As histórias dos petroleiros não fazem um livro, fazem uma enciclopédiaMeu nome é Heraldo Raimundo Pinto Pamplona. Tive a felicidade de nascer no estado do Pará e atualmente desempenho minhas funções aqui na UN BC, Macaé.
Eu nasci em 1937 e ingressei na Petrobras também no outro sete, 1957.
Ingressei pela porta e por sinal foi uma casualidade. Já tive oportunidade de falar isso em outras ocasiões. Eu trabalhava com o meu tio, como estudante de engenharia, no escritório que ele tinha de condição de estrada de rodagem. Estava no segundo ano da engenharia, quando um colega meu, sabendo que a Petrobras estava se instalando em Belém, me convidou para ir até lá, porque eles estavam recrutando estudante de engenharia para trabalhar, mesmo com horário diferenciado para atendimento às aulas. Como eu já tinha esse biscate com o meu tio, não me interessei muito, mas por insistência dele eu subi. Quando eu subi, o cara me deu uma folha de papel, eu nunca esqueço isso, foi um tal de PE, que era pedido de emprego. Aí pergunta várias coisas e eu deixei. Duas semanas depois, estou em casa, a minha mãe diz assim: "Olha, veio uma caminhonete e deixou esse envelope aqui." Naquela época, caminhonete, tipo de picape, era o camburão que chamava, era o da polícia, o rabecão, que é camburão. Eu fiz exame de consciência assim "Que foi que eu andei fazendo de errado para o camburão vir aqui?" Não liguei. Passou uma semana, duas, voltaram novamente e a minha mãe insistiu. Eu abri o envelope: era um convite da Petrobras para que eu me apresentasse para uma entrevista. E eu falei para o meu colega, perguntei se ele tinha recebido, disse: "Eu não recebi nada." "Olha, então vai lá por mim e faz essa entrevista por mim." "Pô, sem você?" "Vai lá porque hoje, quando eu sair da escola, tenho que ir lá para o escritório." Acabei indo e quando eu comecei a entrevista tinha o gerente, o chefe do pessoal que me encaminhou para um técnico. Naquela...
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Meu nome é Heraldo Raimundo Pinto Pamplona. Tive a felicidade de nascer no estado do Pará e atualmente desempenho minhas funções aqui na UN BC, Macaé.
Eu nasci em 1937 e ingressei na Petrobras também no outro sete, 1957.
Ingressei pela porta e por sinal foi uma casualidade. Já tive oportunidade de falar isso em outras ocasiões. Eu trabalhava com o meu tio, como estudante de engenharia, no escritório que ele tinha de condição de estrada de rodagem. Estava no segundo ano da engenharia, quando um colega meu, sabendo que a Petrobras estava se instalando em Belém, me convidou para ir até lá, porque eles estavam recrutando estudante de engenharia para trabalhar, mesmo com horário diferenciado para atendimento às aulas. Como eu já tinha esse biscate com o meu tio, não me interessei muito, mas por insistência dele eu subi. Quando eu subi, o cara me deu uma folha de papel, eu nunca esqueço isso, foi um tal de PE, que era pedido de emprego. Aí pergunta várias coisas e eu deixei. Duas semanas depois, estou em casa, a minha mãe diz assim: "Olha, veio uma caminhonete e deixou esse envelope aqui." Naquela época, caminhonete, tipo de picape, era o camburão que chamava, era o da polícia, o rabecão, que é camburão. Eu fiz exame de consciência assim "Que foi que eu andei fazendo de errado para o camburão vir aqui?" Não liguei. Passou uma semana, duas, voltaram novamente e a minha mãe insistiu. Eu abri o envelope: era um convite da Petrobras para que eu me apresentasse para uma entrevista. E eu falei para o meu colega, perguntei se ele tinha recebido, disse: "Eu não recebi nada." "Olha, então vai lá por mim e faz essa entrevista por mim." "Pô, sem você?" "Vai lá porque hoje, quando eu sair da escola, tenho que ir lá para o escritório." Acabei indo e quando eu comecei a entrevista tinha o gerente, o chefe do pessoal que me encaminhou para um técnico. Naquela oportunidade, tudo era mão-de-obra estrangeira, a maior parte, tudo, era mão-de-obra estrangeira, principalmente voltada para a parte de sísmica e geologia, que era o ramo da engenharia que contemplava esse recrutamento. Tudo bem e eu fui lá. Nessa época, eu também já enganava um pouquinho de inglês e comecei a falar. Aliás, era com um alemão e comecei a falar com ele. Depois de uns cinco minutos, ele disse "ok, volte e se apresente ao pessoal". Quando eu me apresentei o cara disse: "Olha, amanhã, você pode vir trabalhar." Nesse tempo não tinha essa expressão: "É ruim." Mas eu digo: "Vou pensar na história." E passou, comentando com meu tio o que aconteceu, disse: "Ih rapaz, esse negócio aí é uma companhia de gringo, é brasileira, mas só tem estrangeiro lá. Eles devem estar pagando bem." Para você ter uma ideia, naquela época, o meu tio me gratificava, assim, dava, vamos dizer, uma ajuda de custo de 500 cruzeiros, aquele primeiro cruzeiro que existia. Eu comprava os meus livros, ajudava em casa, ia para as minhas farras e ainda sobrava dinheiro. Comprava roupa. Quando eu fui saber qual era o salário, o meu tio caiu na gargalhada; cinco mil e oitocentos cruzeiros. E ele disse: "Não te falei?" Eu disse: "Será que vale a pena? Pô, a gente vai trabalhar para esses gringos?" "Olha, vai que é bom."
Topei e até agora estou aqui. Ainda estudante, terminando o meu curso. Depois terminei o curso de engenharia, a Petrobras desenvolveu um curso de especialização em Salvador, principalmente voltado para área de exploração e produção. Exploração, perfuração e produção. Eu fui engajado nessa parte de exploração. Saí de lá, voltei para Belém, trabalhei no escritório. Fui para o campo, andei por esse Amazonas tudinho, aqui até o Paraná. Bacia Amazônica, Maranhão e Paraná, que eram as três bacias paleozoicas, quer dizer, geologicamente da mesma idade. Idade semelhante. Depois me deram a missão de concentrar todos os laboratórios de geologia aqui no Rio. Quando eu estava conversando com aquela senhora, a Marília, era de Salvador. Foi uma luta árdua, deslocar os baianos de Salvador para vir para o Rio, não foi fácil, mas felizmente implantamos.
Depois eu passei para administração. E vamos dizer assim, o sangue estava muito parado de ficar tanto tempo em escritório, e pedi para voltar para o campo. Nessa oportunidade, era o finado Carlos Walter que era o superintendente, disse: "Então tem aqui Macaé, está começando a desenvolver a bacia, você vai para lá." E vim para cá em 1982 e até agora passei pela geologia, depois passei pela parte de suprimento. Agora estou na produção, nessa parte de plano de contingência de reparo do duto submarino. Está bom e mudou, sim, em termos de geologia, voltada para exploração de óleo propriamente dito, mudou. Agora tem uma correlação muito importante, a natureza do fundo do mar, onde é que os dutos vão passar, entendeu? Agora mesmo nós vamos fazer um trabalho de calçamento do duto, em que a geotécnica do fundo do mar é importante para o sucesso do bom calçamento. E isso a engenharia, principalmente a civil, te dá esses fundamentos. A história de meu ingresso na Petrobras é por aí.
Olha, o fato é esse que eu acabei de te dizer. Eu quero destacar esse fato, mas mostrando o impacto que a presença da empresa dá, não só nas pessoas, na parte social, como também no meio ambiente. Então, esse fato que eu vou te contar ocorreu na costa maranhense, no Maranhão, naquela área denominada Lençóis Maranhenses, uma coisa extraordinária, maravilhosa aquela região. São dunas de uma areia de uma brancura de neve e intercaladas aquelas lagoas de água doce. Então, para você ter uma ideia, o acesso se fazia por aviões, porque carro para andar tinha que ser Jeep com pneus especiais, e no sobe e desce da duna era um tempo muito grande. Então, esse avião saía de São Luís, pousava na praia e da praia você pegava o Jeep e ia até onde a sonda estava, que dava mais ou menos uns 30, 40 minutos por cima da areia. Quem olhava, assim, de cima, via aquela ponta preta da sonda no meio daquela brancura de neve que era uma coisa espetacular. Esse poço foi pioneiro chamado São João, SJ 1 MA, e por que a Petrobras foi fazer essas perfurações lá na costa do Maranhão? É que nessa época estava havendo uma mudança na filosofia exploratória da bacia, da empresa, para deixar as bacias paleozoicas e voltar para uma seção mais nova do cretáceo, tal qual como tem na Bahia, em Sergipe, em outras áreas que são bacias bastante prolíferas. E até antes disso, não se conhecia esse tipo de bacia no Norte. Então, quando as primeiras pesquisas deram conta que havia essa possibilidade de uma bacia cretácea, que era a bacia de Barreirinhas, a Petrobras voltou e foi para lá. Qual era o ambiente de lá? Não sei se você já teve oportunidade de ver, até mesmo em fotografia. É aquela brancura e aqui e ali uns pontozinhos, um aglomerado de pessoas. Três, quatro casas, feitas de palha, parede, telhado, tudo de palha, que sobrevive a custo de pesca principalmente e uma agricultura de subsistência: mandioca, milho, quando tem condições de plantar próximo à lagoa, porque se não, é só areia. Quando a Petrobras chega, imediatamente, chama atenção. Tem gente que nunca tinha visto, nem carro, quanto mais trator e carro pesado carregado com aquelas tubulações enormes da sonda. E nessa época também, não quero desfazer do presente, mas o regime era completamente diferente. O técnico ia para a sonda, por um período mínimo de 90 dias e, quando terminado esse período, tinha condições dele voltar. A única coisa que abreviava o retorno dele era se pegasse a malária, estivesse bem doente, para não enterrar lá, como a turma dizia no beiradão, e voltava para Belém. Enquanto isso, ia passando, então, presta atenção! Outra coisa, ia depender da disponibilidade da mão de obra técnica, muitas vezes o geólogo era um engenheiro de perfuração, o administrador e muitas vezes o cozinheiro para fazer aquele rangozinho imediato. Quando começava a chegar, aquele pessoal lá da circunvizinhança, começava a se aproximar curioso, ficava escondido quando parava o barulho dos caminhões ou dos motores e se aproximavam para saber o que era que estava fazendo. E foi nessa oportunidade que o Ribamar, lá para aquela área tudo é Ribamar. Tudo é José Ribamar, João Lindomar. Eu não sei como é que era o outro nome.
Eu sei que se chamava de Ribamar. O caboclo se aproximou e perguntou para mim o que é que estava fazendo aqueles ferros tudinho. Eu comecei a falar para ele que a ideia daquilo, daqueles ferros, era furar a terra para ver se achava um produto chamado petróleo. Aí ele disse: "Olha, petróleo? Eu não conheço por aqui. Eu moro aqui um bocado de tempo, mas não conheço, nunca vi esse cara por aqui." "Desculpa, mas se nós tivermos chance de encontrar, você vai ver, esse cara é muito bom. Ele ajuda os carros a se movimentarem, ajuda nessa luz que você está vendo, nessa eletricidade, no teu querosene que você tem. Esse petróleo é o bicho! É fora de série!" "E onde que ele se encontra?" "Olha, geralmente está no fundo da terra. Por isso que a gente vai cavar." "É mesmo? E é fácil, e como ele sai?" "Olha, quando ele sai, às vezes ele faz um alvoroço tremendo. Às vezes é mais tranquilo." E nesse papo foi passando. A perfuração começou e nós tivemos a sorte de furar uma seção que tinha um intervalo com óleo. Estava lá trabalhando com o geólogo. E recomendava procedimento que quando acontecesse isso, que você testasse esse intervalo.
É o que a gente chamava na época de "testar formação." Nós fizemos os testes, tomamos todas as precauções, fazendo uma linha de surgência para que, se houvesse alguma coisa, principalmente gás, para queimar à distância. Agora a gente tem que considerar, só um parênteses, que devido àquele solo completamente arenoso a vegetação era baixa, rala.
Aqui ou ali, onde tinha um lençol freático mais próximo da superfície, você tinha uma capoeira um pouquinho mais alta. Tanto assim que, quando nós fomos fazer o queimador, tivemos que passar o trator para evitar a queima daquele mato e apoiar a tubulação que ia queimar. Como é muita areia, imediatamente a tubulação é cheia, nós colocamos água para não ficar bloqueado. Bom, tudo bem. Testamos. Não sei se vocês já tiveram oportunidade de ver, assim, um teste de formação: Primeiro, tem um equipamento, toma pressão estática, depois você, com um mecanismo de cima, na mesa da torre, da sonda de perfuração, roda, ele abre para colocar a pressão lá do fundo em contato com a atmosfera. Então, dá uma diferença de pressão muito grande. Conclusão, se tem gás, é uma zorra, parece assim um barulho de um avião a jato decolando. Eu, sinceramente, não esperava esse resultado, quando começou a abrir não tinha dado o número de voltas, sete voltas, não tinha dado o total de voltas e começou o estalo. Estala daqui, estala ali porque vêm aquelas golfadas, ainda com resto de fluido de perfuração e, quando vi aquilo disse para o cara: "Abre a válvula para queimar. Agora vê o que está saindo." Quando ele queimou, saiu aquele jato de gás, de lama e água da tubulação, ia mais alto que a copa daquela capoeira. E o que é que manda o procedimento? Vamos queimar, se não se vier óleo é aquela barbaridade. E nós tínhamos que colocar o volume de óleo para estimar quanto é que saía naquele período x. Eu corri com uma tocha, uma estopa queimando, e de longe eu joguei: "Blumm." Aí foi aquela labareda. Engraçado, aquilo queimou. Depois de uns 15 minutos começou a vir óleo. E foi aquele óleo jorrando. Mas lá no queimador, porque depois você fecha, controla tudo. É isso que geralmente se vê em filme se chama blow-out, é poço descontrolado. A coluna de fluido da perfuração foi mais leve que a pressão, e a pressão do reservatório joga tudo para fora. É uma barbaridade. É uma explosão como aconteceu, queimou sonda, aqui, no Espírito Santo, idem. Bom, controlado o teste, terminado o teste, você sozinho, aquele dia e noite, tu não tinha esse negócio de um substituir o outro, resolvi dormir. Descansei, tinha que passar, nesse tempo a comunicação era toda com telégrafo, para Belém o resultado do teste, aquela expectativa grande. Eu sei que dormi. No dia seguinte, eu acordei todo doído para preparar para o outro teste. E tomei um banho, a essas altura você não tem fome, nem nada, e me deu aquele estalo: "Ih rapaz, o Ribamar não pintou por aqui, que ele sempre ia lá, me mostrava onde é que tinha, que eu podia caçar umas cobras, essa jiboia, tinha lá para dedéu. Me dei conta do tamanho da clareira que formou com o fogo. Fizemos um outro teste. Conclusão, infelizmente o reservatório era pequeno. Aliás, toda essa fanfarra é sinônimo de um reservatório limitado. E passou o tempo, me deu na lembrança, fui dar uma volta e procurei pelo tal do Ribamar. Pô, Ribamar, está vivo? Eu queria comentar com ele. Perguntei para o vizinho dele, que estava, assim, mais ou menos a uns 500 metros, fui na casa dele, não encontrei. E perguntei pelo vizinho: "Escuta, cadê Ribamar, mulher e o filho?" "Ih doutor, não sei, não? Depois daquele trovoada que vocês fizeram, que deu na sonda, nunca mais eu vi o Ribamar. Para não lhe faltar com a verdade, eu vi ele com a trouxa, a mulher, o cachorro e o filho indo embora por aqui, por esse caminho." "Está bem." Tempo passou, chegou na época de ir embora. E lá perto tinha um barzinho que você tomava umas cerveja, perguntei pelo Ribamar. Ninguém sabia dele. Me deu a curiosidade, fui na casa dele, abri, olhei, o que encontrei? Um fogão cinza, uma panela, dessas de barro que ele tem, com resto de feijão, todo cheio de bicho, mas Ribamar nunca mais eu vi. Aí perguntando para os caras: "Cadê Ribamar?", ele disse: "Olha, onde tem esse tal de petróleo, que o homem da sonda falou, ele não quer ficar perto porque realmente é o bicho." Sumiu.
Esse negócio que eu quero te dizer do impacto que dá nas pessoas. Geralmente pela falta de conhecimento, que nunca viram aquilo, então, a pessoa faz outra ideia e a mudança do meio ambiente, que se realmente você não tiver cuidado, o próprio trabalho já degrada o meio ambiente. Mas nesse ponto, felizmente, a Petrobras, veja só, desde aquela época, tinha o cuidado de restituir, recompunha a roça do pessoal, os roçados deles, as casas. Então, aquele resto de material, se não fosse de material, assim, de barracão, de acampamento, era tudo queimado, destruído ou enterrado, para não ter uso indevido. Então, esse depoimento que eu queria passar para vocês, da influência da empresa em outras áreas.
E tem vários casos desses. Teve um outro caso, foi numa cidade, isso já no Amazonas. Essa foi boa, o padre não quis que a sonda desembarcasse porque, veja só, uma sonda geralmente vinha com 18, 20 balsas. O efetivo, 120, 150 homens. Isso chegava numa cidadezinha pequena, a mulher, coitada, todo mundo casava logo. E o padre não quis, mas houve um negócio de uma festa e faltavam recursos. E o petroleiro chega daqui, chega dali, manda buscar uma cerveja, compra o boi dali. Fizeram a festa para o padre. No dia da festa, a turma afastou, assim, todos os bancos da igreja, colocou um som dentro da igreja, todo mundo dançando, até o padre entrou na farra. Mas é bacana demais esse negócio. Está bom?
Olha, é uma iniciativa boa essa de memória dos trabalhadores da Petrobras, sinceramente, porque se você perguntar para os petroleiros essas histórias todinhas, não faz um livro, faz uma enciclopédia. Tem muita história, muita história. Não é brincadeira. Tanto aqui mesmo, no mar. Tem cada coisa espetacular, mas tudo envolvendo as pessoas. Isso que eu te digo, aquele aspecto social e o resultado. Não vai muito longe, aqui em Macaé, a mudança que está tendo em Macaé, é pena que você não está gravando. Se está gravando, corta. É que a administração da cidade não ajuda. Macaé, como dizia Jaime Lerner, não quer nem ser governador do Paraná, ele queria ser prefeito daqui, porque dinheiro não falta. Em compensação, para a gente andar aqui na rua, é uma barbaridade. Mas como cada povo tem o governo que merece...
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