Projeto Memória Petrobras
Depoimento de Virgílio da Piedade Rodrigues
Entrevistado por Eliana Santos
Rio de Janeiro, 26 de abril de 2005
Realização Museu da Pessoa
Depoimento PETRO_CB695
Transcrito por Susy Ramos
P/1 – Boa tarde!
R – Boa tarde!
P/1 – Queria começar com o senhor nos falando nome completo, local e data de nascimento.
R – Meu nome é Virgílio da Piedade Rodrigues; nasci em Portugal em 7 de outubro de 1946. Cheguei ao Brasil com sete anos, no dia 5 de abril de 1953.
P/1 – Seu Virgílio, conta para a gente quando foi e como foi o seu ingresso na Petrobras.
R – Meu ingresso na Petrobras foi em fevereiro de 1977, trabalhando na área de Planejamento; e dois anos depois eu fui designado para uma missão na Argélia. Eu fui o primeiro empregado da matriz, contratado para a matriz, que foi para o exterior.
P/1 – Isso enquanto...
R – Braspetro.
P/1 – Fala para a gente como foi essa sua missão na Argélia. Conta um pouquinho essa experiência acompanhando sua trajetória profissional.
R – Essa missão na Argélia...
P/1 – Qual o objetivo dessa missão?
R – Era o objetivo de crescer profissionalmente e estar com o nome da Petrobras, que eu me orgulho muito e vou me orgulhar sempre, no exterior.
P/1 – E as atividades lá estavam voltadas para que nesse momento que o senhor foi? Qual era o projeto?
R – A atividade da Argélia, inicialmente, foi um contrato com a Sonatrac, a estatal local, e houve uma descoberta em um campo denominado Ras Toumb. Eu estava na área financeira e durante uns oito anos houve a produção normal. Uma produção pequena, com a participação da Braspetro no percentual, e depois o campo declinou e a Braspetro assinou o segundo contrato, chamado Zelfana, e que infelizmente não deu resultado comercial. Até 1986, na Argélia, eu fui algumas vezes depois de ter retornado ao Brasil após os três anos de residência. A Argélia também representa para mim um lugar, um país muito especial...
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Depoimento de Virgílio da Piedade Rodrigues
Entrevistado por Eliana Santos
Rio de Janeiro, 26 de abril de 2005
Realização Museu da Pessoa
Depoimento PETRO_CB695
Transcrito por Susy Ramos
P/1 – Boa tarde!
R – Boa tarde!
P/1 – Queria começar com o senhor nos falando nome completo, local e data de nascimento.
R – Meu nome é Virgílio da Piedade Rodrigues; nasci em Portugal em 7 de outubro de 1946. Cheguei ao Brasil com sete anos, no dia 5 de abril de 1953.
P/1 – Seu Virgílio, conta para a gente quando foi e como foi o seu ingresso na Petrobras.
R – Meu ingresso na Petrobras foi em fevereiro de 1977, trabalhando na área de Planejamento; e dois anos depois eu fui designado para uma missão na Argélia. Eu fui o primeiro empregado da matriz, contratado para a matriz, que foi para o exterior.
P/1 – Isso enquanto...
R – Braspetro.
P/1 – Fala para a gente como foi essa sua missão na Argélia. Conta um pouquinho essa experiência acompanhando sua trajetória profissional.
R – Essa missão na Argélia...
P/1 – Qual o objetivo dessa missão?
R – Era o objetivo de crescer profissionalmente e estar com o nome da Petrobras, que eu me orgulho muito e vou me orgulhar sempre, no exterior.
P/1 – E as atividades lá estavam voltadas para que nesse momento que o senhor foi? Qual era o projeto?
R – A atividade da Argélia, inicialmente, foi um contrato com a Sonatrac, a estatal local, e houve uma descoberta em um campo denominado Ras Toumb. Eu estava na área financeira e durante uns oito anos houve a produção normal. Uma produção pequena, com a participação da Braspetro no percentual, e depois o campo declinou e a Braspetro assinou o segundo contrato, chamado Zelfana, e que infelizmente não deu resultado comercial. Até 1986, na Argélia, eu fui algumas vezes depois de ter retornado ao Brasil após os três anos de residência. A Argélia também representa para mim um lugar, um país muito especial na minha vida.
P/1 – E a partir daí? O senhor voltou da Argélia e o senhor foi trabalhar com o que, para qual setor?
R – Ao retornar da Argélia eu voltei para a gerência de Planejamento, com o Roberto Mileo Viola, que era o gerente, e eu subordinado diretamente ao Almir Barbassa, e daí nesse mesmo ano, ao chegar aqui em maio, houve uma missão para o Iraque. Eu, então, em agosto fui ao Iraque, e lá passei 30 dias em Basra e...
P/1 – Isso em que ano? Perdão.
R – 1979, agosto de 79. Depois retornei ao Brasil.
P/1 – Quanto tempo o senhor ficou no Iraque?
R – Fiquei 30 dias.
P/1 – 30 dias?
R – E a partir então do ano de 1980 e até 1991, eu fiz parte de um contingente que eu me orgulho muito, e todos os anos eu visitava Argélia, Líbia, Iraque e, por duas vezes, o Iêmen. Sempre na área financeira, área de Planejamento, Orçamento, Implantação de Sistemas e substituição de gerentes financeiros durante as férias. Nesse intervalo até 91 eu também morei na Alemanha, morei dois anos na Alemanha.
P/1 – O senhor morou na Alemanha por interesse...
R – Também da Petrobras. Nesse intervalo de 77 a 91 foram 11 anos em país árabe e dois anos na Alemanha. Era uma fábrica, e residi em um país também muito especial. Posteriormente aos países árabes, por uma mudança de estratégia da própria empresa, que se voltou um pouco para a América do Sul, onde ainda está, eu ainda fiz viagens para Equador e Colômbia. Em 1995 eu me aposentei e, ainda assim, em 1999 eu fui convidado para trabalhar na Petrobras Bolívia, onde eu fui o primeiro gerente financeiro das duas refinarias da Petrobras no exterior.
P/1 – Em 95 o senhor se aposentou; E aí o senhor continuou na empresa ou não? Parou um tempo?
R – Não, eu saí para trabalhar no mercado, até 1999, foi quando eu fui convidado para ir à Bolívia ser o gerente financeiro das duas refinarias. Posteriormente, fiquei lá dois anos, voltei, e agora, a partir de maio do ano passado, eu retornei, novamente com muito orgulho, à Petrobras.
P/1 – O que mudou na sua vida depois que o senhor se aposentou? O que o senhor acha, que o senhor aponta aí para a gente?
R – Em termos de mudança pessoal, obviamente que a aposentadoria nos traz uma certa tranqüilidade porque, em princípio, nos garante um determinado, uma determinada remuneração de aposentadoria que caso haja alguma coisa você já está coberto. E isso obviamente faz muito bem às pessoas, pelo lado pessoal. Pelo lado profissional, eu ainda assim, eu queria continuar trabalhando, e continuo. Desde que eu me aposentei, no dia 1º de julho de 95, eu continuo trabalhando até hoje. Aí você poderia perguntar: “Então porque você se aposentou?”, não é verdade? Então, na realidade, em 95, 94, começaram a haver indícios de que haveria uma mudança na previdência social, e eu já tinha 32 anos de contribuição, e achei que eu não deveria ficar à mercê de mudanças de regras de jogo e que talvez me empurrassem muito mais para frente na aposentadoria que eu já tinha direito naquela oportunidade. Minha aposentadoria foi circunstancial, pontual em função de possível mudança na previdência, não por desejo de parar de trabalhar, tanto que eu continuo até hoje.
P/1 – Conta para mim um pouquinho, seu Virgílio, para a gente que não entende um pouco dessa sua atividade, explica para a gente como é a sua atividade hoje, o que o senhor faz, o que o senhor está realizando.
R – Hoje?
P/1 – Hoje, atualmente.
R – Conforme nós já fizemos na ficha cadastral, eu sou economista. A experiência toda na área financeira, orçamento, planejamento e, obviamente, também na gestão administrativa que fazemos lá no exterior. Com essa experiência adquirida ao longo de tantos anos de Petrobras é que foi possível, no ano passado, retornar a trabalhar na Petrobras aqui no Rio de Janeiro. Essa experiência, hoje está sendo aplicada na UNRio, na gerência de contabilidade e finanças, no que toque a gestão de parcerias de empresas nacionais em consórcios com a Petrobras. Nós fazemos lá a parte financeira em relação aos recursos necessários para a realização das atividades físicas programadas, fazemos também lá a contabilização e controles bancários e reuniões com sócios. Basicamente é isso, dividido entre Petrobras Operadora, em alguns blocos, e Petrobras Não-Operadora em outros blocos, então se resume em gestão de parcerias.
P/1 – Como assim Petrobras Operadora e Petrobras Não-Operadora?
R – É porque há blocos em que a Petrobras é quem opera o bloco, ou seja, se o consórcio, se os sócios quisessem operar um bloco teriam que contratar um operador para perfurar e administrar a perfuração e execução do programa. Acharam por bem que a Petrobras era a melhor parceira também para atuar como operadora, então a Petrobras ali, além de parceira, também é a empresa que opera o bloco. E onde a Petrobras não é operadora? Onde ela apenas entra com os recursos que outro operador solicita para realização do programa físico. De um lado ela é operadora, é responsável técnica pela operação, e no outro ela participa junto a uma outra empresa que é responsável pela operação do bloco; para esse onde ela não é operadora, ela participa com recursos à medida que são possíveis.
P/1 – Queria que o senhor falasse para a gente agora como o senhor vê, como o senhor acompanhou esse processo de internacionalização da empresa.
R – Desde a época da criação da Petrobras Internacional, e ela foi criada devido basicamente aos dois choques de petróleo, sendo inicialmente o primeiro em 1973, para que não houvesse uma dependência tão acentuada dos produtores em relação à necessidade nossa de aquisição de petróleo. A ida do Brasil, da Petrobras, foi exatamente para buscar, para minimizar a dependência da compra de petróleo no exterior. Naquela oportunidade criou-se a Petrobras Internacional; e com a criação da Petrobras Internacional, e com o corpo técnico até hoje respeitabilíssimo, lá fora há um respeito muito grande ao técnico brasileiro de uma maneira geral, e em particular ao da Petrobras, porque a Petrobras é top de tecnologia e de respeito internacional. Com isso a Petrobras andou por estratégias em quase todos os países árabes. Em alguns descobriu, como no Iraque em 1979, dois campos gigantes, não sei se você ouviu falar, se alguém já comentou, campo de Nahr Ums e Majnoon, no Iraque. Esses campos, inclusive, têm uma particularidade. Quando foram descobertos, devido a não se divulgar de uma maneira pública a descoberta desse petróleo, a mensagem por telex foi: “Crioulo doido corre pelo deserto.”, essa foi uma mensagem cifrada da descoberta do petróleo. Obviamente a descoberta no Iraque, isso faz com que a gente, e no caso os técnicos, ganhe muito mais força, acreditem que realmente têm a capacidade de desenvolver um potencial que às vezes a gente não sabe que tem. Essa descoberta e outras também em Angola, em parceria, incentivaram e empurraram e efetivaram que a Petrobras, através inicialmente da Petrobras Internacional, Braspetro, deveria permanecer no exterior. Isso trazia no seu bojo a internacionalização do próprio Brasil. Porque nós sabemos de histórias como alguns países lá fora conheciam o Brasil antigamente: “Um país onde tem banana, um país...”, tinha um pouco de palavras não muito corretas ao Brasil. Isso permitiu que o Brasil também fosse plantando os seus conhecimentos e trocando tecnologia com algumas empresas também de Primeiro Mundo; nós também atuamos na Noruega, com empresas ditas Sete Irmãs, então essa troca e essa posição sempre ativa de capacidade dos nossos técnicos e dos, obviamente, administradores, foi fazendo com que a Petrobras pudesse, hoje, não ser mais uma empresa de petróleo, uma empresa de energia. Isso foi gradativo e isso, obviamente fez com que não só a Petrobras, mas o próprio Brasil tenha hoje um respeito que não é mais um adolescente, hoje é um adulto já respeitado internacionalmente em quase todos os setores. Em termos de Petróleo nós estamos efetivamente na ponta, e eu digo isso até emocionado.
P/1 – Você estava contando para a gente como foi essa coisa da Braspetro ter sido incorporada, a idéia do nome. Como era isso mesmo que o senhor estava, deu início?
R – O nome Braspetro, ele, se vocês verificarem Braspetro é Petrobras invertido o nome. Era para dar essa noção de que era a mesma Petrobras atuando não de maneira inversa, mas atuando fora do Brasil. E foi assim que foi criada a Braspetro. E quando eu recebi, só fazendo um parênteses, quando eu recebi o convite, não foi um convite, a solicitação para fazer prova para a Petrobras Internacional, em 1975, 76, que eu fui chamado, eu não sabia o que era a Petrobras Internacional. Eu trabalhava em Furnas, centrais elétricas de Furnas, que era, junto com a Petrobras, uma outra empresa que todos gostariam de trabalhar. Eu, trabalhando lá, sendo o número 48.325, eu vi que era uma empresa muito fechada para a área de apoio. Eu, como economista, não me sentia muito à vontade ali no meio de 35 engenheiros, mas o meu currículo estava no mercado, então fui convidado a fazer prova, e eu perguntei: “Que empresa é essa Petrobras Internacional?”, “Que empresa é? Vai lá!”. Eu acabei sendo entrevistado, acabei fazendo uma prova de seleção e passei. Aí toda a minha família e todos os meus amigos, em 1977, disseram assim: “Você é louco! Você vai sair de Furnas?”, eu disse: “Eu vou! Porque em Furnas eu sou um número de registro, e na Petrobras Internacional, que está começando agora, eu tenho certeza que todos vão se conhecer pelo nome.” E isso era importante para mim.
P/1 – Qual era a imagem que o senhor tinha, na época, da empresa?
R – A Petrobras Internacional, na época, tinha completado três anos. Eu não conhecia a Petrobras Internacional, eu conhecia a Petrobras e, obviamente por ser uma subsidiária e nova, eu aceitei de certa maneira o desafio de sair de uma empresa onde eu estaria até hoje, se não tivesse vindo para cá, e aceitei o desafio de querer começar com uma empresa e crescer com ela. Foi dessa maneira que eu vim parar na Petrobras Internacional. Depois, então, a Petrobras Internacional hoje está toda dentro da própria Petrobras.
P/1 – Seu Virgílio, nesse tempo, nessa sua trajetória, teria alguma história marcante para o senhor que o senhor possa destacar?
R – Tenho algumas histórias.
P/1 – Queria que o senhor contasse alguma para a gente, alguma que tenha marcado, tenha sido engraçada.
R – Eu não posso contar só uma história, eu vou contar pelo menos umas três ou quatro aí porque, bom, primeiro porque eu posso dizer também que eu conheço três civilizações: conheço a nossa, conheço a muçulmana, a árabe e conheço a alemã, se é que eu posso dizer a alemã, mas como eu morei lá, para mim a Alemanha também foi muito particular porque foi lá que os meus filhos, um com nove, o outro com 15. E lá nós vimos, e eles viram, ali é um país onde você vê na rua o que é cidadania, o que é saber o direito e respeitar o direito do próximo. Eu vivenciei isso lá e os meus filhos também isso, tanto que o mais velho, com 17 anos, depois disse: “Pai, quando eu me voltar eu gostaria de vir fazer um curso na Alemanha porque aqui é um país sério.”. Obviamente tem lá seus problemas, mas saltou aos olhos para mim ter essa vivência na Alemanha, mas de toda maneira a Alemanha foi um trabalho muito duro. Apenas uma passagem hilariante foi um colega que me indicou, indicou o meu nome para ir e eu virei para ele e disse assim: “Você sabe que eu falo melhor francês do que inglês, e lá, com certeza, não vão falar um bom inglês, só vão falar alemão.”. Ele virou e disse assim: “Virgílio, não tem problema, como você não fala alemão, quando eles começarem a rir, você ri junto porque eles vão achar que você está entendendo.”. Isso foi, achei bem colocado isso. Na Argélia, onde eu vivi três anos, um mundo tão diferente onde, por exemplo, o homem, o pai não passeava na Argélia, até 1986, foi a última missão que eu fiz, não passeava com filho mulher naquela época; só passeava com filho homem, filho mulher não passeava. Tivemos também, passagem na Argélia, eu ainda começando a aprender a falar o francês, um dia me dirigi à secretária do gerente geral, e obviamente ela toda com vestimenta a caráter, Madame Namani: “C’est que vous avez durex?”. Ela botou a mão na cabeça, correu gritando, chorando, e eu na minha sala, sem saber exatamente o que estava acontecendo, corri atrás dela, e ela desceu e foi falar com o gerente administrativo, Sávio Barreto de Andrade, e eu cheguei lá ela já estava conversando com ele, e eu disse: “Sávio, o que houve?”, ele vira para mim, eu usava uma barba grande, ele vira e diz assim: “Barbudo, o que você falou para ela?”, eu disse: “Eu pedi durex.” “Você sabe o que é durex em francês?”, eu disse: “Não!” “É camisinha. Como você vai pedir camisinha a uma árabe, assim?”, eu disse: “Me desculpe, então como é durex?”, ele virou e disse assim: “É scotch.” “Pois é, que engraçado, scotch para mim é whisky.”. Na Líbia, por onde eu também passei, um país de um regime muito duro do Kadafi, na televisão só passava Kadafi, também com a capa preta, a exemplo de Houari Boumedienne, que era também o Fidel Castro argelino, já que a Argélia se tornou independente da França em 67. Aliás, a Argélia era um dos balneários franceses, e de tanto aparecer o Kadafi na televisão Líbia, eu em algumas missões que fiz lá, os filhos de brasileiros, com dois anos, três anos, pegavam o lápis, enfiavam em um pedaço de papel e ficavam gritando em casa: “Kadafi! Kadafi! Kadafi!” tal a massificação que isso trazia para as crianças. Posso voltar à Argélia?
P/1 – Pode.
R – Na Argélia, depois da independência, os nômades, também chamados homens azuis, os homens azuis do deserto argelino são homens bem negros de feições brancas. Na realidade são brancos, de viverem a vida toda no deserto eles não chegam a ser negros, chegam quase a ser azuis, e por isso eram chamados de homens azuis. Quando a Argélia se tornou independente, toda a população que vivia na periferia do deserto foi para Argel; e chegando em Argel, o que eram aqueles prédios maravilhosos com arquitetura francesa, umas portas lindas, uns mármores maravilhosos para aqueles nômades que andavam em camelos? Era tudo novidade! Então contam que muitas vezes eles tiravam os tacos do chão para fazer fogueira e fazerem as suas comidas, que na maioria das vezes eram de carneiros, que é a base da alimentação deles, e galinha, já que eles não têm pasto para poderem ter rebanhos bovinos. Com isso foram depredando, obviamente com toda a indisciplina de quem não estava habituado. Inclusive na minha época, de 77 a 79, alguns carneiros caíam das sacadas, das escadas dos edifícios e se esborrachavam lá embaixo. Isso também foi marcante. Eles têm uma festa chamada Ramadã, é uma festa que dura 40 dias, é até um retiro espiritual, mas continuam trabalhando. Eles começam o primeiro dia, já com o nascer do sol, já sem comer, sem beber água, sem fumar, sem ter relações até que o sol se ponha novamente. Então, depois que o sol se põe eles começam todas as rotinas de durante o dia, que faziam durante o dia, tudo, então só vão dormir às 3, 4 horas da manhã, que é quando eles estarão tomando o café da manhã para sair novamente. Com isso o trabalho era conturbado depois de uma semana, nervosos, alguns até já subnutridos, mas isso percorria durante 40 dias.
P/1 – O senhor ia acompanhando essas experiências.
R – Acompanhando, exatamente, e com isso trazia uma série de situações. E tinha uma festa do carneiro, Fête de Mouton, em que em um determinado local se reuniam os comerciantes de carneiros. Quando você olhava na rua as caminhonetes, os carneiros estavam na frente, na cabine junto com o homem, e a mulher atrás, na carroceria. E era assim. Com isso esticamos um pouco agora até o Iraque, em que conta uma história, essa história eu ouvi – são duas que eu vou contar, uma história eu ouvi. Um gerente nosso da Petrobras, como todo brasileiro, e eu apesar de ser português, mas aprendi tudo aqui com vocês, é muito comunicativo, e em uma reunião envolvendo brasileiros em Basra - chegaram a morar 49 famílias –, e em uma reunião social em que havia alguns iraquianos, dizem que algum deles era um sheik, havia um brasileiro, talvez com a minha idade hoje, 58 anos, e que tinha uma esposa de 35 anos, bonita – eu conheci o casal, mas eu não estava lá quando ocorreu isso – e naquela brincadeira de um falando com o outro, contava alguma coisa, o sheik teria dito para o brasileiro: “Eu troco a tua mulher por seis camelos.”, ele disse: “Aceito!”, e a história continuou. No dia seguinte, quando ele abriu a porta de casa, estavam seis camelos em frente à casa dele para trocar pela mulher, e aí foi complicado dizer que na realidade aquilo não era bem assim e, eu não sei se você me permite, posso fazer uma (pausa?)?
P/1 – Pode.
R – Em compensação, como eram países subdesenvolvidos que tinham a sua única riqueza no petróleo, o atendimento médico também era bem precário.
P/1 – Isso para vocês que estavam trabalhando lá, como vocês viviam? Para vocês também tinha essa relação ou não, seu Virgílio?
R – Relação de que?
P/1 – Esse atendimento, essa estrutura que vocês recebiam lá.
R – Essa estrutura que atendia o povo era a estrutura que atendia a gente.
P/1 – Que atendia vocês?
R – Exatamente!
P/1 – Eu queria que o senhor falasse para a gente o que o senhor acha do Projeto Memória, para a gente caminhar nesse processo, o que o senhor acha do Projeto Memória, o que o senhor achou de ter participado com esse depoimento, senhor Virgílio?
R – Olha, eu costumo dizer, ao longo da minha vida, que a memória da empresa, isso – eu já falo isso há muito tempo – a memória da empresa não necessariamente na acepção da palavra do projeto agora, de qualquer empresa, tem que estar registrada, e não na cabeça das pessoas que depois vão embora e a memória da empresa vai junto, tá certo? Eu sempre tive muito orgulho de trabalhar na Petrobras e, mesmo estando fora dela, quando havia a veiculação de matérias sobre a Petrobras, eu me emocionava, mesmo vendo e ouvindo pela televisão, me emocionava. E essa chance de ter voltado agora, efetivamente em maio do ano passado, me fez novamente, utilizando a minha memória, o meu filme da vida que eu já falei para você, trazer tudo aquilo que se passou na minha vida dentro da Petrobras. Quando eu vim aqui ao Edise, já que eu trabalho lá no Moraes e Silva, no Ouro Negro, se eu não fosse direto, e era difícil isso acontecer, para a sala, a gente acaba encontrando com a própria memória da empresa que são os ex-colegas que também fazem parte da nossa vida. Eu diria hoje que esse Projeto Memória, ele é a vida de cada um e é a vida da empresa, que eu acho que todos nós devemos ter muito orgulho. Vocês estão de parabéns!
P/1 – O que o senhor achou de ter participado? Gostou?
R – Ontem, quando a Sheila Santana me telefonou, eu fiquei emocionado pelo fato da lembrança para falar da minha vida na Petrobras que se mistura, eu posso dizer para você – eu digo isso também para os amigos – que depois de um certo tempo de Petrobras, nas nossas veias corre petróleo.
P/1 – Então tá, seu Virgílio, por conta do tempo a gente tem que encerrar. Eu queria agradecer muito a entrevista, obrigada!
R – Eu agradeço a você a oportunidade e fico gratificado com isso.
P/1 – Obrigada!
R – Obrigado!
(fim da fita ____________ )
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