-Nosso, pedir para papai-do-céu não nascer mulher em mundo árabe na próxima encarnação, sabe? Porque realmente é complicado, é muito complicado. E tem que passar um pouquinho lá para entender essa coisa da cultura, da religiosidade deles e tal, sabe? Mas, enfim.
P/1 - ____ ______?
R – É. E a Líbia que nós conhecemos é completamente diferente de hoje. A Líbia daquela época, eu me lembro, a gente via na televisão todo dia, o líder estava lá, o Kadhafi, dizendo o seguinte: “Óh! Os imperialistas americanos, os cães imperialistas, nós somos os “masters of the universe”, mortes aos cães, não sei o que mais”. E hoje é amiguinho, né? Então você vê como é que é, papai-do-céu nos dá essa oportunidade de ver essa mutação, né? Aquilo que antes era “Deus me livre, não quero nem ver pintado”, hoje estão aí. Enfim, política é isso mesmo. Mas da Líbia a gente trouxe assim... Primeiro, os meus filhos se lembram até hoje e sentem muita saudade, acho que pela própria ambiência, né?
P/1 – Hum, hum.
R – Ah, eu acho que a gente nunca comeu tão bem, em termos de disponibilidade de alimentos, de verduras, coisas frescas e tudo, como a gente teve na Líbia, sabe? Frutas maravilhosas! Porque o deserto é um...
P/1 – Tudo importado!
R – Não, aí é que tá, alguma coisa é importado, obviamente, né? Mas o deserto é um terreno muito rico em sais minerais. Então, basta ter água e – gente! – floresce o que você quiser. Então me lembro, menina! Nós tínhamos assim melâncias que eram maravilhosas, aquela coisa carnuda e com um gosto doce. Os pêssegos desse tamanho, né? Era uma coisa maravilhosa. Carne fresca! Eles matavam o boi, carne fresca e tal, com alguns probleminhas.
P/1 – Carneiro?
R – É. Não tinha carne de porco e também não tinha bebida alcoólica. Por outro lado, a Líbia é um país árabe que permite que as mulheres estrangeiras se vistam do jeito ocidental, né? Agora, você tem que tomar alguns cuidados, sempre usar sutiã, roupas mais folgadas, porque na nossa época, principalmente, os mais jovens, que tinham nascido durante o regime, eram muito abusados sabe? Tipo de passar a mão, dar beliscão e não sei o que mais. Então as mulheres eram sempre, assim: era conveniente que andassem em grupo, entendeu? Eu me lembro de uma historinha interessante da mulher do gerente geral da Braspetro, o Almeida, a Marli. O Almeida e a Marli eram pessoas muito econômicas – tô tentando achar uma palavra mais adequada – mas eu prefiro parar por aqui. Eram muito econômicos, né, com o dinheiro. Bom. No mundo árabe tem o que eles chamam de suks. O que é suk? É uma grande feira, imagina: 300 mil barracas e só homem, né?
P/1 – Um mercado!
R – Um mercado, né? Então ali você compra tudo. Então imagina um drive-in todo cercado. Eu digo “um drive-in” pela posição, um lugar todo murado, uma porta só, quer dizer, uma porta para entrar e, obviamente, a única porta para sair. Aí, um belo dia, a Cida chega lá em casa e fala assim: “A Marli, a esposa do Almeida, está convidando a gente, as mulheres para amanhã ir com ela nesse “suk”, para a gente comprar legumes e verduras, parece que é melhor comprar lá porque a gente compra em caixa, então, enquanto que na nossa rua principal – a Gargarij Street– a gente comprava – vamos supor – um quilo de maçã que custava, sei lá, dois dinares, um dólar, lá a gente poderia comprar a caixa por dois dinares. Ai seria dividida e tal.” Aí eu falei para ela: “Tá, você sabe aonde é esse “suk”, o que ela está dizendo?” “Não, mas ela falou que é um mercado grande.” “Tá bom, vamos passar lá, você vai ver.”A hora que ela viu o que que era aquilo, eu falei: “Olha, você está vendo isso aqui? Na hora em que vocês entrarem aqui, quatro, cinco mulheres nesse lugar...” Então imagina o que é entrar num lugar todo murado, com 380 mil barracas lá dentro, talvez com 550 mil homens e entrarem cinco estrangeiras pra comprar verdura ou não sei o quê! Eu falei:“Vem cá, qual é a economia que vocês dizem que vai gerar, 10 dólares, 15 dólares?” Meti a mão no bolso (riso), e falei: “Olha, tá aqui, esquece, isso não é para vocês entrarem. E outra coisa, pô, não viemos aqui também para fazer esse tipo de economia, se precisar de alguma coisa assim, eu ou o Almeida, um de nós vai, porque aí tudo bem, é homem, mas – pô! – mulher, não tem a mínima condição, sabe?” Então esses cuidados eram fundamentais.
P/1 – Eram Fundamentais.
R –E a Líbia era uma coisa interessante pelo seguinte: lá nós tivemos o embargo aéreo. No ano de 92, estava sendo declarado o embargo aéreo à Líbia por causa daquela confusão da Panam. E eu me lembro que numa quinta-feira, a gente recebeu um telefonema, aliás, numa sexta-feira, que era o domingo deles, a gente recebe uma ligação da sede falando assim: “Amanhã, mulheres e crianças fora da Líbia” Porque dali a 15 dias ia ser declarado o embargo aéreo e aparentemente alguém do Itamarati havia ligado para a Petrobras, dizendo que tinha uma certa preocupação com as medidas e as consequências. Então, para evitar riscos, a companhia tinha achado melhor que as mulheres e crianças saíssem da Líbia e fossem para Malta, para ficar em Malta, né? Então eu fui escalado para levar quatro, das seis famílias, eu levei quatro e mais os filhos, fomos para Malta. E aí elas acabaram ficando lá um mês. A coisa não teve nada, mas a companhia achou que era melhor elas virem para o Brasil e nós ficamos na Líbia. Então, os homens, durante 6 meses – isso foi de abril a outubro – nós ficamos lá sozinhos, mas lá na Líbia também não tem nada de mais (riso). Então ficamos lá, pôxa, bebendo, nos divertindo e trabalhando obviamente, né? Mas eu digo, a hora do lazer era na casa de um, na casa de outro.
P/1 – E em relação à bebida, vocês coseguiam levar? Vocês, estrangeiros.
R – É, bom, como já passou o tempo, não tem problema de a gente falar isso agora... (riso)
P/1 – Era no mercado negro?
R – É, era no mercado negro, né? Porque, veja bem, é um país...
P/1 - É conhecido, também é sabido que tem, que existe...
R – Que é conhecido, entendeu? E, olha, é aquela história... Aliás, há de se frizar o seguinte: nós faziamos vinho na Líbia. O Almeida, que era o nosso gerente geral da Braspetro, a companhia de óleo, esse que era econômico, né, ele tinha todo um laboratório na casa dele, com garrafões, não sei o que, e tal, e nós tínhamos essa coisa prazerosa. A cada 2 meses, nós íamos com ele no mercado, comprávamos uva, escolhíamos uma sexta-feira para ir a família, amassávamos as uvas, não sei o quê , papapa, aí deixávamos nos garrafões, aquilo ía fermentando, passando garrafa para garrafa, e, e dalí a uns 2, 3 meses, nós tínhamos o quê? Uns 30 litros de vinho. Era um vinho tinto, obviamente, né? Mas um vinho... Pô, imagina, num lugar em que você não tinha nada para beber, então...
P/1 – Era ótimo.
R – Então a gente dividia os custos, dividíamos a produção e cada um tinha a sua cota de vinho. Batizávamos o vinho, então a gente tinha de tudo, Château Almeidá, (riso) Château Passion, Château de tudo quanto era jeito, sabe? E era muito bom, era algo interessante. O meu filho, ele gosta muito de presunto, e como não tinha carne de porco na Líbia, eu me lembro que cada vez que a gente saía da Líbia de férias, ou vindo para o Brasil, e como tinha embargo aéreo tinha que sair por terra, né, porque a viagem de barco era complicada, eram 12 horas para chegar a Malta, então a gente saía pela Tunísia. Eu me lembro como se fosse hoje, quando a gente chegava no hotel na Tunísia – a Tunísia permitia carne de porco – ele chegava no café da manhã e falava: “Pai, eu posso comer presunto?” E eu: “Claro, meu filho, aqui pode comer presunto.” Menina, ele chegava com uma torre de presunto assim no prato dele. Então aquilo para era a redenção, exatamente, dos “n” meses que ele tinha passado lá sem nada, né? Então a Líbia pra gente foi um período muito agradável, sabe? Muito agradável. Tanto profissionalmente, como a integração que a família teve. Foi um momento muito importante que a gente teve. Tanto é, que você vê, apesar de tudo, a Cida decidiu por ficar mais um ano. E a gente não se arrepende não, com certeza!
P/1 – E de lá vocês foram para onde?
R – Voltei para o Brasil. Fiquei no Brasil uns 4, 5 anos mais, né? Nós ficamos na Líbia de 91 a 94. Em 97, eu estava assim já um pouco... Como eu te falei, eu sou taurino, então eu tenho um certo nível de ansiedade, sabe? E eu estava lá gerenciando essa atividade há uns 4, 5 anos, e aí falei com meu chefe:“Olha, eu gostaria de ser candidato a outros desafios. Não vim pedir nada, só queria que me considerasse para outros tipos de trabalho.” Aí, pô, papai-do-céu, um belo dia, faz com que me chamem: “Olha, assinamos um contrato em Cuba e você tem o perfil para ser o gerente geral lá da unidade.” Aí, já não era mais a empresa de serviços, aí era para ser gerente de uma unidade de E&P, como gerente da Petrobras nessa atividade em Cuba. Aí eu falei: “Não, não, não, não!” Aí agora, já que eu já tinha tomado aquela decisão anterior, mas, coincidentemente, nesse mesmo período tinha surgido uma oportunidade e um convite também, para trabalhar fora da Petrobras. E calhou que as coisas aconteceram quase que simultaneamente, quer dizer, a chance de a gente dizer “sim” para cá e “sim” prá lá. Eu falei: “Não, tem que ter um conselho de família, porque essa decisão agora não é só minha, né? E ganhou Cuba por três a dois. Decidimos então...
P/1 – Isso na votação familiar.
R – Na votação familiar, nós somos cinco. Aí Cuba ganhou na votação familiar e nós fomos para Cuba. Mas ai já foi uma visão um pouco diferente, porque nós chegamos lá em 2000, quer dizer, eu já tinha ido em 99, indo e vindo, e eles foram em 2000. E aí em 2000, a Carolina já tinha 19 anos, Flávio 17 e a Renata 15. A Carolina já estava fazendo a faculdade de turismo, então lá não tinha...
P/1 – A Carolina é a mais velha?
R – É a mais velha, é a mais velha.
P/1 – A pequena é que faz balé?
R – Isso. A Renata é a mais nova. Então tem a Carolina, que fez turismo, o Flávio está fazendo marketing e a Renatinha que é bailarina. Aí a Carolina não conseguiu achar uma faculdade de turismo lá, então ela ficou só seis meses e voltou para seguir a faculdade aqui. E aí foi o Flávio e a Renata com a gente pra lá. Aí foram numa escola também internacional, aí obviamente aprimoraram o espanhol, porque aí era espanhol, né? Aí a Cida, realmente, ela pagou um pato desgraçado, porque apesar de já não ter tanta a barreira da língua, né, mas em Cuba o “buraco é mais embaixo”, viu? Cuba é uma...
P/1 – Como é que...
R – É algo muito difícil.
P/1 – Como foi viver no país, a gente sabe tanta...
R – Não, olha, muitas pessoas me procuram porque como eu já morei lá e tudo, “ah, pô, me dá umas dicas”. Otimo! Olha só: você vai visitar um país que é muito bonito, o Caribe em si é muito bonito, quer dizer, se você fechar os olhos e escolher qualquer lugar no Caribe, pô, você vai ver que você não está perdendo muita coisa trocando de um pelo o outro não, é um mar maravilhoso, aquele mar azul turquesa, águas morninhas, sabe, aquelas areias finas, brancas. Então o Caribe é uma região bonita. Então eu digo o seguinte: Cuba é um lugar que vale a pena você conhecer, se você estiver lá naquela região, né, é um lugar que vale a pena você conhecer para você ir e passar lá uma semana, né? Tem aquela coisa assim, né, da história e da revolução, aquelas lembranças, né? O Che, o Fidel e tal” E tudo bem! Eu acho que para algumas pessoas toca mais do que em outras, mas é um lugar interessante. E, além disso, você tem sítios em Cuba – Cuba na verdade é um arquipélago, são mais de quatro mil ilhas e pequenos cayos. O que são “cayos”? Cayos são ilhazinhas pequetitinhas de 150 metros, 200 metros. E aí, como essas ilhas são muito próximas umas das outras, eles fazem uns pontilhões, assim, porque a água é rasinha e se vai colocando os blocos de calcáreo, pavimenta por cima e tal. Então você tem sítios como, por exemplo, Varadero, que, pô, é um postal, né?
R – E aí, além de Varadero, você tem um outro local no meio da ilha, chamado Jardines del Rey, onde tem Cayo Coco, Cayo Guilhermo. São lugares assim também muito bonitos, é o segundo pólo turístico de Cuba.
P/1 – Cayo Coco e Cayo?
R – Cayo Guilhermo. Para quem gosta de mergulhar, né, pôxa, na frente de Cuba está a segunda maior barreira coralina do mundo. A primeira está na Austrália e a segunda está ali. Então, quem gosta de ver corais, é algo realmente inesquecível. Você faz um cursinho rapidinho lá, pô, e mergulha, você vai lá ver aquilo. Então, é um lugar que apresenta, digamos assim, uma vantagem em relação a outros sítios do Caribe. É muito mais barato do que alguns locais do Caribe. Bom, mas se você vai para lá passar uma semana, você não vai ao mercado, você não vai ver prateleira de supermercado, você vai tomar seu banho todo dia com sabonete bonitinho que tá ali no seu banheiro, tem a toalha para você se enxugar, tem um café da manhã maravilhoso, aí você vai para os restaurantes, vai escutar a Yolanda, vai escutar não sei o quê toda hora, entendeu? Vai dançar a salsa... E, passou uma semana, você: “Pô, isso aqui é a solução para o Brasil, porque o cubano é alegre, tem estudo, tem isso e aquilo”. Mas, na verdade, por trás dos panos, a realidade é outra, bastante diferente.
P/1 – E as dificuldades?
R – Principalmente econômicas, né? Quer dizer, é um país que, obviamente, não tem petróleo, então é um país que não tem uma agricultura, porque ele foi baseado só na cana-de-açúcar, então não produz muita coisa. Ele depende muito de dinheiro do turismo, que é uma indústria relativamente nova lá; só de 91 para cá que tem o turismo. Então, o pouco dinheiro que eles ganham, eles reinvestem em turismo, que é para, pelo menos, gerar a economia do país, né? Tem os charutos que eles vendem. Então, obviamente, as coisas têm que ser sacrificadas para os cubanos, mas não para os estrangeiros que estão lá. Mas para o estrangeiro que está lá, você vai ao mercado e não acha os produtos, você não acha material. E aí é o que eu sempre digo para os meus amigos: “Você não sabe o que é ter dinheiro para ir ao mercado e não ter o que comprar”. Pôxa! Então o custo desse negócio é infinito, porque, pô, não é questão de ter ou não ter dinheiro, né? Eu me lembro – esse era o grande problema de Cuba – você tinha que ir ao mercado todo santo dia. Aí que eu digo: em Cuba já teve uma grande separação. Enquanto que do lado profissional e pessoal na Líbia, as coisas eram, digamos assim, interessantes, eram legais e tal; já em Cuba, o lado profissional tinha algumas mazelas por causa da dificuldade, não sei o que e tal.
P/1 – E o que você estava fazendo em Cuba?
R – Eu era o gerente. Aí é que tá, a Petrobras havia assinado um contrato para a exploração de um bloco offshore, lá, no litoral norte da ilha, para furar um poço. Então era um contrato de risco, né? Então nós tínhamos 9 meses para perfurar um poço e, é o que a gente chama no nosso jargão, “um poço de alto risco e alto prêmio”, né? Quer dizer, a chance de achar petróleo era muito pequena, mas se achasse petróleo era algo muito bom. Então, numa carteira de negócio de qualquer companhia petroleira, você tem aquilo que é a “poupancinha”, digamos assim, que todo dia dá um negocinho, mas você tem aquilo que é o risco, né, e é aqui que você alavanca teus negócios. Cuba reunia essas condições. Então a companhia assinou esse contrato e eu fui indicado para ser o gerente geral da Petrobras em Cuba, onde nosso trabalho era o quê? Reunir todas as condições técnicas operacionais de logística para viabilizar a perfuração deste poço no offshore de Cuba. Então nós preparamos tudo durante 9, 10 meses, perfuramos o poço em quatro meses e meio, mas infelizmente – nós tínhamos só 8% de chance de achar petróleo – prevaleceram os outros 92% de chance. Aí depois nós fechamos as atividades e voltamos para o Brasil. Mas o viver lá era aquela história: até no aspecto profissional era muito complicado. E aí, se você me permite, eu vou te dar alguns casos verídicos. E é isso que eu digo, a questão de Cuba, isso para o cara que vai lá, fica uma semana e vem embora, não vai aparecer. Por exemplo, eu cheguei uma vez lá para o meu motorista e falei assim: “Chirino – Chirino era o nome dele – eu queria comprar uma máquina de perfurar”. Eu tinha alugado uma casa do Estado – porque lá tudo é do Estado –, depois eu te conto essa história, que levou três meses para pintar, né? Mas depois de pronta a casa, depois de três meses de o famoso “inferno socialista”, eu falei assim: “Pô, eu queria comprar uma máquina de furar porque eu queria botar uns quadros nas paredes, tá bom?” “-Ah, tá bom.” Aí demorou uma semana, demorou duas, eu falei: “Chirino, cadê a furadeira?”; “- Ah, tá demorando mas...” Eu falei: “Mas, pô, não tem aqui uma loja de ferragem?” Eu não sabia, não tem loja de ferrgem lá. “Não, mas tô quase conseguindo uma.” Não sei como ele estava conseguindo, bom. Aí ele me aparece com a caixinha da máquina de perfurar: “Pô, finalmente trouxe.” Eu abri: “Chirino, cadê as brocas?”; “Ah, broca aqui não tem.” Eu falei: “Chirino, o que que eu vou fazer com uma máquina de furar sem a broca?” “Olha, eu também achei muito estranho quando você pediu uma máquina de furar, porque todo mundo sabe que aqui em Cuba (riso) não tem as brocas, né?” Eu falei: “Ah, então ótimo, então eu tô com algo aqui que não me serve, é isso, né?” Só para te dar um exemplo de que que eram as coisas. Aí tive que ligar para o Brasil pedir para botarem as broquinhas no malote para mandar para lá. A Cida, minha mulher, “chutava o pau da barraca”, todo o santo dia, né? Ela precisava comprar toalha e foi numa loja lá, depois de rodar uma semana. Porque é aquela história, como tudo é do Estado, as lojas todas são do Estado, se não tem em uma, não adianta ir na outra, porque não vai achar. Mas achou. Alguém falou para ela que no centro, na rua tal, e ela foi lá e “tum”, estava lá, aquela prateleira cheia de toalha. Da mesma cor, né, as toalhas, as toalhas...
P/1 – Toalha de mesa ou toalha de banho?
R – Toalha de banho, toalha de banho. Ela falou: “- Pô, não quero nem saber se é verde, amarela, eu quero.” Ela falou assim: “- Minha filha, eu quero três toalhas, por favor.” Aí a atendente que está atrás do balcão e que se vender ou se não vender vai ganhar os mesmos 10 dólares por mês, tá certo, então na verdade ela tem uma vontade de te atender “muuuito grande”, entendeu? Você está ali atrapalhando o dia-a-dia dela, o descanso dela, entendeu? Bom. “Ah, senhora, a gente não pode vender a toalha hoje.”; “Mas por que não pode?”; “Não, porque nós estamos fazendo inventário.” “E qual o problema de fazer inventário?” “Não, senhora, inventário aqui nesse país é uma coisa muito séria.” Aí ela começa a te dar um aula sobre inventário. Cida falou assim: “Minha filha, veja bem, eu quero três toalhas; então, olha só, tá aqui 30 dólares, você escreve aqui, me dá as três toalhas, você põe no papel, onde tinha três toalhas, você põe esse recibo de 30 dólares e o cara vê no caixa os 30 dólares.”; “Não, senhora, aqui em Cuba inventário é feito com muito controle.” Claro, todo mundo rouba, né, porque todo mundo acha que é dono daquilo também, todo mundo leva alguma coisa, então tem que ter inventário todo santo dia, não é verdade? Aí você entra numa discussão com ela que não vai levar a lugar nenhum e as suas três toalhas que você precisava você não vai levar.
P/1 – E não levou.
R – E não levou a toalha naquele dia, obviamente. Qual é a hora que você sai para comprar pão de manhã cedo? Sete horas da manhã você sai para comprar um pãozinho fresco e tal, então tá bom. Aí eu vou lá na padaria – tinha uma rede nova francesa, que funcionava 24 horas – e aí você chegava todo dia às sete horas da manhã, tinha uma fila enorme. Falei assim: “Mas, pô, eles devem fazer muito sucesso, né?” Aí eu parei lá, não, era pelo seguinte: é porque eles trocavam a turma às sete horas da manhã. Então como eles trocavam a turma às sete horas da manhã, a turma que saía tinha que contar o dinheiro do caixa e a turma que entrava tinha que contar o dinheiro do caixa. Então, eles acabavam essa confusão às oito e meia da manhã. Na hora em que está todo mundo querendo comprar pão, esses desgraçados estão fazendo o caixa. Aí eu falava assim: “Minha filha, porque você não pode fazer às cinco e meia da manhã, troca o turno às 9, às 8?”
P/1 – Ou às 10.
R – Às 10, a hora que for, mas às sete da manhã, está todo mundo aqui fora... Então você acaba se acostumando com esse tipo de, digamos assim, de situação. O lance da pintura da casa, que o pessoal até teatralizou lá na Braspetro (riso), né? Pô, mas é verdade. Eu estava numa casa, que era o nosso escritório, aí não estava conseguindo casa para eu morar, arrumei um escritório, falei: “Não, essa casa aqui é o nosso escritório, dá para ser minha casa”. Era uma casa de dois andares, tinha dois salões muito grandes embaixo e, em cima, tinha quatro quartos, tinham os dois banheiros, tinha um jardim bacana na frente, jardim atrás, tá bom! Aí, tudo lá é do Estado. Aí você aluga a casa ao Estado, então a administradora é que presta serviço para você. E eu falei assim: “Olha, eu queria pintar a casa, porque minha família vai vir para cá.” Tá bom! Aí apareceu uma brigada – porque tudo lá é brigada – apareceu uma brigada, né, quinze pessoas. “Vamos pintar”. Eu falei: “Porra, vai pintar essa casa aqui..”
P/1 – Num dia.
R – Três dias, pô, se muito. Aí, eu passava lá de manhã, passava de tarde. Chegava de manhã estavam os caras sentados: “Escuta, por que que não tem trabalho?”; “É porque a tinta não chegou, a tinta vinha para cá, teve que ir para outra obra, nós estamos esperando a tinta”; “Ah, tá bom!” Aí você passava de tarde a tinta não tinha chegado. Aí você chegava no outro dia, estavam os caras, estava a tinta: “Amigo, o que que houve hoje?”; “É por causa da escada pra pintar o segundo andar, a escada estava ontem aqui, mas hoje teve que ir para uma outra obra não sei aonde.”; “Tá bom.” Aí, no terceiro dia, tinha a tinta, a escada, mas não estavam os homens, né? E eu falei pra ele: “Motorista, cadê os homens?”; “Ah, foram chamados, hoje vai ter um discurso, aí todo mundo é convocado para participar do discurso.” Então, tinha dia que tinha a tinta e a escada e não tinha os caras entendeu? Então levou três...
P/1 – Quase enlouquecedor...
R – É, é. Aí algo que você pintaria em cinco dias levou três meses. Enquanto isso, eu ficava em um hotel com a minha família, pagando 185 dólares por dia. E aí, toda sexta-feira, eu fazia um relatório da atividade, que eu mandava uma cópia para o Ministro de Estado, porque em Cuba são mil olhos e mil ouvidos.
P/1 – Para o Ministro de Cuba?
R – De Minas e Energia. Mandava para ele, mandava para o diretor da Cuba Petróleo, mandava para o nosso embaixador, mandava para a sede do Rio de Janeiro, da Petrobras, porque – como eu aprendi, Cuba é um grande Big Brother, todo mundo sabe o que que está acontecendo lá, todo mundo sabe, todo mundo vigia todo mundo – era maneira que eu tinha de registrar numa folhinha só o que que estava acotecendo, as ações que faltavam, as coisas que tinham vencido, para manter eles ao par. Em Cuba, eles querem o seguinte: qualquer empresa que vá para lá trabalhar, eles querem que você cumpra com o cronograma, que você cumpra com o seu orçamento, que você diga tudo que está acontecendo, é isso que eles querem. Se você fizer isso você está de bem com o Estado. E eu fazia, primeiro porque a Petrobras sempre age assim, segundo porque, para mim, era, pelo contrário, era um canal que eu tinha para fazer chegar aos caras coisas como essa, por exemplo. E, toda sexta-feira, eu botava lá: aguardando a conclusão da pintura da casa do gerente geral. Entre umas coisas eu botava isso. Até que um belo dia o Ministro manda me chamar: “Você precisa escrever isso aqui no seu relatório toda sexta-feira?” Eu falei: “Claro! Claro que eu preciso. Em que país do mundo se leva três meses, Ministro, para pintar uma casa? A minha sede acha que eu estou de sacanagem, que eu estou ficando num hotel, pagando 165 dólares por dia, ao invés de ficar na minha casa. Então tenho dois problemas. Um: o palhaço sou eu, né, para a minha empresa, eu é que sou o vilão da história. E dois: esse dinheiro que a gente está gastando, ministro, eu não recupero nunca mais, né, porque a empresa que não precisava estar gastando isso, está lá.” E o Ministro: “Você consegue resolver isso?” Eu falei: “Perfeitamente, o senhor fecha os seus olhos para o que eu vou fazer, mas eu resolvo isso em uma semana.”; “ Então pode fazer, não me diga nada, mas pode fazer.” E fiz. Peguei 1000 dólares do caixa lá da empresa, cheguei para aquela brigada e falei: “Olha, preciso pintar essa casa em uma semana.” E a casa foi pintada em uma semana! Aí tinha as tintas, tinha a escada, tinha todo mundo trabalhando e sabe como é que é? Então, o verbo que mais se usa em Cuba é resolver, né? As pessoas aprendem a resolver as suas coisa, entendeu? Então, lá tem muita informalidade, tem muito mercado negro. Ah, tem a história de um maldito joelho! Eu tinha comprado uma máquina de lavar roupa e faltava, para instalar a maldita máquina de lavar roupa, um joelho de pvc de 1,5 polegada. Menina, eu passei 20 dias procurando o maldito joelho de 1,5 polegada e não tinha. Eu já estava pedindo para o Rio de Janeiro mandar isso aqui e “nego” rindo da minha cara, eu falei: “Gente, vocês não sabem!” Imagina o que é você chegar todo dia na sua casa, e a sua mulher estar com aquela cara que você conhece, né? Aquela coisa assim bem “zen”, entendeu? “É para esta merda que você me trouxe? Eu continuo lavando a roupa na mão, viu?” Eu falei: “Calma, eu estou quase conseguindo a peça.” Aqui era isso, aqui era aquilo, aqui era não sei o quê e tal, taí. Ó, tô aqui trabalhando, mas não tem problema!” Pô, aquilo vai, né? Aí, um belo dia, eu estou chegando no trabalho, tem lá um camarada fazendo uma obra, um bombeiro, aí eu chamei assim: “Meu irmão, vem cá. Onde é que eu consigo aqui um joelho de 1,5 polegadas?” Ele desceu e falou assim: “Olha, aqui não tem, mas eu sei onde tem.” Falei: “Ôpa, entra aqui no carro.” Aí, ele entrou. “Vamos lá para Havana Vieja”, aí fomos lá para a parte antiga da cidade. Entramos num labirinto de carros e ele falou: “Pára aqui.” Aí eu parei. Aí ele entrou numa casa, ficou uns 15 minutos, e voltou com uma caixinha, entrou no carro, abriu. Menina, na hora em que ele abriu aquela caixinha, eu estava assim, uns 15 centímetros de distância do maldito joelho de 1,5 polegadas de pvc. Aquilo para mim, era um – sei lá – um Oscar. É um negócio assim... pô!”
P/1 – Prêmio, né?
R – Ele falou assim: “10 dólares tá bom?” Eu falei:“Olha, tá caro, mas tá bom.” Pô, se ele me pedisse 100, o que ele pedisse ali, eu estava dando para ele, entendeu? (riso) Então, são essas coisas... Ah! Falando que a mulher estava nervosa, um belo dia, eu cheguei em casa e ela estava rindo. Eu falei, “Pôxa, finalmente alguma coisa...”
P/1 – O que aconteceu?
R – Eu falei: “O que houve?”; “Olha, chegou creme de leite no mercado.” Eu falei: “Meu deus, você está satisfeita porque chegou creme de leite no mercado?” Ela falou: “É, pôxa, há mais de 15 dias que não tinha creme de leite, né?”(riso) Aí eu abri a estante, céus! Ela tinha comprado as 24 latinhas de creme de leite, tinha falado para todas as outras amigas e tal. Então, Cuba é esse exercício freqüente, né, de você ter que ir ao mercado todo dia. E no trabalho a coisa ainda é pior. Porque no trabalho é o seguinte – imagina você, eu vou te dar um exemplo muito fácil: nós tínhamos alugado um lugar no pier, então nós tínhamos uma embarcação que vinha para pegar material e levar para a sonda. E nós estavamos reparando que demorava para o fiscal liberar o barco. Nós pagávamos por este barco – sei lá – oito ou nove mil por dia, e demorava dois dias para o cara liberar o barco, apesar de ser uma coisa rápida, né? Falei: “Tenho que ir lá conversar com esse cara para saber qual é o problema.”; “Doutor, é o seguinte, eu não tenho carro, a minha bicicleta quebrou, então para ir lá no porto, eu tenho que vir da minha casa andando até lá.”; “Ah é? E vem cá, e se eu deixar um carro e um telefone celular com você?”;“Ah, aí eu libero em 10 minutos.” Então, passou a ser muito mais prático e econômico (riso) dar um celular para esse camarada e um carro alugado – que a gente pagava 100 dólares por dia – do que gastar oito mil dólares com o barco que estava lá esperando que o cara saísse, você está entendendo? Então, não é que é má vontade não, porque o cara diz assim: “Olha, eu não vou me mexer daqui porque não vou! Agora, eu vou levar tempo e tudo isso.” Então isso era cotidianamente. Teve um dia, a minha professora de espanhol, também da professora da Cida, era uma senhora já, né? Um dia, eu acho que eles me provocaram de uma tal maneira – eu acho que eu sou um cara muito paciente, um cara que tem o pavio muito longo – aí teve um dia que alguma coisa aconteceu, e eu explodi. Cheguei em casa: “Olha, vocês venceram!” Falando com a minha esposa e falando com a professora: “Não dá mais, eu achava que eu estava aqui, fazendo o melhor que eu posso e tal, e agora esse negócio. Olha, eu não aguento mais! Vocês conseguiram me transformar, eu fiquei verde está vendo, eu tô verde de raiva e tal!” E ela ouvindo caladinha, né? “Olha, eu não aguento mais, a minha paciência a-ca-bou, a-ca-bou!” Aí ela falou assim: “Você já acabou?” Eu: “Já, só queria botar prá fora, mas já terminei.”; “Posso dar uma sugestão para você, posso te dar um conselho?” Eu falei: “Pode.”; “Compre mais.” Eu falei: “O quê?” “Paciência. Porque isso é que o cubano faz todo santo dia.” Ele compra mais paciência, entendeu? Então, para eles também e só por causa do respeito que eles têm por Fidel, as coisas não aparecem, mas eles também sofrem muito. Imagina: a gente ainda sofre um pouquinho tendo dinheiro, né?
P/1 – Para eles ainda é pior...
R – Imagina o que que é isso numa escala, né, sem dinheiro, entendeu? Então, Cuba pra gente foi um pouco mais sacrificado. Sacrificado pelas condições locais, mas para a garotada... Pô, meu filho namorou a sobrinha-neta do Fidel, do Raul. O meu filho é “fogo”! Ele tinha conhecido essa garota lá na escola internacional e eu tô vendo que o namoro tá complicado e tal, e os pais dela não querendo que ela fosse lá em casa, então eu falei: “Flávio, faz o seguinte: convida os pais para virem aqui em casa que, tá achando que eu sou o quê, um bandido, um mal elemento?” Então os pais vieram, aí começamos a ficar amigos e o namoro decolou, né? E eu tô achando que ela é uma menina como outra qualquer, sabia que ela tinha uma coisa com cubano, mas, pô, né? Aí um belo dia, tô lá regando meu jardinzinho, minha roseira amarela, que eu tinha no meu jardim, aí o Flávio perguntou: “Ô, pai, o Fidel não tem um irmão?” Falei: “Tem.”; “Como é que é o nome dele?” Falei: “Raul”, “Ah, acabei de falar com ele no telefone.”
P/1 – Era o pai da menina?
R – Era o tio-avô.
P/1 – O tio-avô da menina.
R – Eu falei: “Peraí, Flávio, então como é que é o negócio?”; “A Mônica, a mãe dela é da família lá da esposa do Raul.” Eu falei: “Raul Castro?” E a Mônica tinha 13 anos, mas era um mulherão, sabe? E o meu filho com 17, né? Imagina!E os dois naquele namoro, aquela coisa toda e eu falei: “Meu filho, em qualquer lugar do mundo uma menina de 13 anos é problema, né? Em Cuba, uma menina de 13 anos (riso), principalmente sendo quem ela é, né?” Falei “Meu filho, faz o seguinte, vai devagar, segura a onda um pouquinho, entendeu? Se você precisar de alguma coisa, vai pensar em alguma outra coisa, mas, pô, pelo amor de deus, num faça nada, (riso) para o bem estar da sua família e do seu pai aqui em Cuba, tá entendendo?” E foi ótimo o namoro deles. Aí, obviamente, a gente veio embora, aí a distância acabou, mas são grandes amigos, já nos vimos outras vezes. Mas foi muito bom esse período lá. Isso foi em 2001 e voltei em 2001. Aí eu fiquei dois anos na E&P, o E&P me chamou para ficar lá dois anos numa atividade, onde eu fiquei, mas aí voltou de novo alguma coisinha com Cuba. A área internacional estava precisando de gente, eu também não estava muito satisfeito assim, eu não gosto muito do que tem uma certa rotina, né?
P/1 – Hum, hum.
R – E achei que estava assim precisando um pouquinho mais de ação. Aí a área Internacional me chamou de novo e voltei prá lá. Quer dizer, desses 16 anos com a área internacional, tem dois anos de E&P. Aí voltei prá lá desde de 2005, por aí, 2004, não, foi 2003, exatamente. Entre 2001 e 2003, eu fiquei na E&P. Em 2003, eu voltei e em 2005, tô eu lá sentado, o meu chefe me chamou e falou o seguinte: “Olha, a gente tá crescendo muito, tem muita atividade para área no norte África, para Oriente Médio, para a Ásia, e a gente está pensando em botar alguém na Inglaterra, para ficar olhando isso, sendo um ponto de apoio na Europa. A gente queria saber o que que tu acha?” Eu precisei de uns dois segundos para pensar mais ou menos, se um negócio desse me interessa ou não interessa e tal: “Eu vou!”; “Mas aí, sabe como é que é, né, esse negócio vai ter muita viagem, né?” Eu falei: “Olha, viajar para mim é cachaça, eu adoro esse negócio.” Pior que eu gosto mesmo, sabe? Mas aí, aquela história, hoje a Carolina está com 25, o Fávio está com 23, Renata está com 21, então eles já não podiam ir porque trabalham, estudam aqui, e a mãe, pôxa, não vai deixar as crianças (riso), sozinhas, né? Então, eu estou desde 2005 na Inglaterra. Então, todo mês, eu sempre tenho uma coisa para fazer no Rio e tal, a cada 30, 40 dias eu venho, passo um fim de semana ou quando sou chamado aqui para alguma reunião. E a cada três meses, mais ou menos, a minha esposa vai e fica lá duas ou três semanas, né?
P/1 – Fazendo revezamento.
R – Fazendo revezamento. E garotada vai quando pode, quando tem uma brecha, férias. Agora mesmo eles estiveram de férias, então uma foi na frente, passou três semanas, voltou. Depois o outro foi e tal. A Renata agora inclusive encontrou um um amigo dela lá da época de Cuba, que o pai dele é o embaixador da República Tcheca e está em Dublin, na Irlanda. Então, foi, esteve lá em casa, foi a maior festa, parece que estão “ficando”, entendeu? Mas enfim...
P/1 – (riso)
R – As coisas que acontecem, esse mundo é muito pequeno, né? E agora sei lá. A minha missão termina agora em setembro e tô muito satisfeito, porque é um trabalho que associa duas coisas que eu gosto muito de fazer: viajar, conhecer novos países, novas culturas, então nos últimos 2 anos, já estive na Mongólia, estivemos agora na Jordânia, estamos desenvolvendo...
P/1 – Vocês vão ver os blocos, a possibilidade de... Como é que é?
R – A gente tem liberdade... A área de desenvolvimento de negócio da área internacional busca oportunidades lá no exterior. Oportunidades tanto no segmento de perfuração, de exploração, que a gente chama de “upstream”, como o de gás, como de refino, né? Então o nosso chefe me falou assim: “Não, você vai trabalhar debaixo da coordenação aqui do pessoal da sede, mas vocês têm liberdade, eu e um rapaz que estava lá comigo, o Bassim Djahjah , aliás, ele vai gostar de ser chamado de rapaz, porque ele já tem 61 anos, mas que é uma pessoa jovem de espírito, eu gosto muito dele. Então estamos eu e o Bassim e a gente está aproveitando um espaço no escritório da área do abastecimento, que faz trading na Inglaterra, então a gente está ocupando uma salinha, nós estamos dividindo os custos e tal. Então, qual é a idéia? A gente trabalha debaixo da supervisão da sede, quer dizer, a gente é ativado por eles, sempre que eles precisam, a gente vai em alguma lugar para buscar alguma oportunidade, para conversar com alguém, para participar de um evento ou ter uma reunião com alguma empresa. Mas a gente tem liberdade também de buscar novas oportunidades, né? E Londres é uma cidadezinha muito interessante, por quê? Primeiro, porque o centro financeiro do mundo está lá, todas as empresas de petróleo tem sede lá, todas as empresas de consultoria técnica tem gente lá. E Londres é um “hub”, pô, saem de Londres todo dia 600 aviões para tudo quanto é lugar do mundo, né?
P/1 – É.
R – E o Brasil é longe, né, quer dizer, se você pensa em Oriente Médio e Ásia...
P/1 – Fica mais pesado, né?
R – Só para qualquer lugar da Europa são 11, 12 horas. Então imagina o que é você ir para uma reunião em Deli. Você vai tirar alguém do Rio para ficar dois dias no avião, para fazer uma reunião de um dia e voltar? Quer dizer, o cara fica quatro dias no avião, para ficar quatro horas numa reunião? É complicado.
P/1 – Demarco, quando você teve esse convite, né, foi inclusive falado do crescimento da área. Me fala um pouco, você está há 16 anos acompanhando a área internacional, o que que foi o crescimento nesses 16 anos?
R – Olha, na época acho que a gente só tinha operação em Angola e nos Estados Unidos. Hoje a genta tá em 22 países, né? Só para você ter uma idéia, eu acho que a gente tinha operação na Líbia, em Angola, na Inglaterra, Estados Unidos. Eu acho que eram quatro unidades, sabe? E hoje estamos em 22 países. Eu não tenho dúvida que a Companhia tomou a decisão muito certa de se internacionalizar. É impressionante! Hoje mesmo eu estive com essa delegação indiana lá no Cenpes, e eu estava até comentando com uns colegas do Cenpes como é prazeroso, como deixa a gente assim muito orgulhoso, por exemplo, eu chego na Mongólia, aí o cara fala assim: “A gente ouviu falar muito da Petrobras.” Dá vontade de chorar, né? “Meu deus!” Porque uma coisa é o cara falar “eu sou brasileiro”, o cara “ah, o Pelé...” e outra coisa é isso, né?
P/1 – Ronaldinho.
R – Ronaldinho, futebol, o cara sempre fala, né? Brasil, futebol. Mas não, os caras falam de Petrobras, então a fama nos precede. Então, eu acho que a internacionalização da companhia é um fato, a companhia apesar de não ser boa em marketing – isso eu estou fazendo uma autocrítica, né? E eu acho que é o que a gente tem que trabalhar, estamos trabalhando muito pra isso.
P/1 – Fora do Brasil?
R – Fora do Brasil. É, fora do Brasil. Veja bem: nós somos uma empresa fantástica em termos operacionais, em termos de tecnologia, isso ninguém questiona, ninguém discute. Mas a galinha cacareja; a pata também bota ovo e só porque não cacareja o pessoal acha que a pata não bota ovo, mas bota ovo também, tá entendendo? Só que a galinha é que cacareja. Pô, você tem que botar o ovo e tem que cacarejar, senão não adianta.
P/1 – Você acha pouca a divulgação da Petrobras fora do Brasil?
R – Acho, acho, acho, acho. Eu acho que já avançamos muito, muito mesmo, né? Mas eu acho que a gente ainda tem um grande espaço para percorrer. Veja bem, para mim, é o seguinte: é empreender, é fazer marketing no sentido de buscar, capturar o máximo de valor nas coisas que a gente faz, ou seja, não é só porque a gente exporta e tal que tá bom. Não gente, olha, e aí? Eu posso fazer mais alguma coisa, eu posso buscar alguma outra oportunidade? E isso que a gente já faz já pode alavancar uma outra oportunidade? Vou te dar um exemplo: esse projeto do Xisto, que a gente está trabalhando agora junto com um grupo de valorosos colegas da ABAST e da área internacional.
P/1 – Da onde?
R – Por que valorosos? O Brasil produz esse óleo de xisto, né, lá no Paraná, em São Mateus do Sul há mais de 20 anos. E esse negócio estava lá como algo, né, teve um momento em que produzir petróleo era nossa missão, não sei o que e tal, só que depois que você descobriu petróleo no mar, pô, a escala ficou muito mais, tecnicamente falando, economicamente era muito melhor no mar, do que tirar ali de rocha, né, bom, na superfície. Só que com óleo chegando a 60, 70 dólares o barril várias empresas e vários países vieram a Petrobras, disse: “Gente, olha só, vocês têm algo aqui que nos interessa, vocês são a única empresa no mundo que produz óleo comercialmente dessa formação do oleo cheio, né, há 20 anos, e a gente gostaria de usar essa tecnologia lá: Jordânia, Marrocos, Mongólia, China e Estados Unidos.” Então, os caras vieram aqui, sabiam tudo que a gente fazia, não porque a gente alardeava, porque interessa para eles e eles querem esse negócio, entendeu? Então, a gente aproveitou essa oportunidade e, graças a deus, a coisa está avançando, quer dizer, estamos levando.
P/1 – Vocês estão vendendo então o xisto?
R – Não, a gente está aproveitando esse conhecimento, essa história de sucesso que nós temos, que é da produção, nós desenvolvemos uma tecnologia para um equipamento, que se chama “retorta”, para pegar essa rocha, que tem óleo impregnado que dá na superfície. Você coloca essa rocha de um certo tamanho dentro desse “forninho”, vamos chamar assim, põe temperatura e com a temperatura você tira o óleo que está na rocha, tá? Bom. E isso passou a ter um valor tremendo. Então a gente está usando isto, assinamos agora um memorando com a Jordânia, estamos acionando com Marrocos. Nos Estados Unidos a gente foi participar de um seminário no ano passado, o departamento de estado falava assim: “Meu deus do céu, mas como é que vocês não divulgam esse negócio?” Então a gente tem um diamente bruto na mão. Só para citar um exemplo. Então eu sinceramente acho que a gente poderia – num momento desses de crescimento da empresa, e pelo fato da empresa já ter um certo recohecimento mundial – buscar mais negócio mesmo. Graças a deus, eu estou num grupo de desenvolvimento de negócio que cada fez que eu chego num lugar e que a gente diz que é Petrobras, é impressionante a quantidade de já de: “Vem cá, eu quero álcool”; “E o negócio do biodiesel?” E não sei mais o quê. Então você vê, basta ter alguém lá, né? E a gente vai porque nos interessa, a gente vai abrir nova fronteira, esse trabalho que a gente faz.
P/1 - O álcool também é um mercado que vai crescer.
R – Ah, muito! Metanol, biodiesel, biocombustíveis, entendeu?
P/1 – Vocês têm sido também procurados ou vocês estão oferecendo?
R – Muito. Principalmente daquelas bandas lá da Índia. Por exemplo, a India é um país agora que a gente está com essas conversas de biocombustível e de álcool. Eu acho que funciona das duas maneiras, né? Porque todo mundo sabe da questão do álcool, o plano que o Brasil desenvolveu há vários anos, mas às vezes falta o seguinte, o cara quer saber: “Com quem da Petrobras que eu falo?” Então é aquela história, bicho, se você não tem alguém; porque o vendedor é isso, você tem que ir lá, bater e falar. Você precisa comprar uma enciclopédia, você vai buscar ou o cara da enciclopédia que vai lá bater na sua portinha, entendeu? Então eu acho que já tem vindo empresas para cá, eu acho que a gente precisa dar um pouco mais, digamos assim, de valor estatégico à coisa do empreender, do fazer o marketing do que a gente tem. Claro, buscando sempre negócio, porque a gente está num momento de crescimento. Então acho que o momento é esse, vamos aproveitar esse negócio, pô! Nós somos a quinta, sexta ou sétima empresa de petróleo do mundo, então por que não? Nós somos uma empresa que tem uma composição interessante, porque nós somos uma empresa estatal, mas também dois terços do capital da empresa está nas mãos de investidores. Nós temos dois chapéus. Então, quando me interessa eu sou estatal, porque para uma ONGC – que é uma empresa estatal – fazer negócio com uma empresa estatal é bom porque eu não sou estatal; agora, quando não me interessa dizer ou quando não agrega nenhum valor dizer que a gente é estatal: “tá aqui ó, nós temos ação na bolsa de valores.” E aí o cara vai ver que a gente trabalha também em cima de lucratividade. Então, é saber usar isso.
P/1 – Claro. Demarco, infelizmente, a gente está acabando a nossa entrevista...
R – Que pena! (riso)
P/1 – Eu poderia passar horas ouvindo também suas histórias
R – (riso)
P/1 – Eu acho que você deve ter muito mais ainda para contar...
R – Olha, eu fico muito satisfeito de poder de alguma maneira colaborar. Eu lamentava muito, porque tem tantos momentos que a gente atravessa na vida profissional, da empresa, ainda mais com essas oportunidades, né? De repente você está fora e acontecem fatos curiosos, fatos pitorescos e tudo, e era uma pena porqueque a gente não tinha os instrumentos para tentar de alguma maneira capturar, guardar, armazenar isso. Mas, graças a deus, eu fico muito feliz de ver que de alguma maneira a gente está tentando preservar um pouco dessa história de sucesso, né? Eu fico muito feliz de estar fazendo parte dela também.
P/1 – O que é a Petrobras para você? Você se sente um petroleiro também, você tem essa coisa da identidade do petroleiro?
R – (riso) Deixa eu te dizer uma coisa. Eu gosto muito de colecionar pensamentos, frases e tal. E tem um que eu ouvi de um amigo, eu recebi um prêmio há pouco tempo, e eu uso muito, né? Eu tenho 27 anos de Petrobras, vou fazer 28 agora em janeiro. Eu também tenho 27 anos com minha esposa, e ela diz assim: “Não, não, não, não, tchã, tchã, tchã, você é casado com a Petrobras, eu sou sua amante!” Eu digo: “Então não reclame, porque a gente não trata melhor as amantes do que as esposas? Até agora você está em vantagem, né?”(riso) Então eu acho que o dia que a gente entra para a Petrobras, a gente acaba tendo um outro casamento, a gente passa a estar casado também com ela, sabe? Eu acho que o nosso grande desafio é de conciliar essas coisas; quer dizer, eu me considero uma pessoa muito obcecada pelo que eu faço, apaixonada pelo que eu faço, mas também muito apaixonado pela minha família, sabe? Eu acho que o meu grande exercício é conciliar essas coisas, mas o saldo tem sido positivo, tem sido positivo.
P/1 – Que bom.
R – Tá bom?
P/1 – Olha, a gente queria agradecer.... Ter tido essa chance de pegar você aqui nessa passagem...
R – Pois é.
P/1 – Só me conta rapidamente: você está aqui no Brasil agora, vcê até falou dos indianos...
R – Isso.
P/1 – Me conta: o que vocês estão fazendo?
R – Bom... Eu estou trabalhando com a Índia desde 2005, nós estávamos buscando oportunidades na Índia, acabou antecipando um pouquinho, eles entraram em blocos aqui no Brasil, onde a Petrobras passou a ser sócia deles. E eles abriram oportunidades pra gente na Índia. Eles vieram aqui agora para analisar algumas oportunidades, então nós vamos analisar oportunidades na Índia que pertence ao ONGC, blocos que pertencem a eles. Vamos entrar de sócios, provavelmente. E eles vieram pra ouvir também as ofertas que Petrobras está fazendo. Então pode ser que a gente seja sócio deles lá, e eles aprofundem mais essa sociedade com a Petrobras aqui no Brasil.
P/1 – Lá é estatal também?
R – Lá é estatal, ONGC é estatal, Oil and National Gas Corporational – é a Petrobras deles, é uma empresa da Índia, ONGC. Tá bom?
P/1 – Tá. Olha, sucesso...
R – Obrigado.
P/1 – Aí para vocês, no seu trabalho...
R – Para nós todos, para nós todos. Te agradeço.
P/1 – Que ajudem a divulgar o Projeto!
R – Com certeza, com certeza, isso eu faço com muito prazer, com certeza.
P/1 – Com a maior dignidade.
R – Tá bom. Obrigado a vocês aí pela oportunidade também, obrigado a todos aí pela oportunidade aí, tá bom?
P/1 – Imagina. A gente é que agradece.
R – Ok.
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