Era um dia chuvoso, de muito frio, Santo Caleffi, estava muito gripado, na sua casa com sua mulher Maria, em Cambé. De repente chega alguém, com um jeep, debaixo de muita chuva. Se aproxima da velha casa simples de madeira, estaciona o jeep próximo da casa ao lado do pomar, com pés de laranjas, tangerina, mexericas enormes, desce do jeep, abre o guarda-chuva enorme, veste sua capa de couro, pisando com sua bota de couro nas poças de água formadas pela chuva intensa, se aproxima da casa de Santo Caleffi, com cuidado, bate palmas. Era início da manhã. Bate várias vezes palmas, fica atento. De repente, Maria vai ver quem é que está chegando ali tão cedo com esta chuva que não para e frio do mês de junho. Ela abriu a janela de madeira da casa simples que morava e à vista um homem no quintal da casa debaixo da chuva forte. Maria a primeira vista não conseguiu identificar quem era.
-Bom dia, disse Maria.
-Quem é?, continuou Maria.
-Bom dia dona Maria, falou o homem.
-Sou José da Silva, o corretor, Santo me conhece, respondeu José da Silva.
-O que o senhor deseja?, perguntou Maria.
-Desculpa incomodar vocês, falou José da Silva.
-Mas vim para conversar com o senhor Santo, é de interesse dele. Tenho um bom negócio para propor para ele, explicou José da Silva.
-Negócio bom!, disse Maria.
-Ele está muito gripado e está muito frio e muita chuva, além do que eu não sei se Santo vai querer falar com o senhor depois de tudo o que aconteceu, disse com firmeza Maria.
-Eu sei, eu sei, ele tem toda a razão de estar magoado, eu entendo, disse José da Silva.
-O senhor espera ai no alpendre para se proteger da chuva e do frio, vou falar com o Santo, disse Maria.
-Muito obrigado, falou José da Silva.
-Quem é que está lá fora?, perguntou Santo.
-é José da Silva, aquele corretor, respondeu Maria.
-Mas este picareta ainda tem a cara de pau de vir aqui de novo, depois de tudo que aconteceu?!, falou indignado Santo.
-Ele disse que tem um...
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-Bom dia, disse Maria.
-Quem é?, continuou Maria.
-Bom dia dona Maria, falou o homem.
-Sou José da Silva, o corretor, Santo me conhece, respondeu José da Silva.
-O que o senhor deseja?, perguntou Maria.
-Desculpa incomodar vocês, falou José da Silva.
-Mas vim para conversar com o senhor Santo, é de interesse dele. Tenho um bom negócio para propor para ele, explicou José da Silva.
-Negócio bom!, disse Maria.
-Ele está muito gripado e está muito frio e muita chuva, além do que eu não sei se Santo vai querer falar com o senhor depois de tudo o que aconteceu, disse com firmeza Maria.
-Eu sei, eu sei, ele tem toda a razão de estar magoado, eu entendo, disse José da Silva.
-O senhor espera ai no alpendre para se proteger da chuva e do frio, vou falar com o Santo, disse Maria.
-Muito obrigado, falou José da Silva.
-Quem é que está lá fora?, perguntou Santo.
-é José da Silva, aquele corretor, respondeu Maria.
-Mas este picareta ainda tem a cara de pau de vir aqui de novo, depois de tudo que aconteceu?!, falou indignado Santo.
-Ele disse que tem um bom negócio para te propor, disse Maria.
-Bom negócio como aquele de Doutor Camargo, falou desconfiado Santo.
-Fala para ele entrar, disse Santo.
-O senhor pode entrar, Santo vai lhe receber, falou Maria.
-Muito obrigado dona Maria, falou José da Silva.
José da Silva subiu uma pequena escada de madeira, pediu licença, tirou o chapéu e entrou na pequena sala, sentou num cadeira de vime e ficou inquieto esperando Santo Caleffi entrar. A sala era pequena e muito simples, tinha apenas três cadeiras de vime, um banco maior de madeira, uma pequena mesa no centro com um ramalhete de flor do campo, na cantoneira um rádio grande, um quadro da Santa Ceia pendurado na parede e um outro com o retrato de casamento de Maria e Santo. José da Silva ficou olhando, percorreu o olho em tudo aquilo, com atenção, para disfarçar o nervosismo e passar o tempo. De repente, enquanto olhava, Santo Caleffi entrou na sala. Santo entrou sério com cara de poucos amigos.
-Bom dia, disse Santo.
-Bom dia respondeu assustado, José da Silva.
-O que lhe traz aqui, perguntou direto Santo.
-Vim oferecer um bom negócio para o senhor, falou encabulado, José da Silva.
-Bom negócio, falou desconfiado Santo Caleffi.
-é bom negócio mesmo, pode acreditar, falou José da Silva.
-O senhor me desculpe por tudo o que aconteceu com o sítio de Doutor Camargo, falou José da Silva.
-A onde fica este novo sítio agora?, perguntou Santo Caleffi.
-Fica no município de Marialva, na Gleba Aquidaban, é um sítio de dez alqueires paulista, plano, de terra vermelha, a mais fértil que existe, é muito bom, o senhor vai gostar, falou José da Silva.
-Se é bom negócio então vamos, surpreendeu Santo Caleffi.
-Vamos agora, continuou Santo Caleffi.
O corretor ficou contente. Santo pegou sua capona de couro para se proteger da chuva e do frio, despediu-se de Maria e dos meninos e foram. Num silêncio pensativo deixaram Cambé, pegaram a estrada rumo a Marialva, estrada que anos atrás eles já tinham percorridos juntos. Alguma coisa tinha mudado, ainda havia muito mato, mas muito já tinha sido derrubado, via-se trabalhadores espalhados nas margens da estrada, ainda de chão batido, organizando seu lote, outros estavam ainda derrubando a mata virgem; havia muitas queimadas e a fumaça se espalhava por todo lado; via-se também muitos caminhões carregados de madeira e toras de perobas, canafístulas e outras, na estrada, levando as toras para as serrarias mais próximas, para transformá-las em tábuas, caibros, vigas e ripas, que seriam usadas na construção das casas, tanto nos sítios como nas cidades. Tudo era muito movimentado, vivo, algo de novo estava acontecendo, nascendo ali; alguns patrimônios já estavam maiores, outros já tinham virado vilas, tudo estava mudando, Santo Caleffi e José da Silva, na estrada que eles já tinham percorridos juntos tempos atrás, dentro do jeep, iam observando tudo num silêncio pensativo, um conhecimento do silêncio, vendo a história acontecer ali na frente deles, vivendo aquele momento. A chuva não parava.
-Esta região realmente não para, tudo está mudando, é muita gente de todo lado vindo para cá, disse Santo.
-E verdade, disse José.
-Até os ingleses vieram para cá anos atrás colonizar esta região, disse Santo.
-Compraram do governo tudo isto aqui, toda esta região de terra roxa, que vai de Londrina até Umuarama, disse José da Silva.
-Compraram mais de 544 mil alqueires de terra e lotearam tudo por aqui em pequenos e médios lotes e formaram também patrimônios, vilas e cidades para vender terrenos ali também, contou José da Silva.
-é eles foram espertos, disse Santo.
-Deve ter comprado toda esta terra vermelha do governo brasileiro a preço de banana e vendido loteada a preço de ouro aos camponeses, disse Santo Caleffi
-Com certeza, confirmou José da Silva.
-Deve ser por isto que tem muitos nomes de ingleses por aqui dados nos locais em homenagem a eles, disse Santo.
-Sim. Até mesmo o nome de Londrina vem dos ingleses, é que quem mora em Londres capital da Inglaterra é um londrino, logo para homenagear eles mesmo deram para o antigo Patrimônio Três Bocas o nome de Londrina e ficou até hoje, pelo menos é o que me disseram, disse José dos Silva.
-Então é Londres/Londrina, disse Santo Caleffi.
-Mais um pouco iam obrigar todo mundo a falar inglês por aqui, brincou José da Silva.
-Eles devem ter ganhado muito dinheiro aqui com a venda de lotes na área rural e nas cidades que eles fundaram, disse Santo Caleffi.
-Veja Santo, presta atenção numa coisa muito interessante que poucos que passam por aqui nota, nós estamos andando por esta estrada com o jeep já há um bom tempo, mas percebeu que a estrada onde estamos ela vai passando sempre em cima do espigão principal desta região, ela vai serpenteando sempre em cima deste espigão, sempre estamos andando em cima, no lugar mais alto desta região que estamos. De um lado do espigão corre uma água do outro lado outra, observou José da Silva.
-Não tinha prestado atenção nisso não, mas agora depois que você falou José, comecei a observar que é isto mesmo, nunca corremos ao lado de um rio, só às vezes, atravessamos ele como já fizemos na outra viagem e vamos fazer de novo agora, no rio pirapó, falou Santo Caleffi.
-Que ingleses espertos!, admirou Santo Caleffi.
-Dizem que eles queriam fundar uma cidade grande, polo, a cada cem quilômetros de distância uma da outra, seguindo este espigão principal, de Londrina até Umuarama, sempre no espigão principal e entre estas cidades maiores a cada quinze ou vinte quilômetros mais ou menos fundar um patrimônio ou uma vila, para que estas pequenas localidades servisse como centro de abastecimento intermediário, para abastecer e dar suporte imediato aos camponeses, que eles tinham vendido terrenos, explicou José da Silva.
-Que projeto até muito interessante destes ingleses, bem planejado, pensaram em quase tudo, sabiam o que queriam aqui, falou Santo Caleffi.
-Com certeza, ganharam muito dinheiro colonizando esta região e vendendo lotes de terra, tanto na área rural como nas cidades e vilas que fundaram, disse José da Silva.
-Mas era isto mesmo que eles queriam, o lucro, falou Santo Caleffi.
-Mas devia ter já muita gente morando aqui nestas terras que Companhia inglesa comprou, falou Santo Caleffi.
-Com certeza existia muitas pessoas morando aqui antes e na época que a Companhia começou a colonizar toda esta região, disse José da Silva.
-Pois é, então a terra era destas pessoas, pois chegaram primeiro e viviam desta floresta e desta terra, falou Santo Caleffi.
-Sim, com certeza, disse José da Silva.
-O que é então que a Companhia inglesa fez para colonizar e vender toda esta terra como era o objetivo dele?, perguntou curioso Santo Caleffi.
-Na verdade o governo, principalmente o do estado do Paraná, queria e pediu para a Companhia limpar a área do que eles chamavam de intrusos, disse José da Silva.
-Que injustiça e desumanidade, indignou Santo Caleffi.
-Pois é, foi isto que fizeram, afirmou José da Silva.
-A empresa colonizadora inglesa, que aqui no Brasil passou a partir do ano de 1925 ter o nome de Companhia de Terras Norte do Paraná, mas as ordens vinham todas de Londres, onde ficava quem de fato mandava em tudo na Companhia, mandava nos negócios deles aqui. Diante da preocupação do governo do estado do Paraná da época de limpar o terreno, desocupar a terra, se livrar dos intrusos, a Companhia propôs comprar toda estas terras que estamos vendo e muito mais e em troca se comprometeu apaziguar a região, explicou José da Silva.
-Isto interessava muito a companhia inglesa e foi o que fizeram, continuou José da Silva.
-Que maldade e ainda com o apoio do governo, falou Santo Caleffi.
-Governo! Que governo! Santo, governo só pensa nos interesses dele e dos grandes, para os pobres é só discurso e mentiras, falou indignado José da Silva.
-Não é fácil, disse Santo pensativo.
-Com isto a Companhia assegurou a si e aos seus sucessores o direito líquido e inquestionáveis sobre a terra negociada, destas terras fertilíssimas, cobertas de mata que estamos vendo agora Santo, falou José da Silva.
-Que coisa, eu não sabia disto não, continuou Santo Caleffi.
-Mas esta é a verdade, esta é a história, falou José da Silva.
-Aqui moravam índios com suas aldeias e vida própria, cultura, religião, já há muito tempo; moravam os caboclos que nós vimos lá no Patrimônio de Paiçandu na naquela nossa viagem a Doutor Camargo, viviam por toda esta região do Norte e Noroeste do Paraná, onde estamos; viviam aqui também muitos dos chamados posseiros, que ocupavam esta terra para sua sobrevivência; e alguns detentores de concessão outorgada pelo governo do Paraná, que já disputavam estas terras com os posseiros. Foram todos expulsos da terra desta terra, falou José da Silva.
-Que injustiça, num lugar tão bonito, rico e com tanta terra, falou Santo Caleffi.
-A ocupação pela Companhia inglesa não foi tão pacifica como dizem, concluiu José da Silva.
-Os ingleses só foram embora daqui quando explodiu a Segunda Guerra Mundial ente 1939 a 1945, porque a Inglaterra precisou de muito dinheiro e começou a vender suas posses em outros países para arredar fundos para financiar a Grande Guerra, disse José dos Santos.
-Sim. Isto é verdade, mas não foi só por isto não, o Getúlio Vargas era nacionalista e não queria que estrangeiros possuísse terras no Brasil, ele proibiu isto, não gostava de ver estrangeiros dominando aqui não, juntou a fome com a vontade de comer, disse Santo Caleffi.
-O interessante é que eles começaram a negociar com o governo brasileiro a compra desta região lá pelo ano de 1922, um pouco depois do fim da Primeira Grande Guerra Mundial, que ocorreu entre os anos de 1914 a 1918 e foram embora com a Segunda Grande Guerra Mundial, disse José da Silva.
-Mas eles deixaram suas marcas por aqui para sempre, falou José da Silva.
-Sim. Para sempre, concordou Santo Caleffi.
-Quem comprou a Companhia Colonizadora dos ingleses foi um grupo de brasileiros ricos, tinham até um banco e um grande jornal, de São Paulo, falou José da Silva.
-O projeto continuou, só que agora nas mãos dos brasileiros de São Paulo, disse Santo Caleffi.
-Mas aqui também vieram como imigrantes para tentar ganhar a vida, ter uma vida melhor, italianos, como nós, alemães, japoneses, espanhóis, árabes, gente de todo o mundo, além dos próprios brasileiros de outras regiões, como mineiros, paulistas, nordestinos e gente de todo o Brasil, aqui tem lugar para todo mundo, concluiu José da Silva.
-Também terra como esta não existe em lugar nenhum do mundo, disse Santo Caleffi.
-Terra vermelha produtiva, fértil, é só olhar o mato viçoso, falou José da Silva.
-é um verdadeiro Eldorado, disse Santo Caleffi.
Conversando assim Santo e José iam percorrendo a estrada e a viagem ficava mais leve. Depois de viajar por uma estrada de chão batido, as vezes passando no meio da mata virgem, as vezes em meio da derrubada, vendo o preparo da formação das primeiras lavouras, chegaram enfim a vila de Marialva.
-Chegamos em Marialva, disse José da Silva.
-Vamos agora sair desta estrada principal e pegar uma estradinha vicinal, menor, que nos levará ao sítio que quero te mostrar Santo, disse José da Silva.
-Como chama esta estrada?, perguntou Santo Caleffi.
-Caraná, respondeu José da Silva.
-São quantos quilômetros até lá no sítio que você quer me mostrar?, perguntou Santo Caleffi.
-São quatorze quilômetros, respondeu José da Silva.
-Como chama esta região do sítio?, perguntou Santo Caleffis.
-Gleba Aquidaban, respondeu José da Silva.
-Indo nesta estrada depois do sítio que você quer me mostrar saímos a onde?, perguntou curioso Santo Caleffi.
-Se formos reto nesta estrada saímos no Patrimônio de Aquidaban e de São Miguel do Cambuí e se tocarmos um pouquinho mais para frente chegaremos em outro Patrimônio chamado de Itambé, explicou José da Silva.
-Aquidaban é um Patrimônio grande, movimentado, igual a Marialva, já São Miguel do Cambuí é menor, Itambé é um Patrimônio grande e movimenta como Marialva e Aquidaban, falou José da Silva.
-Vamos depois conhecer melhor esta região, vou te levar até a Aquidaban, a São Miguel do Cambuí e a Itambé para você conhecer está região toda, você vai gostar Santo, falou José da Silva.
-Tenho interesse sim em conhecer tudo por aqui, falou Santo Caleffi.
-Esta região aqui Santo é muito boa, de terra vermelha, muito fértil e plana, ia explicando José da Silva.
Iam andando com o jeep pela estrada caraná em direção ao sítio que o corretor queria mostrar para Santo. Era uma estrada tortuosa, com muitas pedras, cascalhos, algumas pequenas serras, passava no espigão de uma grande região, onde formava um vasto vale bonito de ver. Havia muita floresta fechada ainda. A estrada caraná era cercada pelo mato, mas já havia alguns lugares em que dava para ver um clarão de mata derrubada e algumas roças já em formação, além de muita fumaça queimando a mata que já estava seca no chão.
-Aqui também parece que a estrada passa no espigão, falou Santo Caleffi.
-Sim, respondeu José da Silva.
-A companhia loteadora dos ingleses pensou em tudo, falou José da Silva.
-Adotaram o mesmo sistema que vimos lá no espigão principal que já passamos, completou José da Silva.
-Fizeram estradas também em cima dos espigões secundários onde lotearam sítios de cinco, dez, quinze e poucos de vinte alqueires paulista, pequenos e médios sítios, para facilitar a venda, eles queriam vender logo estes lotes para fazer dinheiro logo. O sistema deles era uma estradinha passar no espigão onde todos os sítios fariam cabeceira, isto para facilitar o escoamento da produção das safras e a locomoção da população que moravam nestes sítios que eles iam vendendo. No fundo de todos os lotes deveria passar um rio, para servir de abastecimento de água para os moradores, um acesso fácil água. Ali perto do rio devia ficar as casas dos camponeses, formando assim uma verdadeira colônia na beira do rio, ao longo do rio, nas suas duas margens, onde os lavradores não se sentiriam sozinhos, pois logo ali perto tinha muitos vizinhos iguais a eles, explicou José da Silva.
-Nossa estes ingleses pensaram em tudo, falou Santo Caleffi.
-Chegamos, disse José da Silva.
-Este é o lote, continuou José da Silva.
Santo levou um susto. Era um lugar alto, no espigão, no alto de uma pequena serra, com muitas pedras. Havia muito mato, floresta fechada mesmo, mas ali no alto, no espigão, em cima da pequena serra, havia um clarão só de mato rasteiro, pararam o jeep ali, desceram. Santo olhou em silêncio, cessou a conversa, tentou ver tudo, na primeira vista, quase precisou de ajuda para olhar, diante de tamanha grandeza, não cabia só num olhar. Santo entrou um pouco mais no terreno, olhou de novo a mata exuberante, a vista corria, passeava sobre ela, naquele vale imenso.
-A terra é boa, pensou Santo, só com ele. Havia ali muitas perobas vermelha, amarela, rosa e branca; muitas madeiras de lei, de primeira, rara, encheu os olhos, encantou Santo à primeira vista. Achou um pequeno clarão no meio da mata e olhou o vale longe, contemplou tudo aquilo, achou belo, bom, gostou. José da Silva ainda perto do jeep, na beira da estrada caraná, observava tudo. Santo caminhou um pouco mais para dentro do terreno, José da Silva fechou o jeep e o acompanhou, Santo agachou-se, ficou perto da terra, pegou-a com as mãos, olhou-a, era vermelha, cheirou-a, era de cheiro forte de terra nova, contemplou-a. Pegou um pouco de terra nas mãos, ergueu a mão com a terra e foi soltando aos poucos a terra contra o vento e o sol e ficou contemplando ela cair por entre seus dedos.
-O que você está fazendo Santo?, perguntou José da Silva.
Santo ficou sem silêncio. Depois Santo desceu pelo sítio abaixo, José da Silva o acompanhou ia pelo meio da mata olhando, observando tudo, cada detalhe, cada vegetação, cada árvore, cada flor, sentindo o ar fino, agradável, puro, ouvindo o canto da mata, dos pássaros, fartura total, vida plena. Passou por um pequeno rego de água, depois mais a frente por mais um, conforme ia se aproximando do fundo do vale a mata ia ficando mais fechada e viçosa, encantava Santo. Se sentia o centro da natureza, o centro do cosmo, tudo girava em torno dele, era o centro do mundo, sensação estranha, mas plena, bela, sintonia total, identidade total, nunca tinha vivido aquela experiência. Aquele vale girava em torno dele, o acolhia de braços abertos. Chegou no fundo do vale por entre a mata. Ali corria um riacho de água cristalina, que dava para o fundo ver. Dividia o vale. Da outra margem do riacho começava o outro lado do vale, que ia a perder de vista, com mata imensa, viva, exuberante. Santo viu tudo aquilo, viveu aquele momento único, contemplou. Dali foi procurar algum vizinho daquele lote para conhecer e trocar impressão, José da Silva o acompanhava em silêncio, vendo tudo, experiência única, nunca tinha vivido momento igual aquele também e olha já trabalhava há muito tempo de corretor, já tinha vendido muitos outros sítios, tinha experiência. Andaram um pouco subindo a margem do riacho, logo encontraram uma casa simples de madeira, num lugar mais alto do terreno perto do rio. Era uma casa simples. Logo que viram que estavam chegando saiu um senhor grande, loiro, vermelho, olhos claros grandes, cabelos brancos, rosto grande, sério, olhar firme, decidido, mas tranquilo, sereno, parecia bondoso, já um pouco de idade.
-Olá bom dia, disse Santo.
-Bom dia, disse o homem.
-Meu nome é Santo Caleffi, disse Santo se apresentando.
-O meu é José da Silva, disse José.
-Sejam bem vindos, respondeu o homem ainda na porta de sua casa simples de madeira, no topo de uma escadinha de uns três degraus também de madeira na porta da sala.
-Meu nome é Mario Meloni, disse ele.
-Estou observando este lote vizinho seu para quem sabe adquirir, disse Santo Caleffi.
-Que bom, estamos mesmo precisando de um vizinho bom por aqui. Vivemos muito isolado aqui, quase sem vizinho, disse Mario Meloni.
-Não queremos incomodar não, disse Santo Caleffi.
-Imagina não é incomodo não, é um prazer receber um amigo aqui em casa, disse Mario Meloni.
Mario Meloni os convidou para entrar um pouco na sala, fez questão, insistiu, entraram na pequena casa de madeira aconchegante, sentaram em cadeiras de vime.
-Mas me conte um pouco do senhor, falou Mario Meloni.
Olhou para Santo Caleffi e perguntou:
-O senhor é italiano, não é?
-Sim, respondeu Santo Caleffi.
-Há eu já sabia, italianos se conhecem, disse feliz Mario Meloni.
-Eu logo percebi, continuou Mario Meloni.
-Da onde o senhor veio?, perguntou Mario Meloni a Santo Caleffi.
-Vim do Norte da Itália, da Província de Mantova, respondeu Santo Caleffi.
-Viemos da Ilha da Sardenha na Itália, então somos todos italianos também, falou contente Mario Meloni.
-Minha mulher Maria Uzae também é da Sardenha, falou Santo Caleffi.
-Que bom encontrar uma família de italianos como a minha por aqui, falou Mario Meloni.
Neste instante entrou na sala interrompendo um pouco a conversa a mulher de Mário Meloni para servir um cafezinho feito na hora. Era uma mulher de estatura mediana, simpática, forte, já de uma idade indo para velhice, com um lenço na cabeça, um avental, um olhar sorridente, um rosto sereno, morena como são os sardenhos, olhos escuros, tinha uma presença forte, marcante.
-Então o senhor quer comprar este sítio aqui meu vizinho?, perguntou Mario Meloni.
-Sim estou vendo, vamos ver se vai dar certo o negócio, disse Santo Caleffi.
-Vai sim dar sim, com certeza, interviu José dos Santos.
-Vai sim, disse Mario Meloni.
-Eu faço muito gosto que o conterrâneo venha morar aqui meu vizinho, disse Mario Meloni.
-é um bom lote, reafirmou Meloni.
-Aqui é um lugar muito bom, falou Mario Meloni.
-Tudo que o senhor precisar pode contar comigo, disse Mario Meloni.
-Muito obrigado, agradeceu Santo Caleffi.
Se despediram de Mario Meloni e de sua esposa e saíram. Conversaram com o vizinho dos fundos do lote do outro lado do córrego, que também era uma família de italianos, a irmã de Mario Meloni era casada com este vizinho. Ofereceu tudo para ajudar Santo Caleffi caso precisasse e incentivou que ele comprasse o sítio, para ter mais uma família de italiano morando perto deles.
-Desse jeito aqui vai virar uma colônia só de italianos, disse Santo Caleffi.
Já era fim da tarde. José quis levar Santo Caleffi para conhecer os patrimônios de Aquidaban e o de São Miguel de Cambuí. Foram primeiro até Aquidaban. Era um patrimônio grande, movimentado, parecia até maior que a vila Marialva, tinha tudo para vir a ser uma cidade no futuro.
-Nossa Aquidaban é vivo, cheio de gente, muito movimentado, um comércio forte, tem jeito que vai virar uma cidade importante logo, logo, falou Santo Caleffi admirado.
Foram depois no Patrimônio de São Miguel de Cambuí. Também muito movimentado, mas bem menor, ficava muito perto um do outro. Terminado estas visitas José dos Santos fez a pergunta que não aguentava mais esperar.
-E ai Santo gostou do terreno que te mostrei?!
-Sim, gostei muito, respondeu Santo Caleffi.
-Vou ficar com ele, vou ficar com este lote, com este sítio, disse Santo Caleffi.
-Negócio fechado, o sítio é meu, reafirmou Santo Caleffi.
José da Silva faltava explodir de alegria. Já era noite quando pegaram a estrada caraná com o velho Jeep, o velho pé-de-bode, de volta para Cambé. Pousaram novamente em Mandaguari. Alguns dias depois Santo Caleffi foi até ao cartório, agora de Mandaguari e assinou a escritura de compra do sítio, agora definitivamente seu, seu primeiro sítio, deixou de trabalhar de empregado dos outros, seu antigo sonho se realizou. Mas não passou a propriedade para seu nome não, passou para o nome dos quatro filhos dele com Maria. Antônio seu filho mais velho já tinha casado e tinha seu próprio sítio. Agora enfim tinha seu pedaço de chão. Corria o ano de 1948. Realizou-se um sonho antigo.
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