IDENTIFICAÇÃO Meu nome é Sueli de Oliveira Rocha, sou nascida em Santos, em dois de julho de 1945. FAMÍLIA Minha mãe, Celina de Oliveira Rocha, foi a vida inteira dona de casa, e é até hoje. Está com 86 anos e continua comandando a casa. Meu pai, Miguel Ranieri da Rocha, faleceu no ano de 2000. Ele era corretor de navios. Era uma pessoa que gostava muito de leitura. Não fazia apenas palavras cruzadas, ele programava as palavras cruzadas. Em casa, sempre tivemos acesso a livros, a dicionários. Eles eram pobres. Mas, quando a questão era livros, sempre tivemos um bom acesso a livros e jornais. Acho que isso acabou influenciando toda minha formação posteriormente. Tenho uma irmã mais nova, que é professora de geografia aposentada e um irmão mais velho, também aposentado, que trabalhou em uma outra atividade totalmente diferente da nossa. Ele era administrador de obras. Com isso, ele percorreu quase que o Brasil inteiro. Minha irmã se chama Magali Rocha Guerra e o meu irmão João Lino de Oliveira Rocha. INFÂNCIA Conforme já havia dito, sempre tivemos em casa uma atividade leitora, uma formação leitora. Por exemplo, meu pai chegava em casa, no horário do almoço, trazendo o jornal do dia. Logo que acabava a tarefa de limpar a cozinha, quando o meu pai voltava para trabalhar, minha mãe ficava lendo o jornal e sem querer nós líamos junto com ela. Por curiosidade de ler. Praticamente, entramos na escola alfabetizados pela minha mãe, que tinha somente o que corresponderia à quarta série hoje. Juntamente com isso, líamos muitas revistas. Na época, era a revista X9, que meu pai gostava muito. Além de vários dicionários. Eram dicionários diferentes, porque como ele programava as palavras-cruzadas, possuía dicionários que ninguém tinha. Por exemplo, dicionários de adjuntos, dicionários de palavras monossilábicas, de palavras dissilábicas, dicionários de termos de zoológicos. Essa curiosidade foi sendo...
Continuar leituraIDENTIFICAÇÃO Meu nome é Sueli de Oliveira Rocha, sou nascida em Santos, em dois de julho de 1945. FAMÍLIA Minha mãe, Celina de Oliveira Rocha, foi a vida inteira dona de casa, e é até hoje. Está com 86 anos e continua comandando a casa. Meu pai, Miguel Ranieri da Rocha, faleceu no ano de 2000. Ele era corretor de navios. Era uma pessoa que gostava muito de leitura. Não fazia apenas palavras cruzadas, ele programava as palavras cruzadas. Em casa, sempre tivemos acesso a livros, a dicionários. Eles eram pobres. Mas, quando a questão era livros, sempre tivemos um bom acesso a livros e jornais. Acho que isso acabou influenciando toda minha formação posteriormente. Tenho uma irmã mais nova, que é professora de geografia aposentada e um irmão mais velho, também aposentado, que trabalhou em uma outra atividade totalmente diferente da nossa. Ele era administrador de obras. Com isso, ele percorreu quase que o Brasil inteiro. Minha irmã se chama Magali Rocha Guerra e o meu irmão João Lino de Oliveira Rocha. INFÂNCIA Conforme já havia dito, sempre tivemos em casa uma atividade leitora, uma formação leitora. Por exemplo, meu pai chegava em casa, no horário do almoço, trazendo o jornal do dia. Logo que acabava a tarefa de limpar a cozinha, quando o meu pai voltava para trabalhar, minha mãe ficava lendo o jornal e sem querer nós líamos junto com ela. Por curiosidade de ler. Praticamente, entramos na escola alfabetizados pela minha mãe, que tinha somente o que corresponderia à quarta série hoje. Juntamente com isso, líamos muitas revistas. Na época, era a revista X9, que meu pai gostava muito. Além de vários dicionários. Eram dicionários diferentes, porque como ele programava as palavras-cruzadas, possuía dicionários que ninguém tinha. Por exemplo, dicionários de adjuntos, dicionários de palavras monossilábicas, de palavras dissilábicas, dicionários de termos de zoológicos. Essa curiosidade foi sendo despertada em nós e por ter acesso a essas coisas fui tomando gosto pela leitura. Pela vontade de ler. Hoje, sou formada em Letras, em língua portuguesa. Acredito que se tivesse que nascer de novo escolheria Letras, línguas, que eu adoro. As revistas, o meu pai comprava ou trocava. Não são muitas pessoas que fazem palavras cruzadas. Aliás, que fazem já encontrando feita em uma revista, sim, mas que elaboram, não. Não são muitas que fazem esse trabalho. Nós tínhamos um círculo de amigos que trocavam revistas e livros. Acho que compravam em sebo, porque o dinheiro era curto. Mas sei que esses livros sempre apareciam lá em casa, esses dicionários. ENSINO FUNDAMENTAL Na realidade, comecei a estudar com sete anos. Tive que esperar completar os sete. Era uma época que se você fazia aniversário até 30 de junho, poderia entrar com seis anos, senão era preciso esperar fazer os sete anos. Peguei bem essa época, mas já entrei sabendo algumas coisas. Sempre estudei em escola pública. Me orgulho de ser oriunda de escola pública. ENSINO PÚBLICO Inclusive, eu acho que esse Programa de Leitura da Petrobras, que só trabalha com escola pública, tem muito a ver comigo. Porque percebemos que, ainda mais agora, com a democratização, ficou mais fácil das pessoas terem acesso à escola. É preciso que essa escola pública seja de boa qualidade. A partir dos anos de 1970, com uma maior industrialização, por essas indústrias precisarem de uma mão-de-obra mais escolarizada, houve uma abertura. Houve uma ampliação do número de vagas, consequentemente, um acesso maior das crianças à escola. Esse acesso precisa ser revisto. Ainda hoje, existem problemas de vagas, mas não tanto quanto na época que eu entrei. Entrar em uma escola pública era difícil. Quando saíamos da quarta série para a quinta série, precisávamos fazer um exame de admissão. Se você não conseguisse média, ficava fora da escola, porque havia algumas escolas particulares, poucas, mas eram caras. A partir dos anos de 1970, houve uma abertura para um maior número de vagas. Hoje as crianças têm acesso, agora, esse acesso precisa ser de qualidade. É preciso que se garanta a permanência das crianças e uma permanência com qualidade, um ensino com qualidade. Como eu digo, o Programa de Leitura da Petrobras tem tudo a ver comigo, porque você leva a leitura para a escola, por meio de um caminhão cheio de livros e contribui para a qualidade, com certeza, porque muitas escolas nem possuem biblioteca. EDUCAÇÃO O ensino era muito tradicional. Era um ensino baseado no decorar de regras. Talvez, ele até fosse adequado para aquela situação, para aquelas poucas pessoas que estavam na escola pública. Suponha que eu tivesse que dizer porque uma palavra como heróis precisava ser acentuada. Eu teria que saber de cor, para dizer para a professora a regra. Eu escreveria herói: colocaria o acento, sublinharia a sílaba tônica e diria a palavra. Diria que ela é acentuada, porque tem o ditongo O e I, tônico e de som aberto; o “S” no final não altera a regra. Não bastava apenas escrever, era preciso saber de cor, para falar para os professores. Isso não me causou trauma nenhum. Tanto é que, hoje, eu me lembro. Mas sou professora de português e hoje não quero, não tenho a pretensão de que meus alunos saibam falar para mim de cor uma regra desse tipo. Era um ensino extremamente tradicional. Isso ocorria em todas as escolas da época. A língua portuguesa, que é a que mais afeta à leitura, era totalmente com base na gramática. Era uma situação em que, se o professor fosse esperto e precisasse fazer alguma outra coisa enquanto estava dando aula, por exemplo, corrigindo prova, ele colocaria um período inteiro na lousa, um parágrafo, e pediria que nós fizéssemos uma análise sintática daquele período e depois uma análise morfológica. Com isso, a aula inteira ia embora. E mesmo a questão da leitura era pouco feita. Tínhamos um reforço em casa. Na produção de texto, na redação, só se procurava consertar a forma, a idéia muito pouco se trabalhava. Mas essa escola era uma referência. Era o Instituto de Educação, a melhor escola da região. Ela não era uma escola à parte. Todas as escolas que se prezavam tinham esse método, porque era um modelo de ensino da época. Um modelo feito para um grupo de pessoas que tinham acesso à educação pública. Lá em casa, cada um estudava em um horário. Meu irmão não conseguiu passar no exame de admissão, nem de seleção. Ele foi para a escola particular. Minha irmã, que não conseguiu no primeiro momento, foi para particular e depois, no exame de seleção, conseguiu entrar. Por isso, conseguir entrar em uma escola pública era um mérito muito grande. Você era reconhecido. Nesse caso, você sabia muito se conseguisse ter acesso a uma escola pública. ENSINO MÉDIO Estudei primeiro em uma escola municipal. Concluí o estudo de primeira a quarta série, depois do que seria a quinta série hoje, que chamávamos de primeira série do ginasial, até o clássico. O ensino clássico corresponderia hoje ao ensino médio, era dividido. Se você ia para exatas, se você ia para ciências humanas, era todo dividido. Se você ia fazer o magistério, era outra coisa. Eu fiz o clássico nessa escola, em Santos. Depois disso, fui para a faculdade. Desde o início, sempre gostei muito de ler. Essa escola onde eu fiz o ensino fundamental e o ensino médio era extremamente tradicional. E era uma escola modelo para a época, embora tivesse toda essa questão. Essa escola tinha uma biblioteca que era fantástica, era maravilhosa Às vezes, rezávamos para o professor faltar, para podermos ir à biblioteca. Tínhamos acesso ao mundo lá dentro, isso era muito bom. Fui de uma geração que leu muito. Meus colegas de classe liam muito, havia até uma certa disputa e uma troca: “Você leu esse? Você leu aquele?” Costumava ler tudo, absolutamente tudo que caísse nas mãos. Não era um processo seletivo. Líamos muito. Obras consagradas, outras nem tanto. Ia desde o gibi até o que hoje chamam de coleções “Júlia”, “Bianca”. Coisas proibidas. O gibi e essas outras que não eram consideradas literatura, não podíamos ler, os pais não queriam que a gente lesse. A escola também proibia. Então, usávamos todos aqueles subterfúgios, de ler com o caderno na frente ou com um livro que pudesse ser visto por todo mundo na frente. Colocávamos aquele livrinho lá dentro e ficávamos lendo horas. Não sei se líamos porque era proibido. Muitas coisas acontecem porque, a medida em que entramos na adolescência, somos muito românticas. Toda aquela história da mocinha que sofre como uma doida, mas no fim acaba com o príncipe encantado, que só falta ter o cavalo branco. É quase como um retorno, um reencontro com os contos de fada. É quase uma continuação da infância, mas já tem ingrediente do amor mais explicitado. Era muito gostoso também. ENSINO SUPERIOR Escolhi fazer Letras. A essa altura, também estudava francês, uma língua que gosto muito. O francês veio por causa de um prêmio que ganhei na escola, um prêmio de redação. Como falei, era uma escola pública, mas havia um prêmio, que talvez fosse da Petrobras. Não sei, é uma coisa que ficou meio perdida na minha memória. As cinco melhores redações eram lidas na rádio, porque, naquela época, televisão era difícil. Ganhamos uma bolsa de estudos na Cultura Francesa e eu fui uma das pessoas premiadas. Também já gostava de escrever. Comecei fazendo Cultura Francesa por causa dessa bolsa de estudos. Não me lembro qual o tempo de duração da bolsa, sei que depois continuei por conta própria. Era uma coisa boa de recuperar. PETROBRAS Nessa época, a Petrobras estava se instalando, chegando lá por Cubatão, pela região. Na época, nós tivemos que escrever duas coisas: uma redação sobre José de Anchieta e falar sobre a importância de uma refinaria de petróleo. Por isso, acho que era alguma coisa com a Petrobras. Como na época não existia intimidade entre professor e aluno, não se podia perguntar as coisas. Você participava porque era obrigado. Se chegasse algum professor dizendo: “tem um concurso, todo mundo tem que fazer”, fazíamos a redação ou o que pedissem, não tínhamos a liberdade de conversar com os alunos como acontece atualmente. Hoje, meus alunos me contam coisas, converso muito com eles. Mas não havia isso. Eu sei que houve e que fui eu quem ganhou esse concurso, por causa de uma redação que fiz. Tenho quase certeza que foi alguma coisa que a Petrobras instituiu na época. Mas não posso afirmar isso com 100% de certeza e falar: “Foi com a Petrobras” Não sei como recuperar isso. ENSINO SUPERIOR - FACULDADE DE LETRAS Fiz a faculdade em Santos, que ainda não tem uma faculdade pública. Na região, contamos agora com um Campus da Unesp, que fica em São Vicente, não é nem em Santos. Nunca pensei na USP, era uma coisa do outro mundo. Normalmente, as alunas, as mulheres, iam fazer o chamado Curso Normal. Era para se formar professora de primeira a quarta série. Algumas faziam faculdade. Minha opção foi Letras, porque eu queria mesmo fazer Letras. Como falei, sentia que era o que eu queria e que faria novamente se fosse preciso. Sendo assim, ir a São Paulo nem pensar. A USP estava fora de cogitação. Acredito que, talvez, meus pais nem tivessem condições de me bancar em São Paulo e também de pagar passagem de ida e volta. Estudei na Faculdade de Filosofia. Era a única que tinha lá, a Faculdade Católica. Foi muito bom também, nós éramos uma turma muito pequena. Éramos em 13 e fazíamos português e francês, fora as outras matérias. Mas o forte era português e francês, e eram quase aulas particulares, porque eram para 13 alunos. Foram quatro anos de faculdade. Eram mais mulheres. Acredito que os homens, na grande maioria, iam para Direito ou para Matemática. Acredito que já devem ter percebido que, normalmente, o professorado é constituído por mulheres, 90% são mulheres. Quando começa o ensino médio é que os homens começam a aparecer: os que dão aulas de matemática, física, química, matérias de exatas. Essa era uma tendência que também havia. As mulheres iam para Pedagogia, História, Geografia, Letras, onde os homens eram, realmente, a minoria. Acredito que tinha dois ou três na minha classe. Acho que se eu quisesse ter ido estudar em São Paulo, meus pais não gostariam muito. Só deixariam, por exemplo, se eu fosse também com uma outra turma, com alguém muito amigo para ir e voltar. Morar, nem pensar Na época, não tinha isso de mulher morar fora de casa para estudar. AMIZADES Pegamos uma época em que os alunos eram estudiosos. Nos reuníamos para estudar. Uma vez ou outra, tinha um baile na casa de amigos, mas sempre íamos com os pais junto. Estudávamos mesmo e gostávamos. Para falar a verdade, não sei se isso era uma coisa particular da minha classe, dos meus amigos. ENSINO SUPERIOR - FACULDADE DE PEDAGOGIA Me formei em uma época que, logo em seguida, veio a ditadura. Em 1966, já caminhávamos para um fechamento, por isso havia muito cuidado com as mulheres, principalmente, ou então com grupos, com quem você andava. Porque, de repente, poderia desaparecer alguém do grupo. Na turma de Letras, não tinha muito isso, nos juntávamos para estudar mesmo. Mais tarde, fiz Pedagogia, principalmente pela questão de prestar concurso. Uma das questões de pontuação no concurso para o magistério público era o fato de ter outra faculdade. Por isso, fiz Pedagogia, com Licenciatura. Isso aconteceu por volta dos anos de 1972 e 1974. Mas sempre gostei mesmo de ficar na minha área. Então, fui fazendo especializações. Fiz especialização em lingüística, em língua e literatura francesa, em teoria da literatura. Sempre na mesma área, sempre envolta com leitura e produção de texto. TRAJETÓRIA PROFISSIONAL Assim que prestei concurso, passei. Fiquei a minha vida inteira lecionando língua portuguesa. De alguma maneira, eu devia me destacar. Fui chamada para, de vez em quando, coordenar os professores de língua portuguesa, em um órgão equivalente à atual Diretoria Regional de Ensino. Na época, era Delegacia de Ensino. Era o ranço da ditadura nas instituições educacionais. Trabalhei na coordenação de professores de língua portuguesa por quatro anos. Mais tarde, às vésperas de me aposentar, fui trabalhar na Secretaria de Educação de Santos, com projetos de leitura. Sempre fui muito “caxias”. Nunca faltava, achava um desrespeito com o aluno. Sempre gostei de dar aula de manhã e à noite. À tarde, achava sempre muito cansativo, a pressão da gente baixa, faz muito calor. Sempre tive aquele respeito pelo aluno, aquela preocupação. Um aluno que estuda à noite, não é por opção, mas porque trabalha o dia inteiro. Eu acho que a maior frustração do mundo para esse aluno que trabalhou o dia inteiro, que muitas vezes foi para a escola sem jantar, sem tomar um banho, era chegar lá e verificar que o professor dele faltou. Por isso, nunca faltei. Existia na lei uma possibilidade de dar falta abonada, você poderia dar até tantas faltas abonadas, porque não aconteceria nada com você. Mesmo assim, eu nem dava essas minhas faltas abonadas. Quando já estava para me aposentar, tinha todas as licenças-prêmio para tirar. Nessa mesma época, recebi um convite para trabalhar na Secretaria de Educação, com projetos de leitura. Era uma coisa que me atraía muito. Tirei minhas licenças-prêmio e também entrei com pedido de aposentadoria, para poder trabalhar com leitura na Secretaria de Educação de Santos. Isso ocorreu em 1994. PROJETO LER PARA SER Foi uma época um pouco difícil, porque já estava desde 1994 na Secretaria, com outros projetos de leitura. Estava desenvolvendo um projeto que eu mesma tinha elaborado, porque eles me pediram um projeto. Fiz um projeto de você estar, em primeiro lugar, visitando todas as bibliotecas das escolas da Secretaria de Educação de Santos, observando o acervo, se era adequado ao aluno, se estava defasado, quais as condições físicas da biblioteca, se existia biblioteca ou não. Junto com isso, eu e mais uma outra professora, que elaborou o projeto comigo, preparamos um esquema de oficinas para os alunos, para estimular os alunos a ler. Íamos cada dia em uma escola. Fizemos um cronograma para o curso noturno, visitávamos as classes, fazendo oficinas de leitura com os alunos do noturno. Eram oficinas em que nós pedíamos que os professores também ficassem na sala. Pedíamos licença ao professor – nós daríamos duas aulas na classe dele – para que eles também ficassem na classe. De alguma forma, nós queríamos duas coisas. Uma era que o professor de qualquer matéria, de qualquer disciplina, que estivesse na classe no momento, percebesse que a leitura não é só para o professor de português. Ela é uma atividade e também um instrumento de conhecimento para todas as disciplinas, todos os componentes curriculares. De alguma forma, tentávamos instigar aquele professor para que ele fosse um agente promotor da leitura. Esse era um viés. O outro viés era que o aluno tivesse um contato prazeroso com a leitura. Fazíamos rodas de leitura, organizamos hemeroteca com recortes de jornais para que eles selecionassem o que era importante em um jornal para eles. Nessa época, a Petrobras ofereceu para a Secretaria de Educação de Santos o Projeto Leia Brasil, Programa de Leitura da Petrobras. O meu projeto atuava na esfera municipal, até então. O nome dele era “Ler para Ser” e não teve relação com o Projeto da Petrobras. Foram coisas independentes. PROJETO LEIA BRASIL / PROGRAMA DE LEITURA PETROBRAS Em 1996, o Programa de Leitura da Petrobras entrou na Secretaria de Educação. Quando a Petrobras ofereceu um projeto de leitura, quem é que a Secretaria de Educação foi buscar? A Secretaria aceitou e deu para mim, porque eu já desenvolvia um programa de leitura. A essa altura, não havia necessidade de continuar com dois projetos e o “Ler para Ser” acabou, para que nós começássemos o da Petrobras. E até foi uma época muito difícil dentro da Secretaria, porque os professores estavam em greve. Foi uma greve por questão salarial, por planos de carreira. A Petrobras convidou a Secretaria e ficou aguardando o sim ou não, para ver se a Secretaria aceitava o programa. A Secretaria, por sua vez, estava sob uma administração petista. O PT sempre considera a consulta às bases. Não queria se pronunciar nem pelo sim, nem pelo não, sem ouvir as diretoras, que por sua vez também não queriam se pronunciar sem ouvir as professoras. Ficamos nesse impasse. Até que um dia, ligaram da Petrobras e disseram: “Não dá mais para esperar Vocês não querem? É um programa de leitura, se não querem, nós vamos para outro município.” Respondi: “Não, de qualquer jeito, nós queremos Só não sabemos quais são as escolas, mas que nós queremos, queremos” Então, o começo do Leia Brasil foi assim. Comecei nesse projeto, sendo a Coordenadora local do programa. PROGRAMA DE LEITURA PETROBRAS - IDEALIZAÇÂO É preciso que a gente entenda um pouco do Programa de Leitura da Petrobras, que, na época, tinha o nome de Leia Brasil, Programa de Leitura da Petrobras. Esse projeto é, basicamente, um projeto de promoção da leitura, de formação de alunos e professores leitores. Ele foi idealizado em 1992, pelo Jason Prado, que tem uma empresa, a Argus Projetos Educacionais, com sede no Rio de Janeiro. O Jason teve contato com uma experiência semelhante em Londres. Ele viu uma biblioteca que levava livros pelas ruas. Então, ele idealizou o projeto e ofereceu para a Petrobras, conseguindo, assim, o patrocínio. O projeto ficou com o patrocínio da Petrobras e com a operacionalização da Argus. Na realidade, o meu vínculo funcional é com a Argus. A estrutura era assim: a Argus mantinha uma sede no Rio de Janeiro e uma assessoria pedagógica dentro das prefeituras, uma assessoria local. Passei a ser Coordenadora local do “Leia Brasil”, projeto de leitura da Petrobras. PROGRAMA DE LEITURA PETROBRAS - ESTRUTURA Enquanto Coordenadora local do “Leia Brasil”, eu tinha que levar esse programa para dentro das escolas, para o que a gente chama de professora-gerente do programa. Era um professor que se identificava com a leitura, que acreditava na leitura como uma atividade maior em termo disciplinar e que acreditava ser necessário esse estímulo, essa sensibilização pelo gosto de ler, pela promoção da leitura entre alunos e professores. Esse professor-gerente era responsável por organizar na sua escola núcleos de professores leitores. Ele também organizava a sua escola para receber o caminhão, essa biblioteca volante, que levava os livros até lá. A biblioteca volante era toda equipada. Ela foi mudando. Chegamos a ter 19 caminhões circulando pelo Brasil. Cada caminhão levava livros e estantes. Os livros eram colocados com a face voltada para o aluno. Era um conceito de biblioteca em que você chama a atenção do aluno desde a capa do livro. Nas bibliotecas normais, os livros são agrupados um a um e você só vê a lombada, eles ficam espremidos na estante. Muitas vezes, esse fato já é uma interdição à leitura. Às vezes, você não tem vontade de ler, porque você vai puxar e não sabe que livro vem. Na biblioteca volante, o livro fica com a capa voltada para o aluno. Nós tínhamos também toda uma estratégia. Organizavam-se estratégias para receber essa biblioteca volante na escola. Essas estratégias incluíam a formação de um cantinho agradável de leitura: embaixo da árvore – se a escola permitisse e se houvesse um pátio arborizado –, leituras com almofadas no chão, para o aluno se sentir à vontade, e leituras dentro do caminhão. Não havia uma sala apropriada para essa atividade, dependia da escola. O caminhão podia entrar ou não na escola, dependia da facilidade de acesso. Imagina: caminhões de mudança entrando em escolas que têm barreiras, por exemplo, escolas em que o portão é estreito, escolas que tem um muro em cima do portão. Então, o caminho não entra. Nesse caso, até hoje, onde o programa continua, o caminhão fica na porta da escola. Esse gerente organiza a escola em filas, uma classe de cada vez. Os alunos sobem no caminhão, levam o livro para a classe e os livros ficam com eles até a próxima visita. Nós temos calendários, organizamos calendários de visita. O caminhão está cada dia em uma escola e volta periodicamente. Na visita seguinte, começam as devoluções dos livros. Depois, esse livro abre para novos empréstimos. Nós contamos com uma perda natural, como qualquer biblioteca. O que tentamos conscientizar no aluno e que trabalhamos muito com os professores é que, se ninguém devolver, os livros acabam. Há toda uma conscientização de que o livro deve ser devolvido, em bom estado. O caminhão vai sempre à escola com um motorista e um atendente. O atendente leva uma ficha com o nome da escola, preenche em duas vias, por classe, o nome do aluno que tirou o livro, qual foi o livro, qual é a série. Uma via fica com a escola, com a gerente, e outra via é devolvida para o atendente do caminhão. Na visita seguinte, os livros são recolhidos com uma certa antecedência, porque, como falei, temos um calendário do ano inteiro. A escola sabe quando o caminhão vai voltar lá. Quando começou, o intervalo de tempo da visita do caminhão era de 30 dias. Nós tivemos uma interrupção, até porque houve uma adequação antes. O programa era decidido na sede da Petrobras, no Rio de Janeiro, depois ficou resolvido que cada unidade da Petrobras é que deveria decidir qual projeto seria desenvolvido. Acho que, talvez por problemas de verba, tenha diminuído. O Programa sofreu algumas interrupções. No Estado de São Paulo, por exemplo, ele parou entre os anos de 2001 e 2002, se não me engano. Em 2001, ainda funcionou. E voltou agora em 2004. Na Baixada Santista, por exemplo, tínhamos dois caminhões para 54 escolas. Hoje, nós temos um caminhão para 53 escolas. Com isso, aumentou o intervalo. O caminhão volta a cada 60 dias. Só atendemos escolas públicas. TRAJETÓRIA PROFISSIONAL Fazendo um retrospecto. Comecei coordenando localmente o Programa de Leitura Petrobras. Eu coordenava a Secretaria de Educação de Santos. Quando o Programa começou na Baixada Santista, ele foi oferecido para Santos e para Cubatão, onde está localizada a unidade da Petrobras, a RPBC – Refinaria Presidente Bernardes. O entusiasmo pela leitura foi grande e foram muitos os pedidos para que se ampliasse o Programa. Havia um caminhão que percorria a região de São Paulo até Campinas e outro que ia para a região do Litoral Norte. Por isso, em 1997, fui convidada para coordenar o Estado de São Paulo. Fiquei coordenando de 1997 até 2001, quando houve essa quebra no patrocínio. Em 2001, começou o Programa no Paraná e eu passei a coordená-lo. PROGRAMA DE LEITURA PETROBRAS - ATENDIMENTO No seu auge, o Programa de Leitura da Petrobras, que na época se chamava Leia Brasil, atendia a 27 municípios do Estado de São Paulo. Atendíamos crianças desde a educação infantil, EMEI – Escola Municipal de Educação Infantil –, como chamamos em São Paulo, até o ensino médio. Tinha também uma outra particularidade. O ensino médio pegava a fase da adolescência e as escolas de ensino médio eram em menor proporção. Pegava-se mais a faixa que corresponde ao ensino fundamental, de primeira à oitava série. Mas havia uma outra coisa que eu considero de grande importância: o grande valor do Programa. Por uma questão funcional, o motorista e o atendente do caminhão cumpriam um horário de trabalho. O caminhão ia das nove às cinco horas ou das oito às quatro horas. Mas os alunos de cursos noturnos, sabendo do caminhão, porque tinham irmãos estudando no período da manhã ou no período da tarde, queriam também ter acesso ao Programa, bem como os seus professores. Mas não havia como, porque o horário de trabalho do motorista e do atendente não permitia. E o que fazer? Pagar um adicional noturno para outra pessoa fazer esse tipo de atendimento? A solução foi que os professores e os alunos do curso noturno, que não trabalhavam, poderiam também participar do Programa, retirando livros em horários diferentes dos seus de trabalho. Isso aconteceu muito. Então, quando você fala em faixa etária, é uma questão muito relativa, porque, de repente, atendíamos a crianças de três anos, mas também a pessoas de 60 anos ou mais. Era uma gama muito grande. PROGRAMA DE LEITURA PETROBRAS - ACERVO O acervo sempre foi muito variado, ele atendia de tudo. Nunca houve, em uma política de promoção de leitura, alguém que dissesse assim: “Você não pode ler esse livro, esse livro é proibido para você.” Nós tínhamos, por exemplo, alunos de oitava série que nunca tinham lido um conto de fadas. Então, como é que você ia tolher se, de repente, ele pegasse uma história de Cinderela? Claro que tinha aqueles que pegavam porque achavam: “Ah, é mais fácil” Adolescente tem muito disso também. Mas sempre tinha aquele que pegava porque ia ser a primeira vez que estava pegando um livro. A criança de três, quatro anos, às vezes, queria pegar os livros lá de cima. Porque eles achavam que os de lá de cima eram proibidos para eles. E aí eles pegavam, mas logo viam pelo tamanho de letra e pelo fato de não ter figura que não era adequado, mas nós deixávamos. Se ela quisesse pegar, você mostrava: “Você acha que vai conseguir ler?” A criança mesmo respondia assim: “Ah, não Não quero, tia.” Dependendo da ocasião, tínhamos de tudo. Às vezes, a escola dizia: “Precisa ter mais livro do ensino médio.” “Precisa ter mais de primeira à quarta.” Dependia muito do município, dependia da ocasião, dependia se tinha muitos livros emprestados. EMPRÉSTIMOS DE LIVROS Algumas escolas demoravam a devolver, mas isso nunca foi barreira. É claro que tínhamos problemas com alunos que não devolviam livros, mas isso também nunca foi barreira para impedir que a escola participasse do Programa. Quando havia uma escola que devia muitos livros, pedíamos aos professores para se organizar e recolher os livros com os alunos. Então, o Programa deu essa parada no Estado de São Paulo e voltou no ano passado. Voltou em uma época difícil. Embora o lançamento tenha sido em maio, o caminhão começou a rodar em junho ou julho, época que o aluno faz as provas finais. Em seguida, vem o recesso. Ele faz as provas e não vai mais à escola. Na realidade, o caminhão começou a rodar regularmente em agosto. Para o aluno, dia letivo é em agosto, setembro, outubro, até a metade de novembro. Da segunda metade de novembro em diante, ele quer ir para o dia da prova e depois não voltar mais para a escola. O caminhão vai começar agora este ano recolhendo livros do ano passado. Então, o fato de uma escola ter ficado devendo quase 800 livros não é barreira para impedi-la de participar. Porque, se a escola tem vontade, se ela está fazendo um bom trabalho, ela tem mesmo é que continuar participando, é um desafio. Pegar o livro de volta, estimular, saber mostrar para aquele aluno que tem outro colega que quer ler o livro. Um caminhão tem em média 20 mil livros. Têm aqueles que ficam expostos, aqueles que ficam guardados. INVESTIMENTO NO PROFESSOR E uma outra ação muito importante dentro do Programa que está reiniciando e que sempre foi feita é o investimento no professor. Sempre percebemos uma carência no professor. Se o professor não é leitor, ele não forma aluno leitor. Não adianta, porque não forma. O professor que é leitor formará ou não alunos leitores, mas realmente vai estimular. Agora, o professor não leitor, não adianta, ele não vai formar aluno leitor. Todo Programa é voltado para promover a leitura entre alunos e professores. Outra ação muito importante, que os professores sempre amam fazer, é a promoção de encontros de sensibilização para leitura. O Programa pagava um especialista para promover leitura entre professores, reunidos em grupo. Por exemplo, a região de Mogi das Cruzes. Pegava-se Mogi das Cruzes, Suzano, Guararema, São José dos Campos, e se juntavam em um determinado dia da semana, havia um calendário específico para esse trabalho. Em cada região havia pólos. Os professores gerentes iam para aqueles pólos e o Programa pagava um especialista para fazer uma sensibilização, uma dinamização do acervo constante do caminhão. REVISTAS COMPARTILHADAS Isso evoluiu para um outro modelo que a gente tem hoje, que são as revistas, leituras compartilhadas. São revistas maravilhosas, temáticas, nas quais escrevem pessoas de ponta, nos mais diversos ramos de atividade dentro do Brasil. Por exemplo, há um número sobre diferenças, hoje, não só nos meios educacionais, mas também na sociedade em geral. Desde a Declaração de Salamanca, na Espanha, há toda uma tendência mundial para a inclusão das pessoas ditas diferentes. Então, diferente é o gordo, diferente é o idoso, é o que usa óculos, é o portador de necessidades educacionais especiais. Hoje, há toda uma tendência, principalmente, em relação ao deficiente físico, de ele ser incluído no ensino regular. Todas as teorias mostram que se você não segrega a pessoa que tem uma deficiência, que tem uma Síndrome de Down, que tem uma deficiência visual, auditiva, se você coloca no ensino regular, ganham os dois lados. Ganha o aluno dito normal e ganha esse dito, entre aspas, deficiente. Em uma revista como Diferenças, você tem lá os mais diversos ramos de atividades trabalhando com diferenças. Diferença religiosa, diferença de gênero. Na minha época, a mulher fazia magistério ou, quando muito, fazia uma faculdade com características femininas. A diferença de gênero era muito acentuada. Hoje, por exemplo, na área da informática, a mulher compete com o homem. Em uma classe de informática, tem tantas mulheres quanto homens. Essas revistas são extremamente bonitas, visualmente, e também com uma qualidade muito boa. Elas ficam à disposição do Programa. PROGRAMA DE LEITURA PETROBRAS – BAIXADA SANTISTA Nesse formato agora, quando voltou, o Programa foi para a Baixada Santista e eu estou coordenando esta região de Santos, São Vicente, Cubatão e Guarujá. Ele voltou com o nome de Programa de Leitura Petrobras. O que mudou? Por exemplo, eu tinha os especialistas que vinham e trabalhavam com grupos pequenos de 30 a 40 pessoas. Agora, sou obrigada a trabalhar com um grupo maior. No dia 17, vou ter uma única reunião com todos os professores desses quatro municípios da Baixada. O esquema é novo. Embora a gente estimule núcleos de professores leitores dentro da escola, a gente não tem como garantir que eles estejam em funcionamento. Acho que os resultados têm sido positivos. Tanto é que acho que o Programa voltou por uma urgência, por uma série de pedidos, de solicitações de secretários de educação e de professores. Temos o Saresp – Sistema de Avaliação de Rendimento Escolar do Estado de São Paulo –, talvez exista um órgão equivalente no Rio. O Saeb – Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica – atua em nível nacional e o Saresp promove uma avaliação no Estado de São Paulo. É uma avaliação de alunos, é o próprio sistema se avaliando. Quando o Programa estava ainda em funcionamento no primeiro esquema, nós tínhamos uma das escolas que ficou entre as primeiras nessa avaliação. Embora não se fale em ranking, mas se fala qual é a pontuação e acabamos sabendo. Há um depoimento das escolas que se saíram melhor e uma delas apontou como um dos fatores de sucesso o Programa de Leitura Petrobras, na época chamado Leia Brasil. TRAJETÓRIA PROFISSIONAL / AVALIAÇÃO Acho que ter sido a escolhida para coordenar o Programa de Leitura Petrobras foi um presente, porque eu desenvolvia um projeto de leitura dentro da Secretaria de Educação e pude ampliar esse trabalho. RESPONSABILIDADE SOCIAL Eu acho que a gente só tem a elogiar a Petrobras. E quando falo tenho certeza que não estou falando só por mim. Falo por todas as escolas, por todas as pessoas que estão atrás, que estão junto comigo, levando esse Programa. Porque, só para termos uma idéia, o Leia Brasil foi responsável pela instalação de bibliotecas e de outras ações. Um bom exemplo foi um caso que ocorreu em Mauá. A escola não tinha espaço para ter a biblioteca. As mães fizeram uma campanha na região e construíram com tijolos, nos corredores da escola, uma biblioteca. Isso é fruto do trabalho Leia Brasil. Sem contar os alunos que passaram a escrever. Nós tivemos, em Guarulhos, o caso da escola Mário Bombassei, que fez com que os alunos produzissem um livro. Todo esse trabalho se deve à responsabilidade social da Petrobras e a esse envolvimento da comunidade com o programa de leitura. Acho que nós queremos que continue cada vez mais. Só lamentamos o fato de ter diminuído. Mas, ao mesmo tempo que lamentamos, nós agradecemos muito por ter voltado. PROGRAMA DE LEITURA PETROBRAS – BAIXADA SANTISTA No Estado de São Paulo, o Programa retornou no ano passado, em 2004. Agora, ele continuou no Paraná e na Bacia de Campos também, no mesmo esquema, usando as revistas e leituras compartilhadas. É um retorno que está vindo aos poucos. Parece que há estudos para aumentar em mais um caminhão na Baixada Santista, talvez mais um em São Paulo. APOSENTADORIA / TRAJETÓRIA PROFISSIONAL Assim que o Leia Brasil parou, continuei outras atividades. Me aposentei nessa época, mas continuei trabalhando sempre com formação de professores. Agora estou dando aulas também em uma universidade da região. A cada vez que eu tinha qualquer contato com a Secretaria de Educação, como eles me identificavam muito com o Programa, os pedidos choviam: “Mas não pode fazer nada? O que a gente faz, como é que a gente pede, com quem a gente fala na Petrobras?” PROGRAMA DE LEITURA PETROBRAS Não houve pressão, mas pedidos com muita urgência para que o Programa retornasse em sua plenitude. Não foi pelo fato de ter parado que deixou de existir esse carinho com o Programa e esse reconhecimento do trabalho da Petrobras em relação à educação. É claro que sempre existiram dificuldades, porque não é assim: “Vou formar um leitor e ele sai prontinho.” O Programa contribui para a formação, seja na forma da leitura, no seu envolvimento com especialistas, na interação com os autores. É uma maravilha descobrir o prazer de um texto. Isso é sempre lembrado como um trabalho da Petrobras. Parece que há estudos para trazerem outro caminhão, mas essa não é minha área. Ouvi falar que existe, mas a gente só agradece se acontecer mesmo. METAS DO PROGRAMA Quando falamos em metas, pensamos logo em quantificar. E o trabalho com a leitura é muito complicado de quantificar. Como é que você sabe que formou um leitor? Sabemos que contribuímos para a formação. Fazemos um trabalho de observação. Se pudermos falar em metas, colocaríamos da seguinte forma: quando o Programa voltou no meio do ano passado, veio com uma orientação de que os alunos poderiam pegar quantos livros quisessem. Quer dizer, se toda escola resolvesse pegar, normalmente as escolas têm mil alunos, então mil livros ficariam na escola até a próxima visita. Mas, na verdade, a orientação era para que todos os alunos pudessem ser atendidos, todas as classes. Então, os alunos da EMEI até a quarta série poderiam pegar cinco livros, por classe. Da quinta série em diante, eles poderiam pegar 10 livros. Aí cabe uma explicação. Por que só cinco livros nas turmas que estão despertando para ler? E por que 10 justamente para o adolescente que, vamos colocar entre aspas, não gosta de ler? Isso se explica da seguinte forma, por exemplo, na EMEI, da primeira a quarta série, normalmente é um professor só. E o professor pode controlar mais: “Esse livro é menor, tem menos letras, tem mais figuras e pode rodar a classe toda até a próxima visita, e ainda dá tempo de rodar nas outras classes da escola, da primeira à quarta série.” As turmas de quinta à oitava poderiam pegar 10 livros porque os livros são maiores e o adolescente demora mais para ler, tem outros interesses. Considerando esses dois fatores, a gente faz, mais ou menos, um cálculo. Se um livro rodar cinco vezes, já imaginaram a população de livros deixados na escola vezes cinco, a cada visita? Falar em metas é muito complicado nesse sentido, porque como é que se mede, como se forma um leitor? Mas nós temos isso como referenciais. HISTÓRIAS / CAUSOS / LEMBRANÇAS Uma vez, quando coordenava todo o Estado de São Paulo, fui visitar uma EMEI, uma escola de educação infantil municipal, em Santo André. O caminhão tinha estado em Santo André, em uma visita anterior, e os alunos tinham tirado, talvez por ser mais visual, os livros sobre a vida de Monet. Coincidiu que, em São Paulo, estava ocorrendo a exposição de Monet. Santo André e São Paulo são próximas. Então, os professores da EMEI levaram os alunos à exposição, porque os alunos começaram a se interessar, através do livro, pela história e pela vida de Monet. Os alunos de EMEI têm uma faixa etária que varia de três a seis anos. Foi uma coisa emocionante ver aquelas crianças de escola pública, uma escola totalmente isolada de tudo, entrando no caminhão e todo mundo querendo o livro de Monet, procurando livros: “Tem Monet? Eu quero Monet.” “Tia, eu quero Monet, eu quero Monet.” Esse é o resultado de um trabalho, é o resultado do trabalho do Programa, é o resultado do trabalho da professora. É um trabalho coletivo, esse envolvimento, essa sensibilização coletiva. PROGRAMA DE LEITURA PETROBRAS – CURSOS E EVENTOS Sempre promovemos eventos e cursos, oficinas, cursos de contadores de história. Achei interessante vocês falarem da narrativa oral. É uma coisa que é a cara do Programa de Leitura Petrobras, a questão da narrativa oral, de lembrarmos aquelas histórias que eram contadas pelos seus pais, pelos seus avós. E reencontrar essas histórias nos livros. Os cursos de contadores de histórias sempre foram promovidos. É o lugar onde você sabe contar a história para o aluno, olho no olho, mostrando a história, isso sempre foi feito. Cada vez que o caminhão vai à escola é um evento, é um dia diferente. As escolas se programam para atividades voltadas para a leitura. No dia que o caminhão está parado na porta da escola, temos os cantinhos de leitura, cursos de contadores de história, alunos, formação de contadores de histórias mirins, alunos contando histórias de classe em classe, cursos a partir de um livro lido, um teatro, o livro em dobradura. Então, toda escola se organiza num grande evento. Normalmente, todos os professores estão envolvidos. Claro que todos não vão, mas pelo menos 90%. Sempre vai existir aquele professor que aproveita que o caminhão está lá para ir corrigir uma prova, enquanto os alunos estão lendo. Mas, de maneira geral, todas disciplinas se envolvem. Nós fazemos eventos nos lançamentos. Agora, no dia 17 de março, na Baixada Santista, o Programa vai levar a escritora Marina Colassanti e o evento terminará com um ator fazendo um monólogo ou um mímico, alguma coisa assim. Já fizemos grandes eventos, como um seminário de leitura e cidadania, em São Paulo. No Rio, eu sei que tem sempre. O Programa também já produziu um livro, com pessoas de ponta da educação brasileira, falando sobre leitura. O nome do livro é A Formação do Leitor - Pontos de Vista. Então, de que ângulo eu vejo a leitura? E a gente vai sempre perceber isso, como eu vejo, de que lugar eu falo. Ou seja, eu falo de um lugar que tem a ver com a minha história pessoal, com a minha formação, com aquilo que eu sou, com aquilo que penso. Já levamos Cobra Norato com o grupo Gira Mundo, em São Paulo. Sempre trabalhando nesse sentido da leitura no sentido amplo, leitura de diferentes linguagens. Não só leitura do texto escrito, mas uma leitura no sentido maior, uma leitura para formação de cidadania, de cultura geral também. TRAJETÓRIA PROFISSIONAL / COTIDIANO DE TRABALHO Sempre vou falar, se me perguntarem, que exerço outras atividades. Exerço três. Mas a minha paixão é o Programa de Leitura Petrobras. E não é porque vocês estão fazendo a memória da Petrobras. Todo mundo que me conhece – podem perguntar a várias pessoas – sabe disso. Trabalho em uma instituição que é voltada para a formação de professores. Dentro dessa instituição, eu coordeno um grupo de professores de língua portuguesa. São professores alfabetizadores. Mas a minha atividade principal é a editoria de três jornais. Faço a revisão dos textos dos jornais, bem como na Revistas Compartilhadas, essa revista do Programa de Leitura da Petrobras. É uma atividade muito prazerosa, porque você lida com pessoas que, absolutamente, não têm erros. Às vezes, pode escapar alguma coisa de digitação, mas nos textos da Marina Colassanti, do Professor Ezequiel Theodoro da Silva, do Tiago de Melo, não há erros e dá aquele prazer, um orgulho de dizer assim: “Estou lendo um texto que depois vai sair em uma revista e esse texto é de um autor consagrado.” Para mim, é paixão. Tem essa atividade do Programa de Leitura da Petrobras e, ainda, dou aulas na UNAERP, uma faculdade da região. Trabalho com metodologia do ensino da língua portuguesa. LAZER Não sobra muito tempo para o lazer. Por isso, adoro ficar na minha casa com a minha família. Não abro mão de ficar com eles, sair com eles e comer uma pizza, alguma coisa assim. Mas, basicamente, o meu lazer é ficar em casa, curtindo a casa, porque durante a semana é complicado. E claro, eu gosto muito de ler, sou viciada em leitura, isso já faz parte de mim. Só não sei se é lazer ou se já sou eu. FAMÍLIA Sou solteira. Dizem assim: “A quem Deus não deu filhos, o diabo deu sobrinhos.” Tenho sobrinhos maravilhosos, que eu amo, sou coruja com todos. Tenho uma família que me apoia muito. Eu acho que a minha história não seria essa se não tivesse a família que tenho. Tenho um apoio familiar muito grande. PROJETO MEMÓRIA PETROBRAS / FORMAÇÃO DE LEITORES Eu adorei Foi muito bom estar aqui falando de um Programa que é a minha paixão. Não sei se consegui passar o tanto que gostaria a respeito desse Programa. O que é, o que ele contribui para a educação no país, para a formação de leitores. O Brasil carece de leitores. Nos últimos resultados do PISA – Programa Internacional de Avaliação de Alunos –, essa avaliação internacional que começou com a avaliação em leitura, matemática e agora em ciências, o Brasil ficou sempre nas últimas posições. Há uma carência muito grande de leitores no Brasil. Acho que um leitor se forma desde o momento que nasce. Mas se o custo do livro é muito alto e as famílias não podem comprar livros, acho que a função da escola é uma função social, ela não pode abrir mão disso, de formar leitores. E esse trabalho que o Programa de Leitura Petrobras faz, de auxiliar a escola nesse trabalho, isso não tem preço, não tem nome. Então, eu gostaria de ter passado um pouco disso. Não sei se consegui, mas é isso.
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