Meu nome é Isabel Cristina Rodrigues de Macedo Araújo Cunha, mas eu sou conhecida como Isabel Macedo. Eu nasci no Rio de Janeiro, em quatro de setembro de 1973.
Sou bióloga; fiz a licenciatura e, depois, o bacharelado, em curso de extensão. Eu me formei em 2000. Na minha formatura, eu fazia esse curso de extensão. Durante a faculdade, eu trabalhei com desenvolvimento ambiental. Trabalhava também com as comunidades, em torno de unidades de conservação. Mas a minha grande paixão era a fauna, a preservação ambiental diretamente ligada à fauna. Eu fui pra Universidade Rural do Rio de Janeiro, porque queria tentar alcançar esse objetivo, queria fazer mestrado em biologia animal. Acabou que o mestrado ainda não aconteceu. Eu fiquei como ouvinte desse curso de biologia animal, que, como tiveram muitas horas-aula, acabou contando como extensão. A Roda Viva tem um histórico bastante interessante. Trabalha com a educação da juventude para a cidadania. É uma ONG com quase 20 anos de mercado. Ao longo do tempo, eles perceberam a necessidade de aliar isso com o desenvolvimento sustentável e começaram a investir na área ambiental, com projetos que levassem a sustentabilidade, além da questão educacional. Como sou bióloga e tenho experiência nesse campo de comunidade, com unidade de conservação, de sustentabilidade, fui chamada pra trabalhar com a Agenda 21, de Itaboraí. Nós, da Roda Viva, já fazíamos um processo de Agenda 21, em Itaboraí, antes da chegada da notícia do Comperj [Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro]. Itaboraí é um dos municípios que já tinha Agenda anteriormente. A Roda Viva surgiu há 20 anos, formada especificamente por professores que trabalhavam com comunidades carentes. Até hoje existem, na organização, projetos com desenvolvimento comunitário e formação profissional para crianças e jovens. Trabalha também em defesa dos direitos da criança. Mas eu não atuei especificamente nessa área da Roda Viva....
Continuar leituraMeu nome é Isabel Cristina Rodrigues de Macedo Araújo Cunha, mas eu sou conhecida como Isabel Macedo. Eu nasci no Rio de Janeiro, em quatro de setembro de 1973.
Sou bióloga; fiz a licenciatura e, depois, o bacharelado, em curso de extensão. Eu me formei em 2000. Na minha formatura, eu fazia esse curso de extensão. Durante a faculdade, eu trabalhei com desenvolvimento ambiental. Trabalhava também com as comunidades, em torno de unidades de conservação. Mas a minha grande paixão era a fauna, a preservação ambiental diretamente ligada à fauna. Eu fui pra Universidade Rural do Rio de Janeiro, porque queria tentar alcançar esse objetivo, queria fazer mestrado em biologia animal. Acabou que o mestrado ainda não aconteceu. Eu fiquei como ouvinte desse curso de biologia animal, que, como tiveram muitas horas-aula, acabou contando como extensão. A Roda Viva tem um histórico bastante interessante. Trabalha com a educação da juventude para a cidadania. É uma ONG com quase 20 anos de mercado. Ao longo do tempo, eles perceberam a necessidade de aliar isso com o desenvolvimento sustentável e começaram a investir na área ambiental, com projetos que levassem a sustentabilidade, além da questão educacional. Como sou bióloga e tenho experiência nesse campo de comunidade, com unidade de conservação, de sustentabilidade, fui chamada pra trabalhar com a Agenda 21, de Itaboraí. Nós, da Roda Viva, já fazíamos um processo de Agenda 21, em Itaboraí, antes da chegada da notícia do Comperj [Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro]. Itaboraí é um dos municípios que já tinha Agenda anteriormente. A Roda Viva surgiu há 20 anos, formada especificamente por professores que trabalhavam com comunidades carentes. Até hoje existem, na organização, projetos com desenvolvimento comunitário e formação profissional para crianças e jovens. Trabalha também em defesa dos direitos da criança. Mas eu não atuei especificamente nessa área da Roda Viva. Conheço um pouco desse trabalho, mas eu trabalhava na área de meio-ambiente. Em 1992, a Roda Viva já tinha espaço nessas questões ambientais. A atuação dela começou com a juventude, mas a aliança com o meio-ambiente e desenvolvimento sustentável não demorou muito tempo pra acontecer. Eu conheci o trabalho da Roda Viva um pouco depois da sua fundação, mas passei a ter vínculo empregatício só a partir de 2006, com a Agenda 21 de Itaboraí. Eu entrei como assistente da coordenação, em um projeto com recurso do Fundo Nacional de Meio-ambiente. Nós tínhamos dois anos pra implementar a Agenda 21. A equipe era pequena, formada pelo coordenador e eu, a assistente. O nosso papel era fomentar, mobilizar a população e explicar o que é a Agenda 21. A maioria das pessoas não conhece, embora ela tenha sido amplamente difundida pela Eco 92. Nosso primeiro passo era mobilizar. A gente usava a metodologia do Ministério do Meio-ambiente, que conta com seis passos: mobilizar, sensibilizar etc. Fazíamos isso com reuniões, às vezes, semanais. [A periodicidade da reunião] dependia da ocasião e da necessidade, dependia do nível de mobilização e do apoio da Prefeitura. No Brasil, os processos participativos ainda estão se iniciando, porque a gente não tem uma cultura de participação. São raros os governos que realmente apóiam que a população se expresse e diga o que deseja, que participe do orçamento e das decisões das políticas públicas. A Agenda 21, além de ser pouco conhecida, mesmo dentro de algumas prefeituras, ainda não é muito reconhecida como um instrumento e, às vezes, pode parecer uma ameaça. Para que um município participasse da licitação do Ministério para implementação da Agenda 21, tínhamos como exigência a existência de uma lei, porque a Agenda 21 se fortalece e se institui através de uma lei. Exigíamos também que o município tivesse um forte apelo cultural histórico. Ficamos nesse processo até iniciar a Agenda 21 Comperj. Eu e a equipe do Roda Viva participamos do processo de transição, inclusive explicando para as pessoas que a idéia não era um novo processo de Agenda 21, mas a continuação do que já existia. A Petrobras abriu uma licitação pública, com todos os conformes, [para seleção das ONG’s executoras]. Se eu não me engano, foram três instituições inscritas. Nem todas atendiam aos critérios. Um dos critérios era ter experiência em Agenda 21. Não era o meu papel negociar dentro dessa licitação. Eu estava ali como técnica. Se nós fôssemos escolhidos, eu teria o trabalho. O Roda Viva foi pré-selecionado, juntamente com outras três instituições que participaram do processo. Em agosto de 2007, aconteciam as caravanas Comperj. Eu estava acompanhando e ainda não sabia que iria trabalhar no processo Comperj, eu nem sabia que a gente iria participar fortemente da licitação. O gerente tinha dito: “Talvez tenha um contrato pra Agenda 21 Comperj, para fazer os 15 municípios do Comperj”. Mas eu ainda nem sabia. Eu trabalhava para a Agenda 21 Itaboraí. Recebemos um convite, como fórum [local], para uma reunião com todos os representantes. Em Itaboraí, já havia instituída uma comissão pré-fórum, com todos os representantes. Recebemos um convite pra participar de um evento, numa grande área chamada Vera Gol, em Itaboraí. Mas não sabíamos para o que era a reunião. Isso causou uma ansiedade para aqueles que já participavam: “O que pode ser isso? O que é que a Petrobras quer? Como é que a gente recebe o convite assim sem nem saber o que é? Não falaram nada com a gente”. Como no convite dizia que seriam escolhidos representantes, acho que um de cada setor, nós nos organizamos para ir. Nós nos organizamos e tiramos dentro da nossa comissão pré-fórum esses representantes, por uma aclamação. Na Agenda 21, não é usual o voto, que só é utilizado em último caso, se não houver outra forma para se resolver; normalmente, a gente aclama. A gente fazia uma lista e, depois, íamos aclamando os nomes que eles gostariam de ter. Como a gente não sabia o número de vagas, deixamos quatro por setor: quatro da associação de moradores e quatro do governo, caso fosse uma vaga ou duas, ia ser tudo por ordem. Eles [do fórum local da Agenda 21 Itaboraí] foram preparados para essa reunião, não instruídos, mas preparados para o que pudesse acontecer. A reunião era realmente para escolher os representantes que fariam parte de um fórum regional. A idéia, inclusive, é excelente, porque se trabalha com uma área de abrangência de 15 municípios. O fórum regional permite uma interlocução entre esses municípios e fortalece os processos dentro do município. Os municípios saberão das boas idéias que estarão acontecendo e poderão replicá-las. Esse é o papel desse fórum. Só que, naquele momento em especial, as pessoas não estavam preparadas pra isso. Foram convocadas pessoas de todos os municípios e muitas delas nem sabiam o que era Agenda 21, queriam ocupar o espaço de forma apenas política, para poder negociar diretamente com a Petrobras, na intenção de, talvez futuramente, arrumar um recurso. Eu não estou dizendo que as pessoas tivessem má fé, mas elas desconheciam o processo, não sabiam, inclusive, como funciona o repasse de verbas. Esse desconhecimento tumultuou um pouco. A escolha da representação não ocorreu no momento certo. Talvez agora fosse o momento certo, quando com as pessoas estão habilitadas a trabalhar com Agenda 21, estão um pouco mais íntimas do processo. Mesmo em Itaboraí, em que havíamos feito todo um trabalho, ainda faltava formação. Em Itaboraí, a gente chegou a um grupo organizado. A Agenda 21 foi amplamente difundida, foi um trabalho incrível. Nós rodávamos o município inteiro, tínhamos o apoio da prefeitura que, nesse processo, é a proponente junto a Roda Viva. A Roda Viva entrava com a capacitação, fazia o trabalho de mobilização e a prefeitura nos cedeu uma pessoa para trabalhar conosco – o Heleno, sub-secretário de meio-ambiente, um guerreiro e lutador. Apesar de todo esse trabalho, muitas pessoas ainda não participavam e não acreditavam, diziam: “Pra que? Eu tenho mais o que fazer, eu não vou participar.” ou então “Não tenho tempo”, “Isso não vai dar certo”. Mas, no momento da escolha dos representantes do fórum regional, essas pessoas que não haviam participado do processo apareceram, pra tentar se eleger e passar por cima de um processo formal de Agenda 21. Isso revoltou os participantes. Mesmo com a presença do Ministério, de representantes da Petrobras e com a gente tentando contemporizar, criou certo clima, inclusive aqueles de Itaboraí foram os responsáveis pela maior briga. Eles não queriam permitir que as vagas fossem ocupadas por pessoas que estavam fora desse processo e nem sabiam o que era Agenda 21. Nosso plano seria fazer a Agenda 21 de Itaboraí até a publicação. Nosso convênio com o Fundo era esse; tínhamos que publicar a Agenda. O Comperj chegou quando o nosso processo não estava terminado. Conseguimos nos encaixar. Os representantes da comissão pré-fórum da Agenda 21 são praticamente os mesmos eleitos para a Agenda 21 Comperj. Eu nem gosto desse termo, porque fica parecendo que é outra Agenda; não é outra, é a Agenda 21, só que fomentada por uma grande empresa que está fazendo um grande empreendimento na região. Houve uma união dessas agendas, uma união das propostas. Pelo o que eu pude ver nas reuniões que participei com a Petrobras, há um interesse deles em respeitar tudo o que já foi construído pelo município. O Roda Viva mantinha uma equipe de cinco pessoas: um coordenador setorial, responsável por todo o terceiro setor, responsável por fazer todos os contatos com a Petrobras e ver o andamento do projeto; um coordenador regional, responsável pelos 15 municípios; e três coordenadores, cada um responsável pela coordenação de cinco municípios. Seguindo o mapa dá pra se ver o desenho dessa coordenação. Eu fiquei com os municípios de Rio de Janeiro, Niterói, São Gonçalo, Itaboraí e Tanguá. Era minha responsabilidade mobilizar, trazer as pessoas pra reunião, explicar todo o processo e metodologia, falar sobre a Agenda 21, sobre a importância de participação, e explicar a divisão por setor. Foram feitas reuniões mensais e locais. A Roda Viva ficou responsável pelo terceiro setor. Procurávamos as instituições locais, dentre elas ONG’s, sindicatos, igrejas, clubes de serviço e todas as instituições sem fins lucrativos. Pedíamos um espaço pra fazer uma reunião, que não precisava necessariamente ser do terceiro setor. Em Niterói, por exemplo, eu fiz várias reuniões na prefeitura, que tinha um auditório legal e bem central. Niterói é grande, tem um aspecto parecido com o Rio de Janeiro, então era mais fácil levar as pessoas para o centro da cidade. Geralmente, nos outros municípios, a gente fazia as reuniões na igreja, ou em uma ONG. Em São Gonçalo, a gente fez praticamente todas as reuniões no Movimento de Mulheres, uma ONG muito interessante e atuante, e no Guardiões do Mar, outra ONG super atuante. O terceiro setor sempre pede capacitação, para colocar a população dentro de um mercado de trabalho. Essa é a fotografia mais clara do que eu tenho no terceiro setor. O que eu pude perceber é que todos os setores têm demandas muito parecidas. Agrada-me a separação por setores, mas quando se olha o trabalho pronto de cada um deles, se vê que todos são munícipes, portanto seus medos e preocupações muito parecidos. Todo mundo quer: saneamento, habitação, casa pra morar, emprego, capacitação. Do que adianta ter um grande empreendimento se a gente tiver que buscar toda a mão de obra fora do Estado. Essa região, especialmente, não está preparada pra atender a demanda de um complexo como esse, muito menos de todas as empresas de segunda e terceira gerações que virão junto do complexo. O grande jogo é pensar além do Comperj, pensar em tudo o que ele vai atrair pra dentro dos municípios. Esse projeto teve três fases fortes. Começou com a fase de mobilização. Fizemos reuniões setoriais. Cada ONG correu no seu pedaço, tentando trazer as pessoas pra dentro do processo. Trabalhamos com uma metodologia apresentada pela Petrobras, em parceria com o Ministério [do Meio Ambiente] e com o CEA [Centro de Educação Ambiental]. De acordo com essa metodologia, mantínhamos um fichário grande, com 40 vetores qualitativos. O que são vetores qualitativos? Pegaram a Agenda 21 global e tentaram traduzir pra um texto adequado pra gente usar: os 40 capítulos da Agenda 21 global. No primeiro capítulo, nós tínhamos uma seqüência de estágios. No estágio número um, o município não tem secretaria de meio ambiente, não tem quase nada. No segundo [estágio] já tem a secretaria, mas ainda enfrenta alguns problemas, não está totalmente institucionalizada, não tem gente suficiente trabalhando. Ou seja, o processo está ainda devagar. No terceiro [estágio], o município já tem [as instituições], funciona, é atuante, fiscaliza, mas ainda não dá conta do recado. No quarto [estágio], que raramente a gente conseguia encontrar com essa característica, o município tem [as instituições], funciona maravilhosamente bem, fiscaliza tudo e é atuante. Nós levávamos esse material, com os 40 vetores, e líamos junto com um grupo. Eles chegavam a um consenso de qual estágio se encontravam. Esse foi o diagnóstico. As pessoas têm percepção do local onde vivem. A idéia era conseguir percepção das pessoas enquanto moradoras do local. Isso [servia] também para o terceiro setor, porque se eu sou ONG e trabalho com certa população, tenho que ter um olhar para saber como ela se encontra. Nós fizemos isso. [Tudo isso] é ainda a primeira fase. Depois dessa fase de diagnóstico, tivemos também a fase do plano de ação. Nós tínhamos que estimulá-los a pensar nas grandes preocupações em vista da chegada do Comperj. [De pensar, por exemplo:] “Eu não tenho a secretaria, eu estou no estágio um. A secretaria não funciona e está chegando um empreendimento que tem todo um aspecto positivo, em termos de geração de renda, mas que vai gerar um impacto ambiental grande. Não tem outro jeito. O que me preocupa?” O papel deles era listar preocupações, por capítulo, além de escolher o estágio em que o município estava. Nem tudo na vida são preocupações. Então, de repente, o meu município tem água em abundância, o que é útil pra atrair empresas que necessitam de água pra funcionar: é uma potencialidade. Com esse material na mão, a gente partiu pra segunda etapa que era o plano de ação. Se eu tenho uma preocupação, eu posso pensar numa solução. É bem a cara da Agenda 21, que não é um espaço pra reclamar, mas um espaço pra propor: “Eu me preocupo com a degradação ambiental que vai acontecer no meu município, com a chegada desse empreendimento e das outras empresas. O que eu posso fazer pra diminuir esse impacto? Posso aumentar o rigor da fiscalização, propor uma legislação eficiente que impeça ou que obrigue a empresa a reparar qualquer dano.” Todas essas preocupações se transformaram em ações, que podem ser mínimas, pontuais, ou podem ser políticas públicas de longo prazo. Os fóruns [locais] criados [nos municípios] ainda estão se adaptando, não partiram pra execução dos planos. Estamos ainda na fase de término. Acabamos de montar e há um compromisso da Petrobras com a publicação dessas 15 Agendas para, a partir daí, [os fóruns] começarem a trabalhar. Tem algumas ações mínimas que já estão acontecendo. Os [fóruns] fizeram regimentos internos. Elaboraram a lei, para os casos de municípios que ainda não a possuíam, ou adaptaram a lei já existente para o formato do Comperj, de quatro setores. Eles estão se movimentando, se reunindo, participando de outros eventos, procurando esclarecimentos a cerca de tudo que vai acontecer nessa região com a vinda do empreendimento. Essa não deixa de ser uma ação. Foi uma surpresa ver os quatro setores se reunirem. Achávamos que pudessem surgir pendências, porque o primeiro setor tinha uma postura, que é comum, inclusive, de olhar o vetor e achar que aquilo é um teste, uma avaliação para o desempenho da prefeitura: “Poxa, se eu coloco aqui que estamos no estágio um, estou falando mal do meu governo, estou falando mal do meu papel, porque eu sou secretário de meio-ambiente. Vou dizer que está legal.” Enquanto o segundo setor e a comunidade tinham um olhar mais real sobre aquilo, o primeiro setor tentava colocar pra cima. Tinha uma discrepância entre eles. Ao longo do processo, isso foi mudando, quando se deu conta que aquilo não era um teste: “Isso aqui é pra ver como a gente vai fazer”. O primeiro setor foi se alinhando com os outros. Depois de quase um ano de reuniões, quando a gente sentou e colocou todo mundo junto, não surgiu nenhum tipo de dissensão. As pessoas discutiram, brigaram por sua posição, mas sempre chegaram a um entendimento de que aquilo é um plano municipal e, portanto, vale o esforço pra fazer dar certo. O primeiro setor sentou, ouviu a comunidade, que é o maior termômetro para o que está acontecendo, porque mora no lugar, sabe o que tem e o que não tem. O cara da prefeitura também mora [no município], mas tem um pouco de medo de se colocar no papel de avaliador do próprio trabalho. Eles trabalharam em conjunto pra fortalecer o nosso plano de ação. Foi bem interessante, uma experiência muito rica. Mediar essas mesas, conversar com as pessoas, ouvir o que elas tinham a dizer e perceber o empenho delas em fazer dar certo. O empenho foi das pessoas. Nós trabalhamos muito, mas aquelas pessoas trabalharam muito mais, porque tinham uma outra motivação: lutavam pela própria terra, pra fazer alguma coisa funcionar. A gente sabe muito bem que o fato da Petrobras ser a proponente de um projeto como esse abriu muitas portas. A Agenda 21 tem uma cara de terceiro setor e dentro desse projeto existe terceiro setor e comunidade. O terceiro setor é composto também pela comunidade, pelas associações de moradores. Nesse processo é que houve essa diferenciação, que eu acho foi muito legal, porque aumentou o número de vagas, dividiu de uma maneira consciente, abriu espaço pra comunidade ter um número maior de representantes. Dentro desse processo eu pude ver a vantagem de se separar, porque um cara que integra uma associação de moradores vai ter demandas diferentes de uma ONG, diferente da Igreja e do sindicato. Isso abriu um espaço maior para as comunidades. A gente sabe perfeitamente que, historicamente falando, o terceiro setor é que faz a Agenda 21: batalha por ela, dá palestras, capacita. É sempre mais fácil mobilizar o terceiro setor do que os outros. Quem é que compra a idéia de desenvolvimento participativo? É a comunidade. Não são as ONG’s que estão preocupadas realmente em dar voz para os seus assistidos e pares? Então, historicamente falando, é um setor mais presente. Nós tivemos muitos desafios. Fizemos uma Agenda 21 no espaço de um ano e meio. Trabalhamos questões complexas, com um tempo muito apertado. Esse foi um desafio gigante: o pouco tempo. As pessoas saem diferentes desse processo, mas não saem prontas. O projeto é muito válido e ainda tem muitas dificuldades a encarar. Às vezes, eles não conseguem nem conduzir uma reunião com uma pauta que tinha sido proposta, porque ainda têm muitas dúvidas. Naquele [encontro] do hotel fazenda, em Rio Bonito, a gente transformou quatro diagnósticos por setor e quatro planos de ações em uma coisa só. Tínhamos tido uma primeira etapa toda setorial e outra etapa para reunir os quatro setores, onde consolidamos todo o trabalho. Levamos todos os representantes para esse hotel e, em dois dias e meio, consolidamos o resultado de todos os setores. Tivemos diversas reuniões com a Petrobras e ela tem uma característica que eu considero interessante: acompanha de perto o que está acontecendo. Nós contávamos com a presença do Ricardo, da Petrobras, o tempo inteiro; ele esteve conosco na fase Rio Bonito, onde participou da constituição da metodologia e contribui como mediador, visto que nós estávamos praticamente presos [em outras atividades]. Ele era o representante da Petrobras para caso surgisse alguma demanda. Eu consideraria excelente também a nossa relação com o Ministério [do Meio Ambiente]. Tanto o Ministério quanto a Secretaria [do Meio Ambiente] participaram ativamente desse processo, com pessoas atuantes na Agenda 21. A gente começou a fazer a Agenda 21, em Itaboraí, com aquele olhar de cidade dormitório, de injeção de ânimo para o crescimento. A idéia de quem trabalha com o terceiro setor é essa: “Vamos ajudar a desenvolver quem precisa, vamos escolher, entre as cidades, aquelas que mais precisam”. Itaboraí era uma delas. Escolhemos Itaboraí porque ela já tinha a lei aprovada. Itaboraí é cidade pequena, do interior, como informam os jornais. [Quando chegou o projeto do Comperj], eu falei: “Tem que mudar tudo. Essa Agenda 21 deve ter outro olhar. Virá gente de tudo quanto é lugar pra cá”. Eu e todo mundo que estava participando do processo teve esse choque. Teve o grupo dos que recusaram: “Não, nós não queremos.” E teve o grupo dos que apoiaram: “Queremos sim, porque a gente precisa de renda. O município está acabando”. Foi uma corrida. Foi bom em termos de crescimento profissional. Mas foi igualmente difícil lidar com a população, que surtou. Tinha gente que já queria arranjar um emprego na Petrobras. Tínhamos um grupo compromisso com a Agenda 21. No momento em que surgiu essa oportunidade do Comperj, o grupo rapidamente sofreu um inchaço. As pessoas quiseram saber o que era. Começou a suspeita de que nós, do Roda Viva, tivéssemos meio que preparado o terreno pra chegada do Comperj. Isso não existiu em momento nenhum, foram momentos distintos. A licitação da Agenda 21 de Itaboraí aconteceu em 2005; não sei se a Petrobras já pensava no Comperj, ao menos o público não sabia e eu muito menos. Tiveram algumas brigas. O fórum pegou fogo. Até então, não fazíamos reunião semanal. [Após a notícia do Comperj,] passamos a fazer até três reuniões por semana, para poder esclarecer. Muitas pessoas queriam saber se eu tinha informações do que aconteceria. Chegou uma equipe da Petrobras, pra fazer os estudos técnicos e para falar com as pessoas. Eu acho que isso é de praxe da empresa, quando vai colocar um empreendimento. Esse representante [da Petrobras] também ficou com receio da gente, porque buscamos a Petrobras pra fazer o contato. Ele achou que a gente tinha pedido alguma coisa. Ele se esquivou. Em uma reunião, ele chegou a falar pra gente: “Eu vim aqui pra dizer que não estou” Isso irritou um pouquinho. Mas foi só nesse momento inicial, quando ninguém sabia exatamente o que aconteceria. Foi feito o diagnóstico e o plano de ação setorial. Na última reunião, tínhamos a incumbência de definir, com esses participantes, os representantes. As reuniões contavam com cerca 30 pessoas e precisava tirar sete representações, sendo cinco titulares e dois suplentes. Alguns critérios foram definidos e adotados, pelos próprios participantes. O representante deveria participar de todas as reuniões, ter disponibilidade de tempo e interesse no assunto da Agenda 21, ou seja, para ser escolhido, o cara deveria representar de fato o setor em que estava. Mais uma coisa era necessária: o cara vai representar, mas não pode se esquecer das pessoas que ficaram. Se eu sou escolhida pra representar, tenho a obrigação de passar, para os outros, tudo o que está acontecendo dentro do processo da Agenda 21. Esses foram os critérios adotados. Foram eleitos sete representantes, sendo cinco titulares e dois suplentes, pra cada setor, num total de 28 representantes por município. O papel desses representantes seria exatamente esse: quando os quatro setores se reunissem, eles estariam lá pra consolidar o plano de ação. Vai ter uma mudança no perfil da região. A gente tem um Estado com muito destaque para [a cidade do] Rio de Janeiro. Niterói e outras áreas têm empreendimentos grandes, mas o destaque realmente é para o Rio de Janeiro. Com um empreendimento desse porte, a gente dá uma visibilidade, acende uma luz pra essa região que vinha num decréscimo na geração de renda e no emprego. A maior reclamação das pessoas é que não conseguem emprego dentro do seu município, precisando fazer grandes deslocamentos [para trabalhar]. Eu acredito que ocorrerá uma explosão demográfica, porque o canteiro de obras atrai e não é só o Rio de Janeiro que tem dificuldade de trabalho, o Brasil inteiro passa por isso. Tem uma estatística não oficial, em Itaboraí, que [aponta] desembarque diário de pelo menos 100 pessoas. Embora isso ainda não seja oficial, é uma coisa que a prefeitura está analisando. Existem impactos ambientais, existe a questão da proximidade do empreendimento com áreas de proteção ambiental, como o manguezal de Itaboraí e a Baía de Guanabara. Mas é a primeira vez que eu vejo um empreendimento tentar abrir um canal de comunicação com a população. O fato da Petrobras ser uma grande empresa de energia espalhada pelo mundo faz com que ela deva manter sua boa imagem diante do mundo. Pelo o que eu soube, o empreendimento conta com uma tecnologia de ponta que procura ser cada vez mais limpa. Ainda assim tem um impacto grande, até pelo consumo de água. Alguns municípios estão com medo de ficar sem água. Cachoeira de Macacu é um deles. Contudo, de qualquer maneira, ele é inovador. Pela primeira vez alguém vem discutir, antes de passar com o trator por cima, e pergunta: “O que a gente pode fazer? Como a gente pode pensar isso junto?”. O futuro é um pouquinho incerto. Teremos uma mudança de governo, ano que vem. Isso causa certo impacto nesses nossos processos participativos. Eu ainda não tive notícias de como vai ser o fomento desses fóruns, a partir de agora. Eles ainda precisam de muita coisa, precisam de suporte. Eu acho que a Petrobras pode emprestar o seu peso político, afinal ela é uma empresa de grande porte. Ela pode escolher os parceiros com quem vai trabalhar. Nossos parceiros terão que investir nas propostas feitas pelos próprios municípios, diante de seus representantes legitimados pelo fórum. Eu tenho muito otimismo. Se isso acontecer, o Estado do Rio de Janeiro vai ficar diferente. A gente tem a lucrar como cidadãos. Eu quis esse empreendimento aqui no Estado. Isso foi uma luta que aconteceu. Algumas pessoas me perguntaram: “Como é que você, ambientalista, quer trazer um negócio desses pra cá?” Eu falei: “Eu sou ambientalista sim, mas a gente tem que pensar em solução e tem que trazer a renda, tem que ter empregos, o estado tem que crescer.” Eu tenho 35 anos e passei a maior parte desse tempo vendo o estado inteiro minguar, inclusive o município do Rio de Janeiro. Isso se deu por falta de um grande investimento; o que a gente já tinha foi embora aos poucos, mudou pra outros estados. De repente, recebemos um empreendimento que vai abrir uma frente produtiva muita grande, não exatamente o Complexo, mas toda a rede de serviços que ele vai puxar pra essa região. Se tiver um investimento racional em cima dessas propostas municipais, eu verei um futuro legal. Mas depende disso. MILITÂNCIA A luta vale a pena. Eu tenho uma filha e tenho que fazer alguma coisa para que o seu mundo seja melhor do que o meu. É trabalho de formiguinha. É cansativo. De vez em quando, desanima. Não vou dizer que nunca aconteceu de eu acordar com vontade de continuar na cama. Aconteceu sim. Às vezes, a gente encontra uma porta fechada. Às vezes, temos um trabalho lindo acontecendo, mas é vetado exatamente por mudança de governo. Ainda temos poderosos no Brasil e alguns deles temem a participação. A gente vai à luta e alguma hora vai acabar dando certo. Não pode desistir. Pode parecer piegas, mas é verdade: não pode desistir, tem que continuar. Eu gostei [de participar]. Eu me senti muito mais à vontade do que imaginava ficar. Eu não lido muito bem com a câmera. Gosto de falar, mas não necessariamente diante da câmera. [Esse programa] é importante em termos institucionais, tem que mostrar o que está sendo feito. Tem uma parcela grande da população que ainda não sabe e precisam saber. Isso deve ser divulgado. Quando a notícia chega, elas se interessam, procuram saber mais informação e se agregam ao processo. Isso não precisa vir através da Petrobras, podem ter outros proponentes. Um bom programa não precisa ser eternamente financiado pela mesma empresa ou pelo mesmo governo. Pode ser um processo pra outros.
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