Meu nome completo é Izidro Paes Leme Arthou, mais conhecido como Arthou. Como Izidro quase nunca, ficou restrito para a família. Nasci em dois de junho de 1949, no Rio de Janeiro, no subúrbio, onde fui criado. Depois dos 14 anos ganhei o mundo. Sou engenheiro mecânico formado pela UFRJ [Universidade Federal Do Rio de Janeiro] em 1973; depois fiz pós-graduação na área de desenvolvimento. Pode parecer antagônico, mas era a única coisa que eu não conseguia controlar (risos).
Em 1993 comecei a representar o pessoal do Comando da Marinha, nós temos uma sede em Maricá onde funcionava a sede recreativa e uma pousada para o nosso pessoal. Uma vez, chegando lá, quase fui barrado pelo pessoal da vizinhança quando souberam que eu ajudava a dirigir a organização, que era a Associação dos Servidores Civis da Marinha. “Poxa, vocês têm um gueto aí?” “Que gueto?” “É, um espaço que fica só perdido, só travado?” “Tudo bem. Então, vamos fazer o seguinte: sábado estou aqui, nós vamos sentar e conversar e ver o que a gente pode fazer.” No sábado tinha umas dez pessoas lá; nós traçamos um plano e começamos a fazer uma escolinha de futebol para a garotada. Tudo com voluntários, tudo com material da Associação. Montamos aula de reforço para eles; fizemos algumas atividades sociais; dia da criança; festa para a vizinhança da sede. A gente começou a integrar a sede no meio ambiente. Eles tinham razão quando disseram que tinha uma área como uma ilha cercada de segurança para todo lado e que a comunidade não participava. A comunidade começou trocar e foi muito bom para a gente também, porque eu não podia provocar despesas para a Associação porque poderia haver uma reclamação geral dos sócios. Eles não estavam acostumados a isso, não era essa a finalidade da Associação. A gente começou a envolver os sócios e tudo era voluntario. Eu não tinha que pagar recreador; não tinha que pagar professor de para dar...
Continuar leituraMeu nome completo é Izidro Paes Leme Arthou, mais conhecido como Arthou. Como Izidro quase nunca, ficou restrito para a família. Nasci em dois de junho de 1949, no Rio de Janeiro, no subúrbio, onde fui criado. Depois dos 14 anos ganhei o mundo. Sou engenheiro mecânico formado pela UFRJ [Universidade Federal Do Rio de Janeiro] em 1973; depois fiz pós-graduação na área de desenvolvimento. Pode parecer antagônico, mas era a única coisa que eu não conseguia controlar (risos).
Em 1993 comecei a representar o pessoal do Comando da Marinha, nós temos uma sede em Maricá onde funcionava a sede recreativa e uma pousada para o nosso pessoal. Uma vez, chegando lá, quase fui barrado pelo pessoal da vizinhança quando souberam que eu ajudava a dirigir a organização, que era a Associação dos Servidores Civis da Marinha. “Poxa, vocês têm um gueto aí?” “Que gueto?” “É, um espaço que fica só perdido, só travado?” “Tudo bem. Então, vamos fazer o seguinte: sábado estou aqui, nós vamos sentar e conversar e ver o que a gente pode fazer.” No sábado tinha umas dez pessoas lá; nós traçamos um plano e começamos a fazer uma escolinha de futebol para a garotada. Tudo com voluntários, tudo com material da Associação. Montamos aula de reforço para eles; fizemos algumas atividades sociais; dia da criança; festa para a vizinhança da sede. A gente começou a integrar a sede no meio ambiente. Eles tinham razão quando disseram que tinha uma área como uma ilha cercada de segurança para todo lado e que a comunidade não participava. A comunidade começou trocar e foi muito bom para a gente também, porque eu não podia provocar despesas para a Associação porque poderia haver uma reclamação geral dos sócios. Eles não estavam acostumados a isso, não era essa a finalidade da Associação. A gente começou a envolver os sócios e tudo era voluntario. Eu não tinha que pagar recreador; não tinha que pagar professor de para dar explicações de Matemática, Português, nada disso. Não tinha que pagar professor de Educação Física que dava hidroginástica para os velhinhos. Tudo isso começou por causa dessa história. Quando foi noticiada a implantação do complexo petroquímico, muita gente de Maricá já me conhecia, sabia do trabalho que a gente fazia na Associação. Eu dirigia a Associação, já tinha passado por diversos cargos, me chamaram para conversar. Havia uma tentativa de organização da sociedade civil dito organizada. Primeiro fiquei meio incrédulo, dizia: “Eu nunca vi a sociedade se organizar realmente.” Fui eu, primeira reunião; achei tudo muito bonito, mas achei que o pessoal estava viajando um pouco. Segunda reunião, tô eu lá; saia do Rio, ia para lá correndo, enfrentava a reunião, discutia. Eles não viram tudo. Não viram que o complexo está em uma área que deveria ser preservada. Eles não viram detalhezinhos. Eles estavam imaginado que a Petrobras ia chegar distribuindo benesses assim a 3 por 2. Na terceira reunião comecei falar: “Olha, eu acho que ta havendo um engano aí. Se a gente quer alguma coisa, a gente tem que se organizar. A Petrobras é uma empresa, para ela interessa lucro. Ela vai passar por cima de vocês a hora que for preciso, sem sombra de dúvida. Então, se a gente não estiver preparado pra discutir com eles de igual pra igual, já era, eu não venho mais aqui. Eu não vou ficar gastando meu tempo com maionese”. Começou uma discussão em outro nível e nós começamos a preparar o grupo voltado para política social; desse pessoal que estava presente, todos eram líder comunitários. [Os presentes nas reuniões] eram presidentes de associações de moradores, sindicatos, associações de classe, ONGs, cooperativas de serviços, cooperativas de produção. Tinha outros tipos de organizações sociais, até igrejas, diversos tipos de igrejas. Eram 46 organizações tinha uma representação muito boa da sociedade, era um crime não aproveitar aquilo, por causa da faixa que tava abrangendo. Eu disse: “Não é possível que a gente tenha quase a cidade toda representada aqui e não aproveita isso pra nada.” Começamos a fazer um trabalho, foi um acordo que foi feito. Estruturamos o grupo. Isso tudo surgiu com essa primeira reunião que me convocaram. Houve alguém que planejou criar um Conselho Comunitário Regional, achei a idéia ousada, muito difícil, porém, brilhante. Se funcionar, ótimo. Começamos com as reuniões, inicialmente era só voltada para esse Conselho Regional. Quando nosso grupo se apresentava para se reunir juntos com os outros grupos dos outros municípios, a partir de determinado momento começou a ficar muito claro que nós éramos organizados. Tínhamos uma estrutura que os outros municípios não tinham. A gente fez um pacto político, não se tocava em política nenhuma na reunião. Nós tínhamos representantes de partidos, pessoas filiadas a partidos e não se podia defender nenhum interesse partidário. Esse foi um dos tratos mais sérios que a gente teve que fazer. A gente ficou uma reunião inteira discutindo o que era colocar apresentação partidária, como se policiar. Os outros municípios começaram a notar que Maricá tinha estrutura diferenciada. O troço cresceu de uma maneira tal que em fevereiro de 2007, crescendo a história do Conselho Comunitário Regional que é o Concrecomperj, comentei: “Gente, nós já estamos mais do que na hora. A legislação brasileira permite a criação de Conselhos Comunitários, não obriga que ele tenha que ser preso ao sistema governamental, qualquer nível de poder político. Podemos criar um Conselho que seja representante da sociedade inteira, temos aqui já 48 organizações” Fizemos um seminário em outubro de 2006 – com essas organizações todas e mais quem quisesse participar, teve gente que não fazia parte de organização nenhuma e quis participar e também foi – onde avaliamos Maricá sob o ponto de vista da implantação do Comperj: o que era Maricá naquela data e o que a gente precisava. O que nós poderíamos tratar com a Petrobras e o que teríamos que tratar com os governos municipais, estaduais e federais. Por causa desse resultado, por causa da estruturação que sofreu, falei: “Está na hora da gente começar a pensar em ter um Conselho Comunitário do Município, voltado para ele, para resolver os problemas dele.” Temos problemas semelhantes dos outros municípios, porém, nós temos particularidades que os outros municípios não têm. Como eles têm o que a gente não tem. Maricá é o território mais novo do território brasileiro, só passou existir efetivamente na extensão que é hoje depois da última Idade do Gelo. Até cerca de 12 mil anos atrás, a ponta sul, era apenas a ponta sul. Maricá, o território quase todo era uma enorme angra e essa angra cheia de ilhas, mas era uma angra. Começou haver a deposição da primeira camada de areia do primeiro braço da restinga; depois veio a Idade do Gelo, o gelo chegava até aqui o Estado do Rio. Quando terminou a Idade do Gelo com as chuvas, houve o assoreamento da montanha que fechou a angra e criou o sistema lagunar. O sistema lagunar é único. Nós temos animais e vegetais que só existem lá, em nenhum lugar no mundo, que nunca foram de outros lugares ou que foram origem da pré-história que degenerou e virou isso, virou aquilo. Nós somos únicos. A gente tem que ter uma coisa que pense na gente como a gente. Eu já estava morando meio lá, meio cá, começamos a estabelecer as regras do Conselho, montamos um estatuto super aberto, extremamente democrático onde todo mundo tem direito de falar. Só quem vota são as representações oficiais. Esse Conselho cresceu e tomou vulto. Houve umas tentativas de levar para o lado político e eu me afastei. Começou uma briga danada. Eu não admito que tentem fazer um trabalho social, política social se transformar em política partidária. É mortal. Nos afastamos e agora a gente voltou para recuperar um pouquinho. Onde você fala de política social em Maricá, tem 26 pessoas que vão aparecer constantemente (risos). Essas 26 são os diretores do Conselho Comunitário de Maricá, a gente vai estar sempre aqui. A gente está junto do Ministério de Meio Ambiente, do Ministério Público e do Ministério das Cidades. Nós ajudamos a organizar o Fórum Social Mundial; através de um dos nossos braços que é o Conselho Comunitário de Segurança, ajudamos organizar a Conferencia Nacional de Segurança Pública. A gente foi se espalhando. Esses agitadores têm uma disposição absurda. Tem hora que eu estou quase desmaiando e eles estão lá: “Vamo borá, vamo borá, vamo bora” (risos) Fazia parte dos projetos iniciais. No seminário algumas coisas muito interessantes surgiram: um, a implantação da Agenda 21 em Maricá; dois, a implantação do Conselho de Segurança Pública em Maricá; três, a implantação de um plano de educação voltado para o meio ambiente em Maricá; implantação de um sistema de saúde adequada; implantação de um sistema de transporte também adequado, menos agressivo. Agenda 21 fazia parte do Conselho Comunitário. Quando veio a proposta da Petrobras de trabalhar com a Agenda 21, nós fomos verificar o que era e o Conselho começou entrar na história da Agenda. Oficialmente, dentro da Agenda 21 o Conselho só aparece quando eu me posiciono como representante do Conselho. E dentro da Agenda 21 eu represento o Conselho Comunitário, não a Associação dos Servidores Civis da Marinha. O Conselho Comunitário é caracteristicamente Maricaense. Estou tendo que fazer um monte de explicações, que escrever, botar a base teórica em que me baseei, tava ficando acadêmico demais; fiquei desesperado, tenho que voltar e tirando academicismo porque no Fórum Social Mundial em Belém, eu comecei a receber cobrança: “Como é que faz isso? A gente quer fazer. Como é que faz?” Tem que explicar. Tenho que fazer uma cartilha explicando como as populações podem reagir, como elas podem se unir. Hoje, dentro da Agenda 21 local, a maior parte faz parte do Conselho Comunitário de Maricá. Cada um representa sua própria organização. Passou a ser também uma maneira da gente não ter que discutir dentro do Conselho algumas coisas que são de Agenda 21. O Fórum enfrenta um problema que é o poder municipal. O governo passado, simplesmente ignorava toda e qualquer coisa. Para a gente era ótimo. Ótimo no seguinte sentido: ter alguém que resolve fazer alguma coisa errada é melhor que não faça. (risos) Você tem duas opções: esse não quer fazer, então está bom, não perturba; mas esse resolve fazer errado aí perturba. O anterior para a gente era ótimo porque, falava: “Faça o que vocês quiserem.” Tudo bem. O de cá: “Eu quero assim, tem não sei o que lá.” Botou o intermediário, eu falo para ele: “Camarada, a ditadura já terminou. Você não vai me impor nada não. Eu represento uma comunidade. Você tem que me tratar com respeito.” Um dia ele soltou uma numa das reuniões que nós tínhamos com um grupo pequeno: “Não, não é pra discutir em grupo grande.” Escolheram quem estaria nessa montagem. Claro que não me botaram no meio. Eu e Conceição Koide que tem sido uma amiga, uma cúmplice nesses tempos todo. Eu e Conceição fomos conversar com o representante da prefeitura. A prefeitura criou uma sub Secretaria de Agenda 21, subordinada à Secretaria do Meio Ambiente. Essa subsecretaria, segundo a ideação deles, já é a própria estrutura da Agenda 21. Mas “Oh, espera aí, vocês não estudaram a lição de casa. O que é isso? Foram estudar? Pelo menos entraram no site do Ministério do Meio Ambiente pra ver o que é uma Agenda 21? Entraram lá na rede brasileira de Agenda 21? Dá uma olhadinha pra ver como funciona.” Nem isso eles fizeram. Vem alguém que está servindo como legislador, assessor jurídico da prefeitura. Participou das últimas reuniões da tentativa de implantação do Fórum: “Eu acho que tem que ser assim” “Não é assim.” “Não, mas eu quero.” (risos). “Não, porque o prefeito não vai querer.” “Então vamos conversar com ele.” “Não, ele não quer conversar.” “Então não tem.” O Fórum está em um impasse. Vamos ver quem tem mais paciência. As reuniões acontecem, mas ele, oficialmente, não existe. O Prefeito acha que tem que fazer um decreto representando o governo, definindo determinadas coisas. Lançaram uma campanha pública para que pessoas venham participar, se candidatem a participar do Fórum. Não sou contra, só fico preocupado quando vejo um movimento político agindo assim, porque sei que existe um monte de organizações que são fantasmas; oficialmente tem um monte de gente, mas tem uma pessoa só e essa pessoa é ligada ao vereador tal, ao deputado tal, ao prefeito tal. Sem a participação do governo, com participação de outras organizações, representantes do segundo setor, do quarto setor. O nosso setor é muito envolvido com o quarto setor porque praticamente é a mesma coisa. Com as comunidades a gente se entende muito bem. Com o segundo setor – comércio e indústria – não temos problema algum, a tal ponto que a gente montou um estatuto de Fórum. A última vez que houve uma colocação do representante do governo, perguntaram: “O que é que nós vamos fazer?” Eu disse: “Tem uma hora de atacar e tem uma hora de parar. Eu acho que se a gente partir com tudo pra cima não vai resolver nada. Ta na hora de deixar eles se enrolarem na própria corda. Eles vão ficar perdidos” “Mas e se eles fizerem um decreto, criarem um Fórum qualquer a moda deles?” “Vão criar. Isso aí a gente não via impedir. Não tem como. Eles vão criar. Para nós, como sociedade, é destruir tudo que tiver de errado. Se a gente sem estar brigando no Ministério Público por causa da ocupação irregular da restinga, que é uma área de preservação e queriam fazer um mega empreendimento imobiliário lá, se a gente está levando isso no Ministério Público, a gente pode levar outras coisas. A gente tem o Ministério do Meio Ambiente que não vai querer que uma Agenda 21 não funcione bem. Se a gente provar pra eles que ela é repasse de verba pra A, B ou C ou D, é claro que eles tiram todo e qualquer apoio. Só temos uma coisa: usar as armas oficiais. Eu não vou ficar de bate-boca com político sujo porque bate-boca com político sujo eu vou acabar perdendo porque ele é sujo, ele é especialista nisso, eu não. Eu sou especialista em lógica.” (risos) O início da proposta foi 2006 quando a gente fez o seminário Maricá na era do Comperj. A Petrobras tem os problemas dela e teve que dar uma parada na história, ele vinha em uma velocidade e teve que dar uma parada. Mas teria que dar essa parada de qualquer maneira. Tenho certeza que em cada um dos municípios houve um ajeitamento. Temos prefeitos novos que assumiram, tem trocas de políticas, tem vários ajeitamentos que são feitos em um município no ano seguinte a uma eleição. Esses ajeitamentos precisariam tanto para a Petrobras quanto para as próprias comunidades. Isso é ponto pacífico. Está na hora de a gente dar uma paradinha, uma respirada e se reforçar para voltar ao ataque, mas voltar com o pé no chão. Agora, provavelmente, as comunidades – considerando as ONGs, comunidades e o segundo setor, voltam a se reunir a partir de início setembro para a gente definir qual vai ser a nossa posição perante o primeiro setor. “Ô negão, a gente quer isso e acabou. Se não quer isso, tudo bem, vamos pro embate.” A Roda Viva no início houve um tropeçozinho, porque eles contrataram alguém de Maricá para ajudá-los e marcaram uma reunião na mesma data da reunião do Conselho Comunitário. É claro que a reunião deles ficou esvaziada. Eu falei: “Ó, faz tudo, mas não mede força com o Conselho não.” (risos) “Não mede força com o Conselho que não tem sentido”. Eu não ia transferir a minha reunião; todo ano o Conselho marca todas as reuniões do ano; eu sei até dezembro quais são as reuniões que tenho. Não marca nada naquela data para mim. É compromisso. Eles acertaram e depois foi bem. O ISER [Instituto de Estudos da Religiãpo] é do segundo setor, teve algumas reclamações, mas não muitas. Eu também não convivia muito com o setor. A Roda Viva ficou com as comunidades. A ASA [Associação de Serviços Ambientais] com o terceiro setor. A ASA se entendeu, foi paixão a primeira vista com o terceiro setor, foi um pessoal muito novo para lá, participaram do Fórum Social Mundial junto com a gente, organizamos uma sessão lá em 2008 e participamos agora em 2009 de novo, em Belém. A gente mandou um grupo para lá e ficou um grupo aqui, a gente trabalhou linkado. Muito doido, mas muito bom. O pessoal da ASA, quando a gente via estava sumido no meio da população (risos), se entrosaram totalmente. Mas é questão de personalidade. Aquele pessoal estava brigando realmente, estava fazendo gestão ambiental. Quando eles viram o que a gente estava fazendo eles entraram de cabeça. Da ASA não tem nada do que reclamar. O Roda Viva foi só no início, mas depois também se entrosaram as mil maravilhas. A partir daí, eles se entrosaram as mil maravilhas, não tem o que reclamar da Roda Viva. De jeito maneira. Marcelo, às vezes tinha que costurar para caramba porque tem umas organizações que não fazem parte do Conselho e olham para o Conselho com certa desconfiança. Natural quando você se torna uma força política, mesmo não tendo partido, natural que algumas te olham com desconfiança; então o Marcelo, às vezes, tinha que costurar algumas coisas, eu ficava olhando, ele se saia bem (risos). Quando achava que estava perigoso: “Ó, não é por aí não” (risos). “Vai por aí não, é perigoso rapaz” (risos) A Petrobras chega muito sozinha, jogada; nós não conhecemos, tirando o Ricardo que está sempre junto quando tem as reuniões, e o Puig, que a partir de determinado momento participou mais; tirando esse dois não tem Petrobras. Isso não existe. De 2006 para cá o que a gente previu era uma explosão demográfica. O centro de Maricá fica a 30 quilômetros do centro do Comperj. Tem uma estrada que liga Itaboraí à Maricá, 26 quilômetros de estradas, mais quatro e meio e você chega até o complexo. Itaboraí tem alguma dificuldade. Maricá apresenta uns atrativos. Primeiro, tem o mar, apesar de não ser um mar usável, mas é um mar. Não é um mar que você vá tomar banho de praia, só quando está calminho. Ali onde tem a praia, era fundo de oceano. Abertura da baía, entrada da angra, é forte, é junto do canal do atlântico, da correnteza que sobe, mas tem montanhas. Ainda tem montanhas, muito verde, um clima bom, pouca poluição e mais de cem mil lotes vazios. Isso significa que a gente teria no mínimo cem mil pessoas, cem mil casas a mais. Isso dá 300 mil pessoas. Hoje você vê que essa explosão já começou, devagar, mas já começou. Um terreno subiu 100%. O sistema de transporte que não funciona para 120 mil pessoas vai funcionar para 300, 400 mil pessoas? O sistema de água só abrange 5% da população com água tratada. Me chamaram para uma entrevista para explicar que a Cedae está botando água para Itaipuaçu. Eles ficaram assustados quando eu disse: “Da onde você vai tirar isso?” “Ah, do Mombuca” “Não vai.” “Por quê?” “Não tem como negão Eu vi a adutora, não tem como tirar.” “Você viu a obra que eu fiz?” “Não.” “Tá bom. Vamos marcar pra você ir lá ver” “Vou lá, vou criticar e vou dizer que não dá pra tirar essa água que você ta falando” (risos). A única coisa que a gente tem dentro de Maricá, acredite se quiser, são salas de aula o suficiente para a população de hoje. Não me pergunte por que, nem como foi isso. Só não tem um sistema de ensino bem trabalhado. Sou muito radical com relação à ensino. Educação é mais ampla que o ensino, deveria ser olhada de forma bem taxativa, bem grande. Acho que é a única coisa que tem suficiente. O resto é tudo deficiente, 90% das ruas não tem nome, tem loteamentos totalmente irregulares. Maricá cresceu sobre a lei do aproveitamento sem vergonha, da exploração imobiliária sem vergonha. Na década de 50 começaram a fazer os canais, fizeram o primeiro canal, o da costa, para reduzir o volume da lagoa porque havia umas enchentes e disseram que dava febre amarela. Detalhe é que não achei registros de casos de febre amarela em Maricá. Depois fizeram o canal da Ponta Negra e por último o canal da Barra. Rebaixaram um metro e meio de espelho d’água da lagoa. Essa preocupação quando a gente levantou, o seminário que a gente fez abriu muito, a gente teve que discutir muito e foi vendo tudo que estava acontecendo. Um dos problemas que o seminário levantou era segurança. Nós não temos um sistema de segurança forte. Uma das imagens que usei foi o que a gente passou a chamar de efeito Macaé e parece que hoje já se tornou comum. Lembro que dentro do Instituto de Segurança Pública quando falei no efeito Macaé, eles entenderam de imediato o que era. Uma das coisas que a gente plantava com o Conselho Comunitário de Segurança, também, que é outra parte, o Conselho Comunitário de Segurança é uma organização independente que funciona como recomenda o ISP [Instituto de Segurança Pública]; só que quando fui conversar com eles sobre a implantação do Conselho Comunitário de Segurança, eles me explicaram que era demorado. Um dia eles foram lá e eu os convidei para uma reunião do Conselho Comunitário de Maricá. Eles levaram um susto: “Mas a estrutura que a gente precisa para funcionar vocês já tem, já montaram” “Já. Há muito tempo. Só que não vai ser essa, vai ser outra.” Foi montado, o mais rápido a implantação. Em pouco tempo o Conselho Comunitário de Segurança de Maricá se tornou vedetinha dos outros Conselhos Comunitários de Segurança por causa do nosso modo de tratar. A gente não deixava a política interferir: “Não, isso aqui não. Isso é política partidária, não entra aqui.” A gente também começou descobrir que um dos nossos medos já estava acontecendo, já sabemos que existe um movimento de implantação de tráfico de droga. Tenho uma preocupação muito grande com o pessoal que faz parte do Conselho Comunitário de Segurança porque eles acabam se expondo. A nossa sorte é que até agora a gente tem um delegado muito bom; o pessoal do ISP dá um apoio muito grande para a gente e tem outras organizações que também estão ajudando. A própria promotoria identificando, participando mais. O batalhão da PM que fica em Niterói, mas tem uma companhia lá, o pessoal da companhia está participando ativamente. Isso é bom para a gente ver que a comunidade está reagindo. Esse era um dos problemas, o efeito Macaé. Em fevereiro desse ano descobrimos o efeito Macaé já acontecendo, gritante. Maricá tem três sinais luminosos; em dois já tinham crianças rodando bolinha (risos). Dois terços da nossa área foram ocupados (risos). Havia zero população de rua, em outubro do ano passado era zero. Hoje, menos de um ano depois, tem. COMPERJ / BENEFÍCIOS Uma das minhas discussões era isso: como a gente vai tirar proveito disso? A maioria dos empregos por serem específicos – a indústria do petróleo é uma indústria extremamente específica – a maioria das empresas ficam sujeitas a condições internacionais. Você sabe que do seu pessoal nem todo mundo você consegue aproveitar, por causa de condições de ensino e tudo mais. Não queria – e isso foi uma decisão do seminário – que o nosso pessoal fosse usado apenas como caseiros. Isso não é desenvolvimento, nunca foi. Desenvolvimento – vejo desenvolvimento como desenvolvimento sustentável – todo mundo tem que lucrar, o meio ambiente e tudo mais. O dito resort que seria construído que era um empreendimento imobiliário, na realidade, o interesse dele era atrair o pessoal de nível mais alto do complexo, para morar lá. “Estou te dando um lugar lindo, maravilhoso, sem poluição, entre a lagoa e o mar...” Ó que beleza Vende, não vende? De positivo, a primeira delas foi a reação do pessoal. Isso eu acho uma coisa extremamente positiva. A nossa briga para implantar algumas coisas. Com relação a Petrobras, espero que a Petrobras me ajude a criar outra decisão da assembléia, que é o centro de tecnologia operacional popular. São dois centros: um é de tecnologia operacional popular e o outro é voltado para pesquisa científica na área de restinga de lagoas, já que a gente tem essa condição. Exatamente na área que está degradada, se ali não vou ter muita recuperação tem como implantar os dois centros. É uma coisa que a gente espera. Se vai conseguir ou não, não sei. O que eu digo é o seguinte: com Petrobras ou sem Petrobras, os dois centros saem. Conheço Maricá desde os meus oito anos. Quando a gente ia para lá de início, era muito diferente. Eu pescava camarão na lagoa. Já viu isso? A lagoa dava um camarão que só tinha lá. Não existia em outro lugar no mundo não. Só tomei consciência disso porque sempre falava: “O camarão daqui é mais gostoso.” (risos) O pai dizia: “Porque era fresco.” Não Nós íamos para Angra e o camarão de Maricá era mais gostoso (risos). Era um tipo de camarão que tinha lá. Deve ter sido na mutação que foi sofrendo nesses milhares de anos. Não era o que dava no mar, era o que dava dentro da lagoa. Espero que a gente encontre uma familiazinha perdida lá para a gente recuperar. Só não falei muito sobre as benesses. Mas eu não vejo muita. Até a própria estruturação não tem como. Estamos especializando um grupo em montagem de programas culturais, por incrível que pareça. Estamos com projeto de um centro de esporte com uma escolinha de futebol, depois escolinha de tênis, um centro esportivo. Não daqueles grandiosos, pé no chão, para a gente começar trabalhar as comunidades pobres. O esporte ainda é uma das coisas que mais faz as pessoas se desenvolverem, trabalhar as necessidades. Alguns eventos culturais que a gente vai continuar investindo. O Fórum Social Mundial virou parceiro nosso. Existe uma carta de 2008; da sessão que nós fizemos lá saiu a carta de Maricá. Vários itens da Carta de Maricá foram incluídos na carta do Fórum Social Mundial. Isso foi discutido lá, no meio do povo, o que seria e o que não seria incluído. Tem decisões que saíram de lá, estão para o mundo, se você mostrar ao povo como é, eles fazem. Não tenho dúvida disso. É muito simples. Mas você tem que baixar o teu nível. Comentei contigo quando você me entrevistou lá fora: “O que você é?” Eu disse: “Não gosto de falar disso.” (risos). Eu tive que afogar o Engenheiro. Isso não significa nada. Aprendi com pescadores. Tem uma cena que foi o ponto crucial para a decisão do centro de tecnologia. Eles sabiam que eu gostava de pescar, os pescadores lá na colônia: “Você tem que vir aqui um dia pescar com a gente.” “A idéia é boa.” “Venha na quinta-feira porque Fulano é o melhor pescador de galho.” Pescador de galho? Se eu digo para os caras que sou pescador e não sei o que é pescador de galho, como é que eu fico? Foram seis meses para descobrir o que era pesca de galho. Coisa mais ridícula (risos). É tecnologia básica aplicada. Por incrível que pareça. O sistema lagunar inundava com as chuvas, de seis em seis meses inundava, vazava por cima do cordão de areia; 20 dias depois fechava o canal e a laguna voltava ao nível normal e enchia. Nesse período que ela enchia, acredito que nossos primos tupis descobriram que algumas árvores não sofriam efeito nenhum; ficavam debaixo da água seis meses sem problema nenhum. E pior ainda devem ter descoberto algumas outras que, além de não sofrerem efeito nenhum, ainda juntavam um monte de peixes em volta delas. Eles passaram isso para os caiçaras, para os pescadores atuais. Tem algumas árvores que eles usam galhos, colocam espetas desses galhos no fundo da lagoa, nas partes não muito fundas. Depois vão para lá pescar. Agora a historia toda: essas árvores além de não sofrerem danos, eles descobriram o que? Existem lugares que você pode botar, dentro da laguna existem rias, você não pode colocar dentro de uma ria, você tem que colocar sempre nas beiradas, de preferência nos cruzamentos, número um. Número dois, esses galhos produzem uma enzima que é o alimento ideal de um moluscozinho deste tamanhinho que é o pitéu de uns peixinhos quase barrigudinhos que é o pitéu para a lagoa inteira (risos). Quando você espeta aquele galho ali, na hora que o galho se protegendo tentando sobreviver produz a enzima, ele vai junto e faz um shopping center de peixes. Você chega lá e escolhe o que quer. É só isso. É tecnologia, querendo ou não. Juntando todas as outras coisas que vi, surgiu a idéia do centro de tecnologia operacional popular. Não existe tecnologia de ponta sem haver tecnologia básica. Se a gente juntar todas as informações que a gente tem nesse país, e são muitas, a gente sai na frente de um monte de coisa. Pode mudar a cara do país. Lá, a gente tem um povo que às vezes briga para caramba, mas que conseguem ver as coisas com facilidade. Teve um caso de um cara que era radicalmente a favor do dito resort na restinga porque ia trazer emprego, e tremeu quando eu disse: “Negão, eles estão falando em 40 mil empregos. Deixa eu te dar uns dados: internacionalmente, para cada cinco apartamentos de hotel, eu crio um cargo de hotel. Se eles estão dizendo que vão gerar 40 mil empregos, eles estão te dizendo que vão gerar um hotel com 200 mil apartamentos. Você já viu alguma coisa assim? Isto não é hotel.” “É.” “Você acha que tem gente pra suprir um hotel de 200 mil apartamentos? Você acha que tem condição? Você acha que é só um hotel?” “É, não pode, né?” Comecei a fazer outras perguntas, essas perguntas lógicas. O cara ficou me olhando, e disse: “Pô, você me deixou numa encruzilhada.” “Ah, por quê?” “Eu era 100% a favor, mas agora eu to achando que tem maracutaia na história.” (risos) Se eu comentei contigo que quero implantar dois centros de pesquisa, você imagina para mim como é importante a memória. Essa iniciativa para mim é importantíssima, muito mesmo. Existe um trabalho da Maria Chiavatta na UFF [Universidade Federal Fluminense] que também é extremamente bom. A gente tem que pensar nisso. É identidade. Nós temos um problema de identidade. A gente nunca repara no nosso umbigo. Isso é um hábito brasileiro. Talvez por causa do processo que foi a nossa colonização. No Brasil, a maioria das pessoas não vinha para ficar, vinha para enricar e voltar. Ainda escuto muito por aí: “Ah, o que é bom vem lá de fora.” Esse lá de fora você bota 500 endereços. É muito difícil a gente ver um brasileiro com orgulho de ser brasileiro. Essa é a briga maior. A gente mostrar para o povo: “Vocês tem direito de fazer, pode fazer, tem como.” A memória é importante por isso. Sem memória a gente não vai viver. Sem memória, a gente esqueceu muita coisa que foi feita nesse país, muita coisa mesmo. Eu lembro que das bíblias da família, nos livros escritos a mão, tem muita coisa da história da minha família que está há 400 anos no Brasil que você não vê em lugar nenhum. Eu fui descobrir porque tinha termos que eu usava que as pessoas achavam estranho.
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