sobre a coleção
criada em: 21/06/2024
Em julho de 2018 realizei “Revisitação”, um documentário independente em vídeo sobre o ator, escritor e dramaturgo afrosergipano Severo D\'Acelino, retratando um pouco da sua trajetória de décadas como militante anti-racista, além de depoimentos diversos sobre sua produção literária. Durante o período de produção, passei a frequentar a sua residência, localizada em um bairro próximo ao centro de Aracaju, capital do estado de Sergipe, onde este mantém a Casa de Cultura Afro Sergipana (CCAS), fundada e coordenada por ele, e onde também redige os livros publicados por sua editora, a MemoriAfro.
Certa ocasião, percebi uma foto preto e branco de sua mãe, Dona Odília - ampliada a partir de uma 3x4, emoldurada e montada sobre um espelho. A imagem fica pendurada sobre o acesso aos seus aposentos. Naquele momento me surgiu a ideia de fazer uma éspecie de “meta-retrato”, e sugeri à dançarina e produtora cultural Aline Villaça que fizéssemos uma imagem que “falasse”, ao mesmo tempo, de identidade e ancestralidade. Ela aceitou a proposta, mas passado algum tempo, mudou-se de Sergipe, sem que surgisse a oportunidade de realizar a foto. Resolvi então levar a experiência adiante com o próprio Severo. Ficamos muito satisfeitos com o resultado e então conversamos sobre a possibilidade de ampliar a ideia para um ensaio fotográfico, com o propósito de posteriormente editar um fotolivro a ser publicado pela MemoriAfro.
O ensaio foi produzido entre setembro e dezembro de 2019 e reúne imagens e relatos de 12 pessoas, 6 mulheres e 6 homens (incluindo o autor) de diferentes idades e profissões, mas todas engajadas - de uma forma ou de outra - na luta por uma sociedade mais humana, justa e igualitária. As pessoas foram convidadas a partir de indicações do próprio Severo, ao lado de outras com quem já colaborei pessoalmente, ou acompanho com admiração suas atividades em diversas frentes. Com exceção do autor, todos residiam, à época dos retratos, em Aracaju.
A partir da pergunta que inicialmente propus a Aline Villaça - \"Você tem uma foto de sua mãe?\" - a proposta foi expandida para qualquer “ancestral direta”: mãe, avó, bisavó, etc... Eu buscava a presença das matriarcas... Cada um dos participantes deveria também oferecer um breve relato sobre a pessoa escolhida, o que considero fundamental para expôr a essência dessas matriarcas, suas marcas indeléveis impressas sobre o espírito de seus descendentes, e que a imagem apenas não é capaz de revelar.
Ao longo do processo fui me dando conta que havia adentrado um terreno fértil e acolhedor, e que o trabalho transitava entre subjetividade e coletividade, já que as narrativas possuem ao mesmo tempo características singulares e comuns, principalmente no tocante às vivências da população afrodescendente em nosso país.