A morte e vida são linha tênue que nunca dançaram sobre meus olhos, até agora. A abundância de vida ao meu redor me fazia enxergar apenas ela, nunca pensei que me depararia com alguma separação eterna, pois já sofri várias mortes em vida. Vários que tinham rosto cor e voz e hoje em dia são apenas cpf\'s vagando em algum lugar que jamais saberei. Não estão mortos, mas será que quem está vivo longe dos nossos olhos está vivo para nós? Ironicamente, agora me contemplo com alguém vivo na memória, mas que não está mais. Não por orgulho de mandar uma mensagem, mas por cruzar uma parte incomunicável do trajeto. É lógico, e até mesmo previsível um indivíduo não cruzar um século de vida, mas quando acontece, não parece real. A linha se rompeu pela primeira vez. Vi seu rosto pálido, mas estava dormindo. Estavam cometendo um erro, ela acordaria a qualquer instante. Não havia sentido levá-la para longe dos meus olhos, ela estava ainda viva. Não queria a despedida. O egoísmo humano é algo impiedosamente cruel, até mesmo no cenário cinza em que me encontrava. Querer manter uma pessoa ao seu lado, mesmo que estivesse sofrendo é de uma crueldade incabível. Por outro ponto, todo o sofrimento foi transferido para mim. Após semanas, entendi. Não importa o que meus sonhos me disessem, ela não volta mais. Não apenas ela, mas as lembranças vinculadas a ela. As tardes em seu colo ouvindo cantigas, os pães de queijo caseiros, os natais que nunca mais seriam os mesmos. Após mergulhar por anos em experiências, é totalmente incabível se satisfazer com as gotículas que a memória pode oferecer, pois não possuo mais os sentidos. O cheiro do peixe recém frito, o toque em suas bochechas já amaciadas pelo tempo, o odor de seu perfume adocicado e o som da sua voz. Quem um dia teve tudo isso, jamais poderá se contentar com simples lembranças. Te vi em sonhos, te escrevo em abstrações e te perco no intangível. Não há superação que fale,...
Continuar leitura
A morte e vida são linha tênue que nunca dançaram sobre meus olhos, até agora. A abundância de vida ao meu redor me fazia enxergar apenas ela, nunca pensei que me depararia com alguma separação eterna, pois já sofri várias mortes em vida. Vários que tinham rosto cor e voz e hoje em dia são apenas cpf\'s vagando em algum lugar que jamais saberei. Não estão mortos, mas será que quem está vivo longe dos nossos olhos está vivo para nós? Ironicamente, agora me contemplo com alguém vivo na memória, mas que não está mais. Não por orgulho de mandar uma mensagem, mas por cruzar uma parte incomunicável do trajeto. É lógico, e até mesmo previsível um indivíduo não cruzar um século de vida, mas quando acontece, não parece real. A linha se rompeu pela primeira vez. Vi seu rosto pálido, mas estava dormindo. Estavam cometendo um erro, ela acordaria a qualquer instante. Não havia sentido levá-la para longe dos meus olhos, ela estava ainda viva. Não queria a despedida. O egoísmo humano é algo impiedosamente cruel, até mesmo no cenário cinza em que me encontrava. Querer manter uma pessoa ao seu lado, mesmo que estivesse sofrendo é de uma crueldade incabível. Por outro ponto, todo o sofrimento foi transferido para mim. Após semanas, entendi. Não importa o que meus sonhos me disessem, ela não volta mais. Não apenas ela, mas as lembranças vinculadas a ela. As tardes em seu colo ouvindo cantigas, os pães de queijo caseiros, os natais que nunca mais seriam os mesmos. Após mergulhar por anos em experiências, é totalmente incabível se satisfazer com as gotículas que a memória pode oferecer, pois não possuo mais os sentidos. O cheiro do peixe recém frito, o toque em suas bochechas já amaciadas pelo tempo, o odor de seu perfume adocicado e o som da sua voz. Quem um dia teve tudo isso, jamais poderá se contentar com simples lembranças. Te vi em sonhos, te escrevo em abstrações e te perco no intangível. Não há superação que fale, esta não chegou a mim. Apenas me resta dizer o que não pude ainda: adeus, vózinha.
Recolher