Entrevista de Maria Clara de Faria Marcelino (Maga Clara)
Entrevistado por Jonas Samaúma
Juquitiba (RJ), 14 de Julho de 2022
Projeto Vida, Morte e Fé - Programa Conte Sua História
Entrevista número PCSH_HV1269
Transcrita por William Luz
Revisada por Larissa Colejo
P/- Entrevista de Maga Clara, Maria Clara de Faria Marcelino, entrevistada por Jonas Samaúma, filmado por Ana Clara Munner. Juquitiba, 14 de julho de 2022. Projeto Vida, Morte e Fé, Projeto Conte sua História. Entrevista PCSH_HV1269.
Então Maga, então querida, eu ia te pedir para que você fechasse os olhos e voltasse para sua primeira lembrança.
R/- Falecimento da minha mãe.
P/- O que que você lembra?
R/ - Posso abrir os olhos?
P/- Pode, pode abrir os olhos.
R/- Eu lembro de estar com as minhas irmãs mais velhas, pois nos foi proibido de ir ao velório e levar a minha mãe até o cemitério. E eu lembro das minhas irmãs planejando pular o muro, alguma coisa assim, porque eu era muito pequena, eu tinha dois anos de idade. Então a primeira lembrança que me vem forte da minha vida é essa cortada da minha raiz ancestral, minha mãe. É um fato muito marcante.
P/- Então você não tem nenhuma memória sua com a sua mãe?
R/- Não tenho, vívida não. Uma coisa que eu tenho vívida são unhas vermelhas, é, pegando migalhas de pão numa toalha de mesa. Eu tenho essa imagem muito nítida e eu acredito que era a mão da minha mãe, que é uma memória que eu tenho.
P/- E cê tem memórias também do seu pai?
R/- Tenho, com meu pai eu convivi muito mais anos, meu pai faleceu em 97, embora eu tenha fugido de casa na juventude, fugido do meu pai. Mas eu tenho muitas memórias do meu pai sempre indo trabalhar muito cedo, sempre viajando muito. E uma memória muito marcante é que nós não tínhamos proximidade física de beijo, de abraço, de pôr no colo, né. Então meu pai ficava meses viajando, e quando ele retornava para o nosso lar nós ficávamos em fila, assim, uma irmã do lado da outra, e meu pai chegava e nos comprimentava assim. Eu tenho essa memória das chegadas do meu pai com esse comprimento manual.
P/- E eu vou chegar nessa história aí da sua juventude. Mas ainda da infância, assim, você tem alguma alguma história que você viveu, que você lembra que te marcou?
R/- Tenho, quando minha mãe faleceu… É, as duas irmãs mais velhas ficaram com a avó materna e eu e a minha terceira irmã, a Simone, que já é falecida, nós ficamos com a minha avó paterna no sítio. E eu e a minha irmã Simone nós víamos a minha mãe no quintal e nós comentamos isso com a Ana Maria, que é uma moça que minha avó criou - parece que ela é filha do meu avô com alguém, eu não sei se essa história é real. E eu a reencontrei agora depois de mais de 30 anos eu reencontrei a Ana Maria, e ela rememorou esse fato de que a minha irmã Simone e eu víamos minha mãe no quintal da minha vó lá e falavámos “a mãe está aqui, a mãe está aqui!”. E aí eu já comecei a ter contato com esse universo “do outro lado do céu”, né, desde pequena vendo presenças que pra outras pessoas não era visível.
P/- Cê lembra a primeira vez que você viu?
R/- Dessa memória que eu te contei agora não. Mas a primeira vez que eu vi alguém muito nítido foi quando eu morava na Vila Mariana, eu estava dormindo com o pai da (inaudível), né, meu esposo, e eu vi um homem extremamente alto na porta do meu quarto, e eu dei um pulo da cama, acordei ele e falei “olha, tem um homem dentro da nossa casa, na nossa porta”. E era nítido demais para mim essa visão, e esse cara ria, ele ria do meu desespero. E aí o pai da (inaudível) acordou, olhou para a porta do quarto e falou “você é louca, não tem ninguém aí”. E o cara ria mais ainda conforme o pai dela me chamava de louca, e eu em choque com aquele cara na porta do meu quarto. Essa foi uma lembrança muito forte da primeira vez que eu vi alguém tão nítido, igual eu vejo você.
P/- Como é que era quando você via essas presenças, mas criança ainda. Como é que os adultos lidou com isso, com essa sensação?
R/- Eu não contava pros adultos porque eu tinha medo dos adultos (risadas). Eu fui criada com muito medo, eu tinha muito medo do meu pai e muito medo de emitir qualquer percepção, qualquer opinião.
P/- Hum…
R/- Então eu não revelava.
P/- E além de ver essas coisas, que mais que você vivenciava, assim, criança?
R/- Ah, ouvir vozes, né, brincar com alguém que não tava ali, jogar bola com meu amigo. E era só eu que via meu amigo, e aí questionavam “por que que você tá jogando a bola para lá?”, eu dizia, “tô brincando”. Não, não tínhamos liberdade de falar o que se passava conosco.
P/- E você tinha outros amigos, é, encarnados que tinham esse mesmo tipo de experiência?
R/- Ninguém falava nada para ninguém, por isso no nosso período de infância os adultos mandavam e as crianças obedeciam. Nós não tínhamos abertura de diálogo, ninguém falava que a gente tinha sentimento, ninguém explicava pra gente o que a gente tava sentindo. Eu apanhei uma vez da minha madrasta por falar. começar a gritar, chorar, que não queria deitar na minha cama porque tinha duas cabeças no meu travesseiro. E aí eu saía para fora do quarto falando isso, e apanhei para parar de inventar história, porque tava na hora de dormir. Foi a primeira vez que eu contei que eu via alguma coisa, porque eu me assustou, e isso me voltou agora. E eu vi muitas vezes essas duas cabeças no meu travesseiro, só que eu cobria minha cabeça com a coberta e fiquei calada. Depois que eu apanhei aí… Eu já não falava! Depois que eu apanhei foi aí que eu falei menos ainda.
P/- Você falou e apanhou por…?
R/- Por estar inventando história pra não dormir. E tive que dormir com as cabeças lá, morrendo de medo
P/- As cabeças falavam?
R/- Não, elas só estavam lá. Eram duas cabeças de pessoas negras.
P/- Hum… E você teve alguma experiência também de algum contato, de algum guia seu mesmo? É… Algum anjo, algum dos seus guias, se manifestava ou eram só mais aparições, assim?
R/- Não, isso foi muito mais adulta, um outro tempo, em que eu nem sabia que ele não era um encarnado - um desencarnado, né. Pra mim ele era tão real, falava comigo, me dava presentes físicos, que eu acreditei que ele era uma pessoa como você, e não era. E eu só descobri depois.
P/- (risos)
R/- Porque..
P/- Conta essa história.
R/- Conto! É… deixa eu ver que ano foi, não me recordo o ano, mas eu trabalhava na advocacia Fujita, Dr. Jorge Fujita é excelente aí no direito sucessórios. E todos os dias eu tinha que fazer o acompanhamento processual no Fórum João Mendes, né, não era virtualizado as coisas ainda. Um dia eu atravessando a praça onde tem o tribunal de justiça de São Paulo, a Praça João Mendes, eu atravessava aquele semáforo e ia para o fórum. Um dia um mendigo chegou perto de mim nesse semáforo e falou para mim que eu ia ter uma década muito difícil, que iam acontecer coisas difíceis demais pra eu lidar, mas que era para eu encarar os desafios, para eu não perder a fé… E eu sempre conversei com vários moradores de rua na Praça da Sé, pra mim era mais um ali que estava trocando ideia comigo, e ele me deu um ramo gigante de arruda, muita arruda, num jornal todo velho lá e falou que era para eu chegar em casa, ferver essa arruda e tomar um banho do pescoço pra baixo, porque eu ia ter uma década muito difícil. Eu tava com pressa de ir pro fórum, catei aquelas arruda, agradeci e fui. Só que daqui uns dois, três dias eu fui lá de novo no mesmo local, ele apareceu de novo, ele me deu uma moeda muito antiga - que o rapaz que roubou aqui levou - é… Uma moeda muito antiga, uma pedra e… Pode falar alto.
P2/- Uma estrela de 5 pontas.
R/- Uma estrela de 5 pontas, um artefato que parecia que era de prata, muito trabalhado, lindo de morrer. E ele falou para mim que a moeda antiga era para que eu tivesse saúde, que o cristal era bênçãos pros meus filhos, e que aquele símbolo ia me levar até ele na hora certa; e que era pra eu guardar isso comigo porque um dia eu ia ter que devolver para ele. Eu, “tá bom, tá bom, tá bom”, sempre conversei com todo mundo que chegou até a minha pessoa, peguei esses presentes que ele me deu, pus na bolsa que eu usava todo o santo dia, e fui pro fórum. Aí passou não sei quantos dias, eu me encontrava a cada dois, três dias, ele vinha no mesmo local, ali na praça João Mendes, me dava alguma ideia, me dava um presente, falava umas coisas, eu ia pro meu caminho e ele ia embora. Porém um dia eu estou com um cliente fenomenal desse escritório de advocacia que eu trabalhava, ele estava com mandado de prisão expedido por falta de pagamento de pensão alimentícia e era a audiência dele no João Mendes, e ele era um, uma pessoa de muita influência financeira, um grande empresário de São Paulo. E eu estava atravessando a Praça João Mendes com esse cliente, eu estava representando o escritório, e se aproxima de mim esse morador de rua, e ele exalava cheiro peculiar de quem vive nas ruas, e ele veio em minha direção falar comigo, e eu fiquei constrangida por causa do cliente do escritório. Aí eu falei para ele “hoje não, hoje não, eu não posso falar com você”, e ele nem aí, chegou mais perto de mim - foi o dia que eu descobri que ele não é que, eu pensei que ele era - chegou mais perto de mim e falou assim “chegou a hora de você me devolver as coisas que eu te dei”. E eu pra me livrar dele rápido, abri minha bolsa pra pegar o que eu tava carregando desde o dia que ele me deu, aí ele pôs a mão em mim e falou que “não, não é agora, é amanhã antes do pôr do sol, antes do nascer do sol, nesse endereço aqui” e me deu um papel. Aí eu falei “tá bom! Vai, vai, vai!”. Aí o meu cliente virou pra mim, pegou e falou assim “o que que a senhora tá falando Doutora?”. Aí eu falei para ele, “ai, você me desculpe, mas aqui na Praça da Sé tem muitos moradores de rua que são meus amigos, conversam comigo”. Ele falou “não, mas não tinha ninguém do lado da doutora”. Aí eu falei “você não sentiu o odor? Não viu a pessoa?”. E ele falou “não, Doutora, só estou eu e a senhora aqui”. Aí eu falei pra ele, “e esse papel aqui?” - que foi o papel que o Seu José me entregou com o endereço, né, e eu só soube que o nome dele era José no dia seguinte - aí eu falei, “e esse papel aqui, que ele me entregou. Você não viu ele me entregar esse papel?”. Aí ele falou, “não, eu vi a senhora mexendo na sua bolsa e retirou esse papel, mas não tinha ninguém falando com a senhora na hora que a senhora pediu pra ele ir embora daqui. A senhora está bem?". Eu fiquei passada, mas eu não podia perder, né, aquela postura de segurança da advogada que tava levando o cara com mandado de prisão expedido pelo juiz de direito, né. Eu fiquei extremamente confusa dele ter dito que eu tava falando sozinha, e dele ter dito que ninguém me deu aquele papel, que ele me viu pegando o papel da bolsa com endereço que eu não fazia ideia da onde que era. Aí eu fiz uma audiência do cara, deu tudo certo. Saímos de lá, eu fui pro escritório do Dr. Jorge, e vi o endereço e ele falou para mim que era para eu estar nesse endereço antes do nascer do sol, e que não era pra contar para ninguém que eu estava indo até lá. Aí eu peguei, redigi uma carta de que eu estava indo pra tal endereço, “não sei o quê não sei o quê”, tudo direitinho, com tudo que andava acontecendo comigo e com esse senhor, fechei num envelope, coloquei na minha escrivaninha do escritório do Dr. Jorge, e falei pra secretária Iara. Falei, “Iara, se eu não aparecer segunda-feira pra trabalhar você abre a minha escrivaninha e pega a carta que eu deixei lá e entrega pro Dr. Jorge”. Porque pra mim era tudo muito estranho. Como é que vai encontrar com esse cara que o homem não viu, né? E eu fiquei, “que loucura é essa?”, e eu vou nesse endereço. E nessa época eu estava num relacionamento que a pessoa morava comigo, e aí eu virei pra essa pessoa e falei assim, "olha, amanhã eu tenho que sair de casa meio que de madrugada, e eu não posso falar pra onde eu vou com quem eu vou, tudo bem? Você não se assusta porque eu vou sair de casa umas 3:30 da manhã". Ele falou que tava bom, falei tudo bem, e eu falei, “e se eu não voltar, eu deixei uma carta lá no escritório do Dr. Jorge Fujita explicando o que está acontecendo, mas eu não posso explicar o que está acontecendo”, ai tá bom. Eu vi que horário que o sol ia nascer, chamei o táxi que sempre me levava pra audiência pra lá e pra cá, e ele me levou nesse tal desse endereço, que era na Serra da Cantareira. Aí ele me levou nesse lugar, me deixou lá, e a hora que ele me deixou, esse mendigo que eu sempre encontrava, ele estava parado lá em frente a estrada de terra mas totalmente asseado. Com uma roupa branca e uma camisa branca e uma calça branca, sem sapatos nos pés, descalço, e muito bonito, eu nunca vi um sorriso tão lindo na minha vida. Aí a hora que o taxista me deixou, e eu vi esse senhor, que é o que encontrava comigo, eu falei para o taxista, "você tá vendo aquele cara ali todo de branco?". Aí ele olhou para mim e falou assim, "a senhora tá bem, Doutora?". Aí eu falei, "você não tá vendo ninguém ali me esperando?", ele falou "não". Aí falei, "então vai lá que na hora que eu sair daqui eu ligo pra você, e você vem me buscar". Tá bom, o taxista também não viu o Seu José. Aí eu atravessei e quando eu atravessei para ir em direção a ele, ele começou a caminhar e eu caminhando atrás dele. "Me espera, me espera!", “você me chamou aqui né, que que tá acontecendo que ninguém te vê, e eu te vejo?”, e ele não me respondia e começou a subir uma picada na mata. E pra mim eu falava, "Meu, não sei o que que eu tô fazendo aqui, mas eu não consigo ir embora daqui sem saber o que que é isso", e fui seguindo. Segui, segui, a gente subiu, subiu, subiu, subiu, aí chegou no lugar que tinha uma nascente, sabe? Um fiozinho, assim, de água saindo da terra. Aí ele sentou, eu sentei aí ele pegou e falou assim pra mim, "eu estou vindo aqui porque sou eu que cuida de você". E aí ele contou a histórias da minha vida, ele contou histórias do meu pai, ele contou um monte de coisa pra mim que ninguém poderia me falar aquilo que ele tava falando sem ter vivido o que eu vivi. E aí ele falou pra mim que o mundo imaterial era mais real do que mundo material, que o mundo material era uma hiper idealização de crenças de muitas mentes acreditando que isso aqui existe, e isso de fato passa a existir; enfim, ele me deu uma aula gigantesca do mundo imaterial. Só que naquele momento eu tava tão fascinada com tudo que eu tava escutando dele, que eu não conseguia questionar, não vinha… Quando eu pensava numa pergunta ele já me trazia aquele questionamento meu mental, sabe? Enfim, aí ele virou para mim e falou, "você trouxe as coisas que eu te dei?", eu falei "trouxe". Aí eu peguei, ele falou pra eu colocar naquele meio de água, aí ele me perguntou se eu sabia como que a terra fabricava a água, aí eu falei que não tinha ideia, aí ele falou pra mim que era o peso das moléculas da Terra que espremiam nitrogênio e o oxigênio e invertia o leite da mãe terra para alimentar todos os filhos daqui desse planeta, né, que ela gera dela; enfim, ele falou muita coisa. Aí eu dei os artefatos pra ele, ele colocou naquele meio de terra, abençoou e falou pra aquilo ficar comigo por quanto tempo eu sentisse que deveria ficar com aquilo, falei "ok”. E aí ele, meu, ele me deu aula sobre a existência do universo que eu não me recordo tudo que ele falou agora, e na minha percepção eu tinha ficado com ele, assim, no máximo até meio-dia. Mas o sol já tava se pondo quando ele falou pra mim caminhar um pouco mais adiante e dar três gritos bem alto, Kaô. Eu não tinha ideia do que era aquilo e eu tava ali toda entregue ao momento, eu caminhei e dei três berros, "Kaô!", e aquilo ecoava assim na mata, sabe? Eu fico até emocionada de lembrar. Eu retornei pra onde ele estava, e ele perguntou pra mim, "você consegue descer sozinha ou eu tenho que te acompanhar?". Eu falei, "não, eu acredito que eu consigo descer, se o senhor não puder me acompanhar", aí ele falou "então vai". Aí eu levantei e me veio a vontade de dar um abraço nele, né, só que na hora que eu voltei ele já não estava mais lá. E ele me disse isso, o nome dele, eu perguntei o nome. Ele falou que isso não tinha relevância nenhuma, mas que seu eu quisesse podia chamá-lo de José. E aí eu falo do Seu José até hoje.
P/- Você nunca mais viu?
R/- Nunca mais vi, mas eu o ouço as vezes, ele me tira de situações bem embaraçosas (risos).
P/- Hum, legal essa história. Queria voltar lá pra sua infância ainda, na escola teve algum episódio marcante pra você? Alguma coisa que contribuiu na sua memória?
R/- Coisas marcantes da escola, não. O que meu pai esperava que nós fizéssemos, que era tirar notas boas, eu correspondia, né, às expectativas, exceto por um ano que eu repeti e quase morri de medo de contar pra ele. Mas eu tenho um fascínio por uma professora de história que eu tive no Colégio Coração de Maria, em Santos, que ela nos encantava com a forma que ela passava o conhecimento dela a respeito de história, que ela dava história geral, né, e história geopolítica, e ela era extremamente teatral, sabe? A aula dela era um show de teatro e essa professora me fascinou, é o que mais me marcou assim. Ah, e tem aprontações assim no colégio de freira que eu não gostaria de assumir a autoria hoje, depois de tantos anos, que fui eu que fiz aquelas artes, né? (risos) Arte de criança na escola aprontando com as nossas freiras.
P/- Teve alguma dessas aprontações que cê lembra?
R/- Ai, teve uma bem desagradável. Pois quando faltava energia… Aí ela tá gravando isso, mas vocês vão contar isso? Não, né?
P/- Mas você que está contando.
R/- Então, mas isso vai aparecer?
P/- Você não quer que apareça?
R/- Ai, não!
P/- Tá bom
R/- Ah, não. São coisas impróprias que criança faz pra aprontar na escola.
P/- Ah é?
R/- (risos) Né, coisa sem noção.
P/- Sim
P/2- Não, tranquilo, você só conta o que cê, sentir vontade. (inaudível)
R/- Ah não, não vamos deixar quieta isso aí. Isso já passou.
P/- Já passou
R/- Já foi a arte feita.
P/- Então cê fazia bastante arte, cê estudava em escola de freira?
R/- É, um período eu estudei em colégio estadual, naquele tempo que cê tinha que fazer prova de admissão pra conseguir uma vaga, né, quando o ensino estadual era mais rigoroso, né. E aí, um período eu estudei em colégio de freiras, Colégio Coração de Maria, em Santos, que parece que fechou o ano passado depois de não sei quantas décadas de Colégio, fechou na época da pandemia, não existe mais, era lá na ponta da praia.
P/- Uhum, e você aprontava com as freiras por quê? Porque, como era a sua relação… Digo, como é que era a sua relação com essa figura do cristianismo, assim, né… Como é que você…
R/- Então, o meu pai, ele não tinha nenhuma religião, assim, que ele seguia. Porém o ensino dessa escola era considerado excelente, então ele nos matriculou todas as filhas dele nessa escola com a condição de que nós fossemos dispensadas da aula de religião, né? E as freiras aceitaram essa condição, e nós estudamos lá. Então eu não tive contato com essa formação cristã, né. Conheço, sei os rezos…
P/- Mas e quando você era criança você tinha conflitos com isso, assim?
R/- Eu nem pensava nisso.
P/- Nem pensava nisso…
R/- Não, não.
P/- E com outras religião em geral alguma chamava atenção, ou nada?
R/- Nada. Eu vivi bem ateia, bem largada no mundo, até acontecer esse fenômeno aí do Seu José
P/- (risos)
R/- Que me deixou muito encanada. Aí depois que eu vi o seu José, eu ainda advogada, uma vez num fórum trabalhista terminada uma audiência, ele me chamou o meu nome, nome dos clientes e eu entrei na sala. Só que eu vi dois advogados ainda sentados na mesa da audiência, e eu fiquei em pé, né, aguardando os colegas levantarem pra eu poder tomar o meu lugar. Aí o juiz virou pra mim e falou assim, "a senhora não vai tomar o seu lugar, doutora? O que que a senhora está aguardando?", aí eu falei, "eu tô aguardando os colegas levantarem para que eu posso me sentar, né excelência"
P/- (risos)
R/- Aí ele olhou pra cara da escrivã, a escrivã olhou para cara, o outro colega da parte contrária olhou, todo mundo. Aí eu falei, “caramba! Tá acontecendo o que aconteceu com aquele senhor ,né, o Seu José”. Aí eu, muito sem jeito, me dirigi até a cadeira onde eu vi a pessoa sentada e me sentei no colo dela e realizei a audiência meio desesperada, assim, de não saber o que tava acontecendo. E nessa época eu conversei com um professor meu que é um psiquiatra forense, bem famoso aqui no Brasil, Dr. (inaudível), de que essas coisas estavam ocorrendo comigo, que eu estava vendo pessoas que só eu via, e que eu estava ouvindo pessoas que só eu ouvia. Aí ele me ouviu, me fez um monte de pergunta, igual a que você tá fazendo, sobre minha infância, meu pai, minha mãe, e ele acreditou que pelo momento conflituoso na minha vida pessoal, eu tava tendo algum tipo de surto psicótico, vendo e ouvindo coisas, e me recomendou uns medicamentos. Aí eu li a bula lá dos medicamentos que ele havia me recomendado e eu falei, “eu acredito que ele não está acreditando que isto está acontecendo comigo”, e aí eu não tomei os medicamentos. Pois as pessoas não acreditam, né, é muito fora da caixinha. E assim, se você vê as pessoas e escuta as pessoas você se enquadra na CID da esquizofrenia, né. Só que se você ouve e se você vê, e se você lida com isso internamente, sem sair partilhando com os doutores de plantão, né. Se bem que com o psiquiatra da (inaudível) eu falo essas coisas e, tudo bem, ele ainda não me medicou
P/- (risos)
R/- Mas, é… O que eu escuto não me induz a fazer nada que me machuque ou que machuque alguém. O que eu vejo não me induz… Não vou falar que às vezes não me assusta, às vezes assusta, mas não é que me assuste fazendo que eu vá ter alguma atitude danosa pra que eu procure uma castração química de deixar de ver e ouvir o que eu vejo e o que eu ouço, né. E na maioria das vezes eu não ouço nítido, né. Tem dias que eu estou aqui, eu acredito que tem uma família conversando ali, eu abro a porta para ver quem é que tá ai, são pessoas, só que elas não me veem e elas não me ouvem.
P/- Nossa.
R/- Que não é todo mundo que eu vejo que me vê.
P/- E a partir daquele acontecimento ali nessa audiência, né… É… Como que você foi lidando com isso, cê foi…
R/- Eu procurei uma amiga que é espírita a milênios, talvez você a conheça, a Rejane, ela ia lá no parque. E ela fazia esses discursos de mediunidade na Federação Espírita, né, de São Paulo e ela falou assim pra mim, "pra você parar de pagar mico…", porque eu tava comprimentando pessoas no corredor do fórum que só eu tava cumprimentando e eu comecei meio que ganhar uma faminha de loquinha lá do fórum, né. Aí ela falou assim pra mim, "pra você discernir quem tá na carne quem não tá na carne, você feche os olhos. Se você fechar os olhos e continuar vendo a pessoa, ela não está na carne. Se você fechar os olhos e não ver a pessoa, ela está na carne". Aí a partir dessa dica dela quando via alguma coisa, que alguém vinha me cumprimentar eu dava uma fechadinha no olho, se eu não visse a pessoa, eu sabia que era alguém que tava na carne, e se eu fechava o olho e continuava vendo, eu cumprimentava no meu coração. E aí comecei a fazer esse exercício de que quem tá aqui na carne e quem tá aqui na consciência pra poder discernir. Como agora, agora eu estou vendo um monte de gente aqui.
P/- (risos)
R/- Não tava assim agora há pouco. Mas agora tá chegando muita gente aqui.
P/- Gostam de escutar história boa (risos). E aí lá na sua…Voltando pra infância, como é que foi transcorrendo também a sua adolescência, assim, cê teve… Eu queria te perguntar especificamente a primeira lua que você teve, essa relação com o sangue, foi algo marcante, não?
R/- Foi desagradável, no seguinte sentido, eu tava na praia com um grupo de amigos meu, eu morava em um edifício em frente a praia em Santos. E aí eu tava sentada lá na cadeira, e uma amiga minha falou assim para mim, “você tá toda ensanguentada”. Só que eu sou a quarta filha da primeira núpcia do meu pai, então eu já sabia o que era menstruação, o que não era, minhas irmãs mais velhas eram menstruadas. Então eu amarrei uma toalha na cintura, corri pra casa que era em frente, né, atravessava a avenida eu tava em casa. E aí quando eu fui entrar, tava entrando assim pela cozinha, e meu pai tava na cozinha, e o sangue estava escorrendo pela minha perna e meu pai falou assim, "liga na ginecologista que eu não quero ninguém prenha nessa casa”. Foi isso, assim, minha lua.
P/- (risos) E a medida da vida que você foi trabalhando com os elementos, né… Você sente que a lua e a própria lua também do céu tem…É… Você teve aprendizados assim?
R/- Olha, quando a gente faz os cursos de magia, que eu fiz com o Rubens Saraceni o colégio de magia, a gente vê a influência que a lua exerce sobre as marés, sobre as águas e o nosso corpo emocional. Então a gente aprende, né, nas escolas de magia a lua ideal pra germinar um projeto, né. Você tem um projeto no seu coração, você vai fazer uma magia, você faz na lua oculta, que é a lua nova, que você coloca esse projeto lá dentro da terra escura e fria, pra que quando começar a lua crescente ascendente esse projeto venha a terminar. Como é o ciclo da natureza, né, com qualquer planta, com qualquer semente. Mas, assim, é uma ordem natural do planeta Terra esse satélite influenciar nas águas, nas marés, então é tudo muito natural, não tem nada de “Oh! Como a lua…”, entendeu? É uma coisa da natureza que tá aí, como tudo que está interconectado e exerce influência… É um conhecimento a respeito da própria natureza mas nada “Oh!”, né… Como não é também falar, “Oh! o Sol…”, né, que a Terra é um planeta que não tem luz própria.
P/- Entendi.
P/2- Então antes da gente chegar… Como que você… Contou…Você entrou nesse colégio, né… Só para gente passar pela adolescência… Teve alguma coisa, algum episódio, alguma história que seja…
R/2- Ah eu fugi de casa.
P/2- Ah é, você fugiu de casa.
R/- Então, e assim, no decorrer da da minha vida várias vezes eu me perguntei, né, porquê eu fugi de casa e conforme cada faixa etária e percepção emocional, eu me justificava pra mim de uma determinada forma, "ah eu fugi porque eu não tinha a liberdade que eu queria", aí depois passava um tempo, "não, eu fugi porque eu tinha muito medo do meu pai" ai passava um tempo, "ah não eu fugi porque eu tinha sede de sexo, drogas e rock n’ roll". É cada etapa que eu me questionava, eu me justificava pra mim de alguma forma. Hoje eu percebo que foi um movimento maior do que eu, maior do que a minha consciência do momento, alguém no meu sistema que tinha que sair fora, não sei, assim que eu sinto hoje. E aí eu fui embora de casa e tive muitas experiências, né.
P/- Como foi esse ir embora? Como você pensou, assim, pô, vou ir..
R/- Não, não foi nada premeditado, nada planejado. Eu tive uma discussão dentro da minha casa com a esposa do meu pai, e numa revolta, que nem eu escrevi lá na minha biografia do meu poema, eu arrumei minha mala e fui embora. Não foi premeditado, não foi planejado, eu nem sabia para onde ir com a minha mala, entendeu? Aí eu fui bater na casa de uma amiga falando que eu tinha fugido de casa, que não queria mais voltar para minha casa e ela falou que ela não ia poder me receber na casa dela, porque a hora que a mãe dela soubesse que ela pôs a filha do Mario pra dentro ia dar uma confusão e não sei o quê. E minhas amigas dessa escola, né, que eu estudei, elas foram batendo a porta na minha cara, uma a uma, não por elas, porque elas também eram adolescentes, né, mas porque sabiam que os pais, assim que me vissem ali, iam ligar para meu pai, iam ligar para minha casa e eu ia retornar, e aí eu fiquei meio que sem saber para onde ir. E aí eu fui dormir no aquário de Santos, que não tem nada a ver com o aquário de hoje em dia, assim, paisagem, né, era completamente diferente. E tinham três moradores de rua lá no recuo que tinha, assim, pra se proteger do frio, era interno. E eles me deixaram ficar lá com eles, tomei uma cachaça com eles pra esquentar, que tava frio, e eu passei a noite ali com esses moradores de rua porque eu não tinha para onde ir, foi uma noite juvenil.
P/- Aí você passou a noite ali com eles, né…
R/- E várias outras…
P/- Várias outras, e como foi esse período, dessas noites, assim?
R/- Foi muito difícil, porque eu tomava banho no mar, né, com aquela água salgada, fazia uma trança no cabelo… E eu dava aula, eu dava aula de natação no colégio, não, tsc na academia primeiro de maio lá em Santos, pra excepcionais, né. Eu ficava com eles na piscina enquanto o professor da academia oficial…Eu não tinha educação física, eu era uma assistente dele, né, pra cuidar dessas crianças especiais. Então eu trabalhava né, ganhava pouquíssimo, mas nem sabia que eu ganhava pouco porque eu não tinha a menor noção de dinheiro. Tinha uma vida muito próspera, muito boa dentro do seio da minha família, né. Eu não, não imaginava que não iam alugar um imóvel pra mim, que eu não tinha dinheiro pra alugar um imóvel… Eu não tinha noção do quanto custava um prato de feijão, entendeu? E aí eu fui ficando com esses moradores de rua, juntando um dinheirinho e conseguir alugar uma vaga numa pensão em Santos depois de alguns meses, e aí eu fui morar nessa pensão.
P/- Mas você continuou trabalhando, então?
R/- Continuei pouquíssimo tempo porque minha madrasta começou a me procurar, né. Meu pai tava viajando e eu não queria ser encontrada, e aí quando eu vi que ela ia bater lá na academia eu não fui mais trabalhar lá. Aí eu arrumei trabalho, assim, de limpar chapa de lanchonete, varrer chão de lanchonete pra comer, e acabei trabalhando servindo, assim, na lanchonete e fui procurando bicos, né, onde eu não fosse achada.
P/- E você dormia?
R/- Lá no aquário com eles até conseguir alugar uma vaga numa pensão. Não era um quarto, era uma cama e um espacinho no armário.
P/- E teve algum desses moradores que cê teve alguma lembrança? Alguma história que ficou ali, ficou amiga ou…
R/- Sim, eles me esperavam com pão com mortadela pra eu comer e um copinho de cachaça pra não sentir frio quando eu vinha do trabalho, sabe? E cada um tinha sua história de vida lá, porque foi parar nessa condição de rua, né. A maioria deles era em decorrência do alcoolismo, que eles causavam muito em casa, ninguém aguentava mais e eles acabavam saindo de casa por rejeição total da situação em que ele se colocaram e tavam na rua por causa disso, por causa do álcool.
P/- E aí você foi morar nesse lugar, e como seguiu sua vida?
R/- Eu arrumei, ah, eu menti né… Eu tava procurando trabalhos em que eu me enquadrasse lá no jornal né, que era oferta de trabalho no jornal. E aí eu vi uma vaga pra secretária num escritório de advocacia, só que tinha que saber datilografia e eu não sabia datilografia. Mas eu fui lá na entrevista e falei que sabia, e aí me perguntou quantas palavras por minuto eu datilografava, e eu menti, menti descaradamente porque eu não tinha noção de datilografia. E aí o serviço era atendimento telefônico, agendamento e datilografar as petições, né, do advogado lá responsável pelo local. Eu me dei bem na entrevista, acreditaram lá que eu sabia fazer o que eu não sabia. E aí o que eu fiz, eu fui aprovada nessa vaga de secretária, e aí no meu horário de almoço eu ia na escola de datilografia, e levava as petições que eu tinha que entregar no final do dia pra alguém da escola de datilografia fazer o meu trabalho enquanto eu aprendia sdfgsdfg. E eu fiquei nesse trabalho por quase seis anos, né. Quem me inspirou contar essa mentira foi uma fábulas do homem que falava javanês, e eu falei eu tinha lido já essa fábula e eu falei, “eu vou fazer igual o personagem daquela fábula e vou arrumar esse trabalho para mim”.
P/- A história desse chapéu, se puder pegar ele…
R/- Então, esse chapéu entrou na minha vida, pelo meu amigo, Osmar, que é um rapaz que toca maravilhosamente bem, que canta maravilhosamente bem. Ele comprou esse chapelão para a avó dele e a avó dele já estava com Alzheimer, então tem muita história engraçada, embora o Alzheimer seja tão triste né, mas ela era muito divertida. E quando ela ganhou esse chapéu do Osmar, ela lembrou de mim e às vezes ela não lembrava nem dos netos, nem das filhas, né, e ela falou o que ela estava fazendo com o chapéu. E o chapéu não era meu né, ele comprou pra ela, ai ele falou ó, “minha vó diz que esse chapéu era seu e eu resolvi te dar o chapéu”, e ele entrou na minha vida, assim, por uma senhora em um estado alterado de consciência disse que esse chapéu era meu e esse chapéu chegou até a minha pessoa (latidos ao fundo). A partir desse dia pus esse chapéu na cabeça e muitas coisas mudaram. Ele é um grande símbolo, né.
P/- Ele é, ele é o que?
R/ - Um grande símbolo, né?
P/- Sim, qual é o símbolo?
R/- Você não falou disso aqui?
P/- A gente estava falando do silêncio.
R/- Do chapéu…
P/- Do Silêncio, falando do silêncio, você teve alguma experiência já profunda com o silêncio?
R/- Todo dia. Olha o silêncio que é aqui… Nem um pássaro… Estar aqui, viver aqui, é ser o silêncio. E no silêncio você vê e ouve coisas, você percebe que é impossível estar sozinho… Impossível.
P/- E teve, é… Algum sonho que tenha sido também marcante, algum sonho que realmente mudou sua vida, mudou os acontecimentos. Assim, você tá vivendo, e teve um sonho e aquele sonho…
R/- Não, eu já tive sonhos em que coisas aconteceram e que tava dentro daquele sonho, mas não sonho de realização pessoal de que eu tive um sonho e aquilo mudou tudo na minha vida, não.
P/- Não, sonho dormindo.
R/- Ah, eu tenho inúmeros sonhos, inúmeros, vividos, terríveis. Quer ver ainda este ano um que me marcou profundamente é bem terrível. Eu sonhei que eu estava num lugar ermo e eu tomava um tiro, eu senti a munição entrando na minha caixa craniana aqui e enquanto eu estava sentindo esse meu osso estilhaçando eu estava parindo. Amparavam um bebê que saia de dentro de mim enquanto eu tava sentindo aquele projétil acabando com meu crânio, assim, eu sabia que eu ia morrer porque eu tinha tomado aquele tiro e ao mesmo tempo eu tava com o bebê que acabava de sair de dentro de mim e eu acordei com aquele negócio da morte e da vida na minha mão e fiquei reflexiva vários dias com a impressão que esse sonho me trouxe. Esse sonho é bem recente, mas eu sonho demais…
P/- E dos mais antigos assim, é, pra gente deixar, assim… Teve algum outro sonho?
R/- Mais antigo teve, teve um que eu… Da época que eu anotava meus sonhos… Teve um sonho que eu estava num bairro muito arborizado, havia uma perua kombi com vários quadrinhos, venda de gravuras pendurada por toda essa kombi, e essa kombi tava parado em frente a uma casa para qual eu estava me dirigindo. Aí eu entrei nessa casa, era uma sala imensa, com duas piscinas, uma piscina tinha água preta cor de café escuro, e a outra piscina era completamente cristalina e linda, linda, muito bonita, e a outra negra, negra, negra a água. Veio um macaco enorme em minha direção a hora que eu me deparei com essa sala com as duas piscinas, e esse macaco veio em minha direção não agressivamente, parecia que ele me conhecia, só que ele se desequilibrou e caiu nessa piscina escura de água escura. A hora que esse gorila caiu nessa piscina veio uma cobrona em direção a ele e eu dei a mão pra ele, e a hora que ele pulou para sair da piscina nós dois nos desequilibramos e caímos na piscina de água cristalina. Essa cobrona saiu da piscina escura, e conforme ela entrou nessa piscina clara ela foi virando a água, e aí eu acordei. E esse sonho era, sei lá, eu tenho gravado porque eu escrevi e o que eu escrevo fica melhor registrado.
P/- E como foi que você entrou para dentro do mundo da magia e das ciências ocultas?
R/- Foi quando teve um episódio com uma descendente minha, que até então ela levava uma vida como qualquer outra adolescente, e no dia do aniversário dela de dezesseis anos, nós estávamos aqui na montanha, e ela acordou muito cedo, foi para cozinha e começou a fazer um miojo. Oito horas da manhã, eu levantei e falei, “mas o que você tá fazendo, um miojo? tem tanta coisa que você gosta para comer aqui, hoje é o seu aniversário”, aí ela virou pra mim com um garfo na mão da panela e começou a gritar que ela queria a mãe dela, “cadê a mãe dela”. Eu achei que ela estava brincando comigo ou alguma coisa assim, tomei o garfo da mão dela e a hora que eu tomei o garfo ela entrou em pânico como se eu quisesse matá-lá ou sei lá, e ela saiu correndo por aqui gritando absurdamente que queriam matar ela. Aí eu pedi para o irmão dela ir buscá-lá, e esse episódio foi o que a psiquiatria chamam de um surto psicótico, só que eu ignorava completamente essa questão da saúde mental, eu nunca tinha vivenciado isso próximo de mim e eu não entendia aquele episódio que aconteceu com ela. Nós a levamos para São Paulo, antes de ir ao médico eu levei ela ao Paulo Ludogero - que é aquele mago que eu falei para você - para ver o que que tava acontecendo com ela, porque ela estava completamente fora de si e não me reconhecia como mãe dela. E aí eu levei ela lá no Paulo, ela destruiu o terreiro lá do Paulo em surto e gritava que iam matar ela de novo que, queriam mata-lá, e aí ele lá com todo o conhecimento que ele já tinha dessa área magística e espiritual falou pra mim que eu deveria levá-la ao médico, que era uma questão clínica, física e que, claro, nada tá desconectado, que tinha alguma coisa a ver com esse mundo imaterial, sim, só que ela precisava desse olhar integral. Aí a levei ao Hospital São Paulo, uma equipe atendeu super bem, e ela foi diagnosticada com esquizofrenia e a partir da não aceitação de que aquilo estava acontecendo dentro da minha casa, da minha família, que eu comecei essa busca por querer entender, por querer explicar, e por querer reverter, para que ela voltasse a ser como eu a conhecia até então. Foi aí que eu fui pra esse universo da magia do ocultismo…Eu fui estudar a história das religiões, o fundamento que cada etnia tem a respeito da nossa existência, né, mas buscando mudar o que se apresentava, entendeu? Aí quando eu quebrei essas resistências que foram anos, tá? De, para tudo! Não vai atrás de mais nada, não tem mais papo, não tem mais trabalho de umbanda, de magia branca, magia preta, magia rosa, para tudo! Para! E olhe para isso como é e aprenda com isso, porque isso está acontecendo para você aprender mais, pare de recusar o aprendizado e o que se apresenta. E aí eu parei com todos os tratamentos de ordem mística esotérica e espiritual com essa minha filha, continuei levando ela no psiquiatra convencional, que é um excelente profissional e constatei nesses nossos últimos 15 anos de caminhada com esse diagnóstico que realmente há mesmo uma disfunção química neural de transmissão de informação neurológica que só a indústria farmacêutica, no momento, proporciona esse equilíbrio pra minha filha como ela se encontra hoje, super bem. E hoje eu consigo ser grata aos medicamentos psiquiátricos, que eu já tive tanto preconceito, sabe? De querer acreditar que tem outra solução, de que tem outra fórmula para que ela fique em equilíbrio e estabilizada. Foram inúmeras experiências, é… Cada surto trouxe um outro olhar e enquanto eu resistia a aceitar o que estava acontecendo, esse meu contato com esse mundo imaterial ficou meio que bloqueado, sabe? A hora que eu parei com tudo e aceitei falei, “eu vou aprender com o que acontece com ela”, tudo voltou, sabe, desse universo não material, e eu chego a algumas conclusões totalmente pessoais. Não é embasado em nenhum estudo científico ou nem sei se alguém pesquisa isso que eu vou falar agora, mas eu percebo que muitos nesse universo da doença mental, como é intitulada, eu os percebo como seres passando pela primeira experiência física, biológica e completamente associados às dimensões em que a consciência dele tem habilidade de estar. Deu pra entender o que eu falei?
P/- Sim.
R/- Então, nessa caminhada da não aceitação que tava se apresentando, e eu caí nesse lado do ocultismo. Em uma ocasião, pois cada vez que essa minha descendência surtava, mudava a fisionomia física dela, as condições físicas dela mudavam, e em um desses surtos dessas situações ela perdeu praticamente todos os cabelos, ela ficou careca. E levando ao psiquiatra, e vendo como poderia reverter, nada fazia o cabelo dela nascer de novo e voltar. Aí eu a levei num terreiro de candomblé, é até aqui em Juquitiba, mãe Neinha, ela é muito famosa, internacionalmente famosa. Eu levei a (inaudível) até ela, e ela me pediu algumas coisas, ela me pediu cabeças de parafina, crânios, né, de parafina, ela me pediu um monte de semente, semente de soja, feijão branco, feijão preto, feijão fradinho, vários tipos de feijão, vários tipos de amendoim, vários tipos de sementes, essas cabeças, e ela me pediu um miolo de boi. Aí eu comprei esse miolo de boi no açougue, que é o cérebro lá do boi, fui até o terreiro da manhã Neinha, e os filhos de santo dela lá preparam esse miolo de boi com algumas especiarias, que eu não sei todas, eu sei que tinha azeite de dendê, eu sei que tinha alho e outras coisas que eu dizer o que era. Eles prepararam esse miolo de boi com uma reza em yorubá cantando, todos os filhos cantando na cozinha e preparando esse miolo. A hora que eles terminaram de preparar, a mãe Neinha colocou esse miolo de boi na cabeça da minha filha e colocou um lenço e fez a reza dela lá nessa língua yorubá e pediu que nós ficássemos ali com a minha filha e ela foi fazer outras coisas. O miolo cozinhou, era cru e ele foi crescendo, crescendo naquele lenço e começou a escorrer pelo lenço, mas cozido como se tivesse numa panela e foi caindo, foi caindo. Aí passado, sei lá, meia hora, quarenta minutos, a mãe Neinha retornou, tirou o lenço da cabeça dela, conferiu, tava completamente cozido, ela recolheu as coisas, colocou num recipiente próprio, pegou essas cabeças de parafina, pediu para eu repetir o meu nome e o nome da minha filha por 21 vezes com a mão naquele crânio de parafina. E aí eu caminhei com ela até um barracão onde tinham orixás do tamanho, de uma estatura, assim, entre 1 metro e 60, 1 metro e 50, 1 metro e 60 e eu coloquei no pé, acho que foi dessa imagem aqui de Iemanjá, mas em estatura gigante, a cabeça, e fizemos uma entregando das condições psíquicas da minha filha para essa entidade Iemanjá. E a partir disso o cabelo dela floresceu como você está vendo hoje em dia, que só ela quer ter cabelo no mundo, né. Mas não teve remédio convencional, não teve uma explicação pra isso, sabe? Quando você usou de todos os recursos da medicina tradicional e o cabelo só ia embora, ia embora, e foi uma magia assim que não tem como negar que da noite pro dia aquele cabelo explodiu sabe. Então nessa minha caminhada de magia, eu vi coisas que não dá para nossa razão lógica e intelecto explicar. Uma vez eu tava no auge do desespero com essa situação né - quando a gente não aceita as coisas a gente se desespera - e aí eu conheci um centro de magia negra e eu em nome de mudar aquela situação naquele arquétipo idiota, né, que a mãe faz qualquer coisa pelo seu filho - depois eu fui aprender muita coisa nessa questão dos arquétipos psiquicos. Nessa de fazer qualquer coisa pelo meu filho, eu fui, deu um trabalho danado pra que eu conseguisse chegar até esse lugar, que eu nem sei aonde é, que me levaram vendada. Eu sei que o que eu tinha que fazer: de repente eu estava no lugar que era como este daqui, uma floresta, uma clareira nessa floresta com uma fogueira. Eu estava nua com uma capa, mas nua por baixo dessa capa, e haviam 13 pessoas que eu não sei quem são, se eram homens se eram mulheres, que estavam também com uma capa longa, um capuz que cobria assim os rostos. E eles estavam em círculo caminhando e entoando uma cantiga, um som, uma música que me lembra o canto gregoriano, mas não era isso porque era só vocalizado sabe, e formava assim um som muito peculiar que eu nunca tinha escutado. E aí enquanto eles estavam andando em círculo e entoando esse som, a pessoa que foi meu amigo que me levou até essas pessoas chegou perto de mim e falou pra eu tirar a capa, e eu fiquei nua lá naquela clareira, e aí nesse círculo entrou um bode animal, bode com chifre, grandão, tudo, e esse bode falou com vozes humanas vocalizando… O bode falou comigo. Eu fico até emocionada de lembrar de maluquice que a gente passa em nome sei lá do que. E o bode falou para mim que a perfeição está na aceitação, que eu aceitasse, que a partir do momento que eu aceitasse, eu ia ver a perfeição do universo. E eu fiquei tão em choque vendo um bonde falar, e pelada no monte de gente que eu nem sei quem são, nem aonde estava, que eu acreditei que o bode tava mexendo a boca e alguém naquele círculo que tava… Sabe, tipo um ventríloquo, quando a mente não quer acreditar no que ela tava vendo e no que ela tá ouvindo, mas era tão sincronizado que minha cabeça pirou, sabe… É um ventríloquo? O bode tá falando comigo? O que que eu tô fazendo aqui? Agora eu sou o sacrifício! Olha, passou milhões de coisas na minha cabeça. Bom, enfim, o bode falou que se eu aceitasse o que se apresentava eu ia enxergar a perfeição do mundo. Que medo daquele bode, ele era lindo mas eu tava com muito medo naquela situação. Aí depois que o bode falou comigo ele virou as costas, passou por esse círculo, eu não vi mais o bode e eu fiquei ali pelada tremendo na fogueira, tremendo de frio, de medo, tremendo de choque, minha cabeça não entendendo o que eu tava fazendo, e aquele cântico entrando na minha cabeça, parecia que tinha um eco muito forte. Não sei quanto tempo eu fiquei ali, mas aí eu vi a lua e ela tava sei lá, no quarto crescente, porque ela ainda não estava cheia, e aí a hora que eu vi essa lua, que eu olhei a lua, todos eles uivaram, essas pessoas que estavam cantando, um uivo violento, e aí meu amigo veio pois a capa em mim e falou “acabou”. Entramos no carro dele, ele pediu para eu ficar de olhos fechados que ele ia me levar de volta, ou se eu queria colocar a veda eu falei que não, que eu ia obedecer, fiquei de olho fechado e retornei a minha residência. Foi outra experiência muito maluca que eu passei na minha vida, assim, de desacreditar… E aí eu fiquei com isso.
P/- Mas esse era culto de que, esse do bode?
R/- De magia negra.
P/- Magia negra…
R/- Mas depois que a gente vai caminhando, a gente percebe que esse negócio de falar magia negra como algo ruim, pesado, negativo, pejorativo ou de magia branca porque é da luz, porque é o bonzinho… A gente percebe que quando se usa o termo luz e trevas, não tem tendência de positivo e negativo, é a integração da nossa existência, sabe? Pois a Terra é um planeta que não tem luz própria, né, ele depende totalmente da iluminação dos raios solares para a gente enxergar alguma coisa aqui. Então aqui é pura treva, aqui é pura escuridão, que depende do astro Sol para que a gente visualize aí as formas que a gente percepciona, pela nossa visão, com a incidência dos raios solares. Então na magia, sim, o que é negro não é ruim, a pele do universo, ela é negra, se não fosse negra a gente não via o brilho das estrelas, né. E quando vem a luz do Sol, ela ofusca a luz das estrelas, né, elas estão durante o dia aí e a gente não vê. Então a magia branca ou magia negra se refere mais ao horário, ao ciclo da Lua, à luz que está ou não incidindo sobre o planeta Terra. Então a gente aprende magia, mas não fala magia negra, é que são coisas que são realizadas no escuro da noite, entendeu? Não tem esse medo que a dualidade tem, né.
Me perguntam muito, "ai você é uma maga negra ou você é uma maga branca?". Meu, eu sou multicolorida, né, num tem esse negócio de maga negra, maga branca, maga azul, maga verde… Porque mago, maga, é só um arquétipo psíquico que eu me disponho a experimentar, assim como eu já me dispus a experimentar o arquétipo da advogada, é um arquétipo psíquico. Minha psique acredita que eu sou advogada, então eu vou lá faço curso de formação, que é o curso de direito, e me formo, tomo a forma de uma advogada que se pauta em fazer a lei ser observada, cumprida e executada de acordo com os ditames do Legislativo.
P/- E você, antes de você justamente experimentar esse arquétipo do maga, você experimentou esse do advogada, né, como é que foi? Tem uma história, dessa experiência, assim, de ter estudado direito, ter sido advogada…
R/- Olha, o curso de direito, ele é fascinante, ele abre, assim, uma percepção da trajetória humana incrível, né, que vem lá do direito romano, de Napoleão, nosso código civil, as normas para viver em sociedade. Se nós realmente praticassemos que está na Constituição Federal e em outros códigos de lei, a nossa sociedade ia ser incrivelmente próspera, harmônica, né, generosa, mas nós não praticamos o que está na norma, né. É… A norma é como a Bíblia, a lei é como a bíblia, na mão de cada tem uma interpretação, quem convencer melhor o magistrado da sua percepção da mesma norma, leva a sardinha pro seu lado, né. E assim no direito eu vi que tudo que eu aprendi na faculdade era muito bonito, eu sou uma pessoa que tem uma extrema dificuldade de verter lágrimas, eu sou muito mais raivosa do que emotiva, e eu chorei lendo a constituição do estado de São Paulo uma vez. Meus filhos não acreditaram, de tanto que eu me emocionei, de quem assim teve a visão de viver um coletivo com respeito, com ética, com honestidade, com… Sabe, a distribuição da arrecadação do dinheiro da população, para que ela fosse distribuída de forma realmente relevante, né, pra que todos tivessem uma vida íntegra em todos os sentidos. A lei é linda, a lei ela é maravilhosa, né, mas nós as pecinhas humanas, né, a usamos conforme nossa conveniência e interpretação, então eu me desencantei com essa área. Porque quando a gente tá estudando, a gente acredita que vai ajudar de alguma forma, fazer justiça, né, mas na prática as coisas se mostram bem além do que a gente supôs enquanto estávamos acadêmicos. E, sim, eu amava advogar, eu amava acreditar que eu estava defendendo o direito de alguém, só que aí com esse episódio que aconteceu na minha família ficou inviável me manter em minha banca de advocacia, e cuidar da minha descendente. E aí eu escolhi deixar essa área e me formei, tomei a forma de uma terapeuta familiar sistêmica e empresarial, fui fazer um curso de formação com a Tereza (inaudível), uma alemã. E foram dois anos de formação, e eu passei a atuar nessa área da terapia sistêmica porque eu poderia cuidar da minha filha sem ter de me ausentar, pra me dirigir até o local de trabalho e executar coisas, né, e aí foi uma escolha que eu fiz. Deixei o arquétipo da advogada, pedi o cancelamento da minha ordem em 2017, dia 13 de junho de 2017, e me dedico hoje em dia a atendimento terapêutico, mas com um método que eu criei, que é o método FODASE de terapia, né, eu acredito que já conversei com você sobre isso.
P/- Mas pode contar o método de novo
R/- O FODASE ele é uma sigla que significa força, ordem, direção, do amor, serenidade e equilíbrio, que são seis passos internos pra você perceber aonde está a sua força vital, como acessá-lá e mantê-lá, né, a medida em que você visita aÍ os escombros da sua alma, os seus traumas emocionais, as suas paralisias e bloqueios em decorrência das histórias que você passou, você ganha força para estar no presente, consciente das escolhas que você está fazendo. Você estando forte, você vai colocar em ordem tudo o que você é, tudo que você sente, cada coisa tem um lugar, você estando forte e ordenado, você vai poder direcionar os seus sentimentos, as suas emoções para algo útil nos seus dias e no coletivo, né. Então forte, ordenado e direcionado você começa a amar a você, do jeito que você é, do jeito que você sabe ser. Forte, ordenado, direcionado e amoroso você fica mais sereno para manter o equilíbrio na sua vida em todas as áreas. E eu criei esse método com todo esse embasamento de conhecimento que eu fui buscar, depois que aconteceu esse episódio com a minha família, então eu fui estudar a doença mental, eu fui estudar neuropsiquiatria, neurobiologia, para compreender o funcionamento hidráulico químico, mecânico, sistêmico desse organismo que nós somos. E aí busquei junto a Freud, Jung, inúmeros outros nomes da psicologia e da psiquiatria, peguei as dinâmicas que funcionaram para minha pessoa e criei este método de terapia chamado FODASE. Num vai me perguntar porque o palavrão? Todo mundo me pergunta disso, principalmente os amigos que me convidam pra fazer palestra em Centro Espírita, eles querem que eu vá conversar mas eles não querem que eu fale que o nome do meu trabalho é FODASE. O FODASE, ele faz parte da minha vida o, palavrão foda-se, pois quando eu não sabia lidar com as minhas emoções, o que acontecia comigo é que eu tacava um foda-se. Ah, não estava indo legal nesse trabalho? Foda-se! Vou arrumar outro trabalho para me realizar. Ah, esse namoro não tá legal? Foda-se! Vou arrumar outro namorado pra dar certo. Tudo na minha vida era foda-se, ai não tá funcionando, foda-se, eu vou fazer outra coisa da minha história. E o palavrão faz parte do meu sistema familiar, sabe? Todo mundo falava muito palavrão na minha família, e aí a hora que eu compreendo um pouco melhor como eu funciono na minha trajetória, eu não vou abandonar tudo que faz parte de mim, eu adoro o foda-se. Aí eu falei, tá mas agora no mundo terapêutico, né, de acolhimento, de olhar pra gente - se bem que eu sou terapeuta de choque, num sou muito acolhedora, sou mais do choque - eu falei, não, eu não vou viver sem falar o foda-se, essa não sou eu. Aí eu tornei o foda-se essa sigla, e pra cada letrinha do foda-se tem dinâmicas pra serem realizadas e percebido o que você anda fazendo com a sua experiência aqui.
P/- E como foi que deu esse ato de criar, né, uma técnica, um método? Como que cê falou, ah, eu vou sistematizar isso dessa maneira ou como foi a inspiração que você teve?
R/- Foi nisso, assim… Porque tudo é muito combatido, né, o trabalho do Bert Hellinger, o constelador sistêmico, ele é extremamente rebatido e criticado por inúmeras pessoas, e ele que viveu toda aquela trajetória que levou aquela percepção dele, né. Jung, ele como aluno lá do Freud, ele teve todo aquele (inaudível) de conhecimento do mestre dele, só que além daquilo que ele recebeu, ele percebeu por experiências dele que havia outras coisas ali, como o inconsciente coletivo, como os campos morfogenéticos, transmissão celular de informação, de geração a geração, e aí não dava para ele levar na psicanálise, o trabalho do Freud, porque ele tinha o dele com tudo que ele foi abarcando. E assim eu me sinto, com todo conhecimento que eu fui buscar, com tudo que eu estudei, eu coloquei eu, o que eu vivi, o que eu vi, frequentando nesses últimos quinze anos não é manicômios, as internações, inúmeros contatos com pessoas que têm uma percepção totalmente diferenciada do que a gente tem do que seria a realidade, e aí é um trabalho meu, eu senti, eu fiz, eu criei. E quem me procura sente efeitos válidos dentro de si na experiência do dia a dia, então eu me sinto assim também pioneira nessa área terapêutica com o meu método.
P/- E teve alguma, algum caso, é, do seu método que foi transformador pra você, alguma experiência que você viveu com ele?
R/- Só na minha própria vida. De alguém que me procurou, não. Como eu faço, eu atendo você três vezes, numa primeira vez a gente conversa faz toda aquela anamnese lá necessária, aí eu percebo o que seria ideal naquele momento, e te passo umas lições de casa. Pra cada pessoa é uma lição de casa, e eu sei que se você fizer esses exercícios que eu falei para você fazer, você vai caminhar sozinho, você nem precisa mais me procurar depois de passar pelo FODA-SE. Só que se você não pratica aquilo, em algum lugar você se enrosca dentro de você e aí você me procura de novo. Eu te atendo três vezes, porque eu sei que se você fizer o que eu pedi para você fazer, você vai percebendo o que você tá fazendo com a sua história, aqui e agora. Então eu não tenho um caso para te contar que foi ótimo, porque a pessoa me procura, eu passo a caminhada, ela caminha e vai, e eu não procuro saber o resultado .
P/- Mas da sua vida mesmo qual foi o momento que foi marcante?
R/- Quando eu me coloquei à disposição daquela frase de autoconhecimento que eu odiava, porque eu não compreendia, que é “escuta o seu coração”. Nossa, como me enraivecia quando alguém falava isso pra mim, "escuta o seu coração". Eu falava, "escuta o meu coração", o meu coração (sons de batidas do coração). Ou meu coração é mudo e não fala porra nenhuma, ou eu sou surda e não escuto a voz do meu coração, o que quer dizer “escuta o seu coração”? E eu sou muito prática, sabe? Aí eu me coloquei à disposição de ficar escutando esse coração e aí, e ele só ta ta ta pulsando, né. Uma hora eu percebi que entre o meu inspirar e o meu expirar, sei lá, tem um nanosegundo entre o ar entrar e o ar sair, que acontece uma faísca dentro do meu tórax, e a hora que eu tô lá há mó cota, que nem uma idiota, tentando entender entender esse "escuta o coração", quando eu percebi que aconteciam umas faíscas dentro do meu corpo, eu quis perceber aquilo de novo. E aí eu senti meu timô lançando sinal eletromagnético para o meu coração, e a hora que eu percebi que timô é a chave que liga o motor do carro, transmitindo aquela faísca pro coração bombear ar, me veio esse universo do FODASE sabe, aonde está minha força, o que é essa tal de kundalini que todo mundo fala, eu senti. Quando eu senti essa faísca, um éter aqui no meu cóccix subiu queimando pela minha coluna vertebral, um vapor quente para caramba pegou aqui no meu cérebro, aqui atrás, e o meu olho, eu percebi que eu captava a visão com a parte posterior do meu cérebro, e que meu olho era um projetor. Eu fui até pesquisar como funcionava esse nosso sistema visual, e é exatamente assim como eu senti, quando aquele vapor subiu. Mas também só senti essa vez esse vapor subir, nunca mais senti isso outra vez na minha vida. E aí eu percebi que essa frase, "escuta o seu coração", as pessoas querem dizer perceba a sua intuição, né, ah, o universo está mandando sinal, não tem aquele sentimento de que você tá indo por aqui, de repente cê, não, eu vou por ali, ou não eu não vou mais, eu vou voltar. Mas foi essa frase, "escuta o seu coração", que me irritava muito, que me levou a essa aventura interna. Eu vi um elétro… É como se eu fosse uma pilha, aqui fora é músculo, osso e dentro tem um negócio que é um vapor eletromagnético, um fluido, e eu me senti que eu era desfragmentada assim, uma coisa só, com um tudo, eu era uma parte desse tudo. Nunca mais tive essa sensação, busquei várias vezes encontrar esse nano segundo, mas foi aquela vez e nesse dia eu escrevi FODASE, força e isso, isso, isso e faço assim, assim, assim pra perceber em mim aonde estão minhas forças, qual que é a ordem que tem que estar no meu coração, que que eu aceito em mim, o que que eu não aceito, pegar essa parte que eu não aceito e encontrar o lugar dela, porque que tem. E aí nasceu o foda-se assim, com essa minha revolta com o "escute o seu coração".
P/- Nossa, então foi a logo após transe que você…
R/- Escrevi.
P/- Escreveu. Você estava falando que você tinha um embasamento e estudou até chegar nisso, né. Você se formou em que, assim, dentro desses campos alternativos?
R/- Técnica em apometria, pelo Instituto Eterna Iluminação do Ser, que é lá em Guarulhos, na Rua Eunice, talvez numero 32, mas é Rua Eunice em Guarulhos. Me formei em apometria, e quando surgiu esse surto e eu fui buscar medicina, aí eu fui conhecer a apometria, eu fui conhecer a cromoterapia, eu fui conhecer o reiki, eu fui conhecer a constelação sistêmica, eu fui conhecer o thetahealing, que me decepcionou tão incrivelmente. Quanta frustração, né? Em cursos que a gente paga um rim, custa o curso no mercado ai dos órgãos, e depois você descobre que era uma grande fraude. Bom, eu me informei consteladora sistêmica técnica apométrica, auditora em dialética… É…. Theta healing, reiki, cromoterapia, florais, magia, e umas ordens que se diz secreta e por serem secretas eu não vou, né…
P/- (risos)
R/- Desvendar os segredos secretos. Não falamos daquilo que não falamos, deixa isso para o campo do mistério misterioso.
P/- Mas quando você disse que se formou em magia, a que você pode falar é qual?
R/- A do Rubens Saraceni, colégio de magia, em São Paulo, que te ensina todos os símbolos, toda a escrita magistica, todas as representações dos elementos que compõem o planeta Terra, de como você reverenciar os ventos, o fogo, a água, de como você deve abrir uma mandala para saúde, qual o desenho, né, qual o simbolismo da saúde que a geometria sagrada, as velas que se dispõe nessa mandala, a oração que se faz na abertura de uma mandala, por onde você entra nela, o que você fala dentro dela, por onde você sai dela, sincronizando com a geometria sagrada do universo. Aí quando eu falo de magia é do colégio Rubens Saraceni.
P/- E… Então, só pra enumerar, foi apometria, magia, cromoterapia…
R/- Dianética, thetahealing, constelação sistêmica, que você começou pela apometria, né. Aí eu tenho inúmeros cursos aí desses de baciada, né, no oito horas. Eu conheço um cientista de radiestesia que ele tem pirâmides de - como é o nome daquele material cirúrgico? Do piercing lá? - pirâmides de tamanhos gigantescos. O trabalho dele de radiestesia, ele é um industrial aposentado, ele é de São Carlos, ele tem inúmeros livros na área e ele me disse que pra eu ter o conhecimento que ele tem de radiestesia, eu teria que estudar no mínimo vinte anos, no mínimo vinte anos pra praticar o passo a passo daquela experiência. Então o curso de mesa radiônica, multidimensional, arcturiano, sapicturiano, e blá blá blá, eu nem sei te dizer quantos cursos livres eu tenho nessa bacia das almas aí do mundo holístico.
P/- Pegando as mais marcantes, essa de magia…
R/- Olha, a mais marcante pra mim é a do campo morfogenético, né. É tão real o que você não consegue apalpar e levar para um laboratório que é a mais marcante, e eu descobri - que eu tô tentando lembrar o nome do biólogo que eu mando todo mundo ler, (inaudível), é esse? Creio que seja - que é desse campo morfogenético, da teoria dos cem macacos. Uma vez eu aqui na montanha nesse silêncio maravilhoso, já treinando constelação sistêmica há uns três, quatro anos, me coloco aqui no meio da sala, e me coloco a disposição de sentir o Bert Hellinger, o pai aí da constelação. Me deixei tomar por essa representação, por essa consciência do Bert Hellinger, e segui o movimento que o meu corpo apresentava. O meu corpo me levou até aquela estante alí, e eu puxei o volume da enciclopédia “Os pensadores”, eu abri aquele volume ao acaso e peguei um capítulo em que falava de que numa comunidade, os Quakers - se não me engano, na Inglaterra, eu acho que eu estou errada, não é Inglaterra, mas é algum lugar ai europeu - os Quakers, eles se reuniam uma vez por semana no local da comunidade deles, eles sentavam em círculo e ficavam em silêncio respirando juntos. De repente um deles manifestava algum movimento, alguma fala, algum gesto, alguma coisa, todos que estavam lá observavam aquilo que se manifestava e agradeciam. Às vezes vários corpos manifestavam alguma coisa que podia ser fala, gesto, som, comportamento e às vezes nada acontecia naquele período de tempo em que eles se reuniam. E eu, me colocando à disposição do Berth, segui o movimento e abri essa enciclopédia dos pensadores trazendo essa informação desses Quakers, então eu percebi que a constelação sistêmica que a gente conhece hoje, que se reúne um grupo ou você traz a sua questão, aí eu peço para você escolher um corpo dentro das pessoas que estão aqui para representar você, sua mãe, seu pai, seu irmão e as pessoas acabam se comportando fisicamente igual a você, igual a sua mãe, igual ao seu pai. O campo morfogenético do Berth Hellinger é a experiência semanal dos Quakers, então eu não tenho dúvida interna desse campo de acessibilidade que qualquer corpo humano que se coloca à disposição consegue sentir, ver e ouvir. Respondi sua pergunta ou fui longe demais?
P/- Muito profundamente. Às vezes eu fico num silêncio pra sentir a resposta.
R/- Entendo.
P/- E então, na constelação… É… Aproveitando que a gente entrou nela, cê deve ter visto uma constelação de histórias.
R/- Eu cai nesse universo da constelação, e aí eu percebia que se eu tinha algum problema emocional, algum trauma, alguma coisa a ser vista e resolvida, seria com relação à pessoa do meu pai, pois a minha mãe havia falecido quando eu tinha dois anos de idade, eu não vivi nenhum conflito com a minha mãe, nenhuma briga, nenhum desentendimento. Então eu acreditava no meu coração que eu não tinha nenhum problema com relação à figura materna, e quando eu estive em primeira vez em contato com a constelação, a terapeuta, ela pediu para chamar uma pessoa pra me representar, uma pessoa para representar meu pai, e uma pessoa para representar minha mãe. Eu escolhi, começou a constelação a pessoa que representava a minha mãe, ela quis deitar, ai ela deitou no chão, a pessoa que me representava queria chutar o corpo da minha mãe, tava com raiva, queria bater nela, e eu assistindo a minha constelação e tendo contato pela primeira vez, eu falei, puta palhaçada! Nada a ver com a minha realidade, pra que que eu vou querer chutar a minha mãe, brigar com minha mãe? Que merda isso daqui, né, não faz o menor sentido isso para mim, o povo aqui tá num delírio coletivo. Nada a ver com que eu sinto, eu não tenho raiva da minha mãe, ódio da minha mãe, querer chutar o cadáver da minha mãe, que sem noção essa merda. Achei uma merda! Só que eu sou teimosa e persistente como só eu. Falei, não, não é porque eu tenho um primeiro contato com a situação, que eu já vou negar tudo de pronto, mesmo porque Jung disse, né, não nas palavras dele, nas minhas, “negou, fodeu!”, né. Eu falo isso pra todo mundo, mas é embasado no Jung que disse que aquilo que a gente nega, toma conta da gente. Aí eu procurei um segundo constelador pra fazer a mesma experiência, nesse segundo constelador, colocou eu, minha mãe, meu pai, a menina que representava queria chutar e bater no cadáver da minha mãe. Eu falei, caramba, dois grupos diferentes de pessoas que não me conhecem, a reação física de quem me representa idêntica à daquele grupo que eu fiz antes, que coisa estranha. Não satisfeita eu fui procurar um terceiro constelador, com a mesma questão, num outro lugar, num outro bairro, ninguém me conhecia também, cheguei lá naquele grupo e a mesma coisa se repetiu, a moça que tava representando minha mãe imediatamente ela queria deitar, deitava e a moça que me representava, queria chutar, bater, cuspir na minha mãe. Aí eu falei caramba, três lugares diferentes, três grupos diferentes, a mesma reação?
Voltei lá com a primeira consteladora, que foi com quem eu me formei, a Tereza, e falei para ela, “Tereza, eu posso entrar no meu lugar como representante minha mesmo e com os outros representantes?”, ela falou, "pode, só não vai machucar ninguém aqui, não pode pôr a mão em ninguém, não vai pôr a mão, mas pode". Quando eu entrei naquele canto da constelação eu dei de cara com uma coisa que eu não tinha a menor consciência, eu tinha tanta raiva da minha mãe, e eu não tinha consciência. Eu fiquei com raiva porque ela morreu, eu me senti abandonada, eu achei uma injustiça o que ela fez comigo, sem tamanho, achei uma puta sacanagem, me botou no mundo, ficou comigo dois anos e morreu, filha da puta do caralho! E eu não tinha consciência que eu carregava o óbito da minha mãe, como eu tinha só 2 anos, que o que ficou em mim foi isso, raiva, abandono, rejeição, indignação. Eu, como adulta, acreditava que o que eu sentia com relação a minha mãe era um grande vácuo, uma grande ausência da presença de quem me deu a vida, mas não vislumbrava que emocionalmente eu tinha raiva dela. Aí, quando eu tomei contato, a terapeuta falou, "pode por pra fora tudo que você está sentindo, só não pode agredir fisicamente a representante", aí eu falei tudo isso, aí eu chorei como eu nunca me vi chorar na vida, era uma criança mesmo, sabe? Depois que eu chorei toda essa raiva, todo esse sentimento de injustiça, de abandono, de rejeição, de desvalor, e de culpa, por que meio que eu me sentia culpada dela ter morrido, sabe… Aí eu chorei tudo isso, aí a moça que estava representando a minha mãe depois que eu pus toda raiva pra fora, tudo que eu xinguei, chorei, ela se sentou, me abraçou me olhou nos olhos, e falou “esse era o meu destino". Aí me deu uma tremedeira, uma catarse, eu não conseguia controlar o meu corpo quando ela falou isso, sabe, essa frase "esse era o meu destino". Ai meu corpo se debateu, tremendo, tremendo, tremendo, e aquilo foi tremer o tempo que precisou tremer, aí eu consegui abraçar a minha mãe na alma e reencontrar minha mãe, dum jeito de quem me deu a vida, e de quem tem amor nesse ato, sabe. E aí parece que internamente, assim, uma peça encaixou num alívio, sabe, eu precisava ter consciência dessa raiva aí que eu não sabia que tinha. E eu sempre fui agressiva e raivosa e não atinava porque eu… Por que que eu sinto tanta raiva e sou tão agressiva, né? E aí nesse encontro da constelação eu percebi que eu sobrevivi ao óbito da minha mãe, na raiva, na agressividade, então eu sou muito grata à raiva e à agressividade, porque acredito que isso me impediu de morrer junto com minha mãe, sabe, na dor, do corte dessa caminhada terrena. Então a constelação, ela me revelou sentimentos com relação a certas situações que eu desconhecia a meu respeito, e após inúmeras constelações que eu fui fazendo, eu fui descobrindo coisas do meu sistema e aí fui investigando com os ascendentes que ainda estão vivos o pouquinho que eles sabiam da nossa história, sabe. Então esse trabalho, ele me trouxe força da vida de colocar dentro do meu coração onde cabe o raivoso, onde cabe o agressivo, onde cabe o saudoso, onde cabe o habilidoso, cada aspectozinho meu foi retornando e me deixando mais inteira diante de mim. Foi muito curioso ir a três lugares e eu ver uma raiva, que não era nem que eu negasse, eu não sabia! E aí isso me auxilia, quando eu atendo pessoas que perderam o pai ou a mãe em tenra idade, eu percebo que eles também não percebem de que forma isso ficou gravado neles, porque eu não tinha essa informação.
P/- É… Você contou essa da sua mãe, queria perguntar, assim, qual foi ao longo da sua vida a relação com a morte, com as passagens que você vivenciou?
R/- É uma coisa, que eu tenho uma coleção de mortes né. Porque na minha infância foram muitos, né, foi minha mãe, foi a irmã da minha mãe, depois a outra irmã da minha mãe, minha avó, assim, parece que a infância inteira lidando com os velórios da família e todo mundo todo indo, todo mundo indo. Foi muito presente várias pessoas indo o tempo todo, sabe. E aí eu te diria, “como foi isso pra você?”, era natural, morreu fulano vamo lá, morreu fulano, morreu fulano, não era uma coisa esporádica e que causasse um oh, sabe? É aquilo que eu te falei hoje, você chegou aqui no ciclo, vida morte e vida, né. E isso auxilia no processo de desapego, auxilia você desnutrir o medo por mudanças, pois toda vez que alguém sai da nossa esfera de convívio, de visão, pela morte, há uma mudança, né? O cenário muda, não tem mais aquele personagem e dependendo daquele que não tá mais no cenário, até o cenário físico, né, mudança de casa, uma mudança de cidade. Então esse crescer vendo pessoas próximas e queridas morrendo é muito valioso pra dá aí eu não me apegar, né. Não que eu não ame, que eu não goste, eu gosto, só que eu não crio uma dependência daquela presença na minha vida, para que eu continue vivendo legal e bem.
Acontece aquele fato, aquele fato dói, eu sinto aquela dor, se eu consigo chorar, eu choro, se eu não consigo chorar, eu sinto pelo tempo que tiver que sentir, mas sabendo que tudo continua, que tudo continua. E se eu estou aqui é porque de alguma forma eu ainda sou útil pra esse campo material da existência, que eu acredito na inteligência do planeta, sabe, como ser vivo. Eu sinto que aquilo que não seja útil para a existência de tudo o que é o planeta e por tudo que ele tem, simplesmente não necessita mais estar por aqui, né?
P/- E você já chegou a ter uma experiência… É… Que as pessoas que tem mais esse medo da morte né, é porque acha que acaba, né. Na sua experiência, você acha que o que acontece? Ou você já teve alguma experiência de ver, por exemplo, o reino dos mortos, de ver pra onde vão esses espíritos?
R/- É aquilo que eu falo, eu percebo que aquilo que qualquer um acredita, é aquilo que é, é real pra aquela pessoa. Então como eu percebo, eu percebo que sou o ar que entra e sai desse corpo e que quando esse corpo vier a perecer na terra, eu permanecerei nesse ar que entra e sai das pessoas. Não acredito que eu vou pra nave delta, para cidade x, pra o hospital delta, mas se eu cresse que quando esse corpo perecer eu vou para o hospital x espiritual, que vai me levar para faculdade de Aruanda, que vai me levar para algum lugar, eu acredito que se é isso que eu creio é assim que será. Só que eu prefiro ficar com a minha psique livre, para que eu possa vislumbrar um novo, pois tudo que se tem de estudo de doutrina, de tese, a respeito da morte, eu creio que é. Se é para o Alan Kardec daquele jeito e tal, aquilo é real, se é pra testemunha de Jeová que morreu, acabou, que no dia do juízo final aquele corpo será reformado, ressuscitado, é real, compreende? Então eu prefiro não pegar nenhuma crença de realidade já existente para quando eu sair, der meu último suspiro nesse corpo, eu possa estar livre dessas crenças todas e me extasiar no todo como é quando a gente tem um infarto, por exemplo. Eu já tive dois infartos, no primeiro infarto, é… Num vivi muito ele, assim, porque foi muito chocante, eu só pensei assim, se Deus existe não me permita deixar meus filhos pequenos igual minha mãe deixou, porque eu tinha vinte e nove anos, foi só isso que passou pela minha cabeça com aquela dor horrível no tórax e indo embora. No meu segundo infarto, que eu já tava mais avançadinha em anos e em experiência de vida, eu senti aquela dor física horrível no tórax, que parece que algum rolo compressor passando em cima das suas costelas, no seu peito, só que eu vivi aquele processo, eu era paz, assim, eu era uma coisa só, com a grama, com a terra, com o raio de sol, com… Eu era tudo isso que é, eu não sei explicar essa impressão real e verdadeira. Então eu prefiro deixar minha psique, minha mente livre de uma crença a respeito de como é depois que esse corpo perece, pois tudo que eu disser já existe, já estudei e não é para onde eu queria continuar minha trajetória consciencial. Então deixar ela liberta para a fonte, que eu chamo que há uma fonte extremamente inteligente e misteriosa, um gerador dessa energia, todas dessas ondas, dessas vibrações que faz os mundos materiais se manifestarem, eu creio que se eu morrer nessa respiração com a fonte, na fonte eu serei levada, chamada, ida, eu não sei que nome dar. Mas num quero ficar nessas crenças, de que eu morri, ai vou pro hospital, aí vem alguém da minha família, aí eu tenho que reencarnar, eu tenho, eu tenho, eu tenho, ah, não, não, não, não, pra mim muita coisa aí não faz sentido.
P/- Maga, aí vamo da constelação para a apometria. Como que você chegou à apometria, o que você viveu dentro dela?
R/- Eu cheguei na apometria naquela teoria de não aceitar o que estava acontecendo, um tratamento espiritual, nesse Instituto eu passei pela pelo atendimento da apometria e lá acontecia, você chega no local, eles dão uma palestrinha sobre essas transformações da consciência, vivo, morto, uma palestrinha, e eles te levam pra sala de atendimento, você deita em uma maca, o médium ele dá pulsos magnéticos no seu chakras tirando o seu corpo energético, seu corpo astral do seu corpo físico, eles encaminham o seu corpo astral para hospital astral e eles tratam o que eles chamam de impressões de histórias que você já viveu enquanto consciência, que estejam travando a sua saúde física mental e emocional nessa experiência agora. E conforme eu recebi aqueles pulsos magnéticos eu senti mesmo, assim, que algo tava saíndo de dentro de mim, eu me senti dupla, sabe, um corpo pesado aqui e eu senti meu outro corpo aqui, que é o corpo astral sendo levado, como se fosse uma maca étérica, assim, que eu tava sendo levada. Os médiuns que estavam que estava visualizando o que estava acontecendo no meu corpo físico, o estado do meu sistema urinário, meu rins tudo, ele ia relatando pra um médium que estava do lado o que ele tava vendo de problemas físicos, nessa época eu estava com cálculos renais e o médium relatou esses cálculos. Outro médium estava vendo o que é o estava empregnado aí no meu corpo astral de impressões e ele falou que eu estava numa sala, tipo uma seita também, uma reunião espiritual, alguma coisa ,e que eu tinha nessa sala a minha palavra de seguir aquela religião ou aquela seita, só que como eu tô deitada aqui eu não posso fazer pergunta, eu não posso fazer nada, eu tenho que receber e eu só fiquei atenta ao que ocorria. Aí depois que eu passei pelo tratamento na maca você passa pelo orientador do instituto - uma senhorinha maravilhosa não me recordo o nome dela, se é dona Sônia - aí, pelo que relataram que aconteceu nessa sala, ela me dava orientações. Ela pediu para eu estudar sobre vitimismo, sobre obsessão, mas não é sentido do espírito obsessor, obsessão é de eu estar obcecada por uma única percepção pra eu me abrir, pra ver que existem outras possibilidade diante do meu problema, então ela pediu para eu estudar sobre obsessão, pra eu pesquisar, e ela me orientou, pediu para eu voltar outras vezes para fazer o tratamento. Eu voltei as outras vezes e aí, é… Lá nesse instituto eles davam o curso para formação apométrica, aí eu entrei no curso, fiz todas as matérias exigidas, fiz todo o estágio dentro desse instituto e depois eu passei a dar aula de apometria na casa das terapias lá em Carapicuíba. Formei um grupo de apométras em Carapicuíba, um em Alphaville, um em Interlagos, e o de Interlagos a gente se mantém unido até hoje, mais de 15 anos. Então a apometria trabalha com o campo átmico, com o espinho, com a mudança de vibração é um trabalho muito profundo e energético. É, e ele foi trazido pro Brasil por um cardiologista.
P/- E dentro de algum atendimento teve alguma história que cê…?
R/- Então, o doutor José Lacerda, o livro dele é incrível, e assim, dentro dessa egrégora o foco dos apométras é pegar magos negros, que seriam entidades com muito conhecimento do campo vibracional energético, com muito conhecimento de captura de ectoplasma, e que eles usam, né, dos encarnados para retirar energia para a construção dos seus mundos imateriais e materiais. Então o foco do apometra é pegar esse magos negros e trazer para o lado da luz, para o lado da força, dentro dessa egregora da crença espiritualista dos espíritos obsessores, da magia negra, como algo muito ruim voltado para causar dano, né. Só que eu pego tudo o que eu sinto que é livre, faz sentido e trás resultados, então eu não entro na crença mas eu pego a técnica, né, e trago para o meu FODA-SE.
P/- Aham. E só pra gente completar essa sequência de terapias, na magia, dentro da magia da qual você foi formada, teve alguma experiência que transformou o seu olhar, a sua vida, mesmo?
R/- Olha, num foi durante o curso, e nem toda experiência, e nem em todo aprendizado, foi pós isso. A gente tem um exercício de eletromagnetismo, que é tipo São Tomé, pra gente pagar pra ver, que a gente chama de… É a nossa caixa de mistério, você pega uma caixinha - vou até ensinar aí essa magia pra galera - cê pega uma caixinha, e coloca essa caixinha no lugar em que você a veja, pelo menos uma vez por dia, em cima dessa caixinha você escreve “tudo que aqui está, é”, você escreve isso na tampa da caixinha, e dentro dessa caixinha você coloca o que você quer que se manifeste no seu campo material. Quando eu comecei a fazer exercícios de magia com essa caixinha eu tava com uns problemas bucais, eu peguei… Você ou escreve, mas não aconselho as pessoas a escrever por uma questão de interpretação de verbo, eu aconselho recortar figuras daquilo que você quer que se materialize no seu campo, então eu recortei um sorriso saudável e perfeito e coloquei dentro dessa minha caixinha de realizações aí, aí quando você bater o olho nessa caixinha você agradece porque aquilo já aconteceu. Então bati o olho na caixinha, nem pensava que lá dentro tava aquele sorriso saudável, foi o primeiro exercício que eu fiz com a caixinha e poucos meses depois eu tava com meus dentes totalmente saudáveis e tudo realizado, tudo bem, e a gente ensina essa caixinha aí de realização assim. Eu fui fazendo exercícios com essa caixinha, eu já tava acreditando que, da hora, né, tô bem sincronizada com a minha caixinha mágica, eu vou colocar uma palavra dentro dessa caixinha, e eu coloquei a palavra "inusitado", coloquei dentro dessa caixinha, passava pela caixinha, que ficava ali na cabeceira da minha cama, e agradecia porque já era. E nessa, eu percepcionei no meu corpo por dez dias consecutivos, três consciências distintas, uma consciência que eu percebia como Adam Kardiman; uma consciência que era uma cobra, e eu andava que nem uma cobra, fiquei pelada aqui, Thalia testemunhou outro lado, andando como uma cobra (vocalizações), comia como uma cobra, bebia como uma cobra; e uma outra consciência que eu não sei nominar, eu sei nominar Alan Karardim, essa cobra e uma outra consciência que quando eu estava percepcionando ela no meu corpo, eu entendia e falava todos os idiomas que existem sobre o planeta Terra, e quiçá sobre o universo, e tinha uma colombiana aqui comigo, a Sandra Elizabeth Terom, que é testemunha ocular também, que teve várias testemunhas oculares desse fato, ela na minha presença, com essa situação consciencial, ela lia em inglês, ela lia, ela abria livros em inglês aqui, e falava, "mas", ela é colombiana, "eu estou entendendo tudo que está aqui, e eu não falo essa língua", foi um momento de dez dias terrenos que eu senti na minha carne, vi na minha carne, passei pela experiência de que realmente a gente não sabe nada desse mundo quântico de consciência e existência. E isso só aconteceu por causa desse exercício de magia, com essa caixinha que eu pus o inusitado, e assim eu fiquei dez dias, eu não comia, eu só bebia água e manifestando - tem a arquiteta Carol Piçarra, que ela foi foi testemunha dessa minha experiência também - depois desses dez dias que eu vivi assim, se eu não retornasse meus filhos até iam me levar pro psiquiatra, né, porque na visão da medicina tradicional eu passei por um surto psicótico em que eu me percebia nessas três situações, que não chamo de entidade, mesmo porque não faz sentido de acordo com as minhas crenças. Eu sei o que eu vivi na minha carne e aquilo foi muito real. Então você me perguntou o que a magia, se eu já vivi alguma coisa assim, já, e não aconselho ninguém que esteja me ouvindo a se aventurar nessa caixinha, né, com um mínimo de equilíbrio e maturidade emocional, que é real. Por isso que eu digo, aquilo que eu acredito é, seja o que for, se eu acreditar que eu vou bater três vezes nessa vela minha vida vai melhorar, eu vou bater três vezes e minha vida vai melhorar, se eu acreditar que porque eu esbarrei na vela fudeu, fudeu, vai fuder mesmo. O que eu creio como uma verdade em todas as células do meu corpo, que geram sentimentos e uma emoção, aquilo é e se materializa.
P/- Então, perguntando assim, você que viveu outros processos incontáveis, com passagem, com magia, com a loucura, né, convivendo com a loucura… Como isso traz hoje pra você a percepção, assim, do que é a vida ?
R/- Ai, traz uma tranquilidade, né, uma tranquilidade de enxergar a perfeição nas coisas. Assim eu percebo que tudo o que há por aqui nesse mundo material que a gente conhece, o planeta Terra, é perfeito, assim, a folha é perfeita, a árvore é, o pássaro é perfeito, a rocha é perfeita, a nascente é perfeita, a Lua é perfeita, o Sol é perfeito, o sistema solar é perfeito, as galáxias são perfeitas; tá tudo em movimento e tá tudo equilibrado, né, a Lua não sai fora, a Terra não desvia, não para de girar em torno do Sol. Então eu comecei a enxergar a partir dos estudos e da prática da convivência com o que chamam de loucura, que pra mim não é loucura, é percepção de coisas que nós, que se achamos normal, não percebemos, é a perfeição nisso daí, a perfeição em tudo. E eu não acredito que se há um Deus que criou tudo, e fez tudo tão perfeito que ele tenha cagado só na gente, que ele cagou na humanidade. Eu não sei nem o que é humanidade, que que é humanidade? Você sabe?
P/- Eu que estou pra te perguntar o que é humanidade.
R/- Então eu não sei o que é humanidade, pois o que eu percebo, assim, o que é um humano? Ah, é um animal bípede, mamífero, vertebrado que acredita que é inteligente, que acredita que realiza coisas, né, isso é um ser humano. Vários seres humanos com o mesmo dnazinho de bípede, vertebrado, mamífero, com raciocínio, o mesmo DNA é uma raça humana. Humanidade não significa bons comportamentos, comportamentos salutares, comportamentos saudáveis, comportamento cooperativo, né, fala assim “ah que desumano aquilo que fizeram”. Eu realmente não sei responder o que é humanidade, eu sei que enquanto uma raça, com o mesmo DNA, com a mesma constituição biológica, a gente é como o peixe, é como qualquer outro bicho. Um pouco mais desavisados, né, pois os outros, os peixes, as aves, as formigas, as minhocas, elas seguem o dom próspero da existência, né, elas exercem a função que auxilia o todo, e o humano não exerce uma função que auxilie todos os humanos, o humano machuca o outro humano. A gente tá no século vinte e um brincando de jogar bombinha no quintal do irmão, né.
P/- A gente veio até, nesse projeto aqui, Vida, Morte e Fé, até pras pessoas gravarem, no caso aqui, gente tá aqui no alto de uma montanha, né, disruptiva, sem luz elétrica… Queria saber, assim, como é que você saiu e achou esse lugar, como que você parou…? Essa história que você viveu nesse lugar.
R/- Então, esse lugar chegou ainda quando eu advogava, né. Eu tava procurando uma casa de campo, né, que é aquela cartilha que a gente tem né, nascer, estudar, se formar, ter uma família, uma casa, um carro, uma casa de campo, e uma casa na praia, e você será uma pessoa realizada, não é assim que a gente aprendeu? Então dentro desse caminho que apareceu, eu tava procurando uma casa de campo para comprar, e aí o corretor, ele me trouxe até esse local, que estava há anos já pra vender e não vendia. E quando nós começamos a subir nessa montanha, eu fui desgostando de tudo, tava muito tempo sem zelo, sem cuidados. E aí quando nós chegamos aqui na frente da casa, o cara falou assim, “cuidado, tem uma piscina aqui na frente, mas eu não sei direito informar onde é” de tanto que o mato tava tomado, só que você não via a piscina ali na frente; e as dificuldades na estrada e tudo, eu não gostei muito. Mas quando eu entrei nessa sala e vi aquela mesa e aquela estante, parecia que essa casa era minha, eu nem fui conhecer o resto da casa, eu sentei naquela mesa, fiz um cheque de uma pré quantia para garantir a compra, isso era uma sexta-feira, eu perguntei pro cara se eu podia passar o final de semana dormindo aqui, dei o cheque pra ele, ele falou que tudo bem, e aí eu passei o final de semana nessa casa, num clima ainda muito mais rústico, teias, aranhas armadeiras, aqui tem muita madeira e tal. E a medida que eu tomei contato com aqueles caldeirões de ferro que estão aqui, eles são datados de 1800 e pouco embaixo, aqueles caldeirões ali de ferro que tem aqui, parecia que esse lugar era meu, me chamou para cá, e eu comprei assim, entrei, vi aquilo, falei, “essa casa é minha”, e sentei e adquiri a casa. Aí eu só vinha para cá finais de semana, passar o final de semana quando eu não estava viajando a trabalho, eu vinha, meus filhos passaram adolescência deles aqui, aprontaram muito nessa casa, tem milhões de história nessa casa, tem cada lenda urbana dessa casa que um dia a gente faz um vídeo só para isso, pra contar essas experiências extra sensoriais que o meu caseiro, que era evangélico, se envolvia total no que acontecia aqui. E aí depois que aconteceu isso com a minha filha, de ter esse diagnóstico, de eu deixar a advocacia, eu decidi vir morar aqui, por essa paz mesmo, isso faz bem à ela, o contato direto com a natureza. E veio aquele desejo de transformar a montanha em um lugar auto sustentável, né, com a energia solar, hoje a água que chega até esta casa ela vem da nascente, da fonte, só que para ela subir a montanha já sobe com energia solar, parte da casa está com energia solar e o resto da casa eu ainda vou por energia solar e tudo ficará auto sustentável, né. O desejo do meu coração é ter o meu alimento no quintal, não depender mais de um comércio, né, de nada, e viver como qualquer outro ser vivo do planeta terra vive, que é da própria natureza; esse é o sonho aqui, da veinha da montanha.
P/ - E Maria Clara, pra gente fechar, né, (risos). Eu ia pedir então pra você… Cê tem alguma história de amor que você quer contar?
R/- Ah, eu amei tanto, eu já tive o meu coração ligado há tantos corações. É sempre bom amar, é sempre bom caminhar ao lado de uma parceria que tá olhando na mesma direção. Já tive, assim, de relacionamentos que duraram mais tempo, que eu caminhei mais tempo, foram quatro. Eu estou sozinha acho que vai pra uns oito anos já, sem caminhar numa história de amor entre duas pessoas, mas eu só tenho aprendizado guardado, por que nem toda relação de amor que eu vivi foi harmoniosa, foi respeitosa. Eu já vivi experiências bem funestas, bem, ai, Stephen King, no quesito relacionamento, e já vivi, sim, relacionamento harmonioso, respeitoso de amizade; e o que restou dessas experiências é muito aprendizado. E não descarto a possibilidade de ainda viver uma parceria amorosa com algum companheiro que surja na minha jornada.
P/- Agora você me… Queria fechar com uma história que você me contou uma vez, do encontro com Jesus na Ayahuasca.
R/- Ah, foi minha primeira experiência com o Ayahuasca…
P/- Foi sua primeira experiência com o Ayahuasca…
R/- Que eu não tinha a menor ideia do que era o Ayahuasca, da onde vinha isso. Eu estava no arquétipo da advogada, fazendo a defesa de um rapaz que estava foragido em decorrência de documentação aí de passaporte e etc, e ele tinha, o pai era italiano, e a mãe era indígena lá de Manaus, e ele estava lá na aldeiazinha dele, e eu fui pra Manaus, pra arrumar essa documentação aí pra ele poder caminhar tranquilo, burocracia só, e eu com os documentos que ele necessitava assinar, eu fui levada lá num barquinho, atravessando o Rio Negro lá, até esse lugar. E quando eu cheguei lá pra ele assinar, ele falou “doutora, a senhora não quer conhecer uma coisa muito bacana que é a Ayahuasca, que é feito da folha da chacrona com uma raiz que é o jagube?”, e aí ele me explicou como era feito o feitio, na época ele me falou que esse vinho, essa bebida dos ancestrais dele era utilizada pelo pajé da aldeia quando ele era consultado por alguém da tribo, que tava com alguma questão, fosse física ou de outra ordem, que esse membro do clã não tava sabendo resolver sozinho, ele procurava orientação do pajé. Se o pajé na experiência dele, com o conhecimento dele, soubesse como auxiliar esse membro, ele auxiliaria, se ele não soubesse, o pajé tomava esse vinhos, a ayahuasca, para expandir os horizontes dele de consciência, para ele trazer essa orientação até a pessoa da tribo. E que com o passar dos anos esses pajés, anciões mais antigos, eles iam preparando a criança desde pequeno, né, para ser o pajé daquela tribo, com o passar dos anos foram abrindo para os outros membros da tribo em determinadas ocasiões o beber desse chá, e que ele era um expansor consciencial, que eu ia viver uma coisa que eu nunca tinha vivido na minha vida. E eu tava lá né, só assim, né, ouvindo funk, eu vou brigar, reclamar, matar um? Eu desço até o chão, né. Eu vou na Igreja Católica, eu levanto eu sento, eu ajoelho, eu levanto, eu faço a coreografia. E eu tava lá eu e falei, tá bom, vamos experimentar. Meu, eu tomei aquilo e o gosto para mim foi algo, assim, muito ruim, o cheiro, o gosto daquilo, eu tomei um copo lá que me deram, eles me explicaram que eu poderia perder o equilíbrio do meu corpo, que minha visão ia ficar diferente, que a minha audição ia ficar mais aguçada, mas quando eu tomei a segunda dose que me deram… Minha visão, ela não via a folha, assim, a forma da folha, ela via cores na folha, eu sabia que era uma folha, mas é como se eu visse, vou usar um termo que eu não gosto muito, a “alma” da folha, a energia da folha, os átomos da folha. Tudo ficou muito colorido, e tava de noite e eu enxergava as árvores igual eu enxergava essa folha, e quando eu comecei a perceber que eu tava vendo um mundo muito colorido e, vou chamar de desfragmentado, eu vi a figura interna que eu tenho de Jesus Cristo, tá. E quando eu vi aquela figura, eu falei para ele, “nossa eu tenho milhões de perguntas para fazer para você”, porque até aí eu já tinha escutado as histórias das civilizações, as histórias das religiões e eu tava cheia de perguntas pra fazer pra Jesus. E uma das perguntas que eu fiz pra ele é se era verdade que existia o vale dos suicidas, que como diz, né, alguns livros espíritas, que se a pessoa se mata ela vai parar no vale dos suicidas, e que alí ela vai cumprir lá o tempo de existência nesse vale até o tempo que ela teria que viver na terra, né. E Jesus me falou que tudo que eu lia, existia e existia aqui mesmo, e aí ele me levou até o lugar que a gente fala que é a cracolândia, né, que é lugares onde pessoas se reúnem para um processo autodestrutivo, ele falou, "você quer conhecer o vale dos suicidas?", e me levou até esses lugares assim e ele falou, "observa como a descrição dos livros que você lê, como que é o vale dos suicidas, as pedras soltam lodo são fétidas, tem cheiro de urina, tem cheiro de fezes", e esses locais eram idênticos ao que estava descrito nos livros. E eu fui perguntando pra Jesus, “pai, então o vale dos suicidas não é lá no campo astral, só lá?”, não, ele fala que tudo o que existe no etérico, existe nos mundos físicos, que são projeções espelhadas. E aí eu fiz outras perguntas pra Jesus, dentro do que eu tinha lido a respeito das coisas, né, “ah, tem um espírito obsessor que vai induzir a pessoa a ter um comportamento para realizar um furto, para beber um copo de cachaça?”... Porque a gente só vê obsessor, só lê a respeito disso, levando as pessoas a terem comportamentos com consequências meio desastrosas, né, a gente não vê o espírito obsessor buzinando na sua orelha para salvar a vida de uma criança, a gente só lê o lado ruim do que seria um espírito obsessor. E aí Jesus foi me levando a todos os lugares da terra, com todas as escolhas que todo mundo faz, e ele também me disse que há muita coisa ainda implantada dentro da gente que não corresponde à realidade, tipo aquela frase "você colhe aquilo que você planta", isso não é real no mundo natural, né, não é mesmo, mas a gente acredita fielmente que a gente colhe aquilo que a gente planta, e não é. Na natureza, no dia a dia, você planta ali sessenta pés de repolho, com o tanto de formiga que tem aqui no meu terreno, você não colhe sessenta pés de repolho, você colhe meio repolhinho e olhe lá se você conseguir colher. Eu não plantei mexericas, mas eu não fui colher as mexericas que o meu vizinho plantou? Ele plantou e eu colhi, tem coisas que planto, eu não colho e outro colhe, né. Então Jesus me falou que a gente era muito delimitado nessas crenças, nessas informações, nessas frases feitas dito irrefutáveis, né, e Jesus foi me mostrando um jeito leve e livre de perceber as coisas, e eu senti amor, amor não como um sentimento, sabe, mas amor como um comportamento. Jesus era manifestação do comportamento pacífico, super bem humorado, eu ri demais com Jesus na minha primeira experiência com a ayahuasca, ele é muito hilário mostrando as minhas questões infantis, sabe, de acreditar que porque o autor disse aquilo é.
P/- E qual foi um desses lugares que ele fez correspondência?
R/- Ah, eu perguntei o primeiro, foi o vale dos suicidas, e ele me levou na cracolândia, tá aqui o vale dos suicídas. Não é depois que a pessoa se matar que ela vai pra algum lugar, ela já tá no lugar. Ah, tem hospital? Tem. Vamos lá no hospital, num tá aqui a pessoa no hospital? Aqui no hospital, não é lá no hospital. E é tudo muito interno, né, tudo muito interno mesmo, e eu esclareci todas as dúvidas que naquela época o meu coração tinha com relação a tudo que eu lia, né. E aí Jesus me ensinou, você lê e é uma coisa, eu vi com os olhos, leia em voz alta aquele parágrafo, respira aquele parágrafo e vê se o seu corpo recebe aquilo de maneira confortável. Se o seu corpo receber aquilo de maneira confortável, traga para sua experiência e pratique aquilo que você leu, se você ler aquilo, respirar aquilo, e não cair confortável no seu corpo, agradece o autor e deixa aquela percepção com o autor; para você não coube. Foi uma lição que Jesus me deixou.
P/- Muito, muito agradecido. Como foi pra você contar sua história aqui?
R/- Ai, foi bem mais suave do que eu imaginei que fosse, foi gostoso, foi divertido, me trouxe outras memórias que eu nem lembrava mais, e eu pude colocar minha verdade, minha experiência, sem ofender a nada nem a ninguém, e sem querer colocar como uma verdade absoluta, né, pois cada pessoa é um universo, uma história, um livro vivo.
P/- E pra finalizar queria pedir pra você fechar os olhos, como a gente começou. Imagina que você só pudesse levar dessa existência uma memória, uma memória. Qual que seria a memória que você levaria? Pode responder de olho aberto, fique a vontade.
R/- Eu não gostaria de levar nada. Busquei várias cenas… Me veio flor, assim, na cabeça, a hora que cê falou, né, eu via a camélia…
P/- Flores…
R/- Uma memória de uma camélia… Mas ai me veio, porra, vai ainda levar coisa? Deixa essas coisas no lugar das coisas, né, nada… Que venha o eu puder viver que eu não vivi ainda.
(Fim)
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