MINHA MÃE ME DEU UM UNIVERSO PRA MORAR
São muitas as referências. Umas apoiadas em materialidades. Outras tão abstratas que nem consigo descrever em imagens.
Nesse universo moram Tina Turner e Janis Joplin, que ressoavam na casa durante toda a minha infância. Moram as idas para almoçar no Texano depois da escola, idas ao Gosto Gostoso, idas ao terreiro quando passava dias
com minha Vó Nita, sua mãe. Nesse universo, meu, também moram minhas iniciações à escrita, que ela incentivou em nossa convivência - escritas que hoje são meu ofício e meu ócio. Um universo que, com essas imagens e com os sentimentos que não sei descrever, mora dentro de mim e ao qual recorro para estar em paz - seja quando fora é guerra ou é amor.
Obviamente, a construção disso tudo não veio apenas permeada de tranqüilidade. Assim como a relação de muitas mulheres, a nossa foi construída em meio a opressões, que sofremos e reproduzimos. Mas, o que
fica, cada vez mais ao longo do tempo, do meu tempo de vida até aqui, é a força do mundo ideal, positivo, que ela exprimia em palavras e gestos no dia a dia e que aos poucos, lapido positivamente e me entranho mais.
Minha mãe me legou uma dimensão poética e política da qual não abro mão. E que é parte do que lego também ao meu filho, mimetizando um ambiente de verdades - com contradições e revelações - no qual ambas as dimensões, poética e política, estão. Enfim, o que minha mãe me deu foi um universo pra morar, onde remexo, renovo e reconstruo o que sou, sem
me perder.