José Ignácio Fonseca, nascido em três de julho de 1930 em Três Corações, Minas Gerais.
A minha formação básica é de engenheiro civil, de minas e metalurgia, formado pela Escola de Ouro Preto. Na época, eram três cursos simultâneos. Depois, eu me formei também em Geologia, pela Universidade de Wisconsin, nos Estados Unidos.
Eu entrei na Petrobras tão logo concluí o meu curso em Ouro Preto. Eu terminei em dezembro de 1955 e entrei em fevereiro de 1956. Ainda no quinto ano da Escola, nós recebemos uma visita do Senhor Nagel – ele era um dos gerentes do Walter Link – e mais duas pessoas, um era o Senhor Frederico Lange, tentando angariar alunos de Ouro Preto. Todos que quisessem entrar teriam lugar na Petrobras. Na época, as turmas de Ouro Preto eram muito pequenas. A minha turma era a maior até então, eram 24 alunos apenas. Então, nós todos fomos convidados para ingressar na Petrobras no quinto ano da Escola.
Eles se comprometeram, por escrito, que aqueles que se dessem bem na Petrobras num período de dois anos, eles mandariam fazer um curso de especialização nos Estados Unidos. Mandaram isso por escrito para Ouro Preto, tal era a dificuldade de encontrar pessoas de nível de engenharia, mas com conhecimentos de geologia. Naquela época não existia escola de geologia. Ouro Preto era a única escola que tinha um currículo bastante pesado em geologia. Essa era a razão porque nós fomos convidados.
Eu ingressei na área de exploração no Rio de Janeiro. Imediatamente, eles me mandaram para o sul do Maranhão, em fevereiro de 1956. Eu me formei em 1955, no fim de ano. Dois meses depois, estava aqui. Então, fui designado para acompanhar um poço no sul do Maranhão, na cidade de Balsas, onde eu fui assistente do doutor Carlos Walter Marinho Campos, que também foi meu colega em Ouro Preto – ele foi diretor da Petrobras e é falecido hoje. Então, fui ser assistente dele. Ficamos lá uns três ou quatro meses e ele foi designado...
Continuar leituraJosé Ignácio Fonseca, nascido em três de julho de 1930 em Três Corações, Minas Gerais.
A minha formação básica é de engenheiro civil, de minas e metalurgia, formado pela Escola de Ouro Preto. Na época, eram três cursos simultâneos. Depois, eu me formei também em Geologia, pela Universidade de Wisconsin, nos Estados Unidos.
Eu entrei na Petrobras tão logo concluí o meu curso em Ouro Preto. Eu terminei em dezembro de 1955 e entrei em fevereiro de 1956. Ainda no quinto ano da Escola, nós recebemos uma visita do Senhor Nagel – ele era um dos gerentes do Walter Link – e mais duas pessoas, um era o Senhor Frederico Lange, tentando angariar alunos de Ouro Preto. Todos que quisessem entrar teriam lugar na Petrobras. Na época, as turmas de Ouro Preto eram muito pequenas. A minha turma era a maior até então, eram 24 alunos apenas. Então, nós todos fomos convidados para ingressar na Petrobras no quinto ano da Escola.
Eles se comprometeram, por escrito, que aqueles que se dessem bem na Petrobras num período de dois anos, eles mandariam fazer um curso de especialização nos Estados Unidos. Mandaram isso por escrito para Ouro Preto, tal era a dificuldade de encontrar pessoas de nível de engenharia, mas com conhecimentos de geologia. Naquela época não existia escola de geologia. Ouro Preto era a única escola que tinha um currículo bastante pesado em geologia. Essa era a razão porque nós fomos convidados.
Eu ingressei na área de exploração no Rio de Janeiro. Imediatamente, eles me mandaram para o sul do Maranhão, em fevereiro de 1956. Eu me formei em 1955, no fim de ano. Dois meses depois, estava aqui. Então, fui designado para acompanhar um poço no sul do Maranhão, na cidade de Balsas, onde eu fui assistente do doutor Carlos Walter Marinho Campos, que também foi meu colega em Ouro Preto – ele foi diretor da Petrobras e é falecido hoje. Então, fui ser assistente dele. Ficamos lá uns três ou quatro meses e ele foi designado para os Estados Unidos. Eu fiquei no poço, acompanhando. Logo em seguida, fui transferido para Sergipe, para ser assistente de um geólogo alemão, Mr. Fritz Bender, para mapear a Bacia de Sergipe.
O Maranhão não tinha nada, era o fim do mundo. Para chegar ao Maranhão, nós tivemos que pegar um avião, com escala em Sergipe, em Pernambuco. Eu acho que era um Constelation. Daí para frente, pegamos um DC3 e fizemos escala em São Luis do Maranhão. Pernoitamos em São Luis. No dia seguinte, pegamos outro DC3 e fomos para Balsas. A pista era de terra. Lá tinha um acampamento da Petrobras, porque estavam furando um poço para petróleo, mas estava seco como todos do Maranhão.
Balsas era uma cidade pequena, mas muito agradável. A turma da Petrobras conseguiu um entrosamento muito bom com a sociedade local. Tinha um médico lá, o Doutor Rosi, que era uma pessoa formidável; nós ficamos amicíssimos. Também, havia pouca gente de nível na cidade. Não havia estrada asfaltada, nada disso. A região era dominada por um areal tremendo. Para dar uma idéia, às vezes, até jipe atolava na areia. E jipe com dois diferenciais. A locação ficava há uns 15 quilômetros da cidade. A cidade de Balsas tinha alguma infra-estrutura, tinha um colégio dos padres. Inclusive é a cidade onde nasceu o José Coutinho Barbosa, que também foi diretor da Petrobras. Quando nós fomos, ele era um garoto ginasiano, devia ter uns dez anos. De lá fui para Sergipe.
Naquela época, não tinha essa conversa de te dar tempo para pensar, para arrumar as suas coisas. A ordem era a seguinte: “Esteja amanhã em Aracaju a tal hora. Pega o avião aí e não tem conversa.” Tem até um fato interessante: lá o chefe de campo era um engenheiro de perfuração – Osvaldo Garcia de Azevedo – muito amigo, e eu ia ser padrinho do filho dele, mas não pude ser. No dia seguinte, eu recebi uma comunicação via rádio às dez horas da manhã e, no outro dia, eu já estava viajando para Sergipe, onde já me esperava no aeroporto, o geólogo alemão Fritz Bender, com quem trabalhei mapeando a Bacia de Sergipe.
Em seguida, fui transferido para Alagoas. Houve um fato meio pitoresco, porque um colega de Alagoas estava sendo ameaçado de morte por um marido ciumento. Alagoas naquela época... Então, a Petrobras resolveu me mandar para lá e trazer esse rapaz para cá. Era só ciúme, porque esse rapaz nem era de nada, era até meio afeminado. Mas por isso fui dar com os costados em Alagoas, onde fui assistente de um geólogo canadense.
Eram quase que exclusivamente estrangeiros; muitos. Toda a parte técnica era de estrangeiros, principalmente, os americanos. Na equipe do Link tinha muita gente do Canadá. O Link, inclusive, era da escola no norte dos Estados Unidos, para onde ele me mandou. O irmão dele, o Theodore Link, foi o cara que descobriu o petróleo no Canadá. Ele queria ser o descobridor de petróleo no hemisfério sul, já que o irmão foi do hemisfério norte. Quando chegou, ele foi para Nova Olinda. Ele concentrou o serviço no Amazonas, porque um poço em Nova Olinda, infelizmente, deu um show de óleo e, com isso, a Petrobras gastou fortunas lá sem nenhum resultado.
Eu tive esse itinerário no Maranhão, em Sergipe. O alemão não falava uma palavra em português quando chegou aqui no Brasil. Então, na nossa equipe, eu era o único cara que tinha condições de dialogar com ele. Felizmente eu tinha feito um curso de inglês bastante razoável em Três Corações e tinha um vocabulário bom. Quando me mandaram para Alagoas, eu já estava falando inglês com o alemão e fui ser assistente do canadense, que tinha um inglês completamente diferente; inglês de estrangeiro é muito fácil. Ele também falava um pouco de português, eu falava com ele em inglês. Um belo dia, num trabalho de campo daqueles, o Mister Link e o Morales foram visitar as equipes. Nós estamos numa equipe de gravimetria em Penedo, na divisa de Sergipe e Alagoas. Estávamos jantando. A maior parte era de americanos, tinha um alemão, e a língua no jantar era o inglês. Nessa época, o geólogo chefe, a segunda pessoa do Link era o Senhor Luis G. Morales, que era um colombiano, mas praticamente americano – filho de um embaixador colombiano nos Estados Unidos. Nesse jantar eu participei da conversa em inglês. Eu tinha um ano e pouquinho de Petrobras. O compromisso da Petrobras era de dois anos. E ele me falou: “Oh, Zé Ignácio, o seu inglês está tão bom ou melhor que o do Carlos Walter, que já foi para os Estados Unidos.” Para minha surpresa, um mês depois, eu recebo um convite para antecipar minha viagem para os Estados Unidos. Eu ganhei um ano em relação aos meus colegas, porque fui um ano antes.
A universidade era escolhida pelos americanos, principalmente pelo Mister Link. A escolha foi Wisconsin, que era a escola dele. É uma escola de geologia pequena, mas com um plantel de professores espetacular. Muito boa mesmo. Eu fui para Wisconsin com o compromisso de fazer média B. Na Universidade de Wisconsin, o B começava em 83. Eu estava acostumado com aquela dureza de Ouro Preto; tirar oito em Ouro Preto era muito difícil. Achei que seria até impossível. Aí com o tempo, verifiquei que a maneira deles de graduar as provas era diferente, relativa, porque eles pegavam a melhor prova, independente de estar 100% correta e davam dez para ela. Aí, aumentava-se o número de pontos. Vamos supor: eu tiro nove, então aumentou para dez. Ele aumenta um para todo mundo. Então, com isso, é uma nota relativa, mas foi o período que eu mais estudei.
Naquela época, a escola Ouro Preto tinha a melhor matemática do Brasil, seguida pelo ITA e pelo IME. Ouro Preto era a primeira em Matemática. Tanto que lá em Wisconsin, a turma é muito boa em geologia, mas fraca em matemática. Eu era engenheiro e eles não, eram simplesmente geólogos. Então eu passei a gabaritar tudo quanto era prova que tinha matemática envolvida. A matéria mais difícil era geologia estrutural, que o professor costumava até me mandar ao quadro resolver o problema para a turma ver. Então, em pouco tempo, realmente, eu fiquei com prestígio na escola e isso facilitou tudo.
O Mister Link era uma pessoa que pra nós, que trabalhamos subordinados a ele, foi um chefe de exploração espetacular. Tinham campanhas contra ele dizendo que era entreguista, que nunca ia achar petróleo no Brasil, mas tudo conversa fiada de leigo que não entende do assunto. Ele implantou na Petrobras o sistema da Standard Oil of New Jerssey, onde ele foi chefe de exploração. Então, não era qualquer pessoa. O sistema era o seguinte: ele implantou na Petrobras, no departamento de exploração, o sistema de exploração da Standard Oil of New Jersey. Em resumo: ele aqui no Brasil redigiu manuais de todas as especialidades: manual de sísmica, manual de geologia de superfície, manual sub-superfície, com os detalhes de procedimentos e tudo. E, nessa época, os brasileiros passaram a ser assistentes dos americanos mais experientes – a maior parte deles, outros muito ruins, mas isso é normal numa população grande; tem bons e ruins.
Quando eu fui para os Estados Unidos em 1957, o Link ainda estava aqui. Quando eu voltei em 1959, ele me recebeu. Logo em seguida ele saiu, acho que foi em 1960.
Eu voltei dos Estados Unidos dois anos depois. Teve até uma passagem interessante: pelo fato de eu ter conseguido boas notas lá, um dos meus professores escreveu para o Link, dizendo que naqueles dois anos que ele tinha me dado, eu poderia tirar o mestrado, pelos créditos levados de Ouro Preto. E, pela minha performance lá, eu tinha condições de fazer o mestrado. Mas para isso, fora da área de exploração e geologia, eu teria que fazer duas cadeiras: História dos Estados Unidos e Geografia Americana. Escreveram para o Link. Eu falei: “Eu estou interessado, lógico, né?” O Mister Link respondeu, me parabenizando, mas dizendo que para a Petrobras essas duas cadeiras – Geografia e História dos Estados Unidos – não interessava nada. E o mestrado também não interessava, a maior parte dos americanos aqui não tinham mestrado e que, em vez dessas duas matérias, era preferível que eu tirasse mais duas de geologia. Eu achei que raciocínio dele estava correto e assim fiz. Terminei o curso, vim para cá.
Na volta ao Brasil, eles me seguraram no Rio por mais ou menos uns dois meses, para fazer um estágio com o staff da Petrobras. Todos os chefes eram americanos: o Mister Link era chefe de exploração, o Mister Morales era o chefe-geral, o assistente do Link era um tal de Blank Nagel, o chefe de geologia de superfície era Clyde Deal, que era também lá de Wisconsin. O Link, o Deal e mais outro da sísmica eram de Wisconsin, por isso que eles me mandaram para lá e mandaram também vários outros. Então, eu fiz esse estágio de dois meses. Eu sou um geólogo que pode ser considerado de muita sorte na Petrobras, porque daqui do Rio eles me designaram para a Bahia, onde era o foco da exploração e onde se tinha petróleo. Eu fui para ser assistente do americano. Em seis meses, o americano foi ser supervisor na sede em Salvador e me deixou a chefia da equipe no Recôncavo, fazendo mapeamento de geologia, de toda a bacia sedimentar. O escritório era em Salvador. O sistema de folga era de seis por um: seis de campo e um de folga na cidade. Era pior do que o dos caras da sede. A gente morava em acampamentos. Depois de chefe de equipe, eu tive acampamento em Mata de São João, em Madre de Deus, em Valença, em Ilhéus. Mapeei quase que toda a área. E vi e descobri petróleo. Tive a sorte de achar petróleo em uma das minhas locações na área de geologia de superfície.
A sensação é realmente espetacular. Eu descobri uma situação estrutural que valia uma locação, no sul da Ilha de Itaparica – eu mapeei as ilhas todas também. Então, o sistema apresentava uma locação no staff da laje de exploração, que era geofísico, engenheiro de sub-superfície, sísmica, gravimetria e o chefe geral que era o Acyr Ávila da Luz, geólogo também de Ouro Preto. Essa minha locação tinha a sigla, por coincidência, de JI, mas não é por causa de José Ignácio, e sim porque o lugar lá se chama Jiribatuba. Estavam furando e eu ainda estava lá mapeando a área. O geólogo de poço comunicou que iam fazer um teste, que tinham furado uma camada com indícios de petróleo e eu fui para lá, todo entusiasmado. No teste de formação você alivia a pressão, porque o poço é furado por uma coluna de lama para não deixar os fluidos lá de baixo saírem, para evitar blow out e essas coisas. O poço é furado com uma lama pesada para manter o equilíbrio e para outras várias funções. Para testar, você desce uma ferramenta especial com um cilindro de borracha. Quando você ancora a cauda do testador no fundo do poço aquele cilindro se expande e isola toda a coluna que está acima dele. Com isso, o fluido da formação entra nos furinhos, nos buraquinhos do tubo e sai na superfície. A sensação na hora é quando você está na superfície, porque primeiro, o tubo de teste está cheio de ar, então você prepara uma linha de insurgência, uma tocha com fogo. Primeiro é o ar que sai da coluna, qualquer coisa que está entrando: água, óleo ou gás – sopra primeiro o ar que está enchendo a coluna. Começou a soprar, e quando sopra já é um bom sintoma, está entrando algo na coluna. Podia ser água salgada. Começou a soprar ar e de repente pegou fogo. O gás já estava misturado com o ar e pegou fogo. Não era coisa grande não. Era muito modesta, mas de qualquer forma... Ficamos esperando. E estava queimando gás. De repente, o tubo começou a vomitar óleo. Petróleo mesmo, preto Então, é aquela alegria tremenda, por participar diretamente de um furo que deu óleo. Como eu disse, a minha sorte na Petrobras, foi terem me mandado para uma bacia dessas, onde eu aprendi muito e tive a oportunidade de sentir cheiro de petróleo. O pessoal que foi para o Paraná e para o Amazonas não achou nada. Fazia aquela parte teórica, mas não sentia o óleo. Você mapear, apresentar uma locação, ser aprovado, ser furado e dar óleo. Ou não dá, mas de qualquer forma é isso.
Outra parte muito interessante da minha vida profissional: o meu chefe Acyr Ávila da Luz era um sujeito formidável. Ele recebeu uma carta da África dizendo que iam fazer um congresso na Nigéria. Naquela época não estava ainda provada a teoria da migração continental. A migração continental é que a África e a América do Sul formavam um continente único. Depois ele foi rachando e foi, aos poucos, se separando. Tinha um paleontólogo alemão que trabalhou na Bahia. E, na Bahia, nessa bacia onde eu trabalhei – os fósseis são os remanescentes de seres vivos que viveram na época em que foi depositado aquele sedimento – os fósseis da Bahia, se chamam ostracóides, uma conchinha pequeninha, são ostracóides de água doce. É um tipo de fóssil que só dá em água doce. Então, esse alemão, quando terminou o contrato dele com a Petrobras, foi para a Alemanha e, lá no Departamento de Pesquisa, começou a estudar as amostras que ele recebia da África – ele era um cara formidável. Ele constatou que tinha ostracóide de água doce no Gabão iguais aos da Bahia. Como podia ser isso? Com um oceano no meio, o Oceano Atlântico, como poderia ter o mesmo fóssil de um lado e do outro? Era a prova contundente, porque na época era um grande lago de água doce, com a Bahia de um lado e o Gabão do outro, e isso foi depositado. Então, como eu tinha mapeado recentemente o Recôncavo, o Acyr me indicou para apresentar um trabalho nesse congresso na Nigéria, um congresso internacional. Na época, aqui no Brasil, no Recôncavo, nós já estávamos bem mais adiantados do que eles do lado de lá, em matéria de descoberta de petróleo neste tipo de bacia no Gabão. Então, eu fui indicado para apresentar esse trabalho. Eu apresentei o trabalho no Congresso onde tinham pessoas de todas as companhias de petróleo: a Shell, a British Petroleum, a Elf francesa.
Este relatório causou muito interesse, porque essas firmas que estão lá tinham realmente interesse comercial, porque viram que poderiam aprender alguma coisa para usar do lado de lá, aonde tinham concessões e tentavam descobrir petróleo. Então, eu fui muito paparicado na África. Logo que eu acabei de apresentar o trabalho, eu recebi o convite do pessoal da Shell e da British Petroleum, que são extremamente fechados, para visitar os escritórios deles. Isso na Nigéria ainda. A Elf me convidou e me proporcionou uma viagem para ver a geologia do Gabão in loco. Então eu fui para lá e foi também um paleontólogo brasileiro que tinha trabalhado com esse o alemão. Ele apresentou um trabalho sobre Paleontologia e eu sobre Geologia Geral. No Gabão, nós fizemos uma viagem de campo. Acho que foi o primeiro geólogo que constatou in loco a prova definitiva da Migração Continental, não só pelos ostracoides, mas pela semelhança das rochas, de um lado e do outro, eram tais que eu podia mapear lá com os mesmos nomes que eu usava aqui: Formação Sergi, Candeias, Ilhas e tal. Eu fiquei entusiasmado com aquilo. O meu cicerone era um paleontólogo, um húngaro que nos acompanhou para mostrar essas rochas.
Depois eu fui apresentar ao geólogo chefe da Elf, Robert Gageonet, o resultado e o meu entusiasmo sobre o que tinha visto. Conversando com ele, disse: “Não tem dúvida, isso é prova cabal, porque não só os fósseis, mas as formações são idênticas, a seqüência é idêntica, as espessuras são muito semelhantes de um lado e do outro, um é um lado da bacia e outro é o outro. Agora, só tem uma parte no mapa que eu, realmente, não vi semelhança. Daqui pra cá, é tudo igual, eu mapearia com os mesmos nomes, mas essa formação aqui, que vocês estão dando esse nome, eu não tenho na Bahia. Então, eu discordo.” Veja como são as coisas O Gageonet falou: “Não vou lhe responder. Espera um pouquinho.” Aí, foi nos arquivos e trouxe a última versão do mapa geológico dele, que já tinha mudado o nome da formação. Essa formação é muito mais nova e não tinha o equivalente na Bahia. Era bem posterior. Entre uma e outra houve um período de erosão grande. Então, a sorte que eu tive Eu vim do Gabão não só com as informações que foram apresentadas no congresso, como também com um monte de informações geológicas. Eu apresentei um trabalho, dei cópia para o pessoal e recebi em troca perfis sísmicos dos campos do delta do Niger, dos campos de Gabão, de domos de sal. Voltei para o Brasil entusiasmado. Eu ainda era da Bahia. Cheguei à Bahia, fiz vários relatórios, muitos deles, comentando relatórios que eu trouxe dos outros – das Companhias, da Elf, da Shell, British Petroleum –, fazendo analogia com o que nós tínhamos aqui no Brasil.
Eles passaram esses estudos porque receberam também, né? Geologia pode passar, sim. Não é tipo um mapa estrutural sísmico, que pode dar uma locação. Então, eu fui lá para o escritório e, todo mundo sabe que, dois técnicos começam a conversar, sai muito assunto interessante. E, com isso, na Shell, um paleontólogo falou: “Agora com esse seu trabalho que prova realmente que as duas metades da bacia, uma é o Gabão e a outra é o Recôncavo, eu tenho um problema muito sério que eu não consigo explicar. Quem sabe você me quebra esse galho?” O problema era o seguinte: eles tinham numa formação, que é mais ou menos da idade desses sedimentos, um fóssil, um pólen – um fóssil minúsculo das plantas – mas era um pólen re-trabalhado. É um pólen que estava numa rocha que foi erodida e depositada de novo, mas era um pólen do período Paleozóico, do Permiano, como se chama o período. Então, ele falou: “O meu problema é que esse pólen é permiano, é re-trabalhado e está aqui encaixado nos nossos sedimentos. E nós não temos permianos na África. Será que você não tem esse permiano lá do outro lado?” Eu falei: “Talvez tenha. Eu vou lhe mandar uma amostra.” E mandei uma amostra de uma rocha classificada como permiana também na Bahia. Não deu outra: aquele pólen saiu daqui para lá, lógico, no deslocamento. Então, era mais uma comprovação. Patente. Isso não tem dúvida nenhuma.
O Acyr Ávila da Luz ficou muito entusiasmado com esses relatórios que eu apresentei. Então, ele recomendou à chefia aqui no Rio, que eu apresentasse esses trabalhos em todos os distritos, para incentivar a turma. Eu trouxe tanta informação Na época, eu cheguei aqui entusiasmado: “Vamos deixar de terra.” O Link não queria terra, mas falou: “Para ter auto-suficiência tem que ir para o mar ou senão criar a Braspetro”. Foi isso que ele falou. Como conseqüência dessas minhas viagens, eu fui convidado pela diretoria da Petrobras, no Rio, para apresentar o meu trabalho. Porque alguém contou e eles ficaram entusiasmados com o meu otimismo em relação ao mar. Então, eu vim da Bahia para cá, apresentar esse trabalho e, logo em seguida, me mandaram ficar um mês aqui para fazer a primeira avaliação da plataforma continental brasileira. Isso em 1966, provavelmente.
Então, eu vim pra cá e fiz um relatório baseado em pouca informação, mas de qualquer forma eu classifiquei a Plataforma Continental com base naquilo que era importante do lado de lá, por exemplo, o delta do Niger. Então, eu evidenciei que deveríamos perseguir os deltas dos nossos rios e concentrar a exploração na foz dos grandes rios do Brasil, porque eles não mudaram muito de posição com o tempo geológico e, também, pelo sal. Eu tinha visto produção de petróleo em domo de sal. Domo de sal é quando faz aquele monte de sal. E, no Brasil, ninguém conhecia, não se sabia que tinha domo de sal.
O domo de sal é uma das estruturas favoráveis ao petróleo. Não quer dizer que tem, porque aqui tem domo e não teve. Pode ser uma indicação favorável, porque ele mexe. O sal, como todo sedimento, é depositado na horizontal. Quando fica uma camada de uns três, quatro mil metros, a pressão e a temperatura lá embaixo transformam o sal, que é sólido, em fluido e ele começa a migrar. Qualquer fraturazinha, qualquer lugar de menos resistência, ele começa a subir. Quanto mais sobe, faz aquela estrutura, aquele calombo, dobra as formações todas em volta. Então, cria situações de traps, como são chamados, armadilhas para segurar petróleo. Eu fiz esse relatório e com isso foi a primeira coisa que se fez incentivando a ida para o mar. A Petrobras resolveu ir para o mar de corpo e alma. Nesse meu relatório, a área que eu considerei mais importante foi o delta do Amazonas, mas foi uma decepção. Tinha estruturas de toda natureza, mas só faltava uma coisa: as rochas lá não estavam maturas. O petróleo ainda não tinha sido gerado. Daqui há uns cem milhões de anos talvez esteja lá. Mas eu também classifiquei a Bacia de Campos, o delta do Paraíba, eu pus na categoria A. Categoria “A” foi onde os primeiros projetos de exploração foram feitos, as linhas sísmicas, que se furou e tal. Outra coisa também, a vida de todo profissional depende de muita sorte, lógico O sujeito precisa ser competente, trabalhador, mas precisa de sorte, precisa estar na hora certa, no momento exato.
Com essa atitude, eu fiquei com um cartaz danado. Quem ficou meu fã número um foi o Doutor Geonísio Barroso. Ele já estava estudando a criação da Braspetro e me convidou para compor a primeira diretoria da Braspetro. Fui diretor com ele, que era o vice-presidente. O Geonísio foi realmente a mola mestra da criação da Braspetro. Ele tinha sido até presidente da Petrobras. Depois foi diretor e estava mais ou menos no ostracismo nessa época. Todos nós passamos por isso. Eu passei também. O Geisel chamou o Geonísio para ser um tipo de assistente técnico dele. E ele convenceu o Geisel que devia criar a Petrobras Internacional. E começou a estudar. Foi uma grande surpresa quando ele me convidou para ser diretor. Eu fui diretor de 1972 a 1980.
A Braspetro foi criada em 1972. Em 1977, nós tivemos a maior descoberta do mundo. [O que impulsionou a criação da Braspetro], primeiro, foi o insucesso da Petrobras em terra. Na época, nós chegamos à conclusão que além do óleo da Bahia, se descobriu um pouco em Sergipe, mas nada substancial, nada que desse a auto-suficiência. Então, o próprio Link, quando ele saiu, ele teria falado que o Brasil em vez de gastar muito dinheiro nessas bacias de alto risco aqui, devia usar esse dinheiro explorando fora, arrumando concessões fora e também no mar. Mas, naquela época, a tecnologia no mar era muito precária, não se furava como se faz hoje, furava em água rasinha e tal. Então, foi isso. E nós geólogos, nesse meu relatório também eu disse: “Se quiser ter auto-suficiência é no mar. Vamos para o mar.” E fomos para o mar. Fizeram uns programas, nesse meio tempo o Carlos Walter passou a ser chefe de Exploração aqui no Rio e mandou brasa. E daí surgiram essas descobertas.
Nós conhecíamos tudo isso, porque as multinacionais reconheciam os procedimentos de como conseguir concessões, que eram contratos de serviços. Concessão é quando um país estrangeiro te dá uma área, você corre todo o risco e o que você descobrir, divide com eles. Isso a gente tinha conhecimento. Contrato de serviço, que é o que nós tivemos lá no Iraque, todo o investimento é por sua conta e risco, mas a partir do ponto que você descobre petróleo comercial, todo aquele investimento que você fez é ressarcido pela estatal deles. E ainda te dão uma vantagem no óleo descoberto. Em resumo é isso.
A primeira carta é do doutor Pedro de Moura. O Doutor Pedro de Moura foi um grande geólogo da Petrobras, desbravador do Amazonas, do Acre. Também era lá de Ouro Preto. Naquela época, todo geólogo era de Ouro Preto. Eu tenho uma carta do Doutor Moura manuscrita. Naquela época, você fazia manuscrita, não datilografava, não tinha nada. Ele dizia que estava mapeando em Candeias e escreveu para o Mister Clayton, que devia ser um americano chefe, na época do Conselho Nacional de Petróleo, dizendo – ele tinha uma letra muito boa – que tinha constatado naquele mapeamento feito em candeias uma situação estrutural muito interessante que merecia um furo. Ele estava convidado esse Mister Clayton para ir a Candeias em tal dia, porque ele já tinha preparado as montarias – naquela época era a cavalo – para mostrar como ele estava entusiasmado. E esse lugar foi o primeiro campo realmente comercial, não foi o primeiro campo de petróleo da Petrobras. Mas o Campo de Candeias é a primeira descoberta realmente comercial de óleo. Porque Lobato, Itaparica, Aratu, isso tudo é pouca linha. Esse foi o primeiro campo realmente. Outro documento é uma carta do Mister Link, falando sobre o nosso sucesso no exterior, ele escreveu para o Doutor Geonísio Barroso dois parágrafos: que, através dos relatórios internacionais, da imprensa internacional, vinha acompanhando o grande sucesso da Braspetro na Líbia, na Argélia, no Iraque, na Colômbia e estava escrevendo para dar parabéns à equipe que ele conseguiu reunir na Braspetro. Ele ainda diz o seguinte: “não basta ser uma região extremamente prolífica em óleo, como é o Oriente Médio. Além disso, é necessário um comportamento, uma condução geológica exploratória muito inteligente para se descobrir petróleo. Então, a sua turma está de parabéns. Você conseguiu reunir uma turma de alto gabarito que se iguala aos melhores geólogos e geofísicos do mundo.” Uma cartinha assim, de dois parágrafos.
A Braspetro foi estruturada como uma subsidiária autônoma, com a sua própria diretoria. O presidente [da Braspetro] era sempre o presidente da Petrobras, na época, era o Geisel. O vice-presidente era o Doutor Geonísio Barroso. Tinha apenas dois diretores: um diretor técnico, que era eu, e o diretor comercial e financeiro, que era o Carlos Sant’Anna. Assim foi estruturada a Braspetro, para agir de maneira independente, com toda liberdade.
Quando o Doutor Barroso me convidou foi uma surpresa muito grande, porque em 1972 eu 42 anos de idade. Era muito jovem e não esperava ser convidado para a diretoria. Eu ainda falei com ele: “Eu acho que o Senhor está sendo corajoso demais chamando uma pessoa com pouca experiência. Porque o Senhor não chama o Carlos Walter, que é mais experiente? De qualquer forma, eu agradeço o seu convite, mas eu lhe peço um tempinho. Eu vou levar essa notícia à minha esposa. Ela não vai dizer nada, mas só em consideração. Eu também quero a sua autorização para levar isso ao Carlos Walter.” Ele era chefe de exploração aqui, então a pessoa indicada seria ele para ser diretor e punha outro como chefe de exploração. Aí o Barroso – que era um político vivo, uma pessoa encantadora – ficou preocupado: “O Carlos Walter vai ficar ferido. Para sua mulher, tudo bem. Mas eu não te autorizo a falar com o Carlos Walter.” Eu disse: “Doutor Barroso, eu vou ser franco com o Senhor. Apesar de não ter autorização, eu vou falar porque só aceitarei se ele, o Carlos Walter, que é o chefe de exploração me ceder o pessoal todo que eu pedir.” Eu era assistente, era a segunda pessoa, e ele era o chefe de exploração. Eu era o Morales e ele era o Link da época. “Então, ele sabe que eu conheço o pessoal todo e aqui no Brasil a gente pode ter uns caras meio medíocres, uns muito bons, uns piorezinhos, mas a gente leva a coisa. Mas para o exterior só tem que ter gente boa. Eu tenho que falar com ele. Se ele se comprometer a me ceder os técnicos por mim escolhidos – porque eu conheço todo mundo – aí eu aceito.” E não deu outra. Eu fui falar: “Olha, Carlos Walter, eu acho que você é quem deveria ser convidado, mas o que eu posso fazer? Me convidaram...” “Ah, tudo bem. Pode aceitar que todo o pessoal que você quiser eu te dou.” E deu realmente. Então, nós reunimos essa equipe elogiada pelo Link, que foi cedida pelo Carlos Walter.
Na fundação em si, o Geonísio Barroso já tinha formado um grupinho com duas pessoas. Um, principalmente, era um geólogo que, para mim, foi o mais inteligente que eu conheci na Petrobras. Ele já faleceu, era mais ou menos da minha idade: José Maria de Lima Perrella. Ele era engenheiro, nem era engenheiro de Minas, era lá de São Paulo, e fez o curso do Cenap aqui no Brasil. Eu fiz nos Estados Unidos, ele fez aqui. Mas o cara era brilhante. Então, o Barroso chamou o Perrella e o Baccar. O Baccar é um árabe, Muhamed Amin Baccar, muito bom também. O Barroso logo pensou: “Nós vamos para o Oriente Médio, vamos para o mundo árabe, então vamos pegar uma pessoa de origem árabe já ajuda. E ele é um ótimo técnico”. Com essas duas pessoas, eles começaram a estudar áreas. Não faltava área a ser estudada. Tem muita oferta de área, a maior dificuldade é selecionar, porque a maior parte do que te oferecem é “abacaxi”. Mas nós começamos com o pé direito mesmo, porque o primeiro contrato não foi com o Iraque, foi com a Colômbia.
O Senhor Morales, o colombiano-americano, era muito amigo nosso. Ele estava na Colômbia e tinha uma companhia de petróleo já com algumas descobertas, mas estava tendo muita dificuldade financeira. Chamava-se Tennessee-Colômbia, um grupo americano e um grupo colombiano que fundaram essa companhia com a supervisão do Morales, que era um geólogo e geofísico brilhante. Tinham descoberto um campo de petróleo e não tinham dinheiro para desenvolver esse campo. Então, eles resolveram por a venda a companhia e nós nos interessamos e compramos essa Tennessee-Colômbia. Compramos e fundamos a COLBRAS – Petróleos Colombo-Brasileiros, da qual eu também fui diretor. O Morales era presidente desse grupo, e ele continuou. O grupo colombiano ficou com 50 por cento do Tennessee-americano e nós ficamos com 50 por cento Braspetro. Ai, começamos a enviar dinheiro, porque compramos e tal.
Já tinha uma produção de óleo, escritório, tudo funcionando, tinha tudo. Já tinha uma estrutura de produção mesmo. Eles já estavam produzindo nesse campo de óleo, só não produziam mais porque na época a Colômbia tinha deixado de ser exportadora para ser importadora de petróleo. Então, eles adotaram um preço extremamente baixo para qualquer petróleo que fosse encontrado na Colômbia. E nós começamos, furamos mais um poço, descobrimos outro campo de óleo. Chegamos a produzir 12, 13 mil barris por dia. Podia produzir 20, mas por causa da lei colombiana, não nos interessava porque ia ficar mais caro o investimento do que o retorno. Quer dizer, o óleo estava custando no exterior 27, 30 dólares, em plena crise do petróleo, e eles nos pagavam três dólares e 70. Então, não era econômico. Fomos levando, mas num certo ponto, falamos: “Bom, agora nós temos que vender”.
Isso foi em abril de 1972. Em julho, agosto, o poço que estava em perfuração já deu óleo. A compra foi rápida. A Petrobras forneceu o dinheiro, foi à vista o negócio. Achamos óleo e não podíamos desenvolver a produção porque era anti-econômico por causa do preço, não pela qualidade e o volume de óleo descoberto. Pensamos: “O que adianta? Nós estamos aqui marcando passo” Então, resolvemos vender a Colômbia. Foi um episódio muito interessante. O Morales participou ativamente, os colombianos também resolveram vender. Então, o Morales conseguiu uma companhia
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