BANCO DO GUARDA-CHUVA
Eu trabalhava no Banco Nacional de Minas Gerais, êta! Nome pomposo! Era o ano de 1968, as ruas fervilhavam de protestos estudantis e nossa turma queria muito participar das zonas e das confusões. Não importava muito a razão de lado poderia estar.
Eu já havia passado por isso trabalhando no Sindicato dos Taxistas desde os 14 anos e nas vésperas da revolução de 64, fomos intimados pela Diretoria a jogar e queimar panfletos no Campo de Santana. Era um caminho longo carregando papeis que para nós não fazia sentido, apenas eram ordens.
A polícia entrou no Sindicato e encontrou apenas funcionários cansados e perplexos. Eles mandaram a gente encostar na parede sob mira de armas e queriam saber onde estavam os dirigentes. Nós nem sabíamos de nós! Que dirá dos patrões.
Eu era o contínuo que naquela época tinha o nome bonito de Office Boy e fazia o trivial sob as ordens do Senhor Teixeira (Teixeirinha) e acima de mim ainda tinha o Sr. Novaes e o Luiz Carlos (todos funcionários), ou seja, eu era simplesmente mandado.
Os “homens” como todos se referiam aos policiais gritavam instruções e queriam respostas, nós, principalmente eu, nem tínhamos noção correta do que estava acontecendo.
Foi então que Teixeirinha saindo do bloco da parede disse ao policial que imaginávamos ser do DOPS: - Senhor, esse menino, apontando para mim, tem apenas 15 anos e é nosso funcionário, por favor libere para que ele possa ir para casa, a mãe dele com certeza deve estar muito aflita com todo esse acontecimento.
O policial então que vestia uma camisa amarela de manga curta me chamou e disse: - Menino, onde você mora? Respondi: - moro no Leme na Gustavo Sampaio. Ele então disse: - Garoto, voe para casa e nem olhe para trás e se voltar aqui dentro de uma semana vou levá-lo para a cadeia.
Dito e feito. Saí dali correndo e entrei no primeiro ônibus para a zona sul com desejos de sumir para sempre. No caminho fiquei preocupado...
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Eu trabalhava no Banco Nacional de Minas Gerais, êta! Nome pomposo! Era o ano de 1968, as ruas fervilhavam de protestos estudantis e nossa turma queria muito participar das zonas e das confusões. Não importava muito a razão de lado poderia estar.
Eu já havia passado por isso trabalhando no Sindicato dos Taxistas desde os 14 anos e nas vésperas da revolução de 64, fomos intimados pela Diretoria a jogar e queimar panfletos no Campo de Santana. Era um caminho longo carregando papeis que para nós não fazia sentido, apenas eram ordens.
A polícia entrou no Sindicato e encontrou apenas funcionários cansados e perplexos. Eles mandaram a gente encostar na parede sob mira de armas e queriam saber onde estavam os dirigentes. Nós nem sabíamos de nós! Que dirá dos patrões.
Eu era o contínuo que naquela época tinha o nome bonito de Office Boy e fazia o trivial sob as ordens do Senhor Teixeira (Teixeirinha) e acima de mim ainda tinha o Sr. Novaes e o Luiz Carlos (todos funcionários), ou seja, eu era simplesmente mandado.
Os “homens” como todos se referiam aos policiais gritavam instruções e queriam respostas, nós, principalmente eu, nem tínhamos noção correta do que estava acontecendo.
Foi então que Teixeirinha saindo do bloco da parede disse ao policial que imaginávamos ser do DOPS: - Senhor, esse menino, apontando para mim, tem apenas 15 anos e é nosso funcionário, por favor libere para que ele possa ir para casa, a mãe dele com certeza deve estar muito aflita com todo esse acontecimento.
O policial então que vestia uma camisa amarela de manga curta me chamou e disse: - Menino, onde você mora? Respondi: - moro no Leme na Gustavo Sampaio. Ele então disse: - Garoto, voe para casa e nem olhe para trás e se voltar aqui dentro de uma semana vou levá-lo para a cadeia.
Dito e feito. Saí dali correndo e entrei no primeiro ônibus para a zona sul com desejos de sumir para sempre. No caminho fiquei preocupado com meus amigos e chefes. O que poderia acontecer com eles? Soube depois que ficaram retidos por 24 dentro das dependências do Sindicato e depois liberados, já que ninguém ali era responsável por nada e não podiam responder por ações dos dirigentes sindicais que haviam escafedidos antes da chegada da polícia.
Bom, isso também e história e tem nuances e interpretações que alguém poderá contar um dia. Voltemos ao Banco...
Lembro que trabalhava no atendimento ao público, sendo a Chefia exercida para atendimento por Dona Dirce, sisuda, porém justa, e que eu era o orgulho da minha mãe, estudava a noite para melhorar de vida, fazer faculdade e era bancário, ou seja, o modelo ideal de filho para classe média pobre da época.
Uma ocasião eu voltava do almoço quando começou uma correria na Avenida Presidente Vargas com policiais a cavalo perseguindo baderneiros e estudantes que protestavam contra o regime. O Banco cerrou as portas por ordem da chefia da gerencia e quem estivesse lá fora que procurasse se defender ou fugir da melhor maneira. Tentei correr para a frente do Banco e encontrei a porta trancada e nem para mim eles quiseram abrir, pois certamente se assim o fizessem muitas pessoas também entrariam. Corri para a entrada lateral que era dentro do prédio número 509 e a portaria do edifício também estava trancada com as pessoas lá dentro presas sem poder sair e nós na rua sem poder entrar.
Um dos gerentes, muito brincalhão que sempre estava de bom humor e era bem visto pelos funcionários ao ver meu desespero na calçada e temendo que eu acabasse sendo agredido pela cavalaria, subiu rapidamente para o mezanino e abriu as janelas de vidro enormes provocando a entrada de gás lacrimogêneo que eram atirados a esmo em todas as direções. As pessoas começaram a passar mal, clientes desmaiaram e as portas foram abertas para que pudessem sair funcionários e todos aqueles que não aguentavam ficar no Banco.
Daí eu pude entrar e sofrer com o gás, porém livre das pancadas que corriam soltas na Avenida. Enquanto muitos xingavam esse gerente, claro que sem disposição para ser despedido do Banco, eu agradecia a interferência do Senhor Orbílio Peixoto que havia salvo o meu couro de pancada, muito jovem, tipo físico ideal para estudante e baderneiro que ficara intacto pela intervenção do amigo tendo apenas os olhos marejados pelo efeito da atitude dos policiais jogando aquelas latas de fumaça.
E o tempo foi passando, fui promovido a subchefe de seção e fiquei responsável pelas ações e outros documentos de clientes importantes de nossa Agencia, criamos um grupo de trabalho muito bom que se dispunha a resolver qualquer assunto ou pendencia dentro do serviço bancário.
Tínhamos o Serginho também conhecido como Brandãozinho, o craque de bola da filial e representante no Walmap, o Norberto um moleque disposto a qualquer coisa para sacanear alguém e o Gilson que era o mais responsável do grupo freando quando podia nossas nefastas ações. Nosso Chefe de seção um português branco por demais chamava-se Matias era também uma praga e estava sempre disposto a uma boa bagunça, mais tarde juntou-se ao nosso grupo o Auxiliar direto do Contador (chefe de serviço) o João Batista que também não era fácil para fazer estórias.
Um dia fomos avisados que o Contador fora promovido e em seu lugar deveríamos ter uma nova chefia geral, fomos apresentados a um enorme ser de cor negra, uma ótima pessoa, dono de uma paciência que vocês vão observar e compreender. Tinha aproximadamente uns dois metros de altura e era grande como “um mês de trabalho”, porém um coração de mãe e a boa vontade que somente Deus poderia dar.
Passados aquele período em que precisávamos conhece-lo melhor voltamos a nossas “artes” diárias que vou conta-las para que conheçam o time e suas peripécias.
O Matias tinha uma péssima brincadeira de passando por detrás de alguém que estivesse concentrado datilografando (termo muito antigo) um documento ou boleto de credito encher a mão aberta em uma porrada que pegava do pescoço para cima até a nuca. Não era nada que machucasse ou ferisse, porém levava sua cabeça em direção a máquina de escrever e invariavelmente você batia com o nariz no teclado provocando o riso de todos.
Um dia Matias estava preparando um recibo de grande valor e responsabilidade para um dos acionistas do Banco e concentradíssimo no trabalho para fazer a melhor apresentação possível. Quando me mostraram a oportunidade de vingança ideal. Me aproximei bem de mansinho e observado por todos caprichei na pancada naquela cabeça volumosa. Pelo susto e pela força empregada ele foi com corpo e tudo para frente caindo sentado no chão e jogando longe a cadeira de rodinha que estava sentado.
Levantou-se de um salto e vermelho como um camarão partiu para pegar a “gracinha” que havia ultrapassado todos os limites incluindo o de perigo de vida. Quando vi aquela massa branca enorme sair do chão pulei o balcão que separava o atendimento entre cliente e funcionários e ele veio em minha direção disposto a fazer o mesmo para me pegar na porrada.
Salvo fui pelo Sr. Bené nosso contador que subia a escada de frente para o balcão que freou as intenções assassinas do Matias. Dali fomos chamados a sala do nosso Chefe de Serviço que nos aplicou um sermão digno daqueles feitos na Montanha que ouvimos medrosos pensando que talvez fossemos postos na rua, escapamos dessa.
De outra feita, Norberto estava sentado no colo de Gilson fazendo milhões de palhaçadas quando Sr. Bené entrou no espaço e ao ver aquilo perguntou o que estava havendo e todos responderam como tivesse sido combinado: - eles estão brincando de ventríloquo. A gargalhada foi geral. Novamente estávamos na sala da Chefia ouvindo sermão.
Um mês dedicado as festas juninas, eu e Norberto compramos caixas de estalinho para colocar na escada interna (dos funcionários) que ligava o atendimento público a sobreloja. Espalhamos em todos os degraus sabendo que essa escada por ser interna era sempre subida ou descida de maneira bem rápida, pois envolvia alguma questão urgente. Colocamos os estalinhos e entramos no banheiro ao pé da escada para observar o acontecimento e a cara da vítima.
Quando começamos a ouvir os primeiros estalos saímos do banheiro com cara mais inocente possível e vimos dois metros de homem negro com a cara mais branca que sabão de coco descendo atabalhoadamente os degraus, mais honra seja feita ele apoiado pelas paredes conseguiu ficar de pé apesar do susto imenso. Imediatamente fomos levados por um furibundo Contador a sala de sermões que por duas horas falou sobre a nossa irresponsabilidade.
E milhões de outras travessuras que aprontamos como adolescente que já não éramos mais.
Porém, a mais grave não posso deixar de contar: estávamos todos reunidos esperando uma liberação da Tesouraria da Agencia em fechamento de caixas de expediente para em caso de diferença na grade pudéssemos entrar em ação, quando alguém trouxe dentro de bolsa de papelão um lindo e trabalhado rifle Winchester 44 em contrabando dos Estados Unidos, vindo de Utah. Ficamos todos admirando aquela arma que conhecíamos de filmes de faroeste e ela foi então passada de mão em mão, examinadas por nós que tecíamos comentários e fazíamos comparações tolas que envolviam nosso parco conhecimento.
O nosso Contador também participou do exame e dos comentários, sabíamos por observação que a arma estava completamente descarregada e que os projeteis estavam em caixas separadas e que também foram examinadas por todos. Aquilo circulou diversas vezes nas mãos de todos os presentes. Em uma última volta recebi a arma e após olha-la mais uma vez e na frente de todos chamei o “Seu” Bené que distraidamente havia voltado sua atenção para os documentos que estavam na mesa aguardando despacho.
Disse eu: - “Seu” Bené, ele olhou!
Eu então dei um passo para trás já mirando e disparei uma arma vazia.
O susto foi tão grande que aqueles enormes quilos voaram jogando para os lados cadeira, mesa documentos e ele foi bater de costa na junção das janelas que davam para a Avenida Presidente Vargas. Se a janela tivesse aberta ou se ele não se tivesse chocado exatamente nos fechamentos dos vidros teríamos um corpo caindo na calçada espalhando vidros e provocando o mais grave acidente que se teria notícia.
Eu fiquei branco como cera e compreendi a besteira que havia feito, não houve risos, apenas olhares perplexos que se transformaram em desaprovações imediatamente. Todos se voltaram primeiro para a vítima e depois para mim, um trapo com um brinquedo irresponsável nas mãos.
...
Daí o tempo passou e nosso Chefe de Serviço foi promovido para o Departamento de Fiscalização Geral do Banco, em seu lugar aproveitaram seu sub contador imediato Dorival, ele era do tamanho do Sr. Bené, mas uma pessoa calada que não se envolvia em nossos maus feitos, não emitia opinião e fazia muito corretamente o trabalho, ao contrário do seu auxiliar imediato que era o João Batista que pertencia ao nosso grupo de trabalho e parceiro das zonas e bagunças praticadas.
Uma das que eu ia esquecendo; o João fez durante o expediente um estilingue com aqueles elásticos de envolver dinheiro e acertou-me na lateral do rosto. Imediatamente armei-me do mesmo elástico esperando uma oportunidade para a devida devolução.
Tentei acertar o João na hora em que ele parecia estar bem distraído, ele por sorte abaixou a cabeça para buscar um documento que havia caído ao chão e o elástico foi direto no olho direito do ainda nosso Chefe de Serviço.
Ele olhou-me com aquela vontade de me enviar para o Departamento Pessoal e fez um gesto para que eu fosse imediatamente até a sua mesa. Levantei-me como um condenado a morte e ele disse:
- Quero saber se você realmente teve o desejo de acertar-me.
Eu tremulo respondi: Não Senhor. Eu queria acertar o João, mas ele abaixou-se e então acertei involuntariamente o Senhor, por favor me perdoe.
Ele vendo meu desespero estampado no rosto, vou perdoa-lo porque sei que eu não era o alvo, se fosse você teria ultrapassado todos os limites e então a sua demissão seria inevitável.
Pode-se questionar como uma pessoa aturava tanto de um grupo de funcionários que sempre estava aprontando. Mas, quando ele estava para sair e ir para a Fiscalização houve uma festa de despedida na Agencia e reservadamente ele reuniu nosso grupo para dizer que éramos crianças em busca de juízo, mas que éramos um grupo forte e trabalhador, que não tínhamos hora e nem reclamações para quando se fizesse necessário o trabalho.
Que apesar do Banco não pagar horas extras estávamos sempre a postos e dispostos e fazer funcionar nosso serviço, passando muitas vezes do limite de dedicação que se podia pedir a um funcionário. Que diversas vezes saímos da Agencia as quatro da madrugada após o fechamento correto da grade e que as oito da manhã estamos todos lá de volta para mais um dia de labuta participando dos serviços como se nada tivesse acontecido.
Que esse grupo era único e que qualquer um se sentiria honrado e feliz em tê-los como colaboradores.
Um destaque quero dar ao amigo que mesmo fora do Banco virou um grande parceiro participando de minha vida e das minhas amizades fora do sistema, ele chamava-se José Antônio, cujo pai possuía uma fazenda no interior de Minas Gerais e que tivemos o prazer de visitar com um grupo grande de funcionários de nossa Agência ficando todos na cidade de Sacramento, lugar onde os homens andavam de revolver na cinta como nos filmes de faroeste e que nos parecia distante da lei e da ordem como conhecíamos.
Nosso grupo começou a casar, ter filhos e as responsabilidades começaram a pesar para cada um de nós. O novo Contador apesar de ser nosso amigo, talvez não aturasse metade de nossas ações e assim foi por um tempo.
Norberto foi transferido, Gilson também foi para perto de casa, João promovido e o próprio então Chefe de Serviço foi para a Agencia Lido no rodizio que era promovido pela Fiscalização do Banco. Contadores, Tesoureiros e Gerentes de Departamento sempre estavam em movimento.
Eu, em tempos anteriores havia sido recomendado para a então criada Nacional Seguros em cargo de Chefia, mas na entrevista na Avenida Rio Branco descobriu-se que meu Diretor direto e responsável pela atuação da nova seguradora tinha o mesmo nome do meu pai, coincidentemente com certeza. Então fui preterido por simples problema de discriminação ou de medo deles em preconceito. O que vão dizer as pessoas ao ver na ficha o nome do pai deste funcionário. Coisa típica de uma época de incertezas.
Dorival, o novo Contador da Agencia Lido, requisitou-me junto ao Departamento Pessoal do Banco para ser o seu direto vice Chefe de Serviço o que representava um ganho maior para o agora noivo com pretensões para Chefe de Família. E assim começava uma nova etapa onde todos os aprendizados da Presidente Vargas incluindo as travessuras seriam úteis.
Exerci as funções dentro do esperado, superando as expectativas em algumas ocasiões e um dia recebi a notícia que meu Chefe estava sendo designado para outra Agencia e que um novo Contador nos seria apresentado nos próximos dias.
Certo dia então em que eu já gozava da admiração de nosso Gerente Geral da Agencia Lido Senhor Carlos Heitor Gitirana de Montezuma Lins, um cara sensacional que modificou todo o tipo de pensamento dentro da filial e que trouxe uma irmandade tão grande que tornou nossa casa um verdadeiro lar de trabalho. Estava eu trabalhando em minha mesa ao lado da do Chefe de Serviço quando ele me chamou e dizendo meu nome, complementou: - Esse é seu novo Contador a partir de amanhã, estou me retirando e vou apresenta-lo a todos para que saibam que agora vocês têm um novo Chefe de Serviço.
- Ele se chama Carlos Alberto de Souza e veio de nossa Agencia Abolição, espero sua colaboração. Já conversamos sobre você e ele gostou muito de saber sobre o até aqui meu braço direito.
Levantei os olhos e vi na minha frente o cara que alguns anos antes eu havia desafiado dentro das dependências da Fiscalização na frente do Sr. Fernando – Chefe Geral e coordenador de todos os Contadores. Engoli seco e disse: - Muito prazer! Conte com a gente. Nossa turma é muito boa!
Essa estória começou quando do fechamento do recebimento das guias do INSS em todo o Estado, passavam pelo nosso setor e eram somadas, fechadas com a guia de encaminhamento que vinham das Agencias e depois levadas ao Órgão cliente acompanhadas de um cheque administrativo tendo um prazo muito curto entre o fechamento e o dia seguinte a liquidação, sabendo-se que durante um mês o Banco havia usufruído daquela vultosa quantia sem o pagamento de qualquer ônus ou juros.
Neste dia invariavelmente nosso expediente terminava lá para meia noite e ameaçava de vez em quando ultrapassar por falhas e diferenças nas guias de encaminhamento. As vezes vias em duplicidade ou mesmo faltantes nos causavam problemas que só descobriríamos muito tarde da noite.
Neste caso em questão as guias vieram certas, porém no dia seguinte chegou uma nova guia encaminhada pela Abolição que com certeza havia sido descoberta em diferença de caixa do dia anterior e encaminhada como coisa normalíssima. Tratava-se de um valor irrisório, mais que empurrava para alguém que aceitasse a responsabilidade de recolher as multas e juros junto ao órgão oficial que era o cliente.
Um dia inteiro de razões e justificativas entre Contadores das duas Agencias, nós controladores e eles recebedores acabou por me fazer ser chamado a sala do Sr. Fernando acompanhado do Sr. Bené. Em lá chegando fomos questionados sobre os procedimentos e a responsabilização da falha.
Expliquei todo o procedimento e complementei dizendo que no malote do dia seguinte, ou seja, dois dias após o pagamento final recebemos a guia em questão e a devolvemos por não ser mais possível colocar aquele valor em pagamento e que o recebimento seria para nós o reconhecimento de uma falha que não era nossa.
A Fiscalização ouviu os dois lados e determinou que a guia fosse refeita com multa e juros por parte da Agencia Abolição dando por encerrado o problema. Saímos da sala e o Carlos Alberto me disse entre sorrisos que um dia ele seria meu chefe e que eu veria como se faz um problema.
Respondi também brincando, mais falando sério que ele jamais seria meu chefe, pois eu trabalhava no centro e daí somente iria para zonal sul onde eu residia, nada tendo perdido na chamada zona norte da cidade.
E agora ei-lo na minha frente como meu Chefe de Serviço, eu diretamente subordinado.
Fui nesse dia para casa preocupado com o meu futuro, imaginei que ele sabendo quem eu era e do fato acontecido me colocaria a disposição do Departamento Pessoal e que uma nova agencia me seria designada. Sabia que não passaria disso, mas mancharia de alguma forma meu curriculum uma vez que ele teria que justificar a medida tomada e com certeza não seria com palavras elogiosas. Decidi confrontá-lo na primeira oportunidade já que o ditado diz; “perdido por 10 perdido por mil” o efeito da derrota será o mesmo.
No dia seguinte cheguei normalmente cedo para os fechamentos da compensação de cheques e logo depois ele chegou. Fiz meu trabalho além de apresenta-lo a todos que em dúvida vinham falar comigo já que ainda não se sentiam à vontade na frente do novo Chefe.
À noite, após os fechamentos e tendo um dia muito tranquilo, atrapalhado apenas pela presença constante do Carlos Heitor que queria saber dos andamentos do departamento e da aceitação do novo Contador pelo pessoal, Carlos Alberto me convidou para tomar um chope no bar ao lado da agencia para conversarmos sobre o primeiro dia dele e suas impressões.
Essa era a minha oportunidade de clarear os assuntos e firmar uma posição sobre aquele fatídico tema do passado.
Carlos Alberto começou perguntando sobre cada um daqueles funcionários e minha impressão pessoal sobre o time que ele teria em mãos. Fui dando de bom grado as informações que ele precisava e não demorou muito ele começou contando a estória na versão dele que havia sido vivida com a central Presidente Vargas. Antes que ele pudesse falar qualquer coisa que levasse a um impasse ou terminasse em ofensa irremediável me antecipei e disse que o fato havia ocorrido comigo e que eu era aquele funcionário que havia estado do outro lado da mesa dentro das dependências do Setor de Fiscalização. Ou seja, o problema a que ele começara se referindo havia sido um pagina vivida entre eu, ele e o Sr. Bené.
Depois daquele dia em comentários dentro do Banco eu soube que ele era o goleiro do time principal do Walmap onde meu funcionário era o ponta esquerda e que a fama de brigão e arranjador de caso era publicamente notória. Isso não me preocupava porque eu jamais seria parte do time de futebol e jamais trabalharia longe de minha casa, ou seja, na zonal sul do Rio de Janeiro.
Depois dos esclarecimentos e posicionado pelos fatos a conversa ficou muito amena e Carlinhos como mais tarde passamos a chama-lo teve a hombridade de pedir desculpas e ficamos amigos sem ressentimentos.
Não tínhamos ainda quinze dias da posse do novo Chefe, quando Carlinhos me chamou e avisou na cara de pau que havia conhecido uma cliente, e que estava indo com ela para um motel na Barra da Tijuca, que voltaria antes do fechamento da Agencia, deixando os assuntos sob a minha responsabilidade que em caso de necessidade eu deveria dizer que ele estava em visita a um cliente com um problema grave acompanhando um gerente de produção. Ficou estabelecido que em qualquer tempo ele ligaria para saber de ocorrências que pudessem abalar a ausência e estas seriam relatadas.
Aproximadamente as onze horas recebi uma ligação do Departamento de Fiscalização – Sr. Fernando procurando pelo Carlos Alberto, expliquei que ele estava em visita a um cliente acompanhando um dos gerentes e me coloquei a disposição para resolver qualquer questão que se fizesse presente. Ele foi muito rude dizendo que queria falar com o Chefe de Serviço e não com o Auxiliar e que o lugar do Contador era a Agencia não sendo possível que ele se ausentasse do trabalho por nenhum motivo. Argumentei que se tratava de uma emergência e que qualquer que fosse o problema eu estaria apto e disposto a resolver e que assim que ele chegasse eu o posicionaria para que respondesse a Fiscalização.
Tentando de alguma forma responsabilizar-me pela ausência da Chefia, o Chefe Geral da Fiscalização bateu abruptamente o telefone desligando e deixando-me atônito. Passadas duas horas mais ou menos recebo uma ligação do Carlinhos querendo saber se tudo corria dentro da normalidade e se havia algo que ele pudesse saber ou fazer.
Eu estava muito abalado pela conversa que havia tido com o Sr. Fernando e acreditava que algo de muito ruim iria advir daquele malfadado telefonema. Mas por outro lado me achava cheio de razão e sabendo que aquela pessoa que havia julgado o caso da guia de INSS no passado não poderia haver mudado tanto e que em uma nova conversa e de frente com o Carlinhos tudo se esclareceria.
- Bom Carlinhos, aqui tudo bem e dentro das conformidades exigidas. O Carlos Heitor perguntou por você eu disse que você estava fora, mas não precisei dizer onde e ele também não perguntou. A única coisa estranha é que recebi uma ligação muito perturbadora do Sr. Fernando do Setor de Fiscalização e ele queria falar com você. Expliquei que você estava fora a serviço da agencia, porém ele pareceu ficar transtornado dizendo ser mais do que obrigatório sua presença aqui. Tentei contornar e me coloquei mais de uma vez a disposição dele para solucionar qualquer problema, mas ele não quis ouvir nenhuma ponderação e terminou batendo o telefone na minha cara. Acho que você deveria ligar para ele de preferência daqui de dentro.
Uma gargalhada estrondosa via telefone me sacudiu: - Cara, tu és um otário, eu estava no telefone falando com você e nem percebeu a minha voz. Fiz um teste para saber se estavas comigo e descobri que você é um cara legal. Valeu! Agora posso dizer que somos amigos. Mais tarde estarei na agencia.
Bom, o susto foi grande mais o efeito foi maior. Acabaram-se qualquer desconfiança e viramos grandes amigos. Jogamos muito futebol pela Agencia Lido onde todos participavam, tínhamos o goleiro do Banco e um craque de bola que se revelou no meio da agencia. Rodrigo surgiu e comandava o time em jogos de campo e futebol de salão. Montamos um local na praia para voleibol e virou referência para todas as agências da zona sul. Nossa diretoria regional atendendo pedido do nosso gerente geral financiou o material para praia, camisas de futebol e bolas.
Todos jogavam e queriam jogar, do contínuo até o Gerente de Departamento, as meninas jogavam na praia e se misturavam com todos trazendo maridos e namorados. Era na verdade uma grande família.
No Carnaval daquele ano montamos um bloco e os ensaios passaram a ser no bar ao lado da agencia. Começava assim que se fechava o movimento e ia até que último deixasse o lugar. Tínhamos todos os instrumentos de percussão e era muito animado. Esse mesmo bloco e seus ritmistas fizeram meu casamento meses depois, onde eu saí de Mestre Sala e noiva de Porta Bandeira (mas isso é outra estória).
Mas a onda leva e a vida continua, Carlinhos foi designado para outro Departamento e tínhamos outro Contador. Esse novo Chefe Sr. Antônio Carlos tinha vindo da Rio Branco, muito magro e alto estava sempre de paletó e engravatado passando um ar sério. Ele não atrapalhava nossa diversão e brincadeiras, mas também não participava.
Lembro dele apenas em uma ocasião em que ele chamando a atenção de um funcionário dizia: - Para a frente menino, anda, anda, vamos anda... e o mesmo respondeu: - Se eu andar mais fico em impedimento...
Tínhamos na agencia uma brincadeira que era padrão. Na entrada de funcionário novo e sabendo que era o primeiro emprego. Pedíamos durante o expediente que ele fosse pedir na gerencia a conta física da “Fábrica Nacional de Pneus para Navios” e lá ia o coitado ser mandado de lado a lado em todas as dependências inclusive uma vez para o bar ao lado, atrás da cartolina amarela de lançamento da conta. Era hilário ver a cara de sofrimento da vítima e a gozação do pessoal.
Uma outra brincadeira que me lembro era ao fim do expediente pedir que o novo funcionário fosse no subsolo onde ficava a Tesouraria buscar a máquina de achar diferença. O pessoal invariavelmente depois de fazê-lo esperar por algum tempo entregava ao novato uma daquelas que continha um painel de teclas enormes e pesada, era uma “Burroughs” de somar ou autenticadora de recebimentos, ela possuía uma alavanca lateral, era feita em ferro e metal, pesada, possuindo um painel de noventa dígitos, além do que, sendo grande precisava ser carregada no peito pela vítima. Subir as escadas carregando aquele monstro que se dizia portátil era no mínimo um sacrifício muito engraçado de se ver.
Mas aprovado nos testes e aceitando bem as gozações o novo amigo era integrado ao grupo e podia imediatamente fazer o mesmo com aqueles que estivessem chegando. Nós éramos felizes e não sabíamos!
Das brincadeiras que fizemos uma delas ficou célebre no nosso meio e como sempre buscou integrar o novo funcionário a nossa comunidade – Departamento Lido, tornando-o apto a zoar aqueles que chegassem depois dele.
O novo Contínuo já possuía alguns dias de trabalho e com certeza ouvira inúmeras vezes alguém pronunciar a palavra Walmap que na verdade era a sigla de Waldomiro Magalhães Pinto, pai do Presidente do Banco Nacional e dava também nome ao time de futebol amador que era patrocinado pelo Banco, também emprestava seu nome e símbolo as diversas equipes de futebol de salão e de campo, dando inclusive nome a vários campeonatos internos entre Agencias no Rio de Janeiro ou Brasil afora.
O funcionário Rodrigo um dos líderes na arte de zoar novatos pediu a este funcionário recém-admitido a buscar em outra Agencia a ficha de lançamento e movimentação do Sr. Walmap atribuindo-lhe inclusive um número de conta corrente.
Assim, pediu que o mesmo fosse até a Agencia Barata Ribeiro buscar tal documento uma vez que havia sido enviada para o Chefe de Serviço de lá por engano do Setor de Desconto e Cobrança.
O funcionário embora desconfiado foi ao nosso Chefe de Serviço – Agencia Lido – o também zoeiro João Lemos que o autorizou a ir buscar a ficha para atender à solicitação do Rodrigo, chamando-o a responsabilidade pela imensa falha.
Dito isso e vendo a saída do Contínuo em direção à Agencia, ligaram imediatamente para o Chefe de Serviço da Agencia Barata Ribeiro e o avisaram da troça armada pedindo ao mesmo que entregasse qualquer tipo de envelope e o mandasse de volta com a recomendação de guardar como se fosse sua própria vida a ficha em questão.
O funcionário que daremos o nome de Antônio ao adentrar no Departamento que ficava a aproximadamente dois quilômetros de distância indo a pé e andando bem rápido para cumprir a missão de forma a impressionar e agradar seu Chefe maior foi recebido com muitos sorrisos e de forma que soava bem acolhedora deixando-o bem à vontade e contente com a recepção por parte dos colegas de outro Departamento.
Mal sabia ele que avisado da troça preparada todos já se divertiam imaginando o final da brincadeira e receberam a vítima de braços abertos com simpatia e gozações veladas.
Assim, alguns já se preparavam para enviá-lo atrás da ficha de lançamento para outra Agencia sendo escolhida a Posto Cinco que ficava dentro de Copacabana, porém distante outros dois quilômetros. E com certeza a coisa iria crescer mais, já que ele fatalmente iria ser remetido para Agencia Posto Três, obrigando o pobre e inocente Antônio a caminhar pelo bairro sendo motivo de muita chacota.
Por sorte do Antônio, o Chefe de Serviço condoído dos exageros que a “peça” tomava não permitiu o prolongamento da brincadeira avisando o incauto que retornasse a Agencia Lido levando um envelope pardo fechado por fita gomada como se fosse a coisa mais importante de sua vida.
Imagine você que mora ou conhece a cidade e o bairro citado todo o trajeto que seria percorrido até a volta a sua Agencia de origem.
Lido, próximo à Praça Inhangá – Barata Ribeiro, próximo à Rua Figueiredo Magalhães de lá para a Agencia Posto Cinco à Rua Xavier da Silveira e Cinema Roxy – e na volta passar na Agencia Posto Três na Avenida Nossa Senhora de Copacabana e finalmente Agência Lido carregando tão precioso documento. Seria uma caminhada, suponho de mais de oito quilômetros atrás de nada.
Ao adentrar na Agencia o Antônio foi recebido com salvas e palmas de todos que trabalhavam no Departamento o que parecia ter sido um ato heroico realizado pelo agora batizado novo funcionário.
A estória termina, porém, tendo sido levada ao conhecimento do GD da Barata Ribeiro, ele telefonou para o nosso GD pedindo providencias e contando a ocorrência.
Nosso Gerente de Departamento –Sr. Carlos Heitor imediatamente programou uma reunião após expediente para esclarecer os fatos e talvez punir os culpados.
Levamos aproximadamente uma hora de “bronca” e diversas vezes ameaçados de demissão, uma vez que as brincadeiras haviam extrapolado todos os limites possíveis. Acredito que não fomos demitidos porque o número de envolvidos era muito grande o que fatalmente traria prejuízo a agencia expondo demais a figura do mandatário maior de nossa casa.
Levando então em conta a compreensão do Antônio, fomos perdoados após pedidos de desculpas, admitimos mais um funcionário que estava agora apto a fazer troça com aquele que chegasse em nosso Departamento, e fomos todos tomar chope no bar ao lado para celebrar a paz e a manutenção do emprego geral.
Das inúmeras brincadeiras e da necessidade de estar liberado logo após as dezoito horas para participar de jogos de raquete de mesa, o popular “ping-pong” - quando aproximávamos aquelas mesas de aço formando a quadra, instalávamos a rede e surgia de dentro das gavetas a bola e as raquetes surgiu a ideia de antecipar o fechamento com o somatório e confecção dos encaminhamentos a partir das dezesseis horas o que mais tarde foi adotado por todas as agências e tirou da madrugada muito chefe de família, alucinado para estar em casa. O Banco naquela época encerrava o expediente junto com o Ave Maria e problemas de fechamento sempre era um estorvo, principalmente para nós que queríamos estar livres para fazer o Carnaval da Agencia. Eu me lembro de saber de cor e salteado todos os sambas enredos das grandes escolas que eram cantados em nossas batucadas, em viagens de jogos e principalmente na praia do Lido.
Como não podíamos rejeitar clientes após a dezesseis horas o melhor caminho era fazer as guias e ir repetindo novas guias complementares contando que ninguém mais entrasse na agencia.
Nosso Gerente de Departamento fazia vista grossa para esse fato desde que nenhum cliente ficasse sem atendimento, afinal ele também era um participante ativo de nossas atividades recreativas.
Enquanto trabalhei com o Carlos Heitor, ele fazia na Candido Mendes Curso de administração e economia e eu em bloco separado fazia contábeis, ele então descobriu em que sala era o curso e passando pelo pátio gritava bem alto – AZAMBUJA! – e todos sabiam meu sobrenome, sabiam com quem ele estava mexendo. Então passei a dar o troco gritando o sobrenome que ele detestava, que era – GITIRANA! – Assim estávamos quites e sem ressentimentos. Mas no banco isso nem era ventilado para que não desse margem a desrespeito, afinal a fera era nosso Chefe Geral e representante da diretoria.
Mais uma vez nosso Chefe de Serviço foi trocado e nesse meio tempo, entre a saída de um e a chegada de um novo fiquei trinta dias sem chefia direta e tendo apenas o nosso amigo e Gerente Departamental como referência. Aumentaram as responsabilidades e o desejo de não deixar cair o padrão bem-conceituado que tínhamos. O “sacana” passava para a Diretoria do Banco a ideia de que acumulava funções e estava assoberbado de trabalho. Mas comigo ele tinha credito e muito credito.
E mais uma vez fui apresentado a um novo Chefe de Serviço, desta feita um atleta grande daqueles que malha em academia e tinha um Bugre vermelho como veículo de locomoção. Era a prato feito para nossa agencia, parecia ter sido encomendado. Me foi apresentado como João Lemos e assim ficou sendo chamado de Lemos da Yara. Yara era a esposa dele, uma morena bonitona que sempre estava na Agencia e que dava a maior força para nossas atividades extra trabalhistas. Pronto ganhamos de volta um poderoso aliado.
Se ele não era um bom futebolista, era um cara, digamos pau para toda obra e aproveitávamos cada feriado grande viajando, levando o futebol e nossa alegria em todos os lugares. Roberto outro craque da nossa seleção de campo e salão programou uma visita em um longo feriado para a cidade de São João de Nepomuceno e montamos uma caravana em ônibus privado que foi na época o maior sucesso dentro do banco sendo comentado durante muito tempo pela iniciativa e poder de congraçamento havido em um Departamento no Banco Nacional S/A – o banco do guarda-chuva e do jornal das oito horas da Globo. Outro craque do nosso time era o Rodrigo, um lourinho bom de bola e grande amigo de farra e sambas nos finais de expediente, ele tinha como namorada uma grande aliada nossa, a Celeste.
Um parceiro bom de trabalho e brincadeiras era o Moysés, de origem judia nada ortodoxa, topava todas as paradas mesmo que o dia fosse santo para a família.
Tempo bom passado no Banco onde tínhamos que conviver e sem deixar a peteca cair trabalhar e nos divertir.
Quando tudo parecia ser festa, fui chamado para uma reunião na Fiscalização e fiquei preocupado se não havíamos excedido os padrões de alguma forma. Tínhamos um ótimo conceito entre as demais agencias em nível de funcionários, muitos queriam vir trabalhar conosco, muitos frequentavam a praia em nossa barraca, mas a gente sabe que nessa hora tudo pode acontecer.
Lá chegando fui encaminhado desde a recepção do Setor para uma sala de espera e fiquei aguardando ser chamado. Para minha surpresa fui convidado a entrar em uma sala onde se encontrava meu Padrinho de Casamento Sr. Bené que me deu um longo abraço e disse: - estou sabendo das suas aventuras e do exemplo que é a agência Lido. Estou muito orgulhoso e te chamei aqui porque queria que você ouvisse um conselho que apenas eu posso dar. – Quando e se você tiver um funcionário arteiro e muito bagunceiro como você foi para mim, se um dia você tiver um grupo como aquele da Presidente Vargas, antes de demitir ou tomar atitudes lembre-se que ali pode haver um grande sujeito que não se pode perder.
Ele me levou até a Chefia da Fiscalização onde recebi a carta de apresentação como novo Contador – Chefe de Serviço da recém-inaugurada Agencia Posto Três em Copacabana. E que deveria me apresentar na proxima segunda feira ao Gerente de Departamento – Sr. Carlos Alberto.
Saí dali nas nuvens e fui correndo para contar para minha esposa a novidade da promoção e tive que fazer isso por telefone porque ela trabalhava em uma importante empresa de Marcas e Patentes e não havia como fazer isso pessoalmente na época.
Na segunda feira me apresentei como me foi ordenado e o Sr. Carlos Alberto que eu não conhecia antes me foi bastante simpático. Participei do fechamento da compensação e depois fui conhecer todos aqueles que seriam meus funcionários e colaboradores. Alguns eu já conhecia da barraca da praia no posto do Lido e a outros fui formalmente apresentado.
Senti uma certa resistência daquele que seria o meu auxiliar direto, ou seja, o vice chefe de serviço. Mas não dei muita importância, isso se resolveria com o tempo. Ele chamava-se Waldir, mas nós na praia o chamávamos de Canela, muito craque de bola e inúmeras vezes nosso adversário em campo de grama, futebol de salão e society e um dos armadores do time do Walmap era agora meu funcionário direto em quem eu deveria confiar e que dependeria para ter um bom serviço.
Soube que ele estava zangado pois achava que seria por direito a pessoa encarregada de gerir a parte contábil e administrativa do novo Departamento criado. E ficou mesmo decepcionado pela nomeação de outra pessoa que tinha de Banco o tempo que ele já exercia de vice em função de haver auxiliado inúmeros contadores.
Eu o convidei para uma conversa franca e decisiva para que não houvesse entre nós nenhuma interferência. Deixe-o expor suas razões e frustações e depois pedi que me ouvisse, ponderasse e toma-se a decisão que melhor lhe parecesse.
Expliquei que havendo eu passado algum tempo na Central Presidente Vargas havia assistido a presença de muitos ex jogadores do Walmap em posições muito abaixo do desejado em função do tempo que era requerido para estar à disposição do time de futebol. Muitos eram contínuos velhos e sem condição de maiores postos porque quando jogadores como ele desfrutavam de regalias que se pareciam boas tinham o grave defeito bloquear toda e qualquer motivo de promoção.
Como jogadores eles tinham regalias de em dias de treino ser dispensado das funções para estar no campo a tempo e hora do técnico. Que em dias e semanas de jogo em outro estado da federação ou cidades longínquas era preciso dispensa-los por dez dias ou mais. Que na verdade eram falsos bancários e sim atletas federados para honrar em campo o nome da agremiação a que pertenciam.
Mas que quando não mais interessavam ao comando técnico eram dispensados do campo e não tinham conhecimento e nem instrução para seguir na carreira bancaria. Assim após um período muito frustrante compreendiam que seriam eternos ex atletas em funções menores sendo esquecidos como atletas.
Que eu havia conhecido apenas dois ex atletas naquele mundo que haviam de certa forma alcançado algo de bom; Carlinhos que chegou a ser contador e depois deixou o futebol para seguir carreira e um antigo jogador de meio-campo que foi alçado a time profissional onde fez carreira e terminou a vida como técnico renomado de futebol. Sabendo que isso não representaria nada percentualmente em relação aos milhares que nada conseguiram ser de jogadores para outros postos.
Que ele deveria priorizar aquilo que lhe interessava em vida, continuar sendo conhecido como grande craque de bola ou a garantia de uma estabilidade em um emprego para sustento da esposa e seus filhos. Disse-lhe ainda que caso desejasse ser Chefe de Serviço em Agencia eu pessoalmente o recomendaria em futuras avaliações de minha responsabilidade, mas que aguardaria a expressa vontade dele e a dedicação que o cargo pedia.
Ele compreendeu o que lhe foi explanado sem meias palavras e falsas promessas e me disse que estava comunicando ao comando técnico de futebol o desejo de não mais integrar o quadro de atletas do Walmap.
Assim montamos um time de primeira linha no atendimento e na informação requerida pelo corpo administrativo e financeiro do Banco na agencia Posto Três.
Mais algum tempo e a Fiscalização precisou de uma pessoa que assumisse provisoriamente a agencia Posto Cinco por doença e impossibilidade de presença do Chefe de Serviço e eu então pude indica-lo para o exercício da função e ele correspondeu maravilhosamente ganhando a partir dali uma promoção que já se fazia necessária a merecida.
Bom! Eu agora fazia parte dos rodízios de Chefia nas agências e fui designado para a agencia Botafogo, que era muitas vezes superior em movimento e número de correntistas tendo dobrado seus números quando da incorporação do Banco Mercantil de Minas Gerais já no início da minha gestão neste Departamento.
Eu era o mais jovem Contador pelo menos no Rio de Janeiro e em reuniões, as velhas raposas que estacionaram na função não perdiam oportunidade de mostrar superioridade em comandos que haviam exercido. Porém, eu não me preocupava com isso. A experiência deles não era nem de longe a que eu havia adquirido desde a minha admissão no Banco Nacional de Minas Gerais S/A depois Banco Nacional S/A.
Certo dia o Gerente de Departamento da Agencia me chamou na mesa dele e me apresentou a um cliente que eu já conhecia por ter uma conta de grande movimentação que requeria uma atenção maior.
Ali mesmo o cliente autorizado pelo Sr. Ivan Rolim (meu GD na Botafogo) me fez uma proposta de emprego com salário três vezes maior do que eu poderia estar recebendo no banco para exercer a função de tesoureiro em empresa de engenharia. Ponderei que era um pai recente e que meu sonho era poder comprar um carro tipo popular para locomoção minha e da família, que se fosse possível ser despedido, naturalmente eu poderia levantar meus valores em rescisão e o Fundo de Garantia.
Agradeci a interferência e o reconhecimento havido e em alguns dias estava me desligando do banco para exercer novas funções mais condizente com as matérias que eram administradas na UERJ – Maracanã, onde eu fazia Ciências Contábeis e que muito poderiam me servir deste que deixasse a vida de bancário.
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