Marilu Pia Lummertz Oleinski

Marilu Pia Lummertz Oleinski. Eu nasci em Canoas em 24 de outubro de 1976. Eu iniciei minha formação acadêmica com publicidade e propaganda. No decorrer do curso, me envolvi bastante com a área da arte. Já tinha um histórico de infância nessa área e comecei a perceber que a arte era um instrumento que poderia possibilitar a transformação social. Me aproximei do curso de Serviço Social, fui fazendo em paralelo ao curso de Publicidade e Propaganda e descobri, no final do curso, que eu era mais assistente social do que publicitária. Então, resolvi unir essas duas formações trabalhando na área social mesmo, direcionando o conhecimento da publicidade, unindo o serviço social e utilizando a arte como instrumento de transformação. Depois fiz uma especialização em Gestão da Responsabilidade Social que surgiu a partir da minha inserção como gestora na área social. O Centro Refap cidadão é uma parceria da Refinaria Alberto Pasqualini com a ACM, a Associação Cristã de Moços do Rio Grande do Sul. Eu tenho uma história na ACM desde quando era estagiária. Quando surgiu a parceria solidificada com a Refinaria, nós fomos convidados a desenvolver esse projeto “Refap Cidadão”. Eu fui a pessoa indicada pela ACM para coordenar esse projeto aqui na área da Refinaria. Isso foi no ano de 2005. Nós iniciamos o projeto aplicando uma pesquisa de perfil sócio-econômico na comunidade mais próxima da Refinaria, em uma comunidade aqui do seu entorno: a comunidade Navegantes do Município de Esteio. Com essa pesquisa, nós fomos identificando o perfil dessa comunidade e as suas necessidades, além da vulnerabilidade social. A pesquisa apontou várias expressões, desde a violência à precariedade do trabalho e crianças fora da escola. Uma série de informações foram levantadas. A vulnerabilidade dessa comunidade está direcionada pela precariedade do trabalho, que na verdade é uma realidade nacional, e tem muito a questão das crianças estarem na rua. Essa situação é muito latente nessa comunidade. Como ela é uma comunidade horizontal, ela é diferente das comunidades que nós estamos acostumados, o morro, as crianças têm uma circulação intensa na comunidade. Ao mesmo tempo, a comunidade tem a questão do tráfico muito velada. Se tu entrares hoje na comunidade, vais perceber uma comunidade muito organizada. No entanto, se a gente começa a participar dos trabalhos, começa a descobrir e obter informações que são bem comprometedoras para as crianças e para a comunidade como um todo. Hoje nós estamos com 120 crianças, atendendo o universo da escola. Desenvolvemos três modalidades de oficinas: a arte, que é bastante forte; o esporte, que é o nosso carro-chefe e o acompanhamento escolar. Além das oficinas, há o acompanhamento psico-social, através dos técnicos do Centro Refap. Nós atingimos um estado de maturação do Centro Refap, como nós temos avaliado junto à Refinaria. Precisamos avançar em algumas situações, mas aquilo que nós aplicamos com as crianças, até o momento, podemos dizer que obtivemos os resultados desejados, desde o aproveitamento escolar dessas crianças até a inserção delas em novos grupos sociais dentro da comunidade e a possibilidade delas conhecerem outras realidades fora da comunidade também – elas fazem inúmeros passeios educacionais dirigidos. Hoje, entendemos que o Centro Refap é um projeto que veio para ficar, porque já tem esse comprometimento com a comunidade e tem um resultado muito significativo. Somos referência na comunidade de apoio assistencial, se assim podemos dizer. O atendimento direto acontece atualmente para as crianças de 6 a 11 anos. O projeto é pensado para crianças até os 16 anos. As crianças que entraram conosco no ano de 2005, nós temos a projeção que elas continuem até os 16 anos no Centro Refap. Somado ao trabalho direto com as crianças, não podemos deixar de trabalhar com a família para garantir o impacto de nosso trabalho. As crianças absorvem conhecimentos e vivenciam outros espaços, mas retornam para o seu meio, para a família e para a comunidade onde elas estão inseridas. Então, é fundamental que a gente possa trabalhar com as famílias também, fornecendo informações, trazendo-as para o Centro Refap, aplicando outros métodos de intervenção junto às famílias para que elas possam crescer na medida do necessário, do possível, com as crianças. Nós trabalhamos com grupos operativos, grupos de mulheres especificamente, porque a representação ainda é da mulher nessa ligação com as crianças. Então, hoje temos esse trabalho que está sob a responsabilidade do serviço social e da psicologia do Centro Refap Cidadão. Esses profissionais desenvolvem semanalmente encontros com a família, trabalhando assuntos diversos, desde cidadania até a questão emocional dessas famílias. Esses assuntos são bastante vivenciados no grupo. Além disso, nós temos as reuniões que acontecem mensalmente para um grupo geral, no qual as famílias podem acompanhar o desenvolvimento da sua criança. Isso também reflete no nosso atendimento com essa criança. A partir do momento que a família participa, a criança se fortalece e esse é o nosso grande objetivo. Nós temos depoimentos de familiares que falam que a vida deles mudou pela participação no Centro Refap, pelas possibilidades que são oferecidas, desde as palestras até o simples fato de terem quem os escute, de ter profissionais que estão à disposição dessas famílias para ajudá-las a transpor tantas situações complicadas. Esse movimento faz com que as famílias possam sentir segurança e tenham em nós uma referência de apoio. Nós temos acompanhado muito de perto tanto o desenvolvimento da criança quanto o da família e nós podemos ver crianças que quando entraram no nosso projeto não falavam e estavam em escola especial e que hoje conseguiram se inserir numa escola regular, normal, conseguindo se colocar muito bem, obtendo a aprovação. Nós temos uma menina que iniciou o Projeto numa escola especial e ano passado teve a oportunidade de estar numa escola de ensino fundamental. Hoje, temos a felicidade de ter a sua aprovação escolar para o próximo ano. Além disso, há outras crianças que tinham problemas de relacionamento, de expressão e que foram avançando. Com relação às famílias, tudo é muito latente. Mas acabam identificando seus problemas e, por vezes, ficam agradecidas por tê-los trabalhado. Embora não seja esse o nosso objetivo principal. Na medida em que as famílias melhoram, os filhos melhoram também. – Associação Cristã de Moços – já tem a prática de avançar no atendimento até que nós possamos possibilitar, senão para todos, para uma parte desses, a inserção no mercado de trabalho, garantindo uma vida diferente da que eles têm hoje. A Refinaria, em parceria com a ACM, desenvolve o Programa Petrobras Jovem Aprendiz, que também está sob nossa responsabilidade. Atinge jovens de 16 a 18 anos, e caracteriza-se pela profissionalização desse jovem e sua preparação para o mundo do trabalho. Promovemos um encontro entre o Centro Refap e o Programa Petrobras Jovem Aprendiz. As crianças do Centro Refap já se espelham nesses jovens e desejam estar no Programa Jovem Aprendiz ou num outro programa que nós venhamos a desenvolver junto à Refinaria. Já se tem essa expectativa de promover um outro caminho para as crianças que estão no Centro Refap. E para a Refap é uma perspectiva de no futuro próximo ter a sua força de trabalho preparada desde a infância, tendo vivenciado o ambiente da Refinaria. É importante destacar que a Refinaria vive este projeto muito de perto. Nós envolvemos muitos profissionais da Refinaria na nossa ação. E eu não estou falando somente de logística operacional, eu estou falando mesmo de força humana, que se dedica e participa, desde uma festa que nós fazemos até algo que nós precisamos no dia-a-dia, nós temos a oportunidade de vivenciar isso junto aos funcionários da Refap. Isso é bastante importante. As crianças, por vezes, vêm também a este espaço, utilizando inclusive o auditório para projeção de filmes, palestras educativas. Isso é importante para eles vivenciarem esse mundo. A Refinaria é um lugar muito bonito, tem essa característica e tem o título de Refinaria Verde. Como é um ambiente muito agradável, as crianças realmente gostam de estar aqui. Até porque eles desconstroem um mito que a sociedade tem em relação a uma refinaria. As famílias também já vivenciaram momentos aqui nesse espaço e trabalham como multiplicadores de informações na comunidade. Para nós, isso é muito importante, para a Refinaria, sem dúvida, poder desmistificar junto à comunidade tantos preconceitos e prejulgamentos em relação a sua atividade. O projeto, o Centro Refap é vivenciado tanto pela ACM quanto pela Refinaria Alberto Pasqualini. A gestão é muito partilhada, no que diz respeito a todo o funcionamento do Centro Refap. Hoje, eu represento a Coordenação do Centro Refap, junto com a Equipe da Refap e mantemos um contato diário com a área de comunicação, com a Gerência de Comunicação da Refinaria, que nos apóia em todos os sentidos e que possibilita a operacionalização do Centro Refap. Temos o desejo de que a força de trabalho da Refinaria desenvolva ações voluntárias realmente solidificadas no Centro. Isso está intimamente ligado ao programa de voluntariado da Refinaria. As ações que nós fizemos até então, foram ações esporádicas, que foram acontecendo a medida do necessário e do interesse das pessoas envolvidas. Mas nós desejamos, e a Refinaria também, que essa força de trabalho possa realizar ações efetivas no Centro Refap como voluntários. O Projeto Centro REFAP acontece na Unidade do CEP, o Clube dos Empregados Petrobras. Como é num clube, nos possibilitou com maior intensidade aplicar o nosso método de trabalho que surge com o Esporte Clube Cidadão, uma parceria com o técnico da nossa seleção hoje, o Dunga. É um método desenvolvido entre a ACM e ele como atleta e padrinho desse projeto. Nesse espaço do clube, nós conseguimos aplicar este método. Nós temos um ginásio, um amplo campo de futebol, quadras de tênis que nos possibilitam fazer essa aplicabilidade. O espaço é muito bonito, muito atrativo e tem mais uma característica que eu acho importante ressaltar: a comunidade costuma ser um lugar muito pesado, se assim eu posso traduzir. O simples fato de nós tirarmos as crianças de lá nos dias em que precisam vir para o Projeto e estar num outro ambiente, também possibilita um avanço mais rápido dos processos educativos. São muito importantes os projetos que acontecem nas comunidades, mas essa visão que a Refinaria teve foi muito estratégica. Hoje, a gente consegue visualizar o quanto é importante trazê-los para um outro ambiente, fazendo com que eles visualizem outras formas de pensar, de se movimentar, porque neste espaço eles, inclusive, aprendem questões de segurança, questões realmente educativas e ambientais dentro de um espaço diferenciado, que não a comunidade onde eles vivem. Todo o Projeto acontece no CEP, no Clube dos Empregados da Petrobras. Nós temos momentos distintos: a criança quando chega ao Centro Refap, tem o reforço alimentar, acontece o café da manhã; depois ela vai para as oficinas. As oficinas são distribuídas entre arte, educação, esporte e acompanhamento escolar. No esporte, eles vivenciam a iniciação esportiva e já algumas modalidades esportivas, dependendo do desenvolvimento da criança. Na oficina de arte elas trabalham as expressões artísticas. Nosso objetivo é trabalhar expressão e não formar artistas. Se algum artista sair daqui, que bom, mas o nosso objetivo é trabalhar a arte-expressão. As crianças fazem teatro, artes visuais, dança. Elas se movimentam na oficina de arte-expressão desta forma. E o acompanhamento escolar serve para que a pedagoga possa acompanhar o desenvolvimento escolar. Para nós é importante que elas possam estar inseridas na sociedade e a escola, depois da família, é o segundo núcleo de inserção na sociedade. Então, funciona desta forma: depois de passar por essas oficinas, elas têm um almoço com a gente e retornam para a comunidade. O turno da tarde faz o mesmo processo, só que começa almoçando e sai lanchado. O trabalho com a criança, na verdade, é difícil de ser mensurado. Os profissionais que acompanham o processo identificam situações subjetivas, no que diz respeito à criança falar, à criança se colocar, se movimentar. Esse é um resultado bastante importante, mas não podemos deixar de considerar aqueles que são mensuráveis. A escola é um meio em que nós podemos verificar isso, então é um indicador muito forte. Pela escola podemos acompanhar a evolução da criança, desde a leitura até a sua aprovação na escola. Além disso, a questão da família, que nós falávamos antes, da inserção no mercado de trabalho, o simples fato de uma família voltar a estudar. Isso nós podemos mensurar, mas a essência do projeto é subjetiva. Nós podemos ver quando nós percebemos um sorriso, um olhar. Assim a gente consegue mensurar. São tantos momentos marcantes, nós já vivemos tantas etapas no Centro Refap e todos eles muito importantes. Mas, realmente, para nós, profissionais envolvidos no processo, o que vale é essas crianças chegarem aqui e estarem com um sorriso diferente, elas desejarem estar aqui no Projeto. Um momento significativo foi quando nós identificamos uma menina que não falava, ela conseguiu então falar e se inserir num grupo social. Isso moveu realmente todos os profissionais envolvidos. Nós temos uma que é considerada um personagem do Centro Refap. É uma menina chamada “Scarlet”, que teve uma evolução comportamental muito significativa. Inclusive os profissionais da Refinaria que acompanham o processo, podem falar também dessa menina e identificar como ela se desenvolveu. Uma coisa que nos motiva também é o fato de nós estarmos construindo uma nova sede para o Projeto. A Refinaria está investindo num projeto amplo, possibilitando novas salas. Quando nós recebemos essa notícia, foi muito gratificante. O fato de estar aqui trabalhando junto a Refinaria é extremamente enriquecedor, porque, como eu falei das crianças, para nós, profissionais envolvidos, também descobrimos outros caminhos e outras possibilidades e descobrimos que existem profissionais que estão extremamente comprometidos. Aprendemos muito com a força de trabalho da Petrobras. Os profissionais se dispõem a estar no projeto social e, por vezes, quando estamos aqui, nos abastecem de informações que pra nós são extremamente educativas e fazem a diferença para nós profissionais envolvidos lá fora, na sociedade. Eu me considero uma pessoa privilegiada por estar em contato com a força de trabalho da Refinaria, recebendo mais informações sobre o processo, inclusive o processo de gestão. Hoje, nós conseguimos levar para o terceiro setor, que é a área onde estou inserida, muitos aspectos que vivenciamos numa empresa como essa. Isso é extremamente importante. Inclusive, a minha monografia de responsabilidade social é Gestão Corporativa no Terceiro Setor, que nasceu aqui na Refinaria. É esta vontade de falar sobre o que é uma gestão corporativa voltada para o terceiro setor. Para as crianças, estar aqui na Refap é ter uma referência forte, um nome forte envolvido no trabalho. Embora seja a ACM desenvolvendo esse trabalho, as crianças falam: “Nós estamos indo para a Petrobras.” Elas desejam estar nesse espaço. Também, é um ambiente totalmente novo, diferenciado. O projeto social que acontece na comunidade é cotidiano, é normal. O diferencial de nós estarmos aqui é esse: conhecer coisas que nós não conheceríamos. Quer dizer, para a criança, isso é fundamental, descobrir como se movimentar nesse espaço, quem são essas pessoas, o que é refinar petróleo. Isso é muito importante. Participar do Projeto Memória Petrobras, para o Centro Refap e pra mim como representante, é muito significativo. É solidificar um trabalho que nós vimos fazendo com essas crianças, com a comunidade do entorno da Refinaria. Quando recebemos o convite para estarmos aqui com as crianças, nós ficamos muito felizes de poder levar essas carinhas para outros espaços e que as pessoas possam ver através delas que o nosso trabalho está dando certo. É um trabalho que tem muito amor, muita força, muita dedicação e que tem esse reflexo tão positivo na comunidade. Ficamos muito felizes de participar.