IDENTIFICAÇÃO Meu nome é Thabta Matos da Mata, moro em Cachoeiras de Macacu, nasci em 19 de fevereiro de 1980, em Duque de Caxias. Escolhi Cachoeiras de coração. Sou professora do município de Cachoeiras, sou bióloga e presto consultoria para algumas ONG’s na área ambiental. Sou professora há nove anos, gosto bastante. Tenho trabalhado com a área de educação ambiental, fora de sala de aula, há bastante tempo. Trabalho com a educação ambiental dentro da secretaria da educação e também com educação de jovens e adultos. AMBIENTALISMO Já trabalhei com dois projetos, com uma ONG daqui de Botafogo que é o Instituto BioAtlântica e a Reserva Ecológica de Guapiaçu na área de mobilização e sensibilização para projetos ambientais, plano de manejo, um projeto de agrofloresta. RESERVA ECOLÓGICA DE GUAPIAÇU Pertenço à Reserva Ecológica de Guapiaçu, a REGUA, uma ONG, ela não está dentro do SNUC [Sistema Nacional de Unidade de Conservação] agora vai ser uma RPPN [Reserva Particular do Patrimônio Natural], mas lançou um edital, cinco anos atrás, para educador ambiental dentro da reserva. Na época da seleção não foi bem sucedido, mas em seguida o Instituto BioAtlântica fez uma parceria com a reserva pedindo consultoria de um funcionário para trabalhar no plano de manejo da APA [Área de Proteção Ambiental] da Bacia do Rio Macacu. A reserva me selecionou e nós começamos um trabalho. Antes disso comecei a trabalhar com eles, mas mais com colaboração com a Agenda 21 local. A Reserva escreveu a Agenda 21 do município, um projeto pela FNMA [Fundo Nacional de Meio Ambiente], eu já fazia um trabalho com eles, mas era de colaboração, sem contrato. AGENDA 21 LOCAL / CACHOEIRAS DE MACACU / INÍCIO Em 2003 a Reserva propõe esse projeto para o FNMA; o FNMA aprovou em final de 2003 e a gente começa a questão de mobilização, uma parceira com a Prefeitura Municipal de Cachoeiras de...
Continuar leituraIDENTIFICAÇÃO Meu nome é Thabta Matos da Mata, moro em Cachoeiras de Macacu, nasci em 19 de fevereiro de 1980, em Duque de Caxias. Escolhi Cachoeiras de coração. Sou professora do município de Cachoeiras, sou bióloga e presto consultoria para algumas ONG’s na área ambiental. Sou professora há nove anos, gosto bastante. Tenho trabalhado com a área de educação ambiental, fora de sala de aula, há bastante tempo. Trabalho com a educação ambiental dentro da secretaria da educação e também com educação de jovens e adultos. AMBIENTALISMO Já trabalhei com dois projetos, com uma ONG daqui de Botafogo que é o Instituto BioAtlântica e a Reserva Ecológica de Guapiaçu na área de mobilização e sensibilização para projetos ambientais, plano de manejo, um projeto de agrofloresta. RESERVA ECOLÓGICA DE GUAPIAÇU Pertenço à Reserva Ecológica de Guapiaçu, a REGUA, uma ONG, ela não está dentro do SNUC [Sistema Nacional de Unidade de Conservação] agora vai ser uma RPPN [Reserva Particular do Patrimônio Natural], mas lançou um edital, cinco anos atrás, para educador ambiental dentro da reserva. Na época da seleção não foi bem sucedido, mas em seguida o Instituto BioAtlântica fez uma parceria com a reserva pedindo consultoria de um funcionário para trabalhar no plano de manejo da APA [Área de Proteção Ambiental] da Bacia do Rio Macacu. A reserva me selecionou e nós começamos um trabalho. Antes disso comecei a trabalhar com eles, mas mais com colaboração com a Agenda 21 local. A Reserva escreveu a Agenda 21 do município, um projeto pela FNMA [Fundo Nacional de Meio Ambiente], eu já fazia um trabalho com eles, mas era de colaboração, sem contrato. AGENDA 21 LOCAL / CACHOEIRAS DE MACACU / INÍCIO Em 2003 a Reserva propõe esse projeto para o FNMA; o FNMA aprovou em final de 2003 e a gente começa a questão de mobilização, uma parceira com a Prefeitura Municipal de Cachoeiras de Macacu para a sensibilização da comunidade, levou uns três, quatro anos de duração. No final de 2007 o projeto foi concluído com a organização do diagnóstico final no município, foi quando a Agenda 21 Comperj começou a executar um trabalho no município. AGENDA 21 LOCAL / CACHOEIRAS DE MACACU Quando o projeto foi escrito em 2003, era um dos critérios que primeiro se iniciasse o fórum; o Fundo Nacional de Meio Ambiente exige que tenha um grupo de pessoas mobilizadas para iniciar o trabalho na região. Esse grupo de pessoa se sensibilizou, se organizou e começou a montar esse trabalho e o diagnóstico através de consultorias com outros consultores, o pessoal do Fundo teve bastante no município. A Carla Matos, coordenadora da Agenda 21 do Ministério do Meio Ambiente esteve bastante lá. Durante esse período foi feita a parte de mobilização da sociedade; no final de 2007 o trabalho foi concluído, o diagnóstico estava pronto e o Plano Local de Desenvolvimento Sustentável pronto. Nesse mesmo momento o fórum foi se desfalecendo, foi se diluindo. Muitas pessoas desanimaram, deixaram de frequentar as reuniões e isso foi minando um pouco. Quando o grupo da Agenda 21 Comperj chegou ao município, o assunto Comperj estava deixando todo mundo muito agoniado, muito tenso, nervoso com essa situação que a gente não sabia o que era. Costumávamos dizer que a gente podia estar ganhando na mega sena ou recebendo um Tsunami. Era um grande desespero dentro do município não saber o que estava acontecendo. Quando chegaram as ONG’s responsáveis por mobilizar novamente a comunidade, isso voltou à tona. As pessoas que estavam nesse processo que já tinham se desvinculado, voltaram a participar das reuniões, a gente ficou inclusive meio melindrado no início, quando falaram que iam chegar no município para construir uma Agenda 21 a gente falou: “Opa espera aí, a gente fez esse projeto durante quatro anos, como é que um grupo está chegando dizendo para a gente que de oito meses a um ano a Agenda vai estar pronta?”. As coisas não são assim, a gente levou quatro anos fazendo isso. Mas foi uma iniciativa que depois a gente percebeu que tinha um lado bom, era necessário que igualasse os 15 municípios, que os 15 tivessem uma Agenda; dos 15, apenas três tinham iniciado esse processo e um deles era Cachoeiras de Macacu. Era complicado às vezes, a gente era tinhoso a ponto de ser meio reticente nas coisas. Em 2008 quando eles iniciaram esse trabalho, comecei a participar efetivamente de todas as reuniões e quando o fórum foi formado a REGUA foi selecionada para participar enquanto representante do terceiro setor, e me indicou para ser a representante legal da Instituição. FÓRUM DE AGENDA 21 LOCAL / CACHOEIRAS DE MACACU O fórum é composto por 28 pessoas. São sete pessoas de cada setor: o primeiro setor que é o poder público, está bem representado pelas secretarias, inclusive a câmara municipal tem uma cadeira no fórum; o segundo setor que é o comércio local, indústria e o pessoal do setor produtivo; o terceiro setor que são as ONG’s, a REGUA entra como uma das ONG’s, das sete que estão representadas, e tem o quarto setor que eles chamam de Comunidade, representantes das comunidades. Hoje o fórum está sendo criado de direito porque de fato a gente já tem isso, mas de direito precisa de uma aprovação de uma lei que foi escrita por nós dentro do fórum, criamos uma minuta de lei, a câmara de vereadores aceitou como proposta de projeto de lei; a gente acredita que deve ser votada até o final desse mês uma lei que cria efetivamente o fórum da Agenda 21 de Cachoeiras de Macacu. AGENDA 21 LOCAL / CACHOEIRAS DE MACACU / INÍCIO Dos 15 municípios a gente teve Itaboraí, Nova Friburgo e Cachoeiras de Macacu. Três vizinhos. Foram os três que escreveram para o mesmo edital do Fundo Nacional de Meio Ambiente, escrevemos o projeto e demos andamento. Em Cachoeiras de Macacu a gente teve um trabalho que foi mobilizar primeiro o primeiro setor. Vários municípios têm uma sociedade civil organizada bem mobilizada, bem ativa, é a realidade do nosso município, mas a gente via necessidade de mobilizar também o primeiro setor, ele precisava abraçar isso. Hoje ainda é uma legislação de metas fazer com que o primeiro setor se sensibilize, mudou o governo municipal com as eleições, as coisas que acontecem mudam todo mundo, as pessoas que ficam precisam continuar fazendo esse trabalho de mobilizar. Não quero dizer que fomos pioneiros nesse trabalho, não foi isso, foi que a gente andou bastante, caminhou bastante. Foi um processo demorado, mas que foi feito passo a passo de acordo com que a gente acha que deveria ser. FÓRUM DE AGENDA 21 LOCAL / CACHOEIRAS DE MACACU O fórum hoje se reúne mensalmente, ordinariamente ou extra-ordinariamente assim que for necessário. A gente não tem estrutura ainda, não é de direito, não temos nenhuma postura legal, mas a gente conta muito com cada um, com cada representante; a gente tem muitos representantes, que é o meu caso inclusive, represento o terceiro setor, mas estou dentro do setor público também porque trabalho na secretaria municipal de educação. A gente faz um trabalho de formiguinha, são 28 que saem disseminando o plano. A gente refez todo o Plano Local Desenvolvimento Sustentável PLDS; percebemos que de 2000 até 2007 o Comperj não existia para a gente, nada daquilo que estava acontecendo no nosso município, nada que acontece hoje estava previsto. Hoje a gente tem um gasoduto cortando 37 quilômetros do município, tem um pólo petroquímico que vai ser vizinho do nosso município. Nada disso estava previsto até 2007. Em 2007 a gente tomou essa chuvarada de coisas que estão acontecendo agora, tudo isso precisou ser revisto. Comperj / IMPACTOS A gente tem questões prioritárias. Primeiro a conservação natural, a conservação das unidades, a conservação do espaço natural que a gente tem que é rico; o município é rico em unidade de conservação, tem área verde protegida; não por menos a gente teria recebido o primeiro lugar em ICMS [Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços] verde no estado do Rio de Janeiro. Abastece mais de 2.800.000 de pessoas com água do seu principal rio que é o Rio Macacu, mas o nosso maior problema também está dentro desse rio que é a poluição dele, ele está completamente poluído. A gente tem um programa, e a secretaria municipal de meio ambiente tem procurado fechar esse acordo, que é um projeto de despoluição do Rio Macacu, esse vem sendo o assunto mais debatido. Têm outros programas, mas todos bem ligados a questão ambiental; tem questão de lixo; tratamento de esgoto e todos esses outros. Falam que a nossa Agenda 21 é uma muito ambiental, a gente vê que também tem muita preocupação com o social. Nossa preocupação hoje não é com a obra do pólo petroquímico em si, a gente tem juízo suficiente para organizar e se estruturar muito bem para que nada de errado aconteça com o polo. A nossa preocupação é com a demanda, com o crescimento demográfico desordenado que pode acontecer naquela região. Se hoje a gente tem um problema com rio poluído, com lixo que não é tratado, com esgoto que não é tratado, hospital que não é suficiente, escolas que não são suficientes para 55.000 habitantes, que é o que a gente tem dentro do município hoje; a gente fica pensando nos próximos anos com a construção desse pólo, quantas mil pessoas vão chegar para o município. Essa é uma das maiores preocupações para todo mundo, o crescimento demográfico desordenado. O município não tem estrutura para receber a quantidade de pessoas que está prevista para chegar com a construção do polo. Tem um monte de problema acontecendo, mas a grande preocupação é aquele monstro que a gente chama de pólo enorme que vai estar ali. A maioria das pessoas hoje está consciente que o problema não vai ser aquilo que vai ser construído. A construção, o processo de organização, a operação daquela indústria não vai ser tão problemático para gente quanto vai ser a quantidade de pessoas que podem chegar e de repente invadir o município. O que a gente mais preza é a tranquilidade de viver em um lugar que é ambientalmente saudável, respirável e talvez daqui alguns anos a gente não tenha mais isso. FÓRUM DE AGENDA 21 LOCAL / CACHOEIRAS DE MACACU As reuniões do fórum são abertas. A gente tem feito por temas, procuramos marcar a reunião e determinar qual é a pauta; de acordo com aquela pauta a gente faz o convite. Dependendo do tema, temas mais polêmicos, menos polêmicos, a gente varia um pouquinho porque ninguém é de ferro, a gente não aguenta tema polêmico o tempo todo. Comunicação não é uma coisa muito fácil de ser feita, a gente tem um grupo de trabalho que está tentando, nos jornais locais, na internet através de um blog, divulgar o trabalho que a gente faz e as atividades que acontecem dentro do município. Hoje temos dois produtos fundamentais dentro do município, a água, que é o grande produto do município por produzir e abastecer a estação de tratamento de Imunana-Laranjal que abastece 2.800.000 pessoas, Itaboraí, São Gonçalo, até Ilha de Paquetá está indo água que sai do Rio Macac e Guapi-Açu. O outro produto da gente é agrícola, o município é completamente agrícola. Um tema bem polêmico é a agricultura: a gente tem estudos levantando a possibilidade de cultivo de pinhão manso ou outras oleaginosas para biodiesel, esse é um tema complicado porque a gente produz comida, produtos da mesa do dia-a-dia e quando surgem essas possibilidades a gente tem um desequilíbrio de idéias. A gente briga bastante, mas entramos em consenso no final das discussões. Existem várias pessoas com interesses de transformar o município em um município industrial; a gente sabe que não tem vocação da indústria para aquele município. Já tem uma grande indústria que é a Schincariol dentro do município, a gente sabe o quanto de bem fez, mas também sabemos a quantidade de problemas que causa ter uma indústria dentro do município. A gente não quer ser um município industrial, quer ser um município que continue saudável, mas com infra-estrutura para turismo, porque todo mundo acredita que pode ser uma grande possibilidade de turismo sustentável da região. FÓRUM DE AGENDA 21 LOCAL / DIFICULDADES A nossa maior vontade era que o poder público municipal abraçasse o plano local de desenvolvimento sustentável criado pelo fórum como um plano de governo. Essa é a maior vontade, não é só minha, é a vontade de todo mundo, não foi um plano criado por 28 pessoas, foi um plano criado com base no plano que foi elaborado pela REGUA em 2007, e elaborado com participação de todas as comunidades, cerca de 1500 pessoas; a gente teve como base esse plano, mas também incluindo algumas ações. Não contávamos com a chegada dos gasodutos, das empresas associadas ao Comperj e ao próprio pólo. A gente chama aquele plano “da menina dos nossos olhos”. Se a gente conseguisse fazer com que o poder público abraçasse essa idéia como um plano de governo a gente saberia que aquilo ia deslanchar, o município ia conseguir. A nossa maior dificuldade é o convencimento, a mobilização do primeiro setor; o governo municipal todo mudou, a gente não tem pessoas que estavam dentro desse processo nos anos anteriores, organizar isso tudo de novo é complicado. A gente está bem devagarzinho, acho que é o principal; se a gente não tem um alicerce bem feito não adianta correr e fazer um mundo de coisas que não vai conseguir dar conta. A gente está fazendo um alicerce, devagarzinho, pedra a pedra para tentar botar esse plano para funcionar. FÓRUM DE AGENDA 21 LOCAL / LEGISLAÇÃO [Depois de aprovada a leio o que muda é que] o fórum, as próprias pessoas, os próprios representantes vão se sentir de fato empossados. Uma coisa é a gente fazer por amor, cada um faz por vontade própria. Outra coisa é ter respaldo legal, é dizer que você está ali fazendo cumprir uma lei. A gente sabe que infelizmente o Brasil é um país com leis maravilhosas, mas que poucas delas são cumpridas; infelizmente a gente sabe que precisa ter uma lei para as coisas acontecerem. As poucas coisas que acontecem só acontecem por força de lei, depois que o fórum for criado de fato, por uma lei, as pessoas vão se sentir um pouco mais à vontade de representar as suas instituições e colocar suas ações para funcionar, seu trabalho para funcionar e levar esse plano adiante. A lei cria o fórum. Hoje a gente não tem fórum criado, a gente tem um grupo de pessoas que está trabalhando por um ideal. Um grupo de pessoas foi reunido pelo Comperj, pelas ONG’s que foram contratadas para isso, mas a gente não tem um fórum legal, legítimo. Essa lei, a princípio, cria o fórum, dá a organização e também dá uma parte de estrutura. Todo trabalho é feito na casa de cada um e com o computador que cada um tem, dividindo os telefonemas celulares, a gente racha um pouco as despesas entre nós mesmos, enquanto cidadão cada um precisa fazer um pouquinho disso, mas a gente tem dificuldades. Essa lei além de fazer a criação do fórum, dá um pouco da estrutura porque monta a secretaria executiva, coloca o poder público municipal com responsabilidade em financiar uma estrutura para esse grupo de pessoas trabalharem. A gente não precisa receber para trabalhar, mas precisa ter uma estrutura para trabalhar. É muito complicado sair telefonemas da casa de cada um para mobilizar para uma reunião, pagar uma matéria no jornal para fazer um convite, pagar material impresso. A gente tem feito hoje isso com recursos próprios, isso é responsabilidade do poder público. A gente tem um grupo de pessoas que está ali para ajudar na gestão do município como um todo, nada mais justo que o poder público atuar colaborando para que esse grupo de pessoas ajude de fato, mas com um mínimo de estrutura possível. Depois que o fórum for criado, a gente vai se tornar um órgão consultivo e deliberativo. A gente pode entrar com ações de fato, hoje ainda não pode. A gente não delibera, resolve algumas coisas por forma de convencimento, faz com que as coisas sejam resolvidas da forma que o grupo pensa, mas a gente acredita que isso vai mudar muito depois da aprovação dessa lei. Comperj / IMPACTOS Quando essa notícia chegou ao município todo mundo imaginou: “Maravilha, vai ser emprego para todo mundo, a Petrobras chegando aqui vai ser uma festa”. Outros já diziam que era desgraça da vida, era o município acabando, o município virando Macaé, virando Duque de Caxias e a gente não quer isso. Tinha um grupo extremamente contra e um grupo extremamente a favor. O município foi dividido durante algum tempo. Com todas as ações que foram sendo criadas durante esse período, muitas pessoas se convenceram – como eu me convenci –, que não adiantava muito ser contra. Isso vai acontecer, não tem jeito. Não é um município que vai dizer que não quer, até porque não está dentro do nosso município. A gente só tem um problema, a única coisa que divide o Comperj do nosso município é o rio, a gente olha para o lado de cá do rio é Cachoeiras de Macacu, do outro lado é o Comperj; foi um susto muito grande, não foi nada fácil de ser digerido. Na época foi um desespero, a gente não sabia direito o que pensar: “A Petrobras está chegando, não vai ter jeito, quem conseguir emprego está muito bem, quem não conseguir está muito mal”. Nesse período a gente conseguiu ir diminuindo essas angústias. Não que as angústias tenham diminuído em quantidade, elas estão lá, todas elas, acho que a gente vai conseguindo digerir cada uma. A gente pensa nas comunidades, o município hoje tem uma grande área desocupada, a gente sabe que aquela área vai sofrer pressão para crescimento populacional. Mas é uma área que a gente sabe que não deveria crescer, não deveria ter gente ocupando. Tem uma área que alaga no município que já teve um erro no passado de introduzir famílias morando nessas áreas; tem uma grande área agrícola; tem mata, a gente não quer que nada seja devastado para ser construída casa. Hoje a gente consegue pensar isso com um pouco mais de calma, não vou te dizer que todo mundo morre de amores pelo Comperj, isso não é verdade. Todas as discussões ainda giram bastante em torno desse problema porque quando as pessoas receberam essa notícia um grande grupo pensou assim: “Os problemas do município vão ser resolvidos pela Petrobras. A gente não tem um bom hospital, a Petrobras vai fazer. A gente não tem estrada asfaltada, a Petrobras vai asfaltar as estradas.” A gente não tem transporte coletivo decente, nosso transporte coletivo não trafega pelas vicinais, pelas estradas de chão, as estradas rurais que levam às comunidades rurais do município. A gente não tem um monte de coisa. Todo mundo achava que a Petrobras ia resolver esse problema, as pessoas precisam começar a mudar seus conceitos, não é a empresa que vai mudar isso; isso é um problema do município, do órgão público. Comperj / IMPACTOS Quando eu toco nesse assunto do crescimento é que a gente sabe que a Petrobras não vai fazer os serviços públicos que devem ser feitos; se a gente mora em um município com tanto problema, como é que isso vai ser quando esse monte de gente chegar? Temos uma previsão de 100.000 pessoas, 50.000 pessoas, 250.000 pessoas. As pessoas falavam assim: “Pode deixar, nosso município é muito bonito, é muito lindo, quem vai morar no município é quem vai vir trabalhar dentro da fábrica.” Não é verdade, quem vai morar no nosso município é aquele pessoal que vai vir construir essa indústria. Não tem como se locomover para nada mais longe, o município é ali do outro lado, vai se instalar ali. Não é questão de preconceito, quem tem dinheiro ou quem não tem dinheiro, porque quem tem condições financeiras é muito mais prático. O município está a menos de 100 quilômetros do Rio de Janeiro, de Niterói, são locais que as pessoas têm as suas residências. A nossa preocupação é com essas pessoas que vão vir. A gente sabe que existem pessoas de outros estados vindo para essa localidade. Trabalho em escola pública e vejo essa realidade, já tem gente chegando de outros Estados do país esperando a obra começar para arrumar um emprego lá dentro. Essa pessoa quando vem, não vem sozinha, traz esposa, filho, daqui a pouco vem o irmão. Como é que vai ser a vida dessa pessoa dentro do município? Qual é a escola que esses filhos vão estudar? No caso de doença, qual é o hospital que vai frequentar? A gente tem problemas de infra-estrutura graves no município, não acredito que isso vá melhorar da noite para o dia. Depois de 2012, vai ser tranquilo. Depois que a fábrica tiver operando acho que “a gente não tem mais preocupação nenhuma para ter”. Minha preocupação é até a fábrica ficar pronta. O grande choque que a gente vai receber vai ser até a fábrica ficar pronta, porque depois que a fábrica ficar pronta só vai trabalhar lá os operadores, vai ser tudo muito bem monitorado, tudo muito bem organizado, não sou eu que vou ficar me preocupando com aquilo. Sei que a Petrobras tem juízo. Tem gente específica para fazer isso, tem como monitorar isso muito bem. E quando o povo sair de lá de dentro? Quando o último tijolo estiver assentado? Esse pedreiro vai ficar aonde? Essa é a nossa preocupação. A gente já pegou e dividiu 250.000 empregos diretos e não diretos; essas pessoas vão ficar aonde? Se for um quinto para o nosso município é como ter mais um do meu lado o tempo todo. É dobrar a população. A gente não está vendo isso com bons olhos. Vão derrubar uma árvore e a gente que vai plantar dez. Isso não precisa se preocupar. Tem perigo de alguma coisa cair no rio? Eles sabem como se precaver disso muito melhor do que um monte de casa que joga esgoto dentro do rio, que é a realidade de todas as casas do município. A gente não tem uma estação de tratamento de esgoto, o esgoto de todas as casas é misturado com a água pluvial que cai dentro do rio. Se a gente tiver o dobro disso, vai ter o dobro de esgoto sendo jogado dentro do rio. Vai ser muito mais perigoso do que qualquer coisa que possa vir a acontecer com aquela fábrica. Eu sei que a preocupação da fábrica em si, do polo, da indústria gerar algum resíduo é quase nula em relação a todos os resíduos que podem ser gerados com as pessoas que vão ocupar o município da gente. FÓRUM LOCAL DE AGENDA 21 / CAHOEIRAS DE MACACU / AÇÕES Temos participação em vários momentos, a gente já se dividiu para estar nos conselhos municipais, trabalhou junto com a secretaria de meio ambiente com um trabalho no dia mundial de meio ambiente no município divulgando; a gente sabe que é preciso divulgar o trabalho, ninguém é reconhecido se não tiver a divulgação do seu trabalho. Nos próximos dias a gente vai estar junto com algumas comunidades, principalmente comunidades rurais vizinhas do Comperj. Vamos fazer esse trabalho de saber o qual é o anseio de cada comunidade, tendo em vista comunidades que são completamente agrícolas, que estão do lado de um grande empreendimento como esse. É um trabalho de palestras, reuniões, temos trazido esses temas mais polêmicos para debate, para saber se é realmente isso que o município em si quer. Dentro do nosso plano tem algumas ações, a primeira delas é a revisão do Plano Diretor do Município. O Plano Diretor do Município deixou algumas brechas justamente nesses lugares que podem ser ocupados pela população; a primeira ação do fórum foi solicitar a revisão desse plano. O plano começou a ser revisto agora, a parte de ocupação e habitação, um plano de habitação está sendo construído. FÓRUM DE AGENDA 21 LOCAL / METODOLOGIA DE FORMAÇÃO O processo foi bem complicado no início porque a gente fazia parte da ONG proponente; quando surgiram as primeiras reuniões da Agenda 21 as pessoas falaram para gente: “Vai ser dividido em quatro setores...”. Primeiro a gente se descabelou: “Isso não vai dar certo nunca. Como é que isso vai dar certo? Se o negócio é participativo você vai discutir por setor como?”. A gente debateu muito a metodologia utilizada, isso é inevitável, nós tivemos brigas grandes contra a metodologia, a gente estava no meio do negócio e falou: “Isso não dá certo. Não é isso que eu quero responder. A minha vontade não é de responder isso. Por que tem que ser desse jeito?” Fui às quatro reuniões, às vezes aconteciam duas reuniões no mesmo dia porque eram pessoas diferentes, mas o pessoal da instituição falava: “Você tem que saber o que cada um dos setores fala sobre esse processo como que é”. Eu conseguia ter esse olhar, o que o pessoal do primeiro setor enxergava, o pessoal do segundo setor, chegou um ponto que falei: “Olha, eu não quero mais brincar com esse negócio. Eu não vou mais a todas as reuniões, eu vou passar a ir às reuniões específicas do terceiro setor”. Descobri só no dia da primeira reunião com todo mundo, que as pessoas chegaram e falaram assim: “Desse setor saem sete pessoas. Vai acontecer uma eleição, sete pessoas vão representar o setor no fórum do município”. Marcaram a reunião: “A primeira reunião do fórum inteiro vai acontecer no município de Rio Bonito, num hotel...” marcaram num determinado lugar e nós fomos. Lá que a gente viu quem era do outro setor que estava participando, tem um grupo que participa de um monte de reunião junto que não sabia que ia fazer parte desse fórum, e nós fomos. Na primeira reunião a gente teve um monte de medo. A gente saiu de noite do município, em um lugar escuro para caramba e o motorista ficou perdido no meio do caminho para chegar ao hotel, foi um desespero de um olhar para o outro e falar: “O que esse povo que tirou a gente de dentro do nosso município tá trazendo a gente pra outro lugar, vai fazer o que com a gente durante três dias...”. As pessoas ficaram muito agoniadas. A gente saiu do município por volta de umas cinco, seis horas da tarde, e só conseguiu chegar ao hotel às dez e pouco da noite. O primeiro impasse, foi um desespero, a gente não sabia para onde estava indo e o que estava indo fazer. De lá pra cá as coisas foram se acalmando, o grupo das quatro ONGs a gente conseguiu se dar bem com todo mundo, são pessoas maravilhosas que fizeram um trabalho muito bom, que aguentaram a gente reclamando da metodologia deles o tempo inteiro; porque era uma coisa que a gente brigava e pilhava muito, porque a gente fez uma metodologia no passo a passo da Agenda 21, criou a nossa metodologia de trabalho e achava que aquela era a certa. Mania de um ser humano comum, normal achar que o que você faz é o certo. O grupo trabalhava com uma metodologia muito diferente daquilo e às vezes voltava atrás porque a gente brigava muito, falava que a gente não queria aquela metodologia que eles estavam usando, aquela questão de perguntas prontas com respostas prontas não era o que a gente queria. Todo mundo fala muito lá, assim como eu e foi, no início, bem conflituoso, bastante polêmico. A gente ainda recebe e-mails dos facilitadores que a gente chamava na época de dificultadores: “Vocês são mais dificultadores do que facilitadores. Vocês não estão facilitando nada”. Mas foi um processo muito gostoso de participar porque eu vinha de outro trabalho e às vezes me revoltava com aquilo: “Poxa vida. Vocês estão mobilizados assim porque é a Petrobras, porque a gente cansou de rodar o mundo chamando vocês pra reunião e ninguém ia pras reuniões”. Tinha uma dificuldade muito grande. Quando a gente chegava aos auditórios e aquele auditório repleto de gente, falava: “Poxa vida. Brincadeira, né? O que não é carregar um BR numa pasta não faz”. O pessoal da Petrobras chegou, pronto, está tudo resolvido. Todo mundo vem pra reunião. Foram umas situações muito engraçadas, mas foi muito bom. Esse grupo das 28 pessoas tem pessoas que tem conflitos de idéias claros uns com os outros, até porque ia ser muito chato ficar em um grupo que todo mundo pensa a mesma coisa. As pessoas não pensam igual, existem pessoas que discutem umas com as outras. Há uns dois meses atrás a gente teve uma discussão bem feia, bem quente dentro de uma das nossas reuniões, uma das colegas levantou e falou: “A nossa sorte é que a gente ainda sai daqui abraçando um ao outro, porque senão a gente chegava na esquina e arrumava uma briga”. São pessoas que aprenderam a se respeitar muito. A gente sabe que tem um monte de gente de pensamentos diferentes, ninguém manipula ninguém, a gente respeita cada idéia, quando aquilo não é consenso a gente bota em um cantinho, deixa para discutir aquilo outra hora. Foi uma das lições que esse grupo de ONGs ensinou e que a gente vem trabalhando bem firme nisso. Chegou um determinado ponto que a gente não chegou em um acordo, pára a discussão, guarda aquilo em um saquinho e outra hora que o pessoal estiver mais calmo, mais maduro para discutir a gente volta e continua. O fato de acontecer essa integração inclusive entre os setores, o pessoal do primeiro conversando muito mais com os outros setores, não é uma coisa fácil. O primeiro e o terceiro setor sempre têm problemas; o segundo setor a gente sempre acha que o pessoal do comércio não liga para nada, não pensa em nada, não gosta de nada. A comunidade vem para reclamar de alguma coisa. É sempre visto dessa forma: o primeiro setor está lá em cima, é o primeiro porque é o governo, não liga para nada; o terceiro que são as ONGs só brigam; a comunidade só pede e o segundo é alienado. Essa é a visão normal da coisa. A gente chegou a um ponto em que a gente não sabe mais a que setor pertence. No fórum de Cachoeiras a gente já está misturado de uma forma que não tem ninguém respondendo por um setor específico, todo mundo entra em consenso e consegue se organizar de uma forma que dividimos trabalhos, que são muitos, mas a gente divide tudo paritariamente. Todo mundo trabalha junto e na mesma forma legal. AGENDA 21 Hoje cedo antes de vir para cá eu estava conversando com algumas pessoas, até porque se eu vim representando vamos conversar; é dessa forma que a gente trabalha. Essa questão da gestão participativa, de empreendimentos como é o caso desse da Petrobras, isso é muito novo, é muito recente. As pessoas não estão acostumadas com isso. A Petrobras mesmo nunca fez nenhum dos seus empreendimentos levando em consideração. Também não somos tolos o suficiente para achar que tudo o que a gente disser vai ser feito. Não é bem assim. Nós somos muito bebês dentro dessa realidade. É muito bom participar desse processo, é contagioso. É muito gostoso participar de um processo que é revolucionário e trazer uma empresa como a Petrobras e mostrar que ela pode passar por esse processo; é mostrar para os municípios que a gestão pública municipal pode passar por esse processo. Eu acredito que organizar o que a Petrobras tem organizado, é lógico que a gente leva em consideração um monte de coisas, tem recurso para isso, mas é muito fácil passar por cima de um monte de coisas. A gente tem percebido que as opiniões têm sido respeitadas e isso é uma boa forma de mostrar paras outras instâncias de governo que pode ser assim, que a sociedade civil, que o segundo, o quarto, o primeiro setor, a gente pode estar junto. Não foi por acaso que eles preferiram escolher a Agenda 21. Eu sou militante mesmo, ambientalista de verdade, carteirinha, não tem como negar, mas dentro desse processo a gente conseguiu misturar um monte de outros quereres, de outras vontades que passaram a ser vontades minhas, como as questões sociais; como passou a ser vontade do comércio se preocupar com a questão ambiental. A gente consegue ver isso dentro desse fórum muito claro. Só é aquela grande questão, o poder público municipal precisa ver isso. Se os 15 municípios em torno do Comperj que estão tendo essa oportunidade de criar essa agenda participativa e passar por esse processo durante esse período, tivessem os seus governantes, o seu gestor público abraçando esses planos locais nós teríamos pelo menos 15 municípios com uma gestão muito mais eficiente. Às vezes a gente fica dizendo que as pessoas chegam em determinado momento e começam a reinventar a roda, criar coisas, mas porque foi idéia de um governo anterior ou foi idéia de um opositor, que isso não é feito. É por uma questão de brilho de ego, de briga de ego que as coisas acabam desandando. Quando a gente tem um fórum como foram criados os fóruns da Agenda 21, desses 15 municípios, a gente não precisa brigar com política, a gente criou a nossa própria. Não tem briga partidária. A nossa política é outra, é feita de outra forma, não tem o que eu quero, é o que eu acho que é melhor e tentar passar isso adiante e se o que eu acho não for conveniente passa a ser o que o outro pensa. Raramente a gente faz uma votação, porque votar é aquilo: quem ganha, ganha, quem perde, perde. Mas se a minha opinião é que isso aqui é preto e a sua que isso aqui é cinza e a gente chegar num consenso que isso aqui é cinza, a minha opinião passa a ser que isso aqui é cinza também. É aquela questão de não querer igualar, porque cada um tem na sua cultura uma coisa muito diferente, é isso que enriquece o trabalho, chegar num consenso. MEMÓRIA PETROBRAS Juro que fiquei nervosa, fiquei vermelha, disse: “É lógico”, mas assim que me ligaram falei assim: “Ah, isso não é pra mim, vamos chamar outra pessoa”. Depois as pessoas ficaram brincando, as pessoas do fórum: “Thabta, você fez todas as reuniões que a gente teve...” e é um pessoal da comunicação e todas as entrevistas foram comigo. Eu fugia assim como quem foge da cruz. Gostei de vir, apesar de ter restrições com a câmera, microfone, com essas coisas todas, mas fiquei bastante à vontade, falei o que era preciso e queria agradecer vocês e parabenizar pelo trabalho. Achei legal.
Recolher