Projeto: Mulheres na Construção Civil
Entrevista de Joana Cesar Magalhaes
Entrevistada por Genivaldo Cavalcanti Filho
Entrevista concedida via Zoom (São Paulo / Belo Horizonte), 14/06/2023
Entrevista n.º: MNCC_HV007
Realizada por Museu da Pessoa
Revisada por Bruna Oliveira
P/1 - Boa tarde, Joana! Tudo bom?
R - Boa tarde, Genivaldo! Tudo bom!
P/1 - Então, para começar, eu gostaria que você se identificasse, dizendo seu nome completo, a sua data de nascimento e a cidade em que você nasceu?
R - Bom dia! Meu nome é Joana Magalhães, eu nasci em Belo Horizonte, no dia 04 de abril de 1978. É isso! Era isso?
P/1 - Contaram para você como foi o dia do seu nascimento, Joana?
R - Sim! A minha mãe, ela já tinha, eu tinha um irmão mais velho. Nós somos três na família, eu sou a segunda, mas minha mãe queria muito uma menina. E disse que ela ficou na maior alegria que era uma menina. Então, tem essa história aí da comemoração, de ser a segunda, é que dessa vez era uma menina. Então, ela conta muito disso, dessa alegria de ter uma filha. Ela é filha única. São quatro, na verdade, na casa dela, mas ela é a única menina. Eu acho que ela sempre sentiu falta de uma irmã, de ter gente perto. Então, ela falava com muita alegria de ter uma menina, uma filha mulher.
P/1 - E você sabe como ela escolheu seu nome?
R - Foi na verdade uma aluna dela. Uma época, ela deu aula para criança, que chamava Joana, é que ela gostava muito do nome da aluna, então ela guardou o nome no repertório, para quando viesse.
P/1 - Qual o nome dos seus pais, Joana?
R - É Ivan Magalhães e Lúcia Helena César Magalhães
P/1 - E no que eles trabalhavam?
R - Meu pai se formou em Engenharia Elétrica e trabalhava com processamento de dados. E minha mãe é psicóloga e trabalha até hoje no consultório de Psicologia.
P/1 - Como você descreveria seu pai e sua mãe, Joana?
R - Meu pai, eu falo que ele é bem low profile, mas quietinho, mas muito...
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Entrevista de Joana Cesar Magalhaes
Entrevistada por Genivaldo Cavalcanti Filho
Entrevista concedida via Zoom (São Paulo / Belo Horizonte), 14/06/2023
Entrevista n.º: MNCC_HV007
Realizada por Museu da Pessoa
Revisada por Bruna Oliveira
P/1 - Boa tarde, Joana! Tudo bom?
R - Boa tarde, Genivaldo! Tudo bom!
P/1 - Então, para começar, eu gostaria que você se identificasse, dizendo seu nome completo, a sua data de nascimento e a cidade em que você nasceu?
R - Bom dia! Meu nome é Joana Magalhães, eu nasci em Belo Horizonte, no dia 04 de abril de 1978. É isso! Era isso?
P/1 - Contaram para você como foi o dia do seu nascimento, Joana?
R - Sim! A minha mãe, ela já tinha, eu tinha um irmão mais velho. Nós somos três na família, eu sou a segunda, mas minha mãe queria muito uma menina. E disse que ela ficou na maior alegria que era uma menina. Então, tem essa história aí da comemoração, de ser a segunda, é que dessa vez era uma menina. Então, ela conta muito disso, dessa alegria de ter uma filha. Ela é filha única. São quatro, na verdade, na casa dela, mas ela é a única menina. Eu acho que ela sempre sentiu falta de uma irmã, de ter gente perto. Então, ela falava com muita alegria de ter uma menina, uma filha mulher.
P/1 - E você sabe como ela escolheu seu nome?
R - Foi na verdade uma aluna dela. Uma época, ela deu aula para criança, que chamava Joana, é que ela gostava muito do nome da aluna, então ela guardou o nome no repertório, para quando viesse.
P/1 - Qual o nome dos seus pais, Joana?
R - É Ivan Magalhães e Lúcia Helena César Magalhães
P/1 - E no que eles trabalhavam?
R - Meu pai se formou em Engenharia Elétrica e trabalhava com processamento de dados. E minha mãe é psicóloga e trabalha até hoje no consultório de Psicologia.
P/1 - Como você descreveria seu pai e sua mãe, Joana?
R - Meu pai, eu falo que ele é bem low profile, mas quietinho, mas muito carinhoso. Tudo que ele conta, ele é muito quietinho nas coisas dele, mas ele gosta muito, ele é muito emotivo. Então, assim, sempre que ele lembra de alguma coisa, conta uma história, o olho enche de água, então ao mesmo tempo que ele é meio durão, assim, não conversa muito, ele é muito carinhoso. E minha mãe é muito forte, trabalhadora, ela sempre trabalhou muito, é muito alegre, muito alegre, muito sociável. É isso!
P/1 - Você tinha falado que você tinha um irmão mais velho. Vocês são só em dois, ou tem mais algum outro irmão?
R - Tem o mais velho e mais um. Tem o Igor, é o meu irmão mais velho. O Otto é o irmão mais novo.
P/1 - E como é a relação sua com eles, como era na infância, na verdade?
R - A gente brigava um pouco, igual todos irmãos. Mas a gente sempre foi muito junto, porque a gente é muito próximo, a gente tem um ano e meio, um ano e pouquinho de diferença um do outro, então uma escadinha. E assim, o Igor, quando ele começou a adolescência, sair, eu saía junto, então a gente era muito próximo. O Otto, um pouco mais novo, mas também muito amigo. Então, a gente sempre foi muito unido assim, por sermos de idades próximas e os primos também com a idade próxima, a gente era meio juntinho assim, uma gangue. Brigava, mas bem amigos também.
P/1 - E você chegou a conhecer os seus avós?
R - Conheci! Só não conheci o meu avô paterno, mas os outros eu conheci todos.
P/1 - E na infância você tinha proximidade com as duas famílias, do lado materno e do lado paterno?
R - Mais um pouco com a da minha mãe, que morava aqui em Belo Horizonte. A mãe do meu pai morava em Araxá, então é um pouco mais distante. Então, a convivência era mais com os meus avós maternos. Mas com a avó e o avô, eu acho que é uma época ainda que os avós não eram tão presente com as crianças, devido até aos pais, talvez. E a minha avó, a vó Belinha, que a gente chamava, a mãe do meu pai, tava em Araxá, então era mais visita final de semana, feriado. A gente se encontrava um pouco menos.
P/1 - Tem algum cheiro, alguma comida, alguma coisa que até hoje, quando você se depara com aquilo, bate aquela sensação de infância, de volta à infância?
R - O negócio que eu adorava, que era lá de Araxá, e ir para comer macarrão à bolonhesa com… Não é nem macarrão à bolonhesa, meu pai falava macarronada. Com tutu de feijão e melado com queijo ralado de sobremesa. Então, assim, adorava, aquele cheirinho do melado, da rapadura derretida, era minha paixão. Melado com queijo ralado.
P/1 - E do que você gostava mais de brincar quando você era criança, Joana?
R - Eu gostava muito de…. Assim, eu tenho uma lembrança muito grande no dia que a mamãe comprou argila para a gente brincar, essa coisa de moldar argila. Eu gostava muito de fazer barquinho de papel, carrinho, fazer cidades. Então, acho que tem um pouco da Arquitetura aí, já desde pequenininha.
P/1 - Você se lembra da casa onde você passou sua infância?
R - Lembro! Eu lembro assim, tem um apartamento que aí eu morei até um pouco antes dos cinco anos e depois a gente mudou para um apartamento que eu morei dos cinco e que minha mãe está lá até hoje. Mas eu lembro dos dois, assim. E as lembranças do primeiro são poucas, mas são muito assim, de aniversário, a gente brincando lá embaixo, do meu quarto com meu irmão, porque lá eu dividia o quarto com meu irmão mais velho.
P/1 - E você tinha algum sonho de profissão quando você era criança, do tipo: “Ah, quando eu for mais velha eu quero fazer tal coisa?” Ou a Arquitetura já aparecia aí?
R - Não! Queria ser Designer de sapato. Eu, pequenininha, falava para todo mundo que eu queria ser Designer de sapato. Adoro sapatos!
P/1 - Bom, então a gente vai avançar para o início da sua vida escolar. Quais as primeiras lembranças que você tem de ir para a escola?
R - Eu lembro muito da época que eu quebrei o braço, eu era pequena, tinha quebrado o braço brincando no pátio, e aí eu lembro do pátio, do lugar da escola, tinha uma montanha, assim, de areia, que eu achava que era o Everest, que eu adorava brincar, aquelas manilhas de água também, que vira túnel. Então, eu ficava muito ali, na brincadeira da escola. Teve esse caso que eu quebrei o braço, que foi lá brincando, pulando na trave, o banco que eu pulei, que eu tava em cima para pular, escorregou para trás e eu cai em falso. E tinha o jabuti na escola, que eu achava a coisa mais maravilhosa do mundo, aquele casco, e ele era meio desenhado, que as crianças desenhavam em cima dele. Coitado, mas ele era adorável, o jabuti. Era o jabuti e a montanha, que eu achava o máximo.
P/1 - E nos seus primeiros anos de escola, teve algum professor ou alguma matéria que te marcou?
R - Eu sempre gostei muito de Matemática, adorava assim os problemas a se resolver. Mais novinha assim, nas primeiras lembranças, eu lembro muito de aprender as letras, que tinha um quadrinho que tinha uma lixa com o formato das letras, a gente ia passando o dedo, e eu achava aquela coisa linda, o máximo. Então, apesar de eu ser uma pessoa da Matemática, eu achava o desenho das letras uma coisa fascinante, uma das primeiras lembranças de escola, de aprendizado que eu tenho.
P/1 - E como você ia para escola, era perto, dava para ir a pé, ou você tinha que ir de carro ou ônibus?
R - Novinha, meu pai levava a gente de moto. Aquele perigo, eram duas crianças na moto, agarradas no pai, achava o máximo ir de moto. Ou então, minha mãe levava, mas aí era de carro. E depois, um pouco mais velha, numa outra escola, a gente ia de ônibus, que tinha um ônibus perto, eu ia, eu e os irmãos, a gente ia junto, os três.
P/1 - Nesse primeiro, pelo menos do Pré até o Ensino Fundamental, tem alguma história que você se lembra até hoje, que tenha te mercado?
R - Tem uma história, que eu tinha uma colega, única vez que eu tinha uma colega com o mesmo nome que eu na sala, Joana, Joana Barros, lembro até hoje do sobrenome, eu tinha sempre que assinar o meu sobrenome para saber qual que era, qual desenho era de quem. E um dia eu fiz um desenho, que eu não gostei, achei muito feio, eu já tinha posto lá Joana, eu pus Joana Barros. Porque eu fiquei com vergonha: “Não, ninguém pode ver que isso é meu”. Eu já me julgava, vamos ver se tá bom, se não tiver maravilhoso. Eu escondi debaixo do armário, escondi aqui. Podia ter jogado fora, mas nem pensei. Pus o nome dela e escondi debaixo do armário, falei assim: “Isso aqui não é meu”. Acharam, a Joana, coitada, ficou sem entender nada, não fui eu que fiz esse desenho, não que ela tivesse achando alguma coisa. Mas eu escondi o desenho, eu escondi a minha autoria ali no desenho, porque eu achei que não estava bom. E teve uma outra vez também, nessa mesma escola, que tinha acabado a pasta de dente, que a gente escovava os dentes na escola, e eu convenci todo mundo a escovar o dente com sabão, que era a mesma coisa. Eu mesmo eu não usei o sabonete para escovar o dente não, mas eu convenci algumas crianças que era a mesma coisa. Eu estava convencida, só que eu não tive coragem de experimentar não, mas eu convenci os outros.
P/1 - E seguindo para o seu Ensino Médio. A escola ficou mais longe, você teve que mudar de escola?
R - Na verdade, a escola só ia até o Ensino Fundamental, então depois a gente mudou para uma outra escola. Na verdade, era até uma escola, teve um meio do caminho, que a gente foi para uma Escola Estadual, mas aí teve uma greve muito longa, que a gente tava quase perdendo o ano, mudamos para uma outra escola particular, que não era longe de casa não, mas assim, a gente até, às vezes, ia a pé, mas tinha um ônibus que parava na porta de casa e da escola, a gente ia de ônibus também. Mas não era muito longe não. A gente mudou porque realmente não tinha, era só o Ensino Fundamental nessa escola.
P/1 - E chegando nessa época, adolescência, mudam-se os gostos, a rotina. O que você gostava de fazer nessa época?
R - Eu gostava de dançar, eu fazia jazz, achava o máximo! E era o meu esporte, adorava ir na aula, até cheguei a dançar no grupo da escola, apresentar. Então, eu parei de dançar só depois que eu falei assim: “Não, eu vou para a faculdade”. Eu não ia conseguir conciliar as duas coisas. Mas era uma coisa que eu gostava muito. E era isso, era a dança e ir para o clube, a gente ia para o clube depois da aula, às vezes, eu e uma amiga ficávamos lá de bobeira, vendo a vida passar. Isso era os meus hobbies ali.
P/1 - Em relação a gostos, a questões culturais, teve algum livro, filme, disco, alguma coisa que te marcou? Você lembra: “Nossa, esse aqui é a cara da minha adolescência.”
R - Adolescência? Na adolescência, em termos de música, eu lembro da primeira vez que a minha mãe falou assim…. a gente estava no supermercado, ela falou assim: “Vai lá, pega uma fita cassete, uma fita que você quiser”. E eu escolhi a Tina Turner, eu gostava muito da fita cassete da Tina Turner. E A-ha, eram as coisas da época, eu gostava muito. Na infância, eu era apaixonada por um disco da Rita Lee, acho que chama Rita Lee, inclusive, tem ela de cabelo vermelhinho, franjinha, olhando para trás, que eu adorava a trilha sonora toda, então gostava demais. São as músicas de infância e adolescente que me marcaram.
P/1 - E, nessa época, você já tinha definido na sua cabeça que faria Arquitetura na faculdade, ou não?
R - Não! Teve uma época que eu queria fazer Medicina, eu pensei em fazer a faculdade de Dança, que era em Salvador, eu cheguei a olhar, mas a coisa de ir embora, de sair, não sei se eu estava nessa vibe também. Mas passaram algumas vontades, nenhuma muito a ver com a outra. Então, teve a faculdade de Dança, pensei em fazer Medicina e pensei em fazer o ITA, a de Aviação. Mas, no fim, eu fiz Arquitetura. Um dia também, inclusive, me perguntaram, primeiro dia de aula de Arquitetura, por que que eu tinha escolhido e eu não tinha pensado nisso e eu respondi que era porque tem um pouco de cada uma dessas matérias, tem o social, que você está ali falando com as pessoas, tem a matemática, a conta, o cálculo, que é uma coisa que eu gosto. E eu acho que Arquitetura é um campo bem amplo, né, tem arte, tem designer, então eu acho que é um pouco por isso, eu tenho vários interesses, várias artes, eu acho que na Arquitetura a gente consegue viver um pouquinho de cada um desses campos, numa mesma profissão.
P/1 - E como foi, para você, o primeiro impacto de entrar numa faculdade? Quer dizer, é um outro prédio, fica em um outro local, as matérias não são mais genéricas, são específicas da arquitetura. Como foi sua adaptação no início da faculdade?
R - Eu fiquei encantada, eu acho. Porque assim, a escola de Arquitetura aqui em Belo Horizonte, é um prédio que é muito bacana, é no centro, não é no campus, então eu não tive essa vivência muito de campus. Mas é uma escola central, então vivi muita cidade e você ter essa independência também, de estar fazendo o que quer e conhecendo gente nova, para mim foi encantador, foi uma experiência boa, então a adaptação foi rápida.
P/1 - E a vida social durante o período da faculdade, você participava de alguma atividade fora das aulas?
R - Eu, muito cedo, comecei a fazer um grupo de extensão, participei de um projeto de extensão no segundo período já, que foi onde até eu conheci, foi no escritório do Bebeto e da Marisa, que depois, mais para frente, depois que o Bebeto já tinha falecido, eu cheguei a ser sócia da Marisa, muitos e muitos anos depois, por um tempo. Então lá, era um projeto de extensão, mas que tinha haver com projeto, que já estava dentro do escritório. E depois eu fiz um programa especial de treinamento, chama o TET, que era mais de pesquisa. Então, logo depois desse trabalho, eu fui para esse programa de pesquisa, fiquei um ano e pouquinho e depois já entrei para estágio no escritório. Então, eu sempre, durante a faculdade, eu sempre estava envolvida com alguma atividade de extensão ou estágio.
P/1 - Nessa época, você chegou a perceber se tinha muitas mulheres no curso, ou se eram poucas?
R - O curso tem muita mulher, a gente fala que o curso não é um curso que tem pouca mulher, mas acaba que nos escritórios, quem a gente vê com mais destaque, são homens, arquitetos. Mas, na escola, tinham bastante mulheres. Mas realmente quem era… a gente brincava que tinha os______, os jovens arquitetos bem sucedidos, normalmente eram os meninos, não as meninas. Mas tinha muita mulher na escola. E o meu primeiro estágio, foi com o Bebeto e com a Marisa, então eu já comecei trabalhando com mulheres. Eu trabalhei com muitas mulheres durante o meu percurso. Outro dia que eu fui pensar, assim, foi uma boa coincidência, ou então, até propositalmente, uma vontade que acabou essa escolha e que foi muito bom.
P/1 - E me conta um pouco como foi se desenrolando a sua vida profissional, depois dos estágios, qual foi o próximo passo?
R - Então, depois do estágio lá com o Bebeto e Marisa, eu fui trabalhar com a Isabela Vecci, que é uma arquiteta aqui de Belo Horizonte também, que gosto muito, ainda tenho contato até hoje. E trabalhei lá como estagiária, em certo momento: “Tá, Bela, acho que agora eu vou mudar de estágio, começar outras coisas.” “Não, não muda não, fica aqui! Eu te contrato como arquiteta, vou esperar você formar não, fica aqui!” Então, eu fiquei lá direto! Então acabou, que eu fiz só dois estágios, mas um foi um estágio prolongado. E logo depois, até um pouco antes de me formar, eu já comecei, montei o meu escritório junto com outras amigas. Era uma casinha numa vila, aqui em Belo Horizonte, a gente dividia o aluguel e fazia assim, muitas terceirizações para outros arquitetos, pegava um projetinho ou outro, mas ainda no comecinho. Então, eu trabalhava em escritório para Isabela, depois eu até mudei, fui para outros escritórios, mas, em paralelo, eu fazia as minhas coisinhas no escritório, enquanto isso.
P/1 - E quais foram os seus primeiros desafios como arquiteta? Tem algo que você se lembra, que você fala, nossa isso marcou?
R - O primeiro projeto que eu fiz, foi meu, de Arquitetura mesmo, foi um projeto para o meu pai. Então, assim, projetar para a família não é fácil! Tem todo o envolvimento. Então, para mim, foi um desafio. Por ser o primeiro, por ser para o meu pai, eu era recém-formada. Então, teve esse desafio, de virar e falar assim, não, assim não tá, melhor fazer de tal jeito. Então, acho, que não só, acho que quando é pai, conhece mais. Então, eu tive alguns desafios aí, de conseguir entender, até onde eu vou e o que é uma conversa de pai, o que que é uma conversa de cliente. Então, foi um desafio, que foi grande, mas que foi bom. E depois, eu vi que, às vezes, não era nem só porque era meu pai, já tive de cliente também, o meu segundo projeto, que foi uma floricultura pequenininha aqui perto, que eu via também que o cliente, às vezes, não levava muito em conta o que eu estava falando. Então, a gente vê que é difícil, mulher, nova, às vezes, a gente tem que se provar muitas vezes, assim, acertar dez vezes, para eles começarem a te ouvir. Então, às vezes, é meio cansativo, mas vai funcionando, a gente vai cavando esse espaço.
P/1 - Esse escritório que você fez com seus amigos, na época, você ficou muito tempo, ou depois de um tempo você acabou partindo para outra?
R - A gente ficou, não sei quanto tempo, mas foi um tempinho bom. E depois eu viajei, fui para França fazer mestrado. Então, foram cinco anos, eu acho, o escritório. E, em paralelo, também trabalhando com outros arquitetos. Aí foi um momento que eu falei assim: “Não, sempre quis morar fora”. Uma coisa que eu queria ter feito, um intercâmbio, tinha a modo de intercâmbio, eu achava o máximo morar fora, eu era doida para conhecer outros lugares. Mesmo porque a Arquitetura, a gente vê muita Arquitetura diferente em outros lugares do mundo, então a gente fica doido para conhecer, explorar tudo. E eu não tive oportunidade de ir na adolescência, então eu juntei o meu dinheirinho, quando eu falei: “Não, tem um dinheiro que eu consigo ficar, pelo menos um ano, se eu não arrumar um emprego, lá eu consigo fazer o meu mestrado”. Fui para a França, porque lá a faculdade é igual à federal aqui, você paga por ano uma quantidade que é viável, são, sei lá, 300 euros por ano, e a faculdade é pública. Então, eu fui para lá para fazer o mestrado, fiz o mestrado, trabalhei lá em escritório paralelo também. E quando eu comecei o doutorado, mas eu fiz um ano e falei assim: “Gente, fazendo doutorado em Filosofia, eu gosto é da prática, deixa eu voltar.” E aí como eu estava sempre fazendo o mestrado junto com o escritório, eu ficava meio entre dois. Eu falei assim, não, deixa eu fazer agora, conhecer essa prática profissional sem me dividir para duas questões, que é o que eu mais gosto. Aí eu fiquei lá, acabei que eu fiquei quase seis anos na França, trabalhando lá. E aí depois eu voltei de novo. Teve um tempinho bom aí de França na minha vida
P/1 - Durante esse período em que cidade você estava?
R - Em Paris.
P/1 - E deu para você viajar um pouco, conhecer melhor a França ou os países europeus em geral?
R - Sim! Aproveitei para viajar, porque ali é mais perto. Eu falava assim: “Gente, eu tenho que voltar para casa e para o Brasil”. Mas eu falei assim: “Gente, é tão caro uma passagem para o Brasil, deixa eu viajar aqui perto”. Então, minha mãe, às vezes, ficava: “Você fica muito tempo sem vir”. “Ah mãe, tem tanta coisa para conhecer aqui.” E lá, assim, tem uma facilidade muito grande de transporte, de trem, as coisas são perto, os países são pequenos, eu viajei um bocado lá, foi uma época muito rica para mim, em termos de conhecimento, não só de arquitetura, mas cultural também.
P/1 - E no que você acha que esse período que você passou na França, influenciou a sua prática como arquiteta?
R - Influenciou em muitas coisas, eu acho que não só nessa visão do arquiteto enquanto um agente mais amplo dentro da Construção Civil, porque lá, acaba que a responsabilidade, o que o arquiteto engloba, é maior que aqui, então é muito legal. Muitas vezes, quem faz o gerenciamento, não só das obras, mas de todos os contratos, projeto complementar, quem fala pelo cliente, é o arquiteto. Então, ele não só faz Arquitetura, mas acho que é uma coisa que faz muito sentido, ele também é o representante técnico e legal do cliente. Porque é isso, ele está dentro do começo ao fim do processo, o construtor, o engenheiro, às vezes, está muito dentro da edição, mas lá na concepção, se você está na concepção do projeto, você sabe de onde ele veio, os desejos todos, você consegue pesar melhor o que que é mais importante, ou não, para fazer escolhas para execução também. E o conceito lá do começo não se perder. Então, assim, é o arquiteto que está desde o começo até o fim do processo da construção.
P/1 - E como foi o seu retorno para o Brasil?
R - Eu estava lá, eu fui para lá falando: “Eu vou ficar um pouco e volto”. Minha intenção nunca foi ficar tanto tempo, mas a coisa foi dando certo e estava bom. Aí um dia eu pensei: gente, eu tô aqui meio nessa inércia de uma forma, às vezes, provisória e tem que pensar se é isso mesmo, se eu fico, ou se eu volto para casa. E aí, falei assim: “Ah gente, quero voltar!” Saudade de qualquer um dos dois lugares eu já ia ter. Eu pensei: não, vou para o Brasil, para trabalhar no Brasil e viajar a lazer para a França, eu acho que é melhor do que o contrário, vou curtir. Mas foi muito também até por questões culturais, gente, eu quero fazer a minha arquitetura, levar para lá o que eu aprendi e fazer Arquitetura para minha cultura, para minha cidade, para um lugar que eu me identifique mais. Porque é isso, lá você aprende várias coisas, que aqui você não faria, porque, mas culturalmente é diferente. Então, eu queria usar o meu aprendizado na Arquitetura brasileira, pro brasileira, então foi um pouco isso. E aí eu vim, falei, tá fácil! Quando eu fui, eu falei assim, o máximo que pode acontecer é eu não gostar e voltar. Lá, deu super certo a adaptação e eu achei que ia ser super fácil voltar, mas foi difícil a volta, porque um pouco, eu mudei muito, então, é um pouco aquela, cheguei achando que eu conhecia tudo, mas você começa a enxergar as coisas diferentes. Não que as coisas aqui tenham mudado muito, mas eu acho que é porque o meu filtro mudou, então foi um processo interessante assim, de conhecer de novo Belo Horizonte, Brasil, os lugares que eu vivia e achava que já entendia tudo, mas com outro olhar, acho que a lente mudou e foi bacana. Foi difícil no começo, foi mais difícil adaptação de lá para cá do que o contrário.
P/1 - E qual foi o seu primeiro passo profissional depois que você voltou para o Brasil?
R - Então, eu voltei meio já com emprego. Quando eu fui, eu estava trabalhando no escritório da Freuza Zechmeister, que é uma arquiteta aqui de Belo Horizonte, é figurinista também, eu tive uma experiência de um pouco mais de um ano lá. E sai de lá para fazer o mestrado. E ela ficou sabendo que eu estava pensando, se voltava ou não, e aí ela ligava: “E aí, volta para cá! Já resolveu onde você vai ficar? Se você vem?” Então, assim, eu fui, eu já tinha esse plano e eu voltei para trabalhar com ela de novo. Então, teve esse intervalo, voltei para trabalhar com a Freusa. E aí, eu trabalhei mais, eu acho que uns quatro anos, depois que eu voltei com ela, isso tudo. Eu acho que foi quase isso.
P/1 - E me conta um pouco sobre… no seu currículo, digamos assim, pelo que a gente pesquisou, você faz parte do Coletivo Levante. Me conta um pouco sobre isso?
R - Então, quando eu voltei, eu trabalhei com a Freusa, depois eu fui trabalhar na construção da Filarmônica aqui de Belo Horizonte, com a Jô Vasconcelos. E quando acabou a obra da filarmônica, eu fui trabalhar com a Marisa, que foi meu primeiro estágio, que estava numa sociedade com o Maculan. Então, eu fui trabalhar com eles num projeto específico e quando acabou esse projeto, fui contratada para esse projeto específico, eles me chamaram para fazer parte do escritório. E foi nesse escritório, junto com Maculan, que a gente começou o Coletivo Levante. Eu não faço parte mais do coletivo, mas a gente foi em 2017, fim de 2017, que a gente começou, o Maculan conheceu o Kdu através de uma ação do SEBRAE, lá no aglomerado da Serra. Conheceu o Kdu, e viu o espaço, e falou assim: “Joana, você topa, comigo, a gente faz um projeto para eles, que eles estão reformando.” Que era do Centro Cultural Lá Da Favelinha. E aí eu falei: “Uai, topo! Vamos fazer!” E aí a gente fez o projeto para o Centro Cultural e depois para a casa do Kdu. E nisso, falou assim, então vamos fazer um coletivo para a gente conseguir organizar esses projetos. Mas acabou que o meu tempo, até lá no escritório, a forma como a gente estava levando o coletivo, para mim, não estava funcionando. E eu acabei saindo da sociedade com o Maculan e a Marisa, montei o meu escritório, que é o atual, junto com a Sofia e com o Luiz. E sai do Coletivo. Aí eu só fiz esses dois projetos lá no Coletivo Levante, que foram os dois que foram premiados esse ano, a casa do ano do Kdu, pelo ArchDaily. E, ano passado, a gente ganhou o do Instituto Tomie Ohtake, o Centro Cultural Lá Da Favelinha.
P/1 - E como foram essas experiências para você, o destaque de você ter participado de projetos que ganharam prêmios, porque você acha que isso aconteceu?
R - Eu acho que o projeto lá do centro cultural, é um projeto que é muito vivo, muito alegre. Eu acho que é importante essa coisa de trazer Arquitetura também para outros meios, que não o outro luxo, classe média alta. A gente vê o projeto de Arquitetura muito no nicho restrito, de classe alta. E o direito a espaços bem pensados, bem ventilados, bonitos, agradáveis, é imprescindível para qualquer um. A gente tem agora até leis que estão tentando ajudar ao acesso à Arquitetura para mais pessoas, à artes. E mesmo o [Programa] “Minha casa, minha vida”, espacinhos reformulados. Então, acho que tem um pouco esse trabalho, mas que é um trabalho que ainda tem muito para andar. Então, eu acho que como é um ponto que precisa ainda muito ser trabalhado e que muita gente se identifica, de querer ter espaços que tem uma qualidade ambiental arquitetônica, de forma excessiva, acho que é uma coisa que criou muita identificação. E fora que o Kdu é uma pessoa da mídia, ele tem o poder da comunicação que é impressionante. Eu brinco com ele, eu falo que ele é impressora 3D de sonhos, quando ele pensa, ele faz acontecer, ele conversa. O projeto custou, foi lá em 2017/2018, que a gente fez o projeto, eles foram construídos um pouquinho, com ajuda, pouco dinheiro e tal, faz financiamento, teve uns probleminhas no meio do caminho. Então, eles foram finalizados só em 2020, 2022. Mas eu acho que esta importância do projeto e essa força que teve aí, que apareceu muito, foi muito por conta da identificação, nossa, é um negócio legal! Deveria ter mais. E por essa força midiática do Kdu, que estava envolvido nisso.
P/1 - Você falou sobre a duração dessa obra que foi de 2017 até o ano passado aproximadamente. Como a pandemia impactou o seu trabalho?
R - A pandemia deu, não só, mudou um pouco o ritmo de tudo, mas encareceu muito tudo, acho que para Construção Civil, teve isso, de projetos também com menos dinheiro, com menos orçamento. Eles ficaram, às vezes, pausados ou realmente mais lentos, porque os preços ficaram muito altos. E fora essa coisa do ritmo mesmo, das pessoas ficarem menos na rua, apesar da Construção Civil ter podido funcionar durante a pandemia, eu acho que muita gente, os empreendimentos, não fizeram, não trabalharam, não seguiram com projetos por conta mesmo de grana. Para a gente, os arquitetos, acabou que sim, trabalhamos de casa, visitar obra, tinha, mas tudo um pouco diminuído. Na dinâmica do escritório, nós somos três, eu senti muita falta do encontro presencial, então, às vezes, a gente até fazia um meet, ficava lá trabalhando todo mundo junto na sua tela, mais para comentar alguma coisa, conversar. Porque eu acho que Arquitetura é isso, é uma profissão que não é muito individual, eu acho que ela tem muitas mãos trabalhando. Então, que é sempre boa essa troca, é importante essa troca constante. Então, eu senti falta desse contato com os meus sócios, das trocas que a gente tinha. Mas sobrevivemos todos.
P/1 - E pessoalmente, como foi para você esse período? Que estratégia você bolou para conseguir sobreviver emocionalmente, digamos assim, a todo esse isolamento?
R - Eu acho que teve isso, desses momentos que a gente pelo menos uma vez por semana encontrava todo mundo na telinha. E eu tenho um filho que estava aqui comigo, fazendo companhia. Então, o Lucas foi importante nesse processo, então a gente dividiu o escritório lá, ele, fazendo aula virtual, e eu, trabalhando, de vez em quando, eu estava lá trabalhando, numa reunião, apareceu ele atrás fazendo Educação Física. Então, ao mesmo tempo que foi desafiador, eu estava com essa companhia maravilhosa, que é o Lucas, que foi importante no processo para mim.
P/1 - Eu queria que você falasse um pouco sobre a Hemisfério Arquitetura, seu trabalho atual?
R - Vamos lá! A Hemisfério, é um escritório assim, que depois do escritório, da casinha, de logo que eu me formei, com as minhas amigas, que realmente é um escritório mais meu, que eu montei, porque os outros que eu participei era sempre: ou trabalhando com os outros, ou em escritórios que já existiam, que eu fui integrada, digamos assim. Então, é um projeto que eu tenho muito carinho, recente, tem quatro anos que a gente montou o escritório. Para um escritório de Arquitetura é pouco, porque Arquitetura é aquela coisa que custa ficar pronta, o projeto, o processo, construir, mas é um processo que é muito bacana. E eu formei esse escritório junto com dois parceiros queridos, a Sofia Lobato, que a gente se conheceu na minha segunda passagem pela Freuza, eu estava lá, voltei da França, fui para a Freuza. E logo depois ela entrou como estagiária, então ela entrou como estagiária lá, a gente trabalhou junto. Depois eu saí, ela continua muitos anos lá com a Freuza, mas a gente sempre fazia projetos juntas. Então, às vezes, eu pegava ou terceirização ou projeto mesmo, para desenvolver e a gente fazia muita coisa juntas, assim, meio por fora dos outros escritórios e do emprego fixo. Porque é isso, eu fiquei muito tempo, depois que eu voltei, trabalhando para outros escritórios, dei aula também de Arquitetura, agora eu parei com as aulas. E aí chegou um momento que eu falei assim: “Gente, vamos pensar para onde que eu estou focando.” Porque a gente fica, às vezes, na inércia, do preciso matar o leão de hoje, mas e aí? Será que eu consigo ir montando dentro de um caminho de objetivo mais pessoal, que eu esteja mais envolvida? Então, foi com Sofia, eu levei ela para fazer um projeto que o Luiz tinha me chamado, na verdade, ele era sócio de outro arquiteto, o Alexandre Negasawa, o Xan, que eu conheci lá na França. Ele fez estágio no escritório que eu trabalhava, como arquiteta. E ele voltou para cá, montou esse escritório com o Luiz e quando eu voltei, ele me chamou para participar de uns projetos com eles. E acabou que os projetos, quando eles separaram essa sociedade, o Xan e Luiz, todos os projetos que eu estava participando foram para o Luiz, na divisão dos bens, do divórcio. E aí acabei também me aproximando do Luiz, a gente finalizou esses projetos e eu já tava meio, acho que não está funcionando da forma como eu imaginava lá no escritório da Marisa e Maculan e ele falou assim: “Vem pra cá! Eu tô agora sozinho, eu ia adorar te ter como sócia”. Eu falei: “Ah, mas vamos fazer a três essa parada”. E fomos eu, Sofia e o Luiz. Então, é um processo que é muito legal, a gente faz um pouco de tudo, tá começando, a gente vai procurando o nosso nicho, mas a gente está trabalhando com casa, residencial, trabalha com prédios, incorporações. Então, a nossa primeira obra, Hemisférios mesmo, com a formação nós três, que ficou pronta, inaugurada, foi um predinho aqui em Belo Horizonte, não muito grande, mas que a gente tem maior carinho. E estamos correndo aí! Estamos com uma casa, fazendo e a gente trabalha muito nesse lado. Estamos fazendo também, procurando formas de trabalhar com Arquitetura Social, assim, de uma forma que seja viável, sustentável para o escritório porque, por mais que a gente queira ajudar e participar, a gente tem que entender que, financeiramente, às vezes, a gente não tem fôlego para fazer os projetos sociais. Então, a gente tá conversando com Bel, vendo as leis e uma forma de viabilizar. Estamos fazendo uma casa para o Bruno Cabeça, no Morro do Papagaio, aqui. Que foi professor do meu filho de capoeira, então amigo, ele falou, assim: “Tô fazendo o meu barraco, vamos lá!” Conversando com ele para a gente conseguir viabilizar uma outra forma aí, que é uma sementinha lá do coletivo Levante, mas que eu não tive fôlego para acompanhar a forma que estava acontecendo lá. E que a gente está montando também. Então a gente tenta fazer uma Arquitetura, que seja, a gente brinca, arquitetura com sotaque. Que a gente tenha um diferencial, uma coisa de estar mais próximo do que a nossa realidade, a realidade das classes que são maioria no Brasil. Porque a gente fica muitas vezes nos escritórios, eu trabalhei em escritórios maiores, a gente faz muita Arquitetura, que são lindas, mas que são muito fora, às vezes, da nossa própria realidade. Então, a gente está tentando achar formas, nesses quatro anos do escritório, de levar Arquitetura de qualidade para mais lugares. E para lugares mais próximos da gente.
P/1 - Você comentou um período que você deu aulas. Conta um pouco para a gente como foi essa experiência de ser professora de Arquitetura?
R - Foi muito desafiador, foi bem bacana, assim! Mas muito desafiador, porque a Arquitetura, eu dei aula na área de Projetos, então é uma aula prática. E na Arquitetura não tem resposta certa, acho que o que eu gostava tanto na Matemática, que é assim, tem um resultado final, não é igual no português, que é uma interpretação. Na Arquitetura também não tem, a gente tem diversas formas, são muitos pontos a serem levados em conta, que você vai na verdade pôr o que é mais ou menos importante, vai elencar e vai sair um resultado. Então, um projeto, para você ensinar uma Arquitetura que, às vezes, o aluno está querendo: “Mas como que eu tenho que fazer?” Uai, você tem que fazer do jeito que você acha que vai atender esses pontos. E é difícil, assim!” Eles perguntam: “Como você faria?” Como eu faria? Eu tenho que sentar e fazer e vai ser de uma forma completamente diferente. É quase um DNA, você tem ali três letrinhas, que você vai combinando de formas diferentes, nunca vai ter um igual. Então, Arquitetura, assim… Ensinar Arquitetura, não é tão fácil, porque você não tem uma regra, não é uma receita de bolo. Mas é muito legal, porque você aprende muito vendo os outros pontos de vista, coisa que você, às vezes, não pensou, vivências que você não teve, que o aluno tem, tras. Então, eu acho que é muito legal, assim, acho que é um quebra-cabeça muito bacana e um exercício muito rico. Então, foi difícil para conseguir entender, como levar o conhecimento de uma coisa que, às vezes, é tão fluida, para os alunos. Mas foi muito legal.
P/1 - E falando em momentos desafiadores. Qual que você acha que na sua atuação profissional foi o momento mais desafiador até agora?
R - É difícil! Foram muitos, mas eu acho que foi essa coisa de trabalhar num outro país, que a gente chega com um conhecimento, com uma cultura, uma língua, então foi um desafio, até da linguagem, da forma de trabalhar, da cultura. Então, eu consegui ter uma segurança e uma tranquilidade para trabalhar, em francês, na França, com arquitetos e foi super bacana. Mas foi desafiador até para mim mesmo, porque logo que eu cheguei, eu tive oportunidade de começar a trabalhar, então foi assim, aquela loucura, aprendendo a língua, porque eu tinha feito um ano só de francês antes de ir. Mas foi um negócio muito bacana, você conhecer um outro país, trabalhando nele, trabalhando com Arquitetura, que é uma coisa, tão cultural e Designer e formas de fazer. Então, foi muito legal assim. Aprender leis de outro lugar, foi uma coisa que eu vi, que mesmo eu não tendo essa bagagem das leis de lá, da cultura de lá, o cerne da Arquitetura, ainda funcionava. Até eu entender e ter segurança disso, para trabalhar, foi um desafio grande.
P/1 - Você tinha comentado ao longo da sua trajetória profissional, que você trabalhou com muitas mulheres. No que você acha que elas te inspiram?
R - Foram todas assim, mulheres cada uma do seu jeito, mas muito criativas, muito fortes, muito receptivas. Com a Marisa, que foi o meu primeiro estágio, ela era muito perceptiva, ela escutava, então, às vezes, eu conversava, explicava o que eu estava fazendo ali para o Veveco e ele: Tá, muito rápido, vai! E a Marisa, depois sentava, conversava, falava assim: “Vou conversar lá com o Veveco”. “Você viu o que a Joana falou?” Então, ela me escutou, me acolheu. E de um jeito muito calmo, ela sempre, low profile, quietinha, tal, participando mais nos bastidores, mas um arquiteta, assim, incrível. E que depois eu trabalhei como sócia, foi uma honra! Foi assim, meu primeiro estágio, e meu último escritório, que eu trabalhei, então fechou um ciclo. Depois teve a Isabela, que é uma arquiteta incrível, que foi uma chefe, que me deu muita liberdade, então ela fazia as coisas, deixava na minha mão, me deu autonomia e tinha uma confiança muito grande. E depois a Freusa, que é uma artista, todo mundo fala: “A Freusa é difícil!” Ela é bem brava, é muito exigente, mas a gente funcionou por muito tempo e funcionou bem também, ela é uma inspiração nessa força dela de fazer e ter uma confiança e de não levar desaforo para casa e resolver, aquela assim: “Não, é isso, vocês vão fazer!” Em obra tem muito, muitas vezes assim, já escutei assim, de falar alguma coisa na obra, e falar assim: “Eu vou perguntar para o cliente”. O cliente está na mesa. Não, eu sou arquiteta, posso fazer, o projeto é meu. Então, de querer o respaldo de outras pessoas. Isso é uma coisa que a Freusa nunca admitiu, arrumou várias brigas, mas que sempre funcionou e me inspirou muito.
P/1 - E falando sobre essa questão do trabalho, do acompanhamento das obras. Você acredita que em algum momento, você enfrentou alguma dificuldade nesse sentido, pelo fato de você ser mulher?
R - Eu acho, que tem esse ponto de não ser escutado com tanta facilidade, você fala, mas só faz depois de confirmar, de ter o aval de outra pessoa. Então, isso é complicado, porque você tá lá, não, eu estou falando, essa decisão é isso mesmo, pode fazer! E de muitas vezes também ter um enfrentamento: “Ah, mas isso não faz assim, não é assim, não vai funcionar!” E você tem que questionar, e falar assim: “Mas não vai funcionar por que? Você não sabe fazer? A gente pode fazer assim, assim, assado! Você quer que a gente ‘bole’ junto?” Aí você vê que, na verdade, é má vontade! “Ah, não! Eu estou acostumado a fazer assim e não vou fazer diferente só porque ela pediu.” E, às vezes, quando você está sozinha, ou com outro arquiteto que é da equipe, que está fazendo projeto com você, isso não acontece. Então, aquele olhar, tipo assim, deixa eu olhar ali para o cara ali do lado para ver se é isso mesmo, para ver se tem um olhar de aprovação ou não. Então, isso a gente vive ainda, vai melhorando, mas ainda existe. A gente aprende a lidar com isso, mas existe.
P/1 - A gente tem visto nos últimos anos, um crescimento na participação das mulheres na Construção Civil em geral, em várias funções. Como é que você enxerga isso, você vê isso na prática, ou você acha que ainda está muito lento?
R - Eu vejo muito mais engenheiras, tem uma obra que a gente está fazendo, uma casa que é bem grande e que é uma engenheira que toma conta. E a equipe dela, da parte de Engenharia, são todas as mulheres. Então, isso é bacana, o cuidado, o olhar, é diferente. Mas ainda, no canteiro de obra, para execução, a gente não vê tanto, às vezes, algumas, partes de acabamento, ou, às vezes, gesso, coisas mais leves a gente vê mulheres, às vezes, mas nem tanto, mas, às vezes, a gente vê. Então, acho que está crescendo, acho que isso é importante, porque são outras vivências também, outros olhares que são importantes aí, cuidado, construir, as mulheres são boas de construir, de criar, até seres humanos. Por que não, espaços e casas? Acho que é bacana. Ainda é pequeno, mas tá andando.
P/1 - Então, a gente vai um pouquinho já se encaminhando para o último bloco de perguntas, você tinha comentado sobre o seu filho. Como foi para você se tornar mãe?
R - O Lucas, ele não foi planejado, mas foi muito desejado. E ele chegou logo depois que eu voltei da França, então foi um momento bem, já de adaptação, de volta para casa, para esse outro olhar, estando diferente, junto com a gravidez. Então, foi um momento que, quando eu voltei, foi tudo meio junto. Foi incrível, acho que ser mãe me fez olhar várias coisas diferentes, acho que a gente se coloca mais no lugar do outro, aquele cuidado. Então, eu acho que eu melhorei em vários aspectos, que um dia até ia melhorar, mas de uma forma mais rápida, porque tive que enfrentar aquilo tudo. Então, assim, foi uma delícia e uma loucura, ser mãe, mas me ajudou muito em vários processos, de me entender, de entender o outro, então é uma viagem incrível.
P/1 - E quantos anos ele tem agora?
R - Ele tem onze, onze anos.
P/1 - E como foi para você lidar com essa questão da dupla jornada, de você ter uma atuação profissional e também ser mãe, também cuidar de uma criança, como foi isso para você?
R - Foi uma tripla jornada na verdade, porque acaba que eu dava aula, tinha escritório, filho, casa. É pesado, mas a gente se vira! E muitas vezes, assim, eu tive questionamento de… “Mas você vai dar conta? Você tem um filho. E o seu filho? Como é que você vai fazer?” Então, a gente acaba que… Ninguém pergunta isso para um homem. Mas dei conta! É isso! Isso fez parte também desse aprendizado, da gente saber também lidar com seu próprio tempo, entender que, às vezes, as coisas… Acho que a gente fica até mais prática, mais rápida, porque o tempo é curto, então tinha que conseguir fazer as coisas, as mesmas coisas que você fazia, com a mesma qualidade, de uma forma mais objetiva. Então, essa coisa de trazer uma atividade para vida e para as ações e para o trabalho, foi importante. Que eu consegui, assim, não perder tanto, num tempo menor eu estava conseguindo entregar ainda o que eu achava importante e com a qualidade que eu queria. Então foi ótimo!
P/1 - Bom, então a gente vai oficialmente para as perguntas finais. O que você gosta de fazer hoje em dia fora do trabalho?
R - Fora do trabalho? Gosto muito de encontrar com os amigos, viajar. Uma das coisas que eu mais gosto é viajar. Comer bem, curtir espaços e lugares, conhecer lugares, estar com as pessoas, meu filho. Sentar para ver um filme, comer pipoca, debaixo do cobertor no sofá. Então, é curtir essas coisas mesmo, o dia a dia, o que é simples.
P/1 - E quais são as coisas mais importantes para você hoje em dia, Joana?
R - São essas coisas simples também. Meu filho e minha relação com ele. Isso é essencial.
P/1 - E quais são os seus sonhos para o futuro?
R - Conseguir fazer a minha vida profissional com a Hemisfério engrenar, de conseguir ter um escritório aí, sustentável, fazendo coisas que eu acredito. E conseguir dar o suporte para o meu filho também ter os sonhos dele, ter a vida dele feliz e bem.
P/1 - Qual você acredita que seja o seu legado para o futuro?
R - O meu legado é o Lucas. Põe uma carga na criança né, coitado! Mas eu acho que é isso! Espero que belas obras de arquitetura também, espaços que as pessoas vivam e se sintam bem, seja ela pequena, grande. Espaços agradáveis de se estar.
P/1 - Bom, então a gente vai para a última pergunta, Joana. O que você achou de contar um pouco da sua história para a gente hoje?
R - Adorei! Achei engraçado, voltar, lembrar de várias coisas. Estou vendo que eu sou igual ao meu pai também, fico emotiva com todas as histórias que eu conto. E foi uma delícia me reencontrar com a minha história.
P/1 - Bom, então, em nome do Museu da Pessoa, a gente agradece muito essa conversa de hoje com você.
R - Eu que agradeço! Foi ótimo! Obrigada pelo convite, adorei!
[Fim da Entrevista]
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