Eu era apenas una criança de dez anos que morava numa cidade pequena em Santa Catarina. A cidade é Três Barras.
Eu, uma criança, que nunca tinha visto uma televisão, os livros que eu lia eram os da escola, o contato que eu tinha com outras pessoas era com os colegas da escola, com a professora, durante o período de aula e meus pais e irmãos.
Um certo dia, na saída da escola, eu e minha irmã, como sempre, fazíamos o caminho para casa, passando pelo pátio da estação de trem. Durante o percurso vimos um senhor obeso dormindo no banco traseiro de um carro branco. As portas estavam abertas e a chave do carro no banco do passageiro, na frente.
Quando passamos pelo carro, vi a chave, o homem estava roncando. O que eu fiz? Silenciosamente, pedi pra minha irmã ficar quietinha, peguei a chave do carro e saímos em desabalada carreira.
O homem ouviu o barulho da chave e saiu gritando atrás de nós e falando:
- devolva minha chave suas @@@*^&&&.
Corremos mais rápido, atravessamos um rio, próximo à estação, numa pinguela de madeira e eu joguei a chave no rio. O homem viu isso, ficou lá e continuou nos xingando.
Por muito tempo eu e minha irmã não podíamos ver um carro branco que nos escondíamos rapidamente. O nosso maior medo era a mãe descobrir o que fizemos. Iríamos apanhar até dizer chega.
A mãe nunca descobriu e nunca mais vimos o dono do carro.
Depois de alguns meses eu e minha família viemos pra São Paulo.
A mensagem que quero passar é:
Como aprendi essa traquinagem se eu não tinha televisão, só lia os livros da escola e tinha pouco contato com outras crianças?
É claro que me tornei uma pessoa honesta. Professora aposentada. Feliz. Mas...as crianças fazem coisas que ninguém imagina.
Isso aconteceu em 1972.