P/1 – Oi Carla, Boa tarde!
R – Boa tarde!
P/1 – Gostaria de começar pedindo que você me diga o seu nome completo, local e data de nascimento.
R – Meu nome é Carla Regina Santos Lima, nasci em Niterói, Rio de Janeiro. O que é que você quer mais?
P/1 – Data?
R – 3 de junho de 1983.
P/1 – Acabou de fazer aniversário?
R – É.
P/1 – Carla me diga também, assim, como é que foi sua formação? Qual foi a sua escolha? O que é que você escolheu? O que você cursou?
R – Eu tinha uma ideia, que eu não sabia muito bem de onde tinha vindo de que eu seria jornalista, um dia eu acordei com isso na cabeça e achava que seria o que eu faria.
P/1 – Com quantos anos?
R – No segundo grau. Aí, tinha um projeto do Jornal O Globo, não sei se ainda existe, repórter do futuro, e a minha escola foi selecionada para fazer parte desse projeto e eu entrei nele.
P/1 – Qual era a sua escola?
R – Era Instituto São José em Niterói, um colégio católico. Foi bom porque eu descobri que eu detestava aquilo, porque eu participei e achei um saco, aí, eu falei não quero isso não. Mas, aí, eu fiquei sem saber o que eu ia fazer, mas eu ainda não estava preocupada com isso. Um dia eu comecei a me preocupar com o vestibular e peguei um caderno da Unicamp que vinha as descrições de todas as disciplinas, todas as graduações que eles tinham, e tinha Ciências Sociais, que eu nunca tinha ouvido falar, nunca tinha estudado, visto, e nem conhecia nenhuma pessoa formada nisso, mas eu não sei porquê, e é estranho porque eu nunca sei por que eu faço as coisas mas eu faço, eu terminei me escrevendo nisso, li, gostei, quando fiz os meus vestibulares eu me inscrevi para esse curso e terminei gostando, e fiquei, me formei. Estudei na UERJ.
P/1 – Não tinha nada haver com a profissão de alguma amiga sua? Qual profissão dos seus pais?
R – Meu...
Continuar leituraP/1 – Oi Carla, Boa tarde!
R – Boa tarde!
P/1 – Gostaria de começar pedindo que você me diga o seu nome completo, local e data de nascimento.
R – Meu nome é Carla Regina Santos Lima, nasci em Niterói, Rio de Janeiro. O que é que você quer mais?
P/1 – Data?
R – 3 de junho de 1983.
P/1 – Acabou de fazer aniversário?
R – É.
P/1 – Carla me diga também, assim, como é que foi sua formação? Qual foi a sua escolha? O que é que você escolheu? O que você cursou?
R – Eu tinha uma ideia, que eu não sabia muito bem de onde tinha vindo de que eu seria jornalista, um dia eu acordei com isso na cabeça e achava que seria o que eu faria.
P/1 – Com quantos anos?
R – No segundo grau. Aí, tinha um projeto do Jornal O Globo, não sei se ainda existe, repórter do futuro, e a minha escola foi selecionada para fazer parte desse projeto e eu entrei nele.
P/1 – Qual era a sua escola?
R – Era Instituto São José em Niterói, um colégio católico. Foi bom porque eu descobri que eu detestava aquilo, porque eu participei e achei um saco, aí, eu falei não quero isso não. Mas, aí, eu fiquei sem saber o que eu ia fazer, mas eu ainda não estava preocupada com isso. Um dia eu comecei a me preocupar com o vestibular e peguei um caderno da Unicamp que vinha as descrições de todas as disciplinas, todas as graduações que eles tinham, e tinha Ciências Sociais, que eu nunca tinha ouvido falar, nunca tinha estudado, visto, e nem conhecia nenhuma pessoa formada nisso, mas eu não sei porquê, e é estranho porque eu nunca sei por que eu faço as coisas mas eu faço, eu terminei me escrevendo nisso, li, gostei, quando fiz os meus vestibulares eu me inscrevi para esse curso e terminei gostando, e fiquei, me formei. Estudei na UERJ.
P/1 – Não tinha nada haver com a profissão de alguma amiga sua? Qual profissão dos seus pais?
R – Meu pai é advogado e contador.
P/1 – Nome dele?
R – Delusio Gomes de Lima. E a minha mãe é professora.
P/1 – Nome dela?
R – Sônia Maria Santos Lima. E a minha família tem essas profissões bem triviais, que todo mundo já está bem acostumado, quase arroz com feijão. Advogado, professor, contador, aí, aparece uma louca que quer fazer uma alguma coisa que ninguém nunca tinha ouvido falar e nem ela mesmo sabia explicar, aí, você me pergunta por que eu escolhi, eu realmente não sei, acho que foi coisa de momento, eu olhei, gostei e resolvi fazer.
P/1 – Você gostava de estudar história na escola? As matérias eram mais ou menos assim? Você tinha pensado em jornalismo, português, história? Mais humanas?
R – Acho que tanto nesse caderno que eu li, que tinha sobre todas as profissões, eles evidenciavam quais eram as áreas de interesse, poderia induzir o aluno a tentar se candidatar a um curso desse, e lá indicavam que eram pessoas que gostavam de leitura, de falar, de expor ideias, tudo mais e eu achei que tinha alguma coisa haver comigo. Então, dentre todas as opções que incluía isso nas humanas, talvez essa tenha sido a mais sedutora para mim, então, eu terminei fazendo meio que no susto e eu acho que deu muito certo.
P/1 – E onde você cursou?
R – Na UERJ. Foi engraçado naquele ano, porque...
P/1 – Qual é o ano que você entrou?
R – Foi em 2002. Foi engraçado, porque eu morando em Niterói tendo a UFF ali ao lado e meus pais e todo mundo: mas porque você vai fazer na UERJ? Foi um ano que o vestibular complicou para caramba, porque tinha algumas escolas acho que as federais em greve, então, vários pais de alunos de escolas públicas federais embargaram os vestibulares das universidades federais, então, só o vestibular da UERJ não foi embargado, eu cheguei a fazer UFRJ e UFF, e aí, os vestibulares foram cancelados. Então, eu fui aprovada para a UERJ e comecei a estudar na UERJ, quando ainda ia ter a segunda chamada para os outros vestibulares. Então, como eu já estava na UERJ e logo no primeiro semestre eu me interessei por uma pesquisa de um professor, e fui fazer a pesquisa junto com ele voluntariamente, e os outros vestibulares ainda iam acontecer, eu terminei ficando na UERJ meio para susto de todo mundo, porque a UFF era aqui do lado, mas eu acho que, às vezes, as coisas dão errado, depois no fim você descobre porque elas estão entrando no rumo. Acho que ter estudado, ter optado pela UERJ, não só pela qualidade da formação, mas também por várias outras coisas ajudou muito a me deslocar um pouco do meu eixo de sempre, que era em Niterói. Eu terminei passando para a UFF, eu fiz a prova de teimosia, passei, mas eu permaneci na UERJ, mesmo a UFF sendo muito mais conveniente.
P/1 – Quando você chegou lá na faculdade o curso correspondeu ao que você tinha mais ou menos lido? O que você imaginou?
R – No primeiro semestre é um pouco difícil, eu não sei, talvez a empolgação de já estar no terceiro grau já fosse suficiente para eu achar que aquilo era muito bom, independente de qualquer opinião que eu pudesse ter sobre o curso, mas quando eu comecei a realizar a situação e ver que eu estava no curso me agradou bastante. Parecia que era uma coisa que tinha escolhido a mim e não o contrário, que eu a tinha escolhido, porque eu cheguei sem saber o que era demorei um tempo para entender, quando entendi, gostei.
P/1 – E qual foi essa pesquisa que você se engajou logo lá?
R – Foi de um professor no primeiro semestre, ele na sala de aula falou que ele tinha essa pesquisa.
P/1 – Sobre o quê?
R – Era estratificação social em Acari e numa época que Acari estava bem complicado, porque depois o bochicho todo foi para outros lugares, mas Acari naquela época tinha toque de recolher e tudo mais. E eu gostei da figura do professor, gostei da aula dele, gostei do jeito de expor dele, e sei lá porque, loucura, eu falei para ele que eu queria participar, ele convidou alguns alunos, mais ninguém, mas todo mundo estava começando, era uma pesquisa que você nunca tinha ouvido falar, eu falei: eu vou participar. Acho que um jeito meio vira-lata, de vê a porta aberta, entra para ver o que é que tem, sabe? Acho que eu sou meio assim. E aí, eu resolvi participar dessa pesquisa com ele, bati na porta da sala dele, eu falei: eu quero, e ele não tinha bolsa para oferecer, bolsa CNPQ essas coisa, eu falei: não, tudo bem fica só como jeito de aprender mesmo, eu estou aqui para isso. Foi bom, porque somos amigos até hoje.
P/1 – Como que é o nome dele?
R – Dário. Foi bem legal, é uma pessoa bacana, e a pesquisa terminou que com essa confusão toda de Acari, a gente não pode prosseguir em campo, mas a gente fez toda a parte teórica. Então, foi muito bom, foi bem legal, esse jeito meio pouco pensado de fazer as coisas, vou fazer e faz, às vezes termina dando certo. Então, quando eu começo a olhar retrospectivamente vejo que várias coisas bacanas que aconteceram foi justamente porque, ou eu não pensei muito, ou porque eu peguei a onda antes que a onda me pegasse e fui junto com ela e cheguei numa praia bacana, e eu acho que essa pesquisa foi uma delas, desde a universidade e tudo mais.
P/1 – E aqui na Brazil Foundation você chegou também como estagiária? Me conta como foi?
R – Eu não vim nem como estagiária inicialmente, eu vim como bico, eu estava na universidade.
P/1 – Foi também logo no início?
R – Foi logo no início.
P/1 – Que ano?
R – Eu sou péssima com datas, deve ter sido 2003, eu acho, eu já devia ter um ano de faculdade, e coincidiu que o meu pai estava desempregado, passagem intermunicipal. Meu pai me dava dinheiro para pagar a passagem e tudo, mas eu via que estava apertado, e também aquela vontade de fazer alguma coisa, eu falei: não vou só ficar debruçada no livro, eu quero fazer alguma coisa, ganhar o mundo. E esse professor soube que estava precisando aqui na Brazil Foundation de pessoas, porque eles tinham recebido uma quantidade imensa de projetos, que era mais de dez vezes o que tinha recebido no ano anterior, e precisavam de alguém para ajudar a arrumar tudo isso, era uma coisa muito trivial, muito básica. E aí, chamou a mim e outro rapaz que estudava comigo, e viemos. Então, nossa função quando ainda era na Santa Luzia era abrir os envelopes, colocar dentro dos sacos plásticos, colocar na prateleira, e preencher uma ficha de identificação, então, era algo que tinha prazo para acabar se não engano foi um mês, a gente tinha um tempo, 45 dias, para fazer isso e pronto.
P/1 – Mas o que é que ele te explicou o que era a Brazil Foundation?
R – Ele falou que era uma organização do terceiro setor, e aí, eu não entendi nada, porque terceiro setor para mim era aquela explicação de geografia do segundo grau: primeiro setor, segundo setor e terceiro setor da economia. Então, quando ele falou terceiro setor, eu falei: vou para o setor de comércio como assim? O setor de comércio recebendo projetos. Aí, foi que ele me explicou que tinha um outro jeito de significar terceiro setor, mas mesmo assim eu não entendi muito bem, mas eu estava afim, então, eu vim. E confesso para você foi dureza mesmo, dureza financeira que me trouxe aqui, eu não sabia muito bem onde eu estava vindo parar, não achava que fosse nada ruim, porque ele não me indicaria para nada ruim, mas mais uma vez a porta estava aberta e eu falei: eu vou embora, vou nessa e fui.
P/1 – Foi o mesmo professor da pesquisa?
R – Foi o mesmo professor da pesquisa, eu falei: vou lá ver qual que é dessa história. Quando ele falou sobre a Brazil Foundation eu gostei do que ele disse, embora não entendesse muito, isso era tão distante do meu mundo, de quem tinha acabado de sair do segundo grau, eu achava que as coisas eram bem mais restritas a um outro contexto de produção, de economia, e aí, você cai no terceiro setor, onde tem outro viés, outra perspectiva, era muito novidade vindo ao mesmo tempo, novidades boas.
P/1 – E eram muitos projetos, Carla, para separar e selecionar? Me conta.
R – Eram. Acho que foram 890 projetos e no ano anterior não tinha sido nem 80, era uma sala pequena dividida com estantes, ficava todo mundo na mesma sala: Suzane, Cátia, Sheila, eu e esse outro menino, esse rapaz, o Gláucio.
P/1 – Era um espaço só lá em Santa Luzia?
R – Era um espaço só em Santa Luzia. Era uma espécie de um apartamento dividido em três grandes salas, e o Rio Voluntário ocupava uma das salas, a outra eu não lembro se alguém ocupava, acho que não, e uma terceira sala ficou com o Brazil Foundation, acho que era essa a divisão. E eram muitos projetos, era uma tonelada de projetos, de papéis e tinha que organizar aquilo tudo, e para além do que a gente foi chamado inicialmente para realizar, nós dois começamos a propor um bocado de coisas, e se a gente fizesse isso, e se a gente fizesse aquilo, mas e isso e aquilo, e acho que nessa proposição de ideias o trabalho começou a tomar corpo e deixou de ser bico, passou a ser um estágio.
P/1 – Então, o que inicialmente ia ser um mês, você foi ficando?
R – Fui ficando, e aí, depois a Suzane e Cátia firmaram o compromisso de estágio com a UERJ, vimos todas as documentações e eu fiquei aqui como estagiária. E foi uma coisa tão assim, maluca, porque o meu curso nem tem estágio obrigatório, e alguns cursos lá tem estágio obrigatório, e terminei eu vindo, assim, no meio do caos sem saber o que eu estava fazendo.
P/1 – Você considera como o seu primeiro emprego esse?
R – Considero, porque eu tinha formas de ganhar dinheiro, fazia cartões de visita para comércio perto da minha casa, quando era mais criança engraxava o sapato do meu pai para ganhar um trocadinho, claro que ele pagava muito mais do que o engraxo normal, mas eu tinha algum jeito de ganhar um dinheirinho. E aí, quando eu vim para cá foi uma primeira forma de um trabalho mais organizado, com horário, com metas, com perspectivas, patrão, com essas coisas todas. Então, eu considero como primeiro emprego. Foi o primeiro que eu consegui no susto, sem ter corrido atrás dele, então, é uma coisa muito engraçada, e boa.
P/1 – No universo que você estava estudando?
R – Pois é, você perguntou agora como eu vim parar aqui e esse ano viajando para visitar organizações, um rapaz de uma organização me perguntou a mesma coisa: “Como é que você foi parar na Brazil Foundation?” E eu expliquei para ele mais ou menos isso, foi senso de oportunidade, foi dureza financeira, foi necessidade mesmo, e encarar a novidade para ver o que é que podia sair dela e eu acho que foi muito bom, está sendo bom.
P/1 – E essa descoberta do terceiro setor, fale um pouco sobre isso que você nem sabia o que era o terceiro setor, como é que foi descobrir esse mundo?
R – Quando eu vim para cá o Brazil Foundation estava com bolsas para o (___?) aqui na Presidente Vargas para duas pessoas fazerem o curso que era (___?), que era justamente para a ensinar a realizar relatórios dentro dessa perspectiva do terceiro setor em inglês. Então, eu vim sem saber para onde eu estava vindo, tendo uma breve noção e cai num curso sobre esse lugar, sobre esse mundo em inglês. Aí, eu falei: vou ter que dar um jeito de inteirar do assunto e comecei a ler sobre isso, a conversar. Quando eu vim para a Brazil Foundation eu folheava os projetos, que era mais do que eu deveria fazer em princípio, porque eu ia cadastrar os dados que estavam na primeira página do projeto, mas eu passei a folheá-los. Nesses projetos tinham as descrições em pedaços, era bastante partido, mas eram fragmentos do universo do terceiro setor, que são os projetos que nós recebemos. Então, eu absorvi muitas coisas deles, e também paralelo a isso, a Sheila que trabalhava aqui, passou para mim e para o Gláucio várias informações sobre o terceiro setor, e eu fui cavando e descobrindo na prática o que era.
P/1 – A Sheila era analista?
R – Eu não sei o título exato dela, mas ela era uma espécie de gerente, acho que era gerente de programa, alguma coisa assim. Nessa época as coisas não estavam exatamente organizadas, é muito estranho, eu acho engraçado esse caos, do caos nascem as coisas, porque eu vim sem saber para um lugar que estava se formando, então, era tudo muito cru, mas muito bom, com muito potencial, e acho que nessa época as pessoas nem tinham títulos e cargos, elas ocupavam funções, executavam tarefas e a coisa funcionava. Foi assim que eu conheci o terceiro setor, foi caindo de cabeça nele temporariamente por um mês, depois isso se prolongou por anos, e continua até hoje.
P/1 – Você encontrava muita literatura nesse período? Sobre o terceiro setor?
R – Encontrava, inclusive, aqui tinha, a Brazil Foundation tinha, recebia relatórios, documentos, pesquisa sobre o terceiro setor e colocava em caixas que ficavam numa prateleira na entrada do outro escritório. E um dia eu comecei a organizar esse material, porque estava chegando mais e mais e precisava arrumar, limpar, catalogar. Então, eu aproveitava que tinha essa demanda para organizar o material, e também lia o material, separava dez, catalogava, lia cinco, folheava os outros, então, foi com base nessa literatura que já estava aqui, que continua aqui, o acervo está aumentando, cada vez recebemos mais material e foi com esse material que eu fui aprendendo também.
P/1 – Aí, você está me contando que chegou para separar só os envelopes e cadastrar, agora você já está contando uma parte que você está organizando um arquivo, uma biblioteca, como é que foram também essas suas outras atividades, o que é que você fazia depois que acabou essa parte de arquivar o que você fez também?
R – Como eram muitos projetos, precisava de uma maneira para organizá-los para que não fossem perdidos, que ficassem esquecidos em alguma gaveta, que uma pessoa pegasse uma pilha e deixasse outra por engano. Então, começamos a fazer um mini banco de dados, simplesmente, catalogar os projetos numa planilha de Excel, também, além disso, como precisava ler os projetos e analisá-los em termos de qualidade, era preciso que a parte que não pudesse nem mesmo chegar a essa parte, porque não tinha obedecido algum critério do edital, que essa parte fosse eliminada. E aí, Gláucio e eu entramos também para fazer essa primeira peneira dos projetos, e aos poucos a gente ia folheando os projetos, entrando em contato com mais e mais significado deles, e com isso a gente terminou fazendo parte aos pouquinhos da equipe que lia os projetos, primeiro a gente não fazia análise, não era analista, mas olhava os projetos, via se era bom, se valia a pena ou não ler, mas era mais como um treino, algo bem amador, mas já com tendência a se profissionalizar.
P/1 – Já ajudava nessa triagem?
R – Já ajudava.
P/1 – Quem participou dessa seleção, quem estava participando? Que era a equipe aqui?
R – Tinha fixo só a Sheila, e tinha analistas contratados que eram o Siano e a Cler, acho que eles fizeram duas ou três seleções conosco, depois não fizeram mais.
P/1 – Eram de algum instituto? Profissionais autônomos? Professores?
R – Acho que eles eram autônomos, a Cler inclusive estudava nos Estados Unidos, e passava um período aqui no Brasil, era mais ou menos assim. Eu não me preocupava muito com detalhes, eu até pensando: nossa! Entrevista, as pessoas vão perguntar detalhe das coisas, eu era tão boba, não prestava atenção em nada, eu não me prendo em data. Eu só sei que as coisas foram acontecendo eu fui acontecendo junto com elas.
P/1 – Então, você participava fazendo uma certa pré-seleção, vocês acompanhavam o que eles estavam fazendo, a metodologia, você começou a perceber também como é que era a metodologia?
R – Eu ficava de olho na Cler, no Siano, na Sheila, eu prestava atenção no que eles conversavam, no que eles falavam, às vezes eles tinham reunião juntos.
P/1 – Você falou eles estavam formando uma metodologia, o que é que você se lembra dessa formatação dessa metodologia?
R – Esse período, eu lembro muito pouco, porque era feito de um jeito muito pessoal, muito particular, a Cler e o Siano levavam os projetos para casa e traziam já escolhidos, eu não participava do processo, era um processo que acontecia fora do escritório e que depois junta no escritório com o que a Sheila tinha feito. Então, desse momento eu não me lembro de nada que tenha sido expressivo em termos de metodologia, eu acho que conforme nós fomos estudando e a minha formação me confere esse dom de trabalhar no terceiro setor, uma formação adequada para o terceiro setor, também o interesse do Gláucio, interesse da Sheila, a gente pegando material que tinha aqui lendo, e aprendendo junto com os projetos que chegavam, fomos construindo esse modelo de avaliação de projetos, que a gente não sabia explicar direito, mas a gente conseguia fazer.
P/1 – Mas tenta me explicar, eu sou totalmente leiga.
R – Basicamente tem a parte mais prática, que é verificar se o projeto cumpriu as normas mais simples do edital, envio de documentos, de mídia, ou coisa parecida. Então, essa parte a gente já corta uns 30% dos projetos, os outros tem a análise de tudo que a instituição apresenta escrito no documento, isso pode ser feito em relação ao projeto em si e em comparação entre projetos. Você identificar projetos do Ceará, por exemplo, você tem que vê o discurso muito coerente, outros que não são tão coerente assim, ou então, alguns que até são muito interessante na hora de identificar o problema que eles querem resolver, mas eles não têm uma proposta muito concreta de ação para intervir nessa situação e realmente para transformar aquela realidade para outro patamar de realidade. Então, com isso você vai peneirando aos poucos. Uma metodologia clara eu acho que não sou capaz de te passar, esse ano estamos como o processo dez anos, que é justamente para encontrar essa metodologia, porque as coisas precisam adquirir um jeito mais palpável, um legado que possa ser passado adiante, mas com relação a essa leitura de projetos o que depois de muita conversa se chegou a conclusão, era que a gente precisava primeiro saber se as organizações proponentes tinham um bom conhecimento do problema que eles estavam apontando. Segundo se a demanda pela solução desse problema partia das pessoas atendidas ou se era simplesmente um desejo da organização, porque é muito legítimo a organização desejar resolver alguma coisa, mas com a participação de quem sofre o problema tudo ganha muito mais força, principalmente, ganha até mais sentido, porque talvez o problema seja resolvido de uma forma que a organização por estar de fora, não consegue enxergar. Então, a identificação do público-alvo e a caracterização desse público-alvo em relação a proposta e ao projeto sempre foi muito relevante aqui na Brazil Foundation, e outro ponto era saber se aquela metodologia que eles propunham realmente tinha o poder de trazer os objetivos, as metas, os resultados que eles apontavam. Então, era basicamente um serviço de você prestar atenção se as várias partes do projeto tinham coerência entre si e se daquilo realmente poderia sair um resultado, se fossem metodologias incríveis, mas com ações fracas, ou um projeto muito bem identificado, mas que não atrapalhava a vida de quem seria atendido, então, seriam projetos feitos de partes desconexas. Então, muito provavelmente a nossa leitura, digo que a nossa leitura seguia rumo. Tinha os documentos dentro da Fundação Ford aqui, sobre avaliação de projetos, muita coisa saiu desses documentos, a gente lia para ter ideia sobre como ler os nossos projetos. A Sheila tem uma experiência também com avaliação de projetos, eu não lembro agora qual organização que ela trabalhou, mas ela trabalhou e ela tinha contato com esse meio, então, ela já tinha uma certa prática um certa sabedoria que lida no dia-a-dia. E aqui a gente fazia também aos poucos, inclusive isso influenciou para que vários instrumentos de avaliação de projetos fossem feitos, porque antes a gente tentava atribuir notas numéricas, que dessem peso aos itens do projeto, depois a gente passou a entender que não precisava priorizar a esse ou aquele momento do projeto, precisava olhá-lo inteiramente, então, foram várias abordagem, vários olhares, tinha experiência dos analistas externos, e com isso a gente foi fazendo um piquenique, uma salada de modos de ler projetos e somado com o que já acostumávamos a fazer, aqui terminou virando uma coisa bem nossa cara de Brazil Foundation.
P/1 – Você disse que chegaram a fazer uma apostila? Construiu uma apostilazinha?
R – A gente teve pequenos materiais, a Sheila uma vez fez uma pequena orientação, a Carlona, que foi uma voluntária aqui, também fez um documento de orientações para primeira leitura, temos um guia de visita de projetos, que a Graciela fez no ano passado, que realmente ajudou muito porque a parte de visitar era onde você saia do escritório, e aí, você precisava...
P/1 – Eu quero chegar aí nas visitas, mas um capítulo à parte. Vamos também por partes, o banco de projetos começou a ser formado já nessa época?
R – Já era puramente para organizar para a logística, porque os projetos saíam e precisava anotar os projetos que estavam saindo com os analistas, então, ele tinha essa função específica, muito prática, muito óbvia, organizar os projetos e saber onde eles estão.
P/1 – O banco começou você, então?
R – Comigo e com o Gláucio. Então, cada ano um novo banco, porque cada ano mais projetos, sempre aumentando a quantidade, durante um tempo, e aí, com todos esses bancos feitos a miúde, volta e meia a Suzane perguntava: ano passado nós recebemos algum projeto disso? No ano passado nós recebemos algum projeto para atender mulheres no Ceará? Pequenos exemplos, e eu sempre corria lá e catava lá nos bancos que tinham sido feitos, mas isso estava começando a ficar complicado, porque eram vários bancos, era muito pulverizado, cada um com uma estrutura, eu sabia que muitos dados se perdiam assim, nós usávamos Excel, que não é adequado para você colocar bancos com imagens, textos, o Excel é mais para números. Então, o banco de projetos, o banco de dados na verdade, ele surge dessa necessidade de ter uma plataforma que você consiga colocar todos os projetos ano a ano, que ele possa ser alimentado a cada seleção, sem chegar ao nível crítico, nível exausto de informações, porque chega uma hora que o Excel já não cabia mais, virava uma planilha imensa. Então, a gente precisava de um banco que fosse melhor em termos práticos e que desse mais possibilidades para fazer pesquisas, porque uma das coisas que ficaram ressaltadas, é que se você abre um edital e recebe xis propostas, são respostas voluntárias as pessoas que estão se candidatando, então, nós temos dados que foram colhidos, porque tinha essa pretensão de colher os dados, nós temos os dados como consequência do nosso trabalho e isso já dava um retrato bastante significativo do terceiro setor no Brasil. Era o terceiro setor respondendo a uma proposta nossa de seleção, então, nós tínhamos esses dados.
P/1 – Você estava falando que o Excel acabava não dando conta.
R – A gente estava usando programas que não eram adequados para isso, o que tinha sido uma proposta inicial para quebrar o galho já estava tomando corpo de algo mais sério, porque no desespero de ver uma montanha de projetos, como foi no primeiro ano que eu vim para cá, você corre e faz o que tem ao seu dispor, mas depois as demandas continuam e crescem, você continua com a mesma ferramenta e o mesmo método, fazendo do mesmo jeito, e aí, deixa de funcionar tão bem. E como a Brazil Foundation tinha essa vontade, essa necessidade de investigar mais esses dados que tinham colhidos e que estavam organizados, ainda que mal organizados, surge a necessidade de você ter uma plataforma, que realmente dê conta de todas as possibilidades que os dados organizados te dão, que informação desorganizada é o mesmo que informação nenhuma, você não acessa, então, o banco surge disso, na verdade o banco como ele existe hoje, ele é resultado de vários processos anuais de vários bancos, que foram feitos sem esse objetivo de se tornarem um banco, mas que no fim das contas terminaram alimentando um banco que foi feito para ser maior, mais robusto e com mais possibilidade de atendimento. O banco hoje está finalizado nessa parte de passar todos os dados anteriores para ele, foi um trabalho que demorou mais de um ano, porque cada dado, cada linha, de cada planilha, de cada Access, de cada Excel precisava ser visto, revisto, remoldado, para poder ser transferido para caber na linguagem nesse novo banco, que foi desenvolvido por um rapaz que chegou e encontrou o que a gente tinha, eu disse a ele o que a gente precisava, foram vários encontros para ter a tradução entre o que uma socióloga e um analista de sistema entendem sobre a mesma coisa para poder chegar em algo que agrade a quem vai usar, e o PONG como foi chamado o banco de dados.
P/1 – De onde vem esse nome?
R – O nome é de uma origem tão tolinha, o rapaz ele tinha o hábito de colocar P de projeto, traço e o nome do lugar onde ele estava fazendo o projeto, então, ele tinha o p_padaria, o p_açougue, o p_mercado e o p_ong que era para cá para a Brazil Foundation, por falta de outro nome passamos a chamar de PONG mesmo, e aí, nós nos habituamos com isso e ficou PONG e era um nome simpático, bonitinho, rápido de falar, bom para escrever.
P/1 – E as plataformas é o quê? Ele unificou?
R – É para uso interno, ele unificou todos os bancos, os outros bancos existem como backup e os dados foram passados de forma que pudessem ser usados da melhor forma possível de um jeito inteligente, que eles pudessem ser agrupados de acordo com as nossas necessidades, e que tivesse possibilidade de pesquisa, porque a pesquisa no Excel e Access eram basicamente de colocar o Ctrl + L e mandar pesquisar uma palavra, mas isso é insuficiente quando você tem 6 mil dados, é diferente, 6 mil entradas para cada tipo de dado.
P/1 – Pesquisa mais sofisticada?
R – Ele está sendo reformulado para duas coisas, uma para que ele passe por uma grande faxina, que é para você olhar para ele retrospectivamente ver tudo que pode ser melhorado, e aí, tem toda a linguagem do rapaz que fez o banco, ele usa termos super técnicos, mas resumidamente é tirar todos os gatilhos que não são necessários e que foram colocados, limpar as arestas do banco, dentro chama faxina, porque é isso que dá ao PONG a possibilidade de se estruturar para receber novas informações. Já faz um ano que eu vinha conversando com o Victor, que foi estagiário aqui, a possibilidade de incluir os dados de monitoramento no PONG, porque o PONG tem os dados do projeto desde a hora que chega até a hora em que ele é selecionado.
P/1 – Mas isso representa o quê? Para quem não participa, uma pessoa de fora para ela entender, que tipos de dados estão armazenados sobre os projetos?
R – Estão armazenados os dados da instituição, endereço, nome, localidade, telefone, e e-mail, qualquer forma de contato da organização e sobre a proposta, porque o foco da Brazil Foundation sempre foi na proposta, a pouco tempo que a gente vem redirecionando esse foco para que ele seja mais voltado para a organização em si. Então, o banco reflete esse jeito antigo da Brazil Foundation de enxergar as propostas, ele tem muita informação sobre projetos e poucas informações sobre a instituição, se a gente considera que os projetos são algo temporário, que em outros casos são coisas que nem chegam a ser executadas, você tem mais informações sobre o que é temporário, do que informações sobre o que é constante que é a organização. Então, o PONG reúne os dados das organizações e os dados dos projetos que elas propuseram ao longo do ano, e nos projetos sim, nós temos mais detalhes, público-alvo, ação, tipo de ação, em que área que esse projeto se encaixa dentro da nossa classificação de cinco áreas.
P/1 – Sobre a comunidade em que ele se insere?
R – Sobre a comunidade, o parecer de quem avaliou, quem avaliou, e a nota que ele recebeu, ele é bastante útil no sentido de você identificar quais foram as demandas em cada ano, aonde você tem mais projetos, ou mais necessidade para projetos para determinados públicos, para determinadas subáreas, mas ele é insuficiente para identificar dados sobre instituições, não porque ele não tenha essa possibilidade, mas porque esses dados não foram colhidos ao longo dos anos. Então, existe agora a perspectiva e o desejo de que o PONG passe a incorporar mais dados sobre as organizações e isso vai depender do nosso olhar durante a seleção, porque os dados que vão para o PONG são oriundos do processo de seleção, o que estava no PONG e estava nos bancos anteriores foi retirado por nós, então, o que nós retiramos das organizações e colocamos lá, poderemos colocar mais ou menos de acordo com o que a gente tirar das propostas que a gente recebe. Então, a perspectiva agora é fazer essa grande faxina, transformar o PONG numa plataforma que inclua mais possibilidade de respostas, e também um outro desejo que ele possa servir também como instrumento de monitoramento, vinha conversando sobre isso com o Victor, porque o PONG inclui essas informações das organizações da hora que os projetos chegam aqui até o momento de seleção, são selecionados os projetos ao longo do ano, nesse momento o PONG não tem mais entradas e isso seria uma boa base para se incluir os dados do monitoramento, porque isso enriqueceria o PONG e facilitaria, depende também do que a equipe de monitoramento deseja, facilitaria também o trabalho deles.
P/1 – E teria um arquivo só.
R – E teria um arquivo só com informações muito mais ricas, colocadas cotidianamente e que talvez trouxessem um aspecto mais vivo para o PONG, porque ele está muito parado no tempo, ele está parado na proposta que foi feita, mas ele não está atualizado com as coisas que realmente foram realizadas. Então, ele pode ganhar esse espírito de algo mais renovado, de algo mais atual, se ele incorporar ou for incorporado pelo monitoramento, isso precisa ser visto, tem que ver todas as possibilidades de recursos, tanto financeiro como técnico, as possibilidades que o próprio programa oferece, então, é pano para muita manga, mas é coisa que dá para realizar.
P/1 – E essa reunificação no PONG aconteceu quando? Há cerca de um ano?
R – Mas você diz reunificação é o quê?
P/1 – Quando vocês criaram essa plataforma logo que unificou as planilhas de Excel ou de Access?
R – Mais uma vez as datas. Deve ter sido 2008 para 2009, porque foi quando eu voltei para cá para a Brazil Foundation, acho que foi 2008 para 2009, eu trabalhei nela ao longo de 2008 e acho que no final de 2009 ele estava concluído, da maneira como ele está hoje, agora já passou por uma segunda fase.
P/1 – Aí, você falou quando eu retornei, aí, você saiu?
R – Eu saí, eu era estagiária aqui e já estava na parte final da faculdade.
P/1 – Você ficou quanto tempo?
R – Deve ter sido uns dois ou três anos.
P/1 – O que é que você fez nesse meio tempo?
R – Eu estava no final da faculdade, monografia, aquela correria toda, morando em Niterói, trabalhando aqui, aí, chega uma hora que você quer fazer uma coisa diferente, quer tentar outras coisas. E apareceu a oportunidade de trabalhar na secretaria de educação em Niterói, um trabalho que em princípio não tinha muito a ver com nada que eu tinha feito na vida ou que eu tinha estudado, era para coordenar o envio de merendas para creches comunitárias, eu olhei as condições e falei: eu vou. Bom, fazer coisas diferentes e era conveniente perto de casa, fica 20 minutos da minha casa ainda estava na correria da universidade, eu falei: vou lá tentar uma coisa diferente. Fui, foi legal, nada nessa vida é desperdiçado, a gente sempre pode ter um resultado bom de qualquer coisa que faça, e foi muito legal, além de toda conveniência eu perguntei porque é que eles me chamaram, e aí, a pessoa que estava recrutando disse: porque você tem experiência com comunidade devido ao seu trabalho na Brazil Foundation e tudo mais, porque as creches eram em comunidades complicadas, em favelas e era para lá que a gente tinha que ir e entrar na creche abrir a despensa e contar tudo e eu sabia que as pessoas não iam gostar, desvio de merenda e essas coisas e a intromissão de você chegar e parece intromissão e lá considerava que meu trabalho no Brazil Foundation já era um diferencial com relação aos outros candidatos. E eu fui, acho que fiquei dois anos lá, dois, dois anos e pouquinho, e basicamente era coordenar o envio de merendas, então, eu precisava conversar com os fornecedores falar sobre as datas, eu tinha que trabalhar junto com as nutricionistas, porque elas elaboravam o cardápio, mas não tinha muita prática, o cardápio, às vezes, não era possível de ser executado, um dia que era para comer o arroz e o arroz não tinha chegado, e a creche dava o macarrão e a nutricionista chegava via aquilo e não gostava, ligava para mim e eu explicava, então era uma mediação de conflitos, basicamente e era bem legal.
P/1 – Era um exercício?
R – É um exercício, então, foi bom eu mediava conflito eu tinha que atender os interesses da prefeitura, das comunidades, das escolas, dos alunos, das nutricionistas, eu tinha essa situação e era bom que você via o negócio resolvido, a dispensa cheia, as entregas no dia certo, então, era bom, foi mais de uma dessas coisas que eu comecei fazer por fazer e terminou sendo bom, sai um pouco do quadrado, você fica muito quadradinha fazendo a mesma coisa. Aí, lá o meu horário era de onze às dezessete, e um dia a moça que ficava de oito às duas foi para outra função e me perguntaram se eu queria assumir o horário dela, eu falei quero, então, eu ficava lá de oito às duas depois eu ia resolver a minha vida. Aí, bateu uma saudade da Brazil Foundation (risos), eu vim para cá e perguntei: posso vim para cá uma ou duas vezes por semana e ficar aqui, eu sei que tem serviço para fazer, eu quero fazer, vocês já me conhecem, e a Suzane: “Claro que pode”. Aí, fiquei, eu vinha deve ter sido ao longo de seis meses, seis, sete meses.
P/1 – Aí, você já tinha se formado?
R – Já tinha me formado, me formei lá quando eu estava lá na secretaria de educação, vim para cá como voluntária.
P/1 – E voltou para fazer o quê?
R – Eu vim quando estava no processo de seleção estava nesse meio de seleção, foi mais para o final do ano que eu vim, acho que foi, meio para final de ano, quando estão lançando edital.
P/1 – Na seleção de 2008?
R – Caramba! Eu não sei de qual ano foi a seleção, deve ter sido de 2007 para 2008. Foi 2007 para 2008.
P/1 – Aí você participou? Analisou projeto?
R – Eu vinha uma ou duas vezes por semana eu fazia de tudo um pouco, eu organizava estante, eu lia projeto, eu mexia no computador, eu resolvia isso, resolvia aquilo, quando eu dava pitaco em alguma coisa, fazia alguma coisa, eu fazia várias coisas, geralmente eu vinha segundas e terças, ou quando não dava vinha só segunda ou só terça, e eu tirei férias lá no meu trabalho em janeiro de 2008 e eu falei: vou passar esse tempo na Brazil Foundation, então, eu passei a vir quase que todos os dias na Brazil Foundation, eu ficava aqui de manhã até de tarde. E aí, a Suzane me perguntou como é que eu estava lá na secretaria, como era o meu trabalho, condições, salários e tudo mais e se eu não queria ficar aqui, estavam precisando de gente para trabalhar, eu falei: quero. Aí, eu fiquei, então, foi mais de uma coisa que você começa a fazer e vai abrindo caminho, eu aproveitei o tempo vago para vir para cá, e de 2008 para cá estou aqui sem intervalo.
P/1 – Carla me diz, dessa visita do seu retorno o que é que tinha mudado daquela primeira visita quando você chegou?
R – Tinha outras pessoas na equipe.
P/1 – Uma equipe maior?
R – Tinha uma equipe maior.
P/1 – Mas contratado para a seleção?
R – Não tinha voluntários, acho que tinha duas voluntárias, além da Carlona, porque a Carlona já era lá do outro prédio da Santa Luzia, Carlona eu já conhecia, tinha mais duas estagiárias, tinha dois voluntários, tinha estagiária, eu acho que a Lívia não estava aqui, a Lívia chegou um pouco depois, eu não lembro.
P/1 – E a maneira de avaliar estava diferente? Quais são as etapas do processo de seleção? Estava mais ou menos igual?
R – Estava mais ou menos igual.
P/1 – Explica como é que as etapas...?
R – Ficou mais ou menos igual, recebia os projetos, abria os envelopes, parte mecânica: abria o envelope colocar, arrumar, organizar, cadastrar; depois separar os projetos que não cumpriram alguma norma do edital, que você não precisa ler para saber que eles não servem, basta olhar e ver que falta alguma coisa e eles já saem do páreo; e a outra etapa é ler os projetos em termos de qualidade e avaliá-los. Então, continuava a mesma coisa, visita aos finalistas, continuava igual, eu não senti muita diferença quando eu voltei, parecia que eu só tinha saído por dois dias.
P/1 – E aí, você passou a participar das visitas?
R – Passei, antes de sair eu já tinha ido a uma visita com a Sheila, mas como acompanhante, eu só fui olhar fiquei calada e voltei.
P/1 – Foi aonde?
R – Morro do Céu, em Niterói. Era um projeto que inclusive não foi selecionado, só não me lembro o nome dele. Mas, aí, quando eu voltei depois desse intervalo passei a visitar projetos, primeiro no Rio de Janeiro, depois fui visitar em outros estados.
P/1 – E aí, na sua volta você ficou como o quê exatamente? Como analista de projetos? Como foi? Foi definido? Dessa vez estava mais organizado?
R – As coisas estavam organizadas, o trabalho estava organizado, mas ele não estava digamos separado por categorias. Eu não sei se é só na Brazil Foundation ou se é no terceiro setor todo, mas parece que as pessoas trabalham sem ter muita clareza de quais são os limites da sua função, onde começa e onde termina o que faz e o que não faz, você faz o que se propõe a fazer, que mandam você fazer, o que quer fazer, mas os limites são muito fluídos. Então, não existia título, por exemplo, eu não me lembro, tinha o estagiário, o gerente, o vice-presidente, mais os analistas externos, mas nada disso era oficializado, registrado em documentos internos, pelo menos não que eu lembre. Mas, aí, as coisas estavam organizadas, eu diria que elas estavam se organizando, tanto espacialmente, o escritório estava se organizando, novo mobiliário e também as pessoas estavam dividindo tarefas com mais facilidade, estavam atribuído tarefas, se atribuindo, e atribuindo aos outros tarefas com mais clareza. Então, eu fiquei um tempo, eu não sei qual é, eu era analista de projetos, mas não estava escrito em lugar nenhum, nossas assinaturas não eram eletrônicas, então, não tinha aquele título, não tinha nada disso. Nesse retorno eu basicamente cuidava da leitura dos projetos e dos bancos que foram feitos enquanto eu não estava aqui, teve banco, uma das voluntárias a Adriana cuidou disso, ela fez um banco, a Carlona e eu, acho que a Juliana preencheram o banco com os dados dos projetos. Então, o serviço tinha continuado, eu peguei o serviço já começado eu dei prosseguimento a ele, e eu acho que eu aprendi a fazer no meu primeiro turno aqui na Brazil Foundation, eu terminei incrementando e fazendo com mais afinco nessa volta, acho que o intervalo serviu para arrumar um pouco as ideias na cabeça.
P/1 – E as visitas? Vamos lá, o que é que você observa nas visitas Carla? Conta para as pessoas que não conhecem a Brazil Foundation? Me conta que parte é essa das visitas? O que é que vocês vão observar? O que é que vocês vão analisar?
R – A primeira coisa que eu observo é a reação das pessoas a mim. É muito engraçado, porque a Carla Lima da Brazil Foundation eu não sei o que eles imaginam, mas certamente não é alguém da minha altura com cabelos cacheados de calça jeans e tênis chegando na organização deles para conhecer o trabalho deles. Então, as pessoas reagem de uma forma muito engraçada: você é a Carla Lima, que bonitinha, tem essas reações, parece que elas estão sendo quebradas em alguma expectativa delas. Então, é bom quebrar essas expectativas, mesmo porque eu tento ir aos projetos com menos de expectativas possível, eu acho que você já vai com o olhar treinado para alguma coisa você termina enxergando o que não existe, mas enxerga só o que atende a sua necessidade de enxergar, você quer enxergar aquilo termina (chegando?).
P/1 – Estamos falando das entrevistas pré-seleção ainda?
R – Mas só tem visita na seleção mesmo.
P/1 – Tem visitas do andamento depois?
R – Tem.
P/1 – Outro projeto?
R – Não as de monitoramento eu faço, eu faço visitas de seleção. E aí, como se faz visitas? Primeiro eu acho que precisa ler o projeto, saber do que se trata e saber onde está indo, mas sem grande ambição de enxergar alguma coisa, você quer enxergar tem que ir com o coração e cérebro abertos para você olhar e captar o que existe ali, tem uma parte bem sensorial na vista à projetos. Depois olhar como as pessoas lá na organização se entendem, interagem e observar o clima, às vezes, você vai a uma organização e as pessoas não falam a mesma língua, cada uma fala de uma coisa, você liga para marcar a visita e eles nem sabem quem você é: deve ter sido a fulana que mandou o projeto. Então, tem umas que são assim, desconectadas, as pessoas são pouco, eu não sei, talvez elas não estejam conectadas com o que a outra está fazendo, e isso é possível de observar quando se visita uma organização. Observar também coisas mais práticas, como estrutura física, se é adequada, se é segura, perguntar sobre a manutenção do imóvel, se é alugado, se é comodato, perguntar sobre o que é que pode influenciar na execução do projeto que não dependa exclusivamente da organização que propõe, se um teto cair, por exemplo, se um chão está em vias de partir ao meio de tão gasto, de tão velho, ou se uma criança pode esbarrar num degrau, cair e bater a testa, lascar a cabeça, esse tipo de coisas que se observa no cotidiano. E sobre a visita de projetos...
P/1 – O que é que é um ponto que elimina? Pode eliminar um projeto numa visita?
R – O que é que pode eliminar? Eu não sei se porque eu nunca passei por isso, mas eu não sei se existe alguma coisa que você possa sacar assim, isso elimina no projeto.
P/1 – É um conjunto de coisas?
R – É um conjunto. Claro que existem coisas muito absurdas mesmo, coisas absurdas, mas eu acho que eu nunca fui a um projeto absurdo. Eu lembro, só para dar um exemplo, que era para atender crianças no horário oposto que elas estavam na escola, e era um projeto que no texto ele falava em arte e educação, e atendimento psicossocial, coisas muito bacanas, complementação escolar. E aí, quando chegamos lá na visita, existia o espaço, existia organização e existiam as crianças, mas as crianças ficavam sentadas numa sala vendo TV, e aí, a gente perguntou sobre o projeto, a pessoa falou: “não é que aqui faz muito calor, a gente liga esse ar e a criançada vem para cá ver TV”, não há nada de mal de uma criança ver TV numa sala fresquinha, mas se a proposta do projeto era ir muito além disso, isso desqualifica bastante o projeto, ainda que o que ele esteja fazendo não seja muito ruim, nem um pouco ruim, oferecendo conforto àquelas crianças, mas ele está longe do que ele disse que fazia. Então, isso é algo que elimina o projeto, não precisa ser algo bizarro, estapafúrdio, basta ele não ter coerência, eu valorizo muito a coerência nas coisas dos projetos, se você tem um problema e propõe a solução as duas coisas tem que se falar entre si, se você vai atender um público e seu público não está satisfeito tem algum problema aí, tem alguma incoerência, se você tem uma proposta de educação com valorização do ser humano com atendimento psicossocial, com recreação, com tudo isso envolvido e no fim das contas tudo isso se resume a uma sala refrigerada com TV, existe uma incoerência também. Então, eu acho que é isso que elimina um projeto, mas eu ainda sou um pouquinho chata, eu insisto para ver se dá para encontrar alguma coisa bacana naquela organização, porque é um processo que você já se debruçou, já fez tanto, para você nadar e morrer na praia não vale a pena, então, eu investigo até a exaustão, as visitas costumam demorar um pouquinho.
P/1 – Você tem rodado muito? Para onde você já foi?
R – Eu já fui para Minas, Bahia, Ceará, Sergipe, São Paulo, aqui no Rio; já visitei, Brasília, Goiânia, vários lugares.
P/1 – Como que é esse Brasil pela ótica dos projetos?
R – Pela ótica tem dos projetos...
P/1 – A sua ótica desse Brasil que está aí nesses projetos?
R – É algo assim espetacular, são contextos que para gente pode ser algo que a gente percebe friamente, percebe pelo que você lê, ou vê, mas quando você visita as organizações você vê que tudo isso que você conhece por leitura, por ouvir falar, por ouvir dizer, existe, pulsa, tem sangue, sua, essas coisas elas têm vida, existe como se um texto ganhasse vida. Esses contextos são muito, muito interessantes quase espetaculares, porque você vai e você enxerga coisas que outras pessoas estão te dizendo, de uma forma que você não poderia enxergar tão rapidamente, porque não fazem parte do seu mundo mais direto. Então, é quase um exercício antropológico de se olhar e olhar o outro, e dar valor a ambas as coisas, sem precisar de categoria de valor, mas você reconhecer a importância que os outros atribuem aos seus cotidianos, e como que é importante você enxergar o que há de potencial em todas essas diferenças, todas essas pujanças que tem por aí, porque é tudo muito bonito, é muito impressionante. A gente volta dessas visitas a projetos, eu volto otimista, eu volto muito otimista quando eu vou a organizações, pode ter sido o cenário mais escabroso que eu tenha visto, mas por incrível que pareça eu volto otimista, e o que eu vi não me assusta, de forma alguma, pelo contrário eu fico até enaltecida de enxergar coisas tão maravilhosas de gente correndo atrás, gente resolvendo, gente identificando problemas, demandas, se propondo a resolvê-los. E é um ambiente muito variado, muito rico, você visita um projeto numa organização no centro de uma cidade imensa, depois você cai no sertão e vê as vacas correndo atrás de você e você correndo numa estrada de terra, e no final tem um quilombo e você conversa com as pessoas do quilombo, depois você sai dali vai para o aeroporto cheio de executivos, voa e chega num hotel, você tem um banho quente, e você estava lá no quilombo, onde falta água encanada. Então, eu acho que é um exercício até de gratidão, eu me sinto grata quando eu volto desses projetos, grata por eles existirem, grata pela vida que eu tenho, grata pela oportunidade de vê-los, não estou dizendo que eu vou e vejo coisa que são poucas em relação que eu vivo, não é nada disso, eu vejo coisas extraordinárias, eu vejo gente feliz, vejo pessoas com empolgação, vejo ambientes bonitos, vejo coisas muito emocionantes e eu acho que isso já vale muita coisa, é uma experiência boa.
P/1 – Teve alguma que te marcou mais? Me conta uma que tenha te emocionado mais?
R – Eu ainda não visitei organizações que me levassem a um cenário muito tocante, no sentido de ficar sem palavras, mas tem sim momentos muito, não sei, é uma coisa tão difícil de explicar, tem hora que parece que você saiu da galáxia, e você não acredita que está ali. Dessa vez agora eu fui para um quilombo no Norte de Minas, primeiro eu fui para a cidade Montes Claros, então, eu estava na cidade, ambiente urbanóide com o qual eu estou acostumada. Aí, eu entrei num carro, estrada de não sei quantas horas rumo ao Norte, chegamos num lugar, não eram seres extraterrestres, eu sabia que eu continuava dentro de Minas Gerais, mas era um mundo de terras, terra a perder de vista, é uma coisa absurda, era muito lago, muita água, muito córrego, muito tudo, numa pobreza que não tinha fim, aquela terra maravilhosa exuberante, mocado de vacas pastando bem bonitas lá, fazendas imensas e eu perguntava para o rapaz: “A gente já está chegando?” “Falta pouco.” E aí, meia hora, daqui a pouco, mais dez minutos, e eu sem relógio eu não sei quanto tempo levou esses dez minutos, mas com certeza foram mais de dez minutos, e chegamos no quilombo e estava lá aquelas pessoas vivendo, plantando, colhendo, conversando, falando, vida normal, mas elas eram tão diferentes de mim, sem classificação, eu falava: caramba! Tão diferente de mim Carla, mas diferente das pessoas que eu estou acostumada, eu falei: caramba! As pessoas tão novas, mas já estão ressecadas na pele, as mulheres curvadas, aquela pobreza manifestada no corpo, eu fiquei assim. Aí, tem as casas que o governo federal faz e eu estava um pouco constrangida, aí, comecei a ver umas casas razoavelmente bem feitas, bonitas, bem acabadas, e atrás umas casas muito, muito velhas, atrás de cada casa nova tinha uma casa muito velha, aí, eu perguntei: ‘porque atrás de uma casa muito nova tem uma casa muito velha?” E aí, o rapaz que estava comigo falou: “o governo federal faz essas casas para eles para evitar chagas e qualquer problema de casa insalubre, e dá para as pessoas morarem, mas eles não querem se desfazer das casas antigas deles e permanecem com as casas novas”. Que curioso e é uma casa muito acabada, a gente entrou numa casa dessas e tinha lá uma família e ela fez um café para a gente, a gente sentou, comemos um biscoito e tudo mais, aí, quando eu fui tirar foto com eles, eles quiseram tirar foto na casa antiga, aí, a cozinha da mulher, inclusive, era a cozinha da casa antiga, a vida dela continuou acontecendo na casa antiga, mesmo ela tendo uma casa nova, porque aquela casa antiga tinha muito mais significado para ela do que quaisquer dez casas que ela pudesse receber, antes de entender isso, eu não estava entendendo, eu estava querendo saber o porquê daquilo e tudo mais, eu me sentindo constrangida pela simplicidade, pela falta de recurso alheia e as pessoas que estavam ali na falta de recurso estavam muito bem com o que tinha, não era por falta de opção, porque elas queriam estar daquele jeito que elas gostavam, que davam valor. Eu não sei dizer o que é isso em palavras, eu acho que significa um certo desprendimento e uma valorização extra material a tudo que compõe a sua vida, aquela casa era a casa, o lar deles.
P/1 – O oposto dessa visão da cidade?
R – É. Estavam mega felizes, mega realizados com a casinha velha que tinha sido construída pelo avô.
P/1 – Eles ocupavam a casa nova?
R – Eles ocupavam aqui e ali, tinha móveis aqui e móveis ali, tinha uma cozinha cá e uma cozinha ali, eles faziam o café em uma cozinha e o bolo em outra, era uma coisa engraçada demais, e todo mundo, eu passei um dia no quilombo. Então, eu acho que foi uma coisa boa de perceber como a gente é apegado a matéria, ao que é exposto aos olhos. Eu acho que quando você me pergunta sobre as visitas, talvez o que mais ressalta para mim, como Carla, justamente essa possibilidade de enxergar o invisível, de interpretar o impalpável, porque são os olhares, os gestos, as sensações, as exclamações, a sobrancelha que levanta, essas coisas que no final das contas, às vezes, as bobagens são as coisas mais importantes da vida, e o resto é bobagem, então, essas pequenas bobagens terminam construindo um cenário muito bom, impactante.
P/1 – Você faz visitas também pelo JAPER? Eu queria que você falasse se as visitas são diferentes.
R – Não são diferentes, o JAPER ele é um plano entre governos Estados Unidos e Brasil, que tem o objetivo de erradicar, ou pelo menos diminuir as desigualdades raciais e étnicas. Esse plano já existe alguns anos, e no Brasil é o Ministério das Relações Exteriores junto com a SEPPIR, que é a Secretaria de Política de Promoção da Igualdade Racial, que estão a frente desse plano com essa juntos, a Brazil Foundation foi selecionado, foi escolhida por indicação da Fundação Interamericana, como a fundação para executar a seleção de projetos dentro desse âmbito entre os países. Então, com a expertise da Brazil Foundation em seleção de projetos, nós fomos escolhidos para executar essa seleção que levasse em consideração os objetivos desse plano, eliminação da desigualdade racial e étnica, promoção da desigualdade racial e étnica na mídia, acesso à justiça para as pessoas de minorias étnicas, raciais, no caso do Brasil os negros nem são minoria, mas enfim. A Brazil Foundation executou, lançou edital, começou a seleção e visitou os projetos, foi feito dentro do que a gente já estava acostumado a fazer, formulário, edital, etapas de seleção e visita a projetos, e por último teve as visitas e uma reunião onde foram selecionados os projetos que vão receber o financiamento. Então, foi bastante similar a seleção da Brazil Foundation, mas com essa característica de ter um foco bastante específico, ao contrário das seleções anuais, que a gente estava acostumada a fazer, e também porque era uma situação intermediária por outros organismos, a Embaixada América, a SEPPIR, a sociedade civil organizada lá nos Estados Unidos e aqui, então, tinha mais atores envolvidos, não era exclusivamente uma proposição nossa, uma ideia nossa, era algo que envolvia mais pessoas. Então, isso acaba levando você a ter mais, precisar ter mais jogo de cintura, fazer acordos, para tentar chegar num resultado que agrade a todas as pessoas envolvidas, e é um momento bom de você aprender a lidar com outras pessoas que participem do seu cotidiano de trabalho, também abre frente para um próximo trabalho da Brazil Foundation que ela queira fazer editais mais focados, por exemplo, ela tem experiência do JAPER, sem contar que é uma coisa danada de boa você ter sido indicado pela sua excelência no trabalho, nós fomos indicados porque fazemos bem e isso já é um prêmio.
P/1 – Uma prestação de serviço?
R – Uma cooperação técnica, acho que no contrário está escrito cooperação técnica, não sei bem quais as diferenças em termos práticos de um para outro.
P/1 – Que faz parte da equipe do JAPER?
R – Aqui dentro sou eu, e tem Anette Kaminski que é o ponto focal, uma analista que participou do JAPER, mas não é da equipe da Brazil Foundation, ela trabalha com a gente, e o Marcos Gaspar que foi um analista contratado especificamente para análise e visita desses projetos, e eu aqui, somos nós três.
P/1 – Eu gostaria que você falasse do calendário anual, como é que é o seu calendário de trabalho? Como você se organiza e se divide nessas tarefas?
R – O pico de trabalho vai mais ou menos de setembro até abril, maio, porque é o tempo que compreende a seleção de projetos. Setembro e outubro a preparação do edital, lançamento; aí, até dezembro administrar os projetos que chegam, organizar, responder dúvidas de instituições que queiram enviar projetos; e aí, até maio é todo o processo de seleção, leitura, triagem, avaliação, viagem. Então, é quando tem esse pico de projetos e é quando eu estou concentrada, eu concentro as minhas horas nesse trabalho na seleção de projetos, nos outros meses eu procuro organizar o banco de dados, é quando eu debruço mais sobre ele, cuidar do acervo da organização, a gente tem um material riquíssimo, com muitas informações, e ele está todo organizado e todo catalogado para ser usado pela equipe, ao dispor da equipe, e também cuido de qualquer outra ideia que aparece. Então, aqui na Brazil Foundation costuma ter plano de trabalho, mas sempre aparece coisas que somam a esse plano, então, tem nosso cronograma de ações, vão aparecendo coisas no dia-a-dia. Agora, por exemplo, o JAPER, hoje o comitê final vai receber o relatório dos projetos selecionados até o dia 30, eu estou mobilizada com o JAPER, que é a divulgação dos finalistas, estou mobilizada com essa parte do JAPER, porque depois vai precisar do monitoramento dos projetos e a gente precisa sentar, conversar sobre monitoramento, acompanhamento.
P/1 – Você também faz monitoramento?
R – Eu não faço monitoramento, mas como tem o JAPER eu acho que é uma possibilidade muito boa de aprender o que o monitoramento tem para ensinar e aplicar os projetos do JAPER, já que eu sou a pessoa aqui dentro que está ligada ao JAPER, isso ainda vai ser discutido, para ver detalhes sobre o monitoramento.
P/1 – É o primeiro ano desse projeto?
R – Na Brazil Foundation sim, é a primeira vez que se executa uma coisa do JAPER, mas esse acordo já tem um tempo.
P/1 – Do banco de projetos se existe uma possibilidade, se vocês pensam numa abertura, se é possível se tem nexo você pensar em abrir esse banco de projetos para pesquisadores? Também, o que vocês pretendem fazer também está querendo construir alguma coisa mais palpável, quais são mais ou menos os planos de vocês?
R – A ideia de abrir o banco ela sempre existiu, mas existem formas de abertura, por exemplo, ele é localizado em termos de informática, de servidor aqui dentro, para um acesso externo às pessoas que quisessem acessar precisariam ter a mesma estrutura, então, exigência pouco prática de ser feita, que as pessoas tenham mesmo pacote de programas, de servidores, de acesso. Mas a gente tem informação que ela renda fruto, a possibilidade que nós vemos como mais viável é de permitir que os pesquisadores venham até aqui, chamá-los, convidá-los, temos interesse em convidá-los para que eles usem essas informações para transformá-las em textos e documentos acadêmicos, em propostas, em qualquer forma de indicador que seja possível. Então, ele assim que tiver completamente concluído ele pode sim e a gente já está começando a ver isso, ver possibilidade de uso dessa informação, que foi colhida, foi tratada, armazenada e solidificada, para que pudesse ser usada.
P/1 – E quanto a produção de algum guia de tornar essa metodologia mais palpável?
R – Você diz com relação a...
P/1 – Metodologia mesmo. Construir um guia de visitas, esse guia vocês ainda utilizam? Esse pequeno material que você disse que começaram a produzir, se vocês continuam a utilizar? Se vocês vão renovar?
R – O guia de primeira leitura que a Carlona fez está bem ultrapassado, foi uma coisa muito pontual que ela fez quando estava saindo, estava prestes a sair, ela elaborou isso para que as pessoas que viessem pudessem ter uma ideia de como era a primeira leitura, mas o processo de seleção mudou e essa questão de primeira e segunda leitura caiu por terra, antes o projeto era lido duas vezes por cada analista, mas não faz mais sentido isso.
P/1 – Por que não dá tempo?
R – Não é que não dê tempo, porque na verdade valia mais a pena quando os analistas eram todos externos, para que eles não precisassem levar um bocado de projetos, mas quando os analistas passaram a estar aqui dentro. Aliás essa foi uma das mudanças que aconteceram quando eu voltei para cá, quando eu voltei para cá a equipe da Brazil Foundation passou a ser mais responsável por tudo que era feito aqui, a seleção de projetos não eram mais para analistas externos, é para equipe da Brazil Foundation fazer. Então, hoje nós temos os analistas aqui dentro da Brazil Foundation para os projetos que recebemos. Então, essa primeira leitura que era para facilitar o trabalho de quem leria depois, que recebia, eu não sei se era por projeto, por hora, por dia, então, essa primeira leitura fazia todo sentido, agora nós ainda temos tempo para ela, mas talvez ela não faça muito sentido, porque quem está aqui dentro já vai analisar o projeto, então, não precisa fazer uma triagem, que depois ele mesmo vai pegar o resultado dessa triagem para analisar melhor. Então, esse material da primeira leitura ele existe, ele está guardado, ele foi de grande ajuda, mas eu acho que não representa mais o nosso trabalho. Uma coisa que eu sempre percebi na Brazil Foundation, mas acho que eu demorei para conseguir verbalizar isso, era que o trabalho aqui era de apagar incêndios, as coisas aconteciam você corria e fazia, acontecia você corria e fazia, a pouco tempo passou a ter planejamento, eu acho que boa parte do que a gente faz e foi construído é oriundo desses incêndios apagados. Então, falta o método, falta a categorização e a sistematização de tudo que a gente faz, transformar a nossa prática em algo registrado e se tornar um legado, caso caia uma bomba nesse prédio e exploda tudo, e as pessoas que executam as funções desapareçam da face da terra, que alguma coisa permaneça. Quando a Carlona saiu foi um choque para a gente, ela era voluntária, mas ela vinha todo dia, ela era analista de projeto também na área de saúde, saiu, avisou que ia sair, saiu sem traumas, mas foi complicado, porque era uma função estratégica que estava com uma voluntária, que nada estava sistematizado, então, a gente precisou correr para resolver esse buraco, mas que o grande barato agora é a gente sentar e falar espera aí, vamos transformar isso em algo que seja possível de ser replicado, de ser passado em diante, para que possa ter uma maneira de fazer, um modus operandi, que seja usável e que seja possível para qualquer pessoa que venha, que se interesse a utilizar. Então, esses instrumentos que a gente tem, eles ainda são muitos salpicados.
P/1 – Então, você tem planos de sistematizar esse conhecimento de vocês?
R – Já são muitos processos de seleção feitos sensorialmente, está na hora de fazê-los com o tom profissional que a gente tem, mas de forma que isso possa ser explicado, possa ser dito, transformado em exemplo, talvez transformado em fazer organizado e não um simples fazer acontecer cotidiano, sem que isso tenha sido registrado, eu acho que a gente já passou desse patamar, de apagar incêndios.
P/1 – Já tem muita experiência acumulada.
R – É.
P/1 – Carla queria que você me contasse um pouco o que foi o encontro de Itatiaia? Me conta um pouquinho com é que é? Sua proposta, seu objetivo? Como é que você vê o resultado de encontro?
R – Em Itatiaia foi o encontro de seleção dez anos, porque esse ano a Brazil Foundation completa dez anos, e o interesse foi levar uma proposta que a gente selecionasse projetos, não projetos, organizações que já tivessem sido apoiada por nós em algum processo de seleção, para que essas organizações fizessem junto com a gente uma sistematização de suas metodologias, também a análise da sua trajetória e memória institucional. Esse mesmo trabalho que as organizações farão, nós fazemos também esse ano, eu digo que é o momento terapia da Brazil Foundation, sentar no divã e pensar de onde viemos, o que somos e para onde vamos. E aí, vamos ver depois de quantas sessões no divã a gente resolve todos esses entraves existenciais nossos, que todo mundo tem, toda organização tem, a gente está nessa secura por organização e por entendimento, eu acho que isso é resultado de uma sede coletiva por mais entendimento sobre a própria prática, um momento de sentar, de se analisar, e pensar tudo que é importante para você e a organização, nesse momento em diante. Eu acho que o momento de Itatiaia foi uma prévia disso, ou talvez uma celebração dessa ideia, ainda que não tenha sido a conclusão, foi o começo, mas já é uma celebração desse esforço. Juntamos as organizações, lá fomos nós morro acima e chegamos lá no meio dos macacos, das cobras (risos) e foi bem legal a gente ficou acho que quatro dias, quatro dias, o meu problema são os números, nesses quatro dias as organizações ouviram sobre a proposta, a gente acredita que o que elas tinham de dúvidas sobre a proposta, não sobre a execução das tarefas, sobre a execução de tarefas as dúvidas sempre vão existir, mas sobre o cerne da proposta eu acho que naquele dia ficou claro para todo mundo, foi um momento terapêutico coletivo, todo mundo se inteirou do que faria ao longo desse ano, se inteirou da importância disso, que eu acho que é o mais importante, você atribuir significados positivos ao que você faz, eu acho que em Itatiaia começou a centelha para fogueira feita ao longo do ano. Então, esse momento de Itatiaia foi muito bom para isso, foi um ritual de iniciação para o projeto de dez anos.
P/1 – Você já pode dar sua avaliação de como é que está? Do trabalho da Brazil Foundation ao longo desses anos, como é que você avalia?
R – Eu acho que eu falei aos poucos no meio de tudo que falei hoje, mas se é para colocar num resumo a minha avaliação é que fizemos muito, pouco em relação a tudo que é necessário, mas muito em relação a que uma pessoa sozinha poderia fazer, e coletivamente fizemos bastante. Tudo começou de uma forma bem simples e sonhadora e continua sendo simples, porém mais elaborada e agora é o momento de colocar o pé no chão, continuar com a cabeça nas nuvens e fazer acontecer, continuar tudo o que já é feito, aprimorar, aprender o que já aconteceu, saber atribuir significados a isso, analisar a trajetória, e eu acho que se tivesse que dizer alguma coisa sobre a Brazil Foundation ao longo desses dez anos, eu diria que vir para cá foi uma coincidência extraordinária de nascimento profissional meu e de fortalecimento e potencialização da Brazil Foundation, me sinto muito privilegiada de ter vindo para cá no começo da Brazil Foundation, e que esse começo dela tenha coincidido com o meu começo profissional também, parece que, às vezes, parece que somos gêmeos siameses (risos) tivemos, não a mesma trajetória, mas os mesmos laços da questão temporal muito parecida, mas a minha avaliação é que depois que eu tiver avaliado bem a Brazil Foundation eu vou poder adiantar um pouquinho a avaliação que faço sobre mim mesma.
P/1 – Me conta uma história engraçada, alguma história que a tua memória traga. Eu sempre faço essa pergunta em todos os projetos, mas aqui tem sido muito corrido, quase tenho conseguido fazer. Que história que você se lembra?
R – Eu não lembro. História engraçada aqui na Brazil Foundation?
P/1 – Ligado ao trabalho, ligado a visita? Uma que a tua memória te traga?
R – Não me vem nada na memória, momentos engraçados para mim eram mais aqui no escritório mesmo, visitas engraçadas eu ainda não tive. Mas momentos engraçados no escritório aqui sim, a equipe da Brazil Foundation variou muito, mas em alguns períodos tinha umas pessoas absolutamente hilárias aqui dentro. A Carlona, por exemplo, a Carlona passava o dia fazendo piada.
P/1 – Quem é a Carlona?
R – É a Carla Neto é porque tinha a Carla Neto e a Carla Lima, que sou eu, então, era a Carlona e a Carlina, era mais fácil para todo mundo, do que falar os dois nomes, ficava muito pomposo. Então, era Carlona e Carlinha, e a Carla Neto era absolutamente engraçada, ela colocava brilho no dia, muito bom. Eu não me lembro de histórias engraçadas ou curiosas.
P/1 – Que guarda com carinho?
R – Eu não lembro.
P/1 – Está chegando no final eu queria perguntar se tem alguma coisa que a gente não conversou aqui e que você gostaria de deixar registrado?
R – Não, acho que perguntou tudo que eu já imaginava que caberia na entrevista.
P/1 – Você está casada?
R – Não, solteira.
P/1 – O que é que você gosta de fazer nas suas horas de lazer também?
R – Eu gosto de andar, de comer, de movimentar, então, o movimento que for se andando, dançando, nadando, passeando, eu gosto, o movimento faz parte da minha vida é o que eu gosto de fazer em horas vagas.
P/1 – Queria perguntar se você gostou de ter participado?
R – Eu gostei de participar.
P/1 – Obrigadíssimo.
R – De nada.
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