Programa Conte Sua História
Programação Vidas, Vozes e Saberes em um Mundo em Chamas - Vidas e Lutas Ameaçadas
Quilombo Dezidério Felipe de Oliveira
Entrevista de Waldemar, Anselmo, Maria Guiomar e Weimar Oliveira de Souza
Quilombo Picadinha (MS), 07/06/2025
Entrevista n.º: PCSH_RH005
Realizada por Museu da Pessoa
(00:00:08) P/1 - A coisa muito difícil que eu ia falar que vocês vão precisar fazer primeiro é começar cada um se apresentando. Dizendo o nome e quando nasceu.
R/1 - Pode ser do mais novo, do mais velho.
R/2 - Como quiser. Pode ser. Como vocês quiserem.
R/3 - Meu nome é Waldemar de Oliveira Souza. Sou nascido em 1956. Estou aqui para responder o que vocês precisarem.
R/1 - Meu nome é Weimar Oliveira de Souza, sou nascido 8 de 7 de 1962 e estamos aí na Lida.
R/4 - Meu nome é Anselmo Ronaldo Oliveira de Souza, nascido dia 21 de abril de 1960. Estamos aqui prontos para responder as perguntas.
(00:01:02) P/1 - Eu queria saber como é que começa a história desse território? Como é que começa a história desse quilombo?
00:01:11 R/1 - Essa história ela começou em mil... Meu avô chegou aqui em 1907. Ali onde está o Iame ali. Ali foi a primeira moradia dele. Ele veio de... Quando ele veio de Minas Gerais, ele foi nascido em Uberaba, e veio de lá, ele veio direto para Maracajú, a região de Maracajú. Lá ele teve um, acho que uns 5 ou 6 anos que morou, mais ou menos lá. Casou com a filha de um índio Terena, e lá em Maracajú eles tiveram quatro filhos, qoi, quando ele veio pra cá, em 1907. Ele já trouxe quatro filhos de lá. Aí ele chegou, e essa aqui era tudo mata Não tinha... Tinha só trieiro Ele chegou e alojou ali Aí ele alojou ali com a... Com a esposa dele e os quatro filhos Quando foi por volta de 1924 Um amigo dele Que chamava Atilio Torraca É muito famoso aqui da região Família muito antiga. E falou pra ele... Desiderio, você não quer adquirir essa área de terra? Pra você é terra de avoluta isso aqui....
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Programação Vidas, Vozes e Saberes em um Mundo em Chamas - Vidas e Lutas Ameaçadas
Quilombo Dezidério Felipe de Oliveira
Entrevista de Waldemar, Anselmo, Maria Guiomar e Weimar Oliveira de Souza
Quilombo Picadinha (MS), 07/06/2025
Entrevista n.º: PCSH_RH005
Realizada por Museu da Pessoa
(00:00:08) P/1 - A coisa muito difícil que eu ia falar que vocês vão precisar fazer primeiro é começar cada um se apresentando. Dizendo o nome e quando nasceu.
R/1 - Pode ser do mais novo, do mais velho.
R/2 - Como quiser. Pode ser. Como vocês quiserem.
R/3 - Meu nome é Waldemar de Oliveira Souza. Sou nascido em 1956. Estou aqui para responder o que vocês precisarem.
R/1 - Meu nome é Weimar Oliveira de Souza, sou nascido 8 de 7 de 1962 e estamos aí na Lida.
R/4 - Meu nome é Anselmo Ronaldo Oliveira de Souza, nascido dia 21 de abril de 1960. Estamos aqui prontos para responder as perguntas.
(00:01:02) P/1 - Eu queria saber como é que começa a história desse território? Como é que começa a história desse quilombo?
00:01:11 R/1 - Essa história ela começou em mil... Meu avô chegou aqui em 1907. Ali onde está o Iame ali. Ali foi a primeira moradia dele. Ele veio de... Quando ele veio de Minas Gerais, ele foi nascido em Uberaba, e veio de lá, ele veio direto para Maracajú, a região de Maracajú. Lá ele teve um, acho que uns 5 ou 6 anos que morou, mais ou menos lá. Casou com a filha de um índio Terena, e lá em Maracajú eles tiveram quatro filhos, qoi, quando ele veio pra cá, em 1907. Ele já trouxe quatro filhos de lá. Aí ele chegou, e essa aqui era tudo mata Não tinha... Tinha só trieiro Ele chegou e alojou ali Aí ele alojou ali com a... Com a esposa dele e os quatro filhos Quando foi por volta de 1924 Um amigo dele Que chamava Atilio Torraca É muito famoso aqui da região Família muito antiga. E falou pra ele... Desiderio, você não quer adquirir essa área de terra? Pra você é terra de avoluta isso aqui. E eu te levo, eu conheço um rapaz de Ponta Porã, que era do Ibra na época. Que é o próprio Inca hoje, né? Chamava Ibra na época. O cidadão chamava João Batista de Azevedo. Aí ele falou, eu quero... Porque ele era uma pessoa muito determinada, meu avô... Segundo as histórias que tem dele Ele era muito corajoso, muito determinado Aí ele foi lá apresentar ele lá por... Por esse cara lá E o cara Conseguiu essa área de terra pra ele Aí ele demarcou, mediu essa área Foi um maior sofrimento pra medir Pra marcar, porque era tudo mata, né? Encontrou resistência aí em redor Mas ele venceu, conseguiu marcar tudinho E nesse meio de tempo, os documentos na época eram tudo Cuiabá, porque era Mato Grosso. Não existia Mato Grosso do Sul. Era tudo em Cuiabá, que era a capital. Isso em 1924. Quando foi em 1932, teve uma revolução. E ele participou dessa revolução. com uma tropa aí, não sei como é que era que eles falavam aí. E ele participou dessa revolução. Aí quando ele retornou da revolução, já em 1936, não, antes de... Quando ele retornou, depois de 1932, ele esteve aqui com a família e ficou mais quatro anos, três anos. Aí ele faleceu. E esse documento tinha ido pra lá. Quando foi em 1937, o documento saiu. O título definitivo. Ele tinha conseguido um título provisório antes da área. E depois veio o título definitivo lá de Cuiabá. Só que quando saiu essa notícia, ele já tinha falecido.
O título saiu em 1937 e ele morreu em 1935. Aí ficou os filhos. que não tinha um estudo não conhecia o que era lei, não conhecia nada nenhum tinha estudo nenhum eram doze filhos que ele adquiriu quatro veio de lá e mais oito foi aqui que nasceram então aí que começou a malandragem pegaram para fazer inventário da minha avó e uns caras aí muito espertos né advogado, engenheiro, entrou no meio e tudo E fizeram o que fizeram. Fizeram uma partilha para a minha avó de 600 hectares. Aí deu 25 hectares para cada herdeiro de 30 hectares. 30 hectares era da avó e 30 hectares dos herdeiros. Fizeram. E aí dessas 30 hectares que era da minha avó que fizeram a partilha o advogado ainda cobrou 150 hectares de honorário. Ou seja, eles levaram 3.148 hectares. Sumiu. E aí foi entrando fazendeiro, fazendeiro... E chegou um ponto que... Que os caras vinham, trouxeram mais de 200 Paraguai. Na época que meus tios contavam, né? Eles ficaram num momento muito preocupante aqui. E os caras tinham pista de avião, tudo aí. Colocaram madeireira. Duas, três serrarias aí. E nossos tios que eram acostumados a caçar, até no território deles, eles caçavam porque as caras não podiam sair mais. Ficaram encurraladas aqui. Porque eles não passavam do corguinho que tem ali. Os portões eram todos cadeados. Ninguém entrava. Só eles. E avião. Aí quando foi em 40, em 50... 49, 50... Por aí... O meu tio mais velho chamado Miguel Ele começou a querer demandar Contra eles, né? Pra tentar recuperar a terra deles, né? Aí foi luta e luta, e... Aqui no estado, e... Intimam os fazendeiros, fizeram aqueles, né, sabe? Movimento doido, e cada vez que o meu tio intimava, ou que o juiz intimava eles, os fazendeiros, isso aqui coiava de caminhão de boi. Que saía. com certeza, não sei se era pra comprar alguma coisa algum juiz, alguma coisa saía caminhão de boi que chegava a trancar essa estrada tanto boi que tinha aí e aí chegava um ponto que o advogado desistia teve um advogado que falou pro meu tio que o direito era nosso falou, Miguel, o direito é de vocês a terra é de vocês, o documento de vocês é legítimo o título é do seu pai mas vocês não têm dinheiro Os homens têm muito dinheiro.
Não vai ter advogado que aguente o dinheiro desses homens. Aí meu tio esmureceu. Chegou e falou pra todo mundo, pros outros irmãos. Contou a história e falou, ó... Eu tô parando porque não adianta. Vou ficar sofrendo aqui. Aí tinha um fazendeiro que comprou a fazenda aí. Dos caras. Que fizeram o rolo. Tirava o sarro do meu tio. Ia na casa do meu tio. Meu tio morava do outro lado do córrego, na chacrinha dele. Ia lá e falava pra ele. terra de vocês, direito de vocês, mas vocês não têm dinheiro. Foi um sofrimento, uma humilhação muito grande. E depois eles tinham um plano para tirar nós todos daqui, para tirar todos que moravam aqui. Eles iam largar 5 mil bois em cima daqui. Eles tinham um plano para acabar mesmo com os negros daqui. Ou seja, era para limpar, né? Porque eles queriam comprar o restante que tinha aqui e ninguém queria vender. Então eles falaram, matar vai dar problema, né? Então vamos meter boi nele e escovar com ele daí. Aí graças a Deus um senhor daí de Dourados que era amigo da família aqui. Ele era um cara de muita influência. É dono de uma concessionária aí. Ele chamava Alamparim, né, Gil? E ele tinha amizade com os caras também. Só que ele falou, não. Com os negros, não. Vocês não vão mexer com eles. Se vocês mexerem com eles, vão mexer comigo. Porque um tio meu serviu o exército com ele. Eles eram muito amigos do exército. Esse tal de lamparinha. Foi o que não deixou. E aí os anos foram se passando, foi perdendo aquela vontade de brigar, porque você não tem recurso pra brigar com os caras. Aí foram tomando conta. E tá até hoje essa briga aí. Hoje tem uma briga federal, né? Nós tem apoio da Justiça Federal, do Ministério Público Federal, que nunca tivemos, né? Hoje deu uma mudada. Mas por enquanto é isso, é isso. Onde vocês quiserem falar. Fica à vontade.
R/4 - É, o nosso avô, ele... Foi inspetor de quarteirão na cidade de Dourados, né? E tinha um grande amigo dele aí, Marcelino Pires. Se ela é mulher do Marcelino, que era colária Pires. Eles eram um compadre, viu? Eles... Fazia, ó, novena, rezateio nas casas Ele era pensador de café da Elva Mate, né? Elva Mata da Vejeira Ele participou de tudo isso aí E ele comandava aí, ó Fez a segurança do estado Depois da guerra do Brasil com o Pai Aguardo Esse é o legado da coisa Então ele comandou essa área aqui de Campo Grande pra cá, ele e os companheiros dele, né?
R/1 - E o Briante.
R/4 - E o Briante. Werner Bete era um dos companheiros dele. Era de tamanho da captura. Então ele batalhava forte aí. Sob a luta pra fazer segurança dos territórios, né? Aí, quando chegou a hora da demarcação da divisa lá, aí tudo parou, pá. Com a luta dele aqui, ó Eu tô firme e forte ainda Tem até uma espada que ele deixou No... Bem, ela deve ter um presente aí, né?
R/1 - Na verdade, ele foi um guerreiro, né? Ele aí... Um grande herói mesmo, meu.
R/4 - Avô Até tinha uma estrela do exército brasileiro Que tava com a tia, viu? Aí acho que ela vendeu pra uma pessoa aí Que eu não sei quem.
R/1 - Que era.
00:11:20 R/4 - Mas tinha umas bolas e barbastos ali. Então essa aí foi a luta dele. Só pode falar de novo que ele teve um problema.
00:11:29 R/2 - Eu sou Maria Guiomar, tenho 67 anos, nasci daqui e sou neta de Desiderio Filipe de Oliveira.
00:11:39 P/1 - Que ano que a senhora nasceu?
00:11:41 R/2 - 26 de 58.
00:11:44 P/1 - A senhora é a mais velha? É a mais velha que está aqui? Você?
00:11:48 R/2 - Não, é ele.
00:11:50 R/3 - O mais guri.
00:11:52 P/2 - E eles estavam falando, dona Maria, um pouco da história, como eles se lembram, da história do seu avô, né? A avó aqui nessa região. E a senhora quer falar alguma coisa sobre essa história? Como é que a senhora vê essa história?
00:12:13 R/2 - Muita luta e sofrimento, né? Humilhação. Porque a minha mãe contava as histórias da minha avó. Era horrível, né? Porque minha avó era parteira, partoerente, não sei como que fala, né? E ela era chamada pra sua azenda pra fazer os partos, quando tinha uma senhora pra ganhar neném, né? E... Simplesmente ela não podia nem levar os filhos dela, né? Se ela levasse, eles tinham que ter um... Ficar escondido nas fazendas por lá, né? Então eu acho isso muito sofrimento e muita humilhação pra mim, né? Minha origem... Minha avó passou, né? Por tudo isso, além dela ir fazer o favor, ela não podia levar os filhos, né? Porque eles não podiam sentar na mesma mesa pra participar de uma janta, um café, né? Porque eram negrinhos, né? A minha mãe conta a história assim, que eles foram numa fazenda e ela tinha o irmão caçula dela. A avó levou junto, né? E lá era uma festa de dia das crianças, de confraternização lá das senhoras lá e ela levou o gurizinho dela. Ela ainda ia pegar um bebê e participou de ajudar, né? Na luta lá. Aí, o que que acontece? Levaram o filho dela pra mesa, né? Simplesmente foi uma criada lá e pegou ele e tirou. Aí minha avó perguntou por quê? Aí a senhora respondeu, né? Não, ele não poderia participar, né? Aí você imagina, uma festa de confraternização no dia das crianças. Como que esse guri se sentiu, né? Essa criança. Pior do que um animalzinho, né? E aí depois vem as lutas, ela ficou viúva, o vô faleceu, ela ficou sozinha e já começaram a se aproximar dela pra poder fazer a malandragem, né? Que é na questão de terra. E já fizeram... Pra vir os documentos dela segurar, o vô faleceu em 35, esses documentos foram chegar em 38, porque ela pediu, naquele tempo tinha um filho no quartel, né? E aí o filho falou com um cumpadre dela, mandou uma carta pedindo pra ele entregar lá no comando do exército, Ponta Purã. Aí ele entregou. Acho que demorou uns três meses ela disse que chegou os documentos da avó, né? Mas já chegou com divisão, dívida, né? E aí vem vindo essa luta. Você vê, tem cento e poucos anos isso, né? Não é brincadeira, né? Eu vi minha tia morrer, né? Lutando por isso aqui, ninguém nunca conseguiu. Nem respeito.
A luta deles foi muito triste. Que nem respeito eles tiveram. Nem respeito. Uma luta difícil. Trabalhava com... Animal, né? Se veio daqui em Campo Grande buscar sal, querosene. De carreta. E até hoje não foram. Não fizeram o direito deles, né? Os mais velhos já foram todos e nós já estamos indo, né? Estamos na estrada. 67, 69 e vão indo. E só mentiras e mentiras. Entre os políticos, no meio, ali vão dando de cartório. Eu vou falar uma coisa pro senhor, Mato Grosso do Sul, se entrar pessoas de verdade querendo trabalhar, acho que vão ter que fazer mais cadeia. Porque só tem pilantragem, safadeza, sonegação, é tudo. Tudo que você imagina de que não se deve ser feito, aqui nessa região é feito. E não adianta você procurar, porque é só mentira e mais mentira. Aqui, pra sobreviver, Eles tinham as lavourinhas de mandioca, cana, milho, arroz. Arroz tinha muito. Plantava-se muito arroz. Feijão, batata. Aí quando chegava a época que a lavoura estava assim, ou mais verde, ou já pronta pra colher, o que eles faziam? Os fazendeiros daqui, que tinham tomado conta de tudo, né? E arrumaram os documentos, esquentaram. e não sei como é que fala, fizeram as tramoias deles e conseguiram, né? Eles colocavam mais de 1.500, 1.700 cabeças de boi trazidas do Pantanal pra cá. Quando chegavam nessa, a estrada não era essa aqui. Vocês vieram reta nessa aqui, né? Ela era aqui, ela saía lá naquele canto de mato pra estrada de chão também, que é onde a asfaltada era chão, né? Buraco e só tinha alguns caminhões de tora das fazendas, algum de jipe, eram os carros que se usava muito.
00:18:38 R/1 - De jipe, era de fazendeiro, né?
00:18:39 R/2 - É, de quem tinha, né? E... aí eles, quando chegavam ali, toda vez que isso vinha, a boiada deles estourava. Sabe, que ele dava aquele tropelo no animal, que eles não seguravam. Passavam por aqui, cerca, casinha de sapé, pau-a-pique, aquilo ia tudo no pé dos animais. Porque animal é animal, né? Se assusta eles. Ou se você vai ainda e solta uma... dá um tiro, solta uma bomba, uma coisinha, né? Um foguete. O que que acontece? O gado se espanta, né? Que aquilo... E tirava tudo no pé. Cabava. Cabava. Lavoura. Até animal morria. Juntos, sabe? Que tinha os primos ali, que tinha... Bezerro tinha. Cavalo. Às vezes tinha cavalinho novinho, né? Pequeno. Porco, galinha. O que tinha! O que tinha saía no pé. Todo ano era isso. Eles vinham do Pantanal pra cá. Parece que era certo e planejado, tudo feito pra casa. Uma vez tiraram a casa de um senhor que morava, acho que uns 30 metros assim da estrada de chão, no pé. Os animais levou. Tudo, derrubavam tudo. E reclamavam pra quem? Pra quem? Pra ninguém, porque não adiantava falar, né? Até o último acontecimento aqui foi o nosso, nós tínhamos aqui mais ou menos 400 a 500 pés de fruta. Entre laranja, limão, lima, aquela mexeriquinha, tangerina, pão-cã. Eles mandaram, simplesmente chegou um caminhão. Só eu e minha mãe, eles estavam para a fazenda trabalhando lá perto de... E aqui, eu e minha mãe só, eles chegaram e falaram que vieram passar veneno nos pés de fruta. Minha mãe falou, mas como assim? Não, dona, é uma ordem do governo do estado e vamos passar. E simplesmente foram descendo aqueles homens, até então eu nunca tinha visto bomba passar veneno. Foi a primeira que eu vi, passando nos pés de pranto com três dias. As plantas estavam todas morrendo, cheias de frutas. Secou. Hoje, você pode pegar um pé de laranja e tentar plantar aqui onde era que você não consegue ter fruta. Ela vai até um ponto, amarela todinha as folhas e as frutas vão rachando e caindo. Não fica no pé. É jogar dinheiro fora, você compra um pé de fruta pra plantar aqui. E isso, simplesmente fizeram isso, não trouxeram uma muda de outra coisa, não ofereceram um pagamento por aquilo.
00:21:52 R/2 - Simplesmente veio como se tivesse uma campanha do bichinho da água, da dengue, né? Mas estavam fazendo favor, estavam limpando. E ninguém nunca se preocupou, ninguém nunca Falou, mas o que aconteceu? Vocês receberam alguma coisa? Vocês foram chamados pra explicar o que era isso? Por que disso? Nada, simplesmente nada. Fizeram e... E assim eles fazem com tudo, né? Eles não podiam caçar, meus tios caçavam, meus primos caçavam. Eles vigiam de caça, né? Naquela época. Comiam muita caça, matavam pra comer mesmo. E não podiam, porque tinham lá os portões e tinham os capangas, né? Não passavam. Lá tinha ameaças, porque se o fulano tinha depósito de arma dentro do campo de aviação, que o outro lá tinha não sei o que, então ia até uma altura, mas não dava, né? Tinha que voltar, corrar bem até as pernas e ir embora. Foi uma vida bem difícil. E não tá sendo muito diferente, não. Porque você simplesmente é peitado, você é olhada do pé pra cima. Com coisas que você é um lixo, você não é nada. O que você tá falando? Você não é ninguém? Você tá falando o que aí? Não faz muito tempo. A minha cunhada saiu, ela trabalha no... Ela é funcionária pública. Ela saiu com o carro, o pneu. Deu uma murchada. Tem uma borracharia aqui, os BR aí. Ela encostou pra calibrar o pneu. E tinha um senhor arrumando uma carreta, mais outros. Aí, simplesmente, o cara da borracharia falou com ela, né? Diz, oi, fulano, e os quilombola. Aí o cidadão disse que girou e olhou, falou, Falou o nome de um primo nosso lá, né? Que ele conhece, o dono da bochecharia. Aí disse que ele falou, faz dia que eu não vejo ele. Aí disse que ele simplesmente virou de lá e falou... Ele vai... Como é que é? Não esqueci como que foi a fala dele.
R/3 - Fala pra ele que ele vai ver o que merece.
R/2 - É, fala pra ele que ele vai ver o... Não foi bem essa fala não, mas é isso aí. Ele vai ter o que merece. Então, quer dizer que são coisas que meu primo foi procurar, foi saber quem que era. Aí ninguém quer falar, ninguém quer se meter. Eu vi, mas não vi, né? É igual a história da menininha. Eu vi, mas não vi. Não vi direito, não sei quem que é. E a vida da gente aqui é assim. Vai até uma altura, dá um pouco para, porque... Ah, eles são muito fortes, eles ameaçam duro. Esse povo aí é bravo, eles são valentes, eles vão matar. Então, o senhor acha que nem nós vivemos aqui? Mata mesmo, faz o que quer, né? Então, o senhor às vezes até engole muita brasa, muito fogo por isso, né? Porque o que vai te defender? Você vai confiar em quem? Em ninguém. Você confia desconfiando. É um ditado muito certo. Você confia desconfiando. Porque não dá pra confiar. Você não tem como confiar nem nos próprios... o nosso executivo. O que foi em 75? Acho que foi em 1975. Teve uma audiência com todos os proprietários aqui de terra, né? E meus tios foram. 71. E lá teve uma audiência, né? O juiz deu o ganho de causa pro meu tio. O advogado foi com ele até a casa de uma prima minha que morava na cidade, tomara um café, conversou e ele falou, você não fique andando por aí sozinho, vá embora para sua casa e tal, porque esse daí pode ser muito perigoso. E ele foi, saiu no jornal, saiu em tudo. Mas e o que que aconteceu? Simplesmente nada. Acho que até o cidadão que foi o que julgou a causa, o juiz, eu acho que eles transferiram pra aquele tempo, Cuiabá, né? É, Cuiabá. Ele foi pra lá. Transferido, acho que com 15 dias ele sumiu aqui da cidade. Então, são coisas assim muito, sabe? Você vive encurralado. É como se tivesse um bando de... de pássaro dentro de uma gaiola pequena, né? Você fica ali sem saber o que fazer.
P/2 - Também a Azra tá falando um pouquinho da sua avó, né? Como é que a senhora acha que sua mãe viveu isso?
R/1 - Essa história toda.
R/2 - A minha mãe? Ixi! Com muita revolta, muita mágoa, né? Muita tristeza, né? Porque minha mãe era caçula de 11 irmãos. Doce de mamão, naquele tempo amendoim, abóbora, ovo, porco, galinha. Então a gente ia uma... a semana inteira. Trabalhando, juntando essas coisas. Aí no sábado a gente ia aquela carroça e ia pra cidade vender. É, daquelas de roda de ferro, né? Que às vezes até caia, o negócio que elas emendam. E a gente ia junto com ela. Uma vez ela comprou um animal e ela não sabia que o... O animal era bravo. Quando deu lá em frente o quartel ali, tinha muitos buracos, e o animal ficou bravo e não queria ir pra frente nem. E a carrocinha dela virou com tudo, tudo dentro. Aquilo foi rapadura, ovo, frango, banho de porco, que ela vendia também num estambor. E era assim. Às vezes fazia em troca lá na cidade. Ela levava polvilho e trocava por trigo. E assim ia, né? Farinha trocava por querosene, que usava muito dos lampião, né? Aquelas lamparina, que tinha um lampião, que era aquele já mais moderno, né? Que era de rico. E aí tinha a lamparina, né? Aí que era querosene. Às vezes ela trocava, fazia troca, né? Trocava farinha por querosene, açúcar, né? Trocava porque fazia um rapadura e o doce, mas não tinha o açúcar, né? Minha mãe nunca mexeu com açúcar. Então, tinha... Muita dificuldade. Pra ela foi muito difícil. Nós ajudava muito, ela desde criança, a gente com acho que dois aninhos já tava lá sentado aí indo se trabalhar, né? Então, a gente ajudava muito. E daí eu tinha o tempo de ir pra escola, né? Que era mata, uma mata, cinco quilômetros de mata fechada. Nós ia onze horas. Não, onze horas nós saía, vinha tomar o banho e saía correndo pra ir pra escola. a pé. Andava cinco quilômetros, chegava lá em cima, onde tinha a escolinha. Aí ficava até cinco horas. Saía. Estava escurecendo, nós entrávamos dentro dessa mata. Você imagina um bando de criança no meio de uma mata onde tinha onça, tinha macaco, tinha... Além das histórias, né, que o pessoal contava. Aí eu vi uma assombração e a gente, quando é criança, acredita, né? lobisomem, sombração, boitatá, não sei quem mais. A gente vinha, o coração vinha a mil, né?
00:30:43 R/2 - Era difícil. Às vezes a mãe ia, o tio montava num cavalo e ia encontrar com a gente. Aí era uma felicidade só, né? Porque quando vinha eles ficavam felizes, porque tinham a companhia, né? Lá ali eles levavam uma espingarda no negócio do cavalo ali, nem sei como que chama. morrer, né? Ou foge, sei lá. E a gente ficava feliz, né? Tinha um tio nosso, quando ele tava por aqui, ele ia toda tarde buscar nós lá. Era longe. Muito longe. Às vezes a mãe ia. Mas ela ia até chegar aqui, quando terminava a mata, né? Ela não enfiava na mata sozinha também. Porque nós era mais, né? Nós era uma turma. Então era mais.
00:31:32 P/1 - Aqui em Santos.
00:31:36 R/2 - Só faleceu mais velhos.
00:31:39 R/3 - É, falar um pouco do velho Desidério. O Desidério, na verdade, ele é o proprietário dessa área de 3748 hectares. Só que ele não conseguiu Pegar os documentos na mão Que quando chegou ele já tinha falecido, né? E... Ele foi ao carreteiro, ele é o cara que viajava aqui pra Campo Grande Ele encontrava a flota de carreta dos.
00:32:08 R/1 - Outros que saíam do lugar Carreta de boi, né? Carro de boi.
00:32:10 R/3 - Carreta de boi, ele não falava até tremião não, né? E... Então era seis meses de viagem Ele ia, comprava, levava as coisas daqui Vendia lá e comprava as coisas e trazia ele lá pra cá, pô Com os vizinhos, né? Então, na verdade, ele é o proprietário disso. Só que quando chegou esses documentos, ele já tinha falecido. A sua esposa era índia, não entendia de nada o sido. Era criado que nem pintinho, né? Corta e chega lá para noite. Não ficava perto de ninguém. O que aconteceu? Os espertos, os donos de cartório. Chegou o documento lá e falou, não, você dessa negrada aí, você é coitada dos índios lá. Índio é ela, não sabe de nada. Vamos fatiar.
00:32:59 R/1 - Mas foi vendendo.
00:33:02 R/3 - Isso aí foi vendendo, foi vendendo. E os fazendeiros foram entrando aí. Aí entrou um fazendeiro bem grande aqui.
00:33:08 R/1 - Delírio, tosa.
00:33:10 R/3 - Família tosa aí. Aí já abriu uma estrada aqui. Na época tinha aqueles F600 amarelos Aí colocaram três serrarias aí E fez uma.
00:33:24 R/1 - Vila lá em Ribam Porque tinha muita madeira, isso aqui era rico em madeira.
00:33:27 R/3 - Só madeira de leite Aqui na Amazônia, aqui na Amazônia agora já tá fatiado também, né? E... E aí a madeira tinha mesmo Tinha mais de 300 pessoas trabalhando Aí trouxe uma paraguaiada aí Pra abrir isso aí, pra fazer pasto pra gado Abriu esse mundão aqui. Foi clariana aí. Aí ficou um mato aqui.
00:33:49 R/1 - Saiu na vila lá.
00:33:51 R/3 - A vila tinha três casas. E... Então... A lei de abediação deles foi em cima disso. Aí fez documento em cima de documento. Isso tá comprovado. Se vocês pegarem a história disso aqui... Aqui na faculdade tem um livro bem escrito sobre essas coisas que foram montadas com os mais velhos do que nós. Pessoas que sabiam muito mais. Aí fizeram um livro. Com os professores daqui do ano. Qual a outra ali, aquela outra cidade?
00:34:27 R/1 - Perto de Campo Grande. Sidrolândia?
00:34:31 R/3 - Sidrolândia é aquela outra.
00:34:34 R/1 - Maracaju?
00:34:35 R/3 - É Maracaju também. E então foi montado esse livro. Muito bem feito. E tem aí na universidade a história do velho Desidera aqui. Ele foi plantador de café com Marcelino Pires. É o fundador de Dourados, Tudim. Ele teve uma grande influência aqui que todo mundo conhecia Desidera e respeitava ele. Foi delegado.
00:34:56 R/1 - Naquela época não falava delegado, falava... Superdor de Quarteirão.
00:35:02 R/3 - Então ele era uma pessoa aqui bastante respeitada Agora, quanto sofrimento daí pra cá Que é uma história, um pedaço que eu sei sobre junto com meus tios Pra cá Aí vem chegando nós, né? Muita luta A gente era aqui que nem os nabuzinos Não sei se vocês conhecem o nabu, né?
00:35:22 R/1 - Não, nem devo ter visto falar, hein?
00:35:24 R/3 - É Arisco aí Porque as pessoas, né?
00:35:28 R/1 - Atropelavam.
00:35:29 R/3 - Pô, queria correr, né? Queria que o pessoal aqui abandonasse isso aqui. Pra eles acabarem de fechar isso aí. Aí tem mais histórias, histórias deles, né? Tentando expulsar o povo daqui. Ah, vocês saem daí porque esses caras vão matar vocês aí e tal. Então, são umas coisas assim que a gente andava muito amedrontado. Aí foi crescendo também. Vai ficando também, mas não é bem assim. Aí tinha um estilo. Mas não! Vamos ficar na nossa que... Beleza! Vamos ficar nesse pedacinho que nós estamos, vamos segurar, é nosso! E ficou assim!
00:36:03 R/1 - O outro vendeu porque os gostou, né?
00:36:05 R/3 - Ficou obrigado! Um pedaço! E até hoje! Eu não sei se vocês viram as histórias aí... Que quando o Inca aqui mexeu aqui pra nós aqui... Que um pessoal trabalhando o Inca aqui... 2005. 2005, né? Dei mais de... Mais de 120 caminhonetas.
00:36:23 R/2 - Só caminhonetas.
00:36:25 R/3 - Dos fazendeiros aí. E o Inca... Estava ali do outro lado do quadrinho. Fazendo um trabalho ali em um... Em um sítio ali.
00:36:34 R/1 - Telemitação.
R/3 - E aí... Tentando correr com o Inca. O Inca teve que chamar a polícia federal. Aí dei umas dez caminhonetas, mais rápido. Estou por lá, por aqui. Um barulho cheio. E aí não queriam sair não. Isso aí a Polícia Federal ajuda duro mesmo. Pra não deixar... Eles queriam espancar os caras, porque os caras não tinham nada a ver, né? Estão medindo, fazendo o trabalho deles, né? Então, esse sofrimento nosso aqui é muito grave. Aí... Ah, não, mas tem a Polícia Federal protegendo vocês como? Vocês vão embora pra lá, nós ficamos aqui.
R/1 - E aí?
R/3 - Naquela hora da noite, quem que protege nós? Nossa, Deus, né? É o que nós até hoje. Ah, cuidado na estrada lá. Cuidado com o que? Se Deus proteger nós, ninguém vai fazer nada. E graças a Deus, até hoje, nem triscar, nós triscou. Então são umas coisas assim, mas teve e o sofrimento continua. A gente foi criado descalço, praticamente sem roupa.
R/1 - Era assim.
R/3 - Meus pais, minha mãe comprava aqueles fardos de de bolsa branca para fazer os bornauzinhos. Quando não tinha bornau para a gente estudar tinha um coleginho ali que eu estudei até o quarto ano. Então saía aquele bornauzinho faceiro, né? Super sol, cara.
R/1 - O cara só tinha apanhado um negócio aqui, né?
R/3 - Não sei o nome que falava.
R/1 - Como é que era aqui?
R/3 - Eu não entendi, eu acho assim... É onde?
R/1 - Suspensol. Suspensol, né?
R/3 - Então, eu fui criado daquele jeito, descalço. Cachado jamais. Eu vim conhecer uma butina, com 12 anos. Não sabia andar. Ia sair, tropicava e caía.
R/4 - Tinha aqueles comicastros?
R/3 - Não, depois foi aquilo lá.
R/1 - É.
R/3 - Então... O sofrimento... Ele continua. Tentou passar pra eles um lado melhor. Na verdade, eu tenho dois filhos, praticamente não trabalham. Eu que dirijo, minha esposa, eles, né? Põe a estudar. Os que não conseguiu porque não quis, quis trabalhar e tal, mas... Toda vida foi assim, já pegou um tempo melhor. Porque tá tudo sob controle, né? Então, é isso aí. Agora, nós, mais velhos, só temos pra caramba aqui. Minha mãe toda a vida, que nem diz ela ali, toda a vida trabalhou. Ela nunca esperou nada de ninguém. Sempre ali. Todas as tias. Não todas, todas. Todas elas não tinham esse negócio de não esperar pelo marido. Mas trabalhava também, né? Mas você ganhava pouco. Então, você plantava um pedaço de coisa aí pra você vender, você tinha que trocar. Então, por exemplo, se você queria matar uma nuvia, uma coisa, você ia no quentinha lá e tal, o cara trocava pra pegar aquele milho ou feijão, abóbora pra dar pros bichos desses também, então fazia uma troca e era assim. Açougue, essas coisas tinham açougue aí na... na vila, a gente comprava carne por mês, pra pagar por mês. Você ia lá e pegava lá o tanto lá. Nosso pai, a gente fazia um negócio aí, e a gente sempre atrás.
P/2 - O que eu queria perguntar para vocês, os filhos e as filhas de vocês não têm esse medo que vocês fizeram, que ainda está presente aqui?
R/1 - Tem.
R/2 - Eles têm mais, né?
R/3 - Tem, mesmo eles têm, mas só que.
R/2 - Assim, já mais, sem mais.
R/3 - Tem mais sabedoria, né? Agora eles são mais espertos, né? Com as coisas diferentes. Tem o celular, já tá tudo conectado, né? Não está fazendo faculdade, já tá ali no meio do povão, então é diferente, né? Já começa... Aí tá conversando com a devotada, tá conversando com vários tipos de pessoas, né? Então, aquele medo já não é mais assim, não. Tem medo, mas... medo, mas... Porque...
R/1 - Eu acho assim... Posso falar? Posso, né? Porque... Eu tenho uma filha e um filho, que eu falei, 16 anos. Meu guri. Até ele tá pra igreja. Ele já falou pra mim, pai, larga a mão disso. Esses caras vão matar o senhor aí. Meu mandato de presidente da associação terminou em fevereiro. Agora é outro rapaz que está à frente. Então meu filho falou, pai, larga a mão disso aí. Vão matar o senhor e a troca do que? Vão morrer a troca do que? Por causa de terra? Eu falei, não meu filho, não é por causa de terra. Isso é um direito nosso. Isso é pra vocês. É pro futuro. Porque se nós for entregar tudo que a gente tem pros outros de mão beijada, é o que eles querem. Eles ameaçam pra isso. Então, a minha filha a mesma coisa. Minha filha ainda é pior.
R/2 - Vixi!
R/1 - Fica até doida. Agora, o que a gente pensa? Morrer, todo mundo vai morrer, né? Então, chega uma hora que vai morrer. Agora, a gente tem que ter também aquela determinação de que uma hora vai acontecer, né? Alguma coisa boa vai acontecer. Porque nós não estamos com a mentira. E outra coisa que me intriga muito é que a gente vai na justiça tudo certinho, sabe? O procurador fala, ó, os caras fizeram assim, seu avô foi zurpado. O nome correto é esse, foi zurpado. O Estado brasileiro tem a obrigação de recompensar vocês. Entendeu? Porque o nosso quilombo aqui é diferente dos outros. Entendeu? Aquelas pessoas que refugiou... Ficou lá no cantinho, fizeram aquele grupo ali... E ficaram ali, resistiram ali, né? Não! Aqui não! Aqui é documento! Nós temos o título definitivo disso aí! Nosso título está guardado! Título está lá! Título definitivo! Desiderio e Filipe de Oliveira! E essa dívida que eles criaram... Não existe em lugar nenhum! Os cartórios fizeram isso! Em 1932 teve um cartório aqui... Ele era português... Português puro mesmo, não tinha nem descendência brasileira. Na época, o pesquisador, ele pesquisou na época, o estrangeiro no Brasil naquela época não poderia assinar documento nenhum. Ele é estrangeiro. E ele fez, ele assinou o documento para os caras. Então, é incrível esse tipo de coisa. É uma... É matando um leão todo dia. Agora, até quando a gente não sabe onde vai, né? Mas eu jogo bola às vezes, tem um amigo meu tem um campo ali, ele me chama para jogar bola, eu não quero nem ir lá mais, né? Porque se você vai lá, os caras estão lá, né? Os bambambam lá. Aí chega um fazendeiro lá e ele fala para mim, e aí? E o quilombo doces, como é que está? Diz que vai sair terra doces aí, não sei o que. Bom, uma hora vai sair. Aí ele começa a pegar do meu pé, sabe? Dizer pra mim largar a mão disso. Porque é perigoso. Esqueça as conversas. É perigoso. Porque já gastaram mais de três milhões de reais com o advogado. E não vai ter jeito. O advogado tá... Tá preocupado que parece que não vai conseguir. Por que que a gente não pega esse dinheiro pra nós e deixa eles em paz? Entendeu? É o papo do cara. Ou seja, ele está te ameaçando, dizendo que está te dando um conselho, mas ele está te ameaçando.
R/1 - Cuidado que isso é perigoso. Você viu o que aconteceu lá na Bahia com a fulana lá. Precisa mais ameaça do que isso, né?
R/4 - Com a igarete?
R/1 - É, com aquela senhora lá. Então a vida da gente é... É que agora nós vivemos um século de ameaça. Exatamente. E o que mais entristece a gente é isso. Por que, poxa vida? Outro dia eu vi o negócio, acho que dia 5 agora foi o dia do negócio do meio ambiente. Aí eles ficam falando, ah, os quilombos indígenas que protegem a natureza, que protegem, é o dia de comemorar. Poxa, nós protege, os caras destroem e os caras mandam. E nós não, nada. Quem protege não tem nada. É estranho, não é? Isso chega a ser rebortante. Eu já falei em vários seminários que eu fui aí, você perde até o controle. Aí os caras falam, não, você tem direito de falar, desabafa mesmo. É muito humilhante isso. Uma coisa que... Como que o governo vai alegar que não tem dinheiro? Como? Você acha que 80 milhões, sei lá, cento e poucos milhões é dinheiro pro estado brasileiro? Isso eles devem gastar de papel higiênico por mês. É? Porque tá louco, gente. Que nem eu falei lá numa reunião que eu tive em Campo Grande, lá no Inca. Falei, gente, 40 milhões, 80 milhões, que vocês vão pagar os caras lá com Não é, tipo assim, dar o cheque na hora. Vocês vão parcelar. O governo titula essas coisas, né? Só o estado do Mato Grosso do Sul paga isso aí. É só o governo querer. O governo do estado podia falar, Lula, é o seguinte. Está lá no meu estado essa briga, eu não quero briga mais lá. Vamos resolver isso aí. Eu entro com tanto e você cobre o resto. Vamos resolver. Mas não.
R/3 - Demita esse pessoal, dá o que...
R/1 - Paga eles, tira eles, véi.
R/3 - Acerta os documentos, a ação, tudo lá. Porque isso aí fica uma bagunça. Ninguém tem documento. O usuário tem documento. O documento dele é forjado.
R/1 - Agora veio uma... Vocês devem estar sabendo. Ratificação de título. Da fronteira aqui. Eles estão desesperados. Os fazendeiros aí. Porque todos estão grilados. É título falsificado. Cara, por que não resolve gente?
R/3 - Essa faixa aqui?
R/1 - Uma faixa de 150 quilômetros de fronteira. E nós moramos daqui a 100 quilômetros do Paraguai. Daqui onde nós moramos. Então 150 vai rebrilhante. E mesmo assim não se resolve.
R/3 - É só mentira. Vai falar bem a verdade, é só mentira.
R/1 - Chega, fala, fala, fala, um monte de coisa. Não, não. Essa semana já resolve. Já tá, tá.
R/2 - Assim não acabou.
R/3 - Aí todo mundo fica atento. Aí chegou. Ah, não, porque eu me soquei lá e tal, sabe? Gente, eu nem dou mais moral pra isso. Porque não tem graça.
R/1 - E agora... Agora aqui pra acabar, de complicar ainda mais, é que nós aqui, nós fomos nascidos e criados em Dourados. Município de Dourados. Isso tem mais de cem anos. Agora vem e nós somos de Itaporã.
R/3 - Itaporã pegou.
R/1 - Itaporã tomou conta. Sem ninguém saber. Você vai numa consulta médica, você pede a comprovante de residência. Você mostra, mas você é de Itaporã. Você tem que procurar saúde em Itaporã. Nós ganhamos um trator do governo federal. Do político aí. Então tem que ter contrapartida da prefeitura, né? Aqui. Aí eu fui lá outro dia que tem que renovar documento. Porque eles fazem aquela documentação todo ano, né? Pra poder... Pra ver se tá em dia o trator, se tá trabalhando, se tá parado. Esse tipo de coisa, né? Se tá tudo certo. Então eles pedem a documentação e a gente leva lá, né? Tira toda a receita federal, um monte de coisa. E leva. Chegamos lá. o cara assinar um documento lá pra nós aí o secretário de agricultura falou, ó infelizmente eu não vou poder assinar a profecia Dourado não vai poder mexer mais com isso eu falei, como assim? não, porque vocês são de Itapurá agora então eu não posso assinar pra você eu falei, meu Deus do céu, o que que é isso?
R/2 - Taxa de iluminação pública O ano retrasado veio R$ 90,00 de taxa.
R/1 - Todo mês também, todo mês.
R/2 - E você reclama, você vai na defensoria, você vai no... Como chama o outro lá? Ministério Público, você reclama. Pode reclamar, à vontade.
R/1 - Veio uma vacina da Covid no início. Solicitou vacina que era específica para quilombola, indígenas e... Isso é um negócio que o governo inventou, né? Aí veio perguntando quanto nós era do quilombo. Aí só lê uma quantia de família, né? Que era do quilombo. Tá. Você tem que procurar o postinho da... De uma vila ali em Douradas. Vocês não conhecem. Aldo Zindaia que chama. Tem um posto de saúde lá. Tá. Chegamos lá. Não, mas vocês não podem. Vocês... A vacina de vocês foi pra Itapor, né? E aí? Aí tivemos que vacinar como qualquer outra pessoa normal, que não fosse quilombola.
(00:50:04) P/1 - Depois?
R/1 - É depois, aí foi vacinando normal. E vai fazer o quê? Apareceu no IBGE três quilombolas tapurã. Aí falaram pra nós que a vacina foi tudo pra tapurã. E ninguém resolveu nada. Ministério Público foi pra cima e... E não sei o que... Denunciamos lá pra Brasília, lá pro lado desse negócio da saúde... Que ninguém resolveu nada.
R/3 - Ter direitos humanos, tudo... Só aquela blá, blá, blá. Blá, blá, blá é bastante.
R/1 - Nossa!
R/3 - Mas você fala assim, agora vai. Vai ficar mais difícil.
R/1 - Então isso tudo pra gente é uma tipo... Parece que é um tipo de um... Uma ameaça assim disfarçada pra você desistir. Aí você tem que entender, você está vendo que você não é nada? Se nós quisermos, nós acabamos com vocês aí. Cai a ficha, né? Vocês não são nada. E poxa vida, ué... Outro dia eu vi aqui na... Na reportagem da polícia. Do... Televisão daqui do estado de Dourados, hein? Os índios, um cara matou um índio, uma caminhonete branca. Acho que o cara atropelou sem querer, né? O cara vinha vindo ali no anel viário e o índio de bicicleta. Ele bateu e matou o índio. Aí os índios fizeram o maior protesto, né? Tomaram conta, aí a polícia veio e tirou o cara da caminhonete pra eles não pegarem ele, né? E ali os índios ficaram revoltados, porque eles queriam pegar o corpo dali que estava no asfalto e levar pra aldeia, né? E a polícia não deixava eles pegarem. E aí começou Os caras atirando, tinha policial que joelhava no chão atirando nas índias, nas crianças. Ao vivo, os caras filmando. É assustador. Aí tinha um índio que ia na frente da Casa 12, né? Atira! Você tá matando um trabalhador, atira! Você é bandido, você não é policial, você é pistoleiro! E o cara tem dinheirinho e fala, atira! Todos sanguentados, já tudo, aquelas balas de borracha, né? Que que é isso, gente? Aí você vê um negócio daqueles, você fica preocupado. Uns índios que são organizados, que são, né? Eles são fortes, tem o... A FUNAI, tem tudo, tem ministro agora, né? Sofre desse jeito, imagina nós! Quem? Quem que vai vir nos defender?
00:52:46 R/2 - O jovem de hoje, daqui, tem muito mais medo do que nós. Do que o passado. Muito mais medo. Porque eles conhecem mais a realidade, né? Convivem mais com a sociedade. É faculdade. Em muitos movimentos, um são advogados, outro é médico, né? Eles têm muito mais medo. Eles falam pra gente. Não é brincadeira não, se eles quiserem eles fazem, porque a gente está no meio, convive e a gente sabe do que são capazes. Então eu falo, os jovens de hoje daqui têm mais medo do que os mais antigos, como se fossem pais, tios, que não tinham tanto medo, era mais pela ignorância mesmo também, um pouco. Meio bicho.
00:53:41 R/4 - Na sua avó e tal, fortalece esses jovens pra entrar nessa luta? Ou o contrário, eles querem que esqueçam? Como é que vocês veem isso?
00:53:56 R/3 - Eles querem ver o abandone. Isso aí é um perigo danado.
00:54:05 R/2 - Eles acham. Eles acham ameaçador, né?
00:54:10 R/3 - Mas eles têm medo de os pais sofrerem, um tio, um mais velho. É isso que eles têm medo. Só que não aconteceu, eu vou falar bem a verdade, não aconteceu nada com nós porque nós toda vida trabalhamos para esse povo aqui. Nós tivemos muita influência de trabalhos. A gente, toda a vida, fomos as pessoas que nós fomos criados trabalhando e a gente não brincava. Ia para o trabalho escuro e voltava escuro. A gente trabalhou fortemente mesmo. Então, as pessoas acabaram gostando da gente. Falaram, não, mas os negros são trabalhadores. Esse negro aí tá louco, rapaz. Trabalha demais. São as pessoas, gente humilde, são as pessoas que buscam, não tem dó de derramar o soro, né? Então, eu acho Só nós sofremos mais represária que alguma coisa por causa disso. Aí quando mexeram mesmo aí, eles afastaram de nós, né? Passava, nem olhava mais na gente. O cara parava e tal. Passava um tumbo. Hoje não. Se eu falar isso, eu admito. Hoje eles passam, cumprimentam, mas você sabe aquele cumprimento meio... Passa-se a besquinha, um tói. E antes não me parava, batia palco.
00:55:29 R/1 - Tanta história.
00:55:30 R/3 - Hoje já não. Então eu falo que nós não sofremos.
00:55:33 R/1 - Mais por causa disso. Trabalhamos muito esse povo aí. Mas o fator principal para cumprimentar o que ele está falando é terra. Se não é terra, eles não estavam nem aí. Agora essa terra aqui é aquela que está na Bíblia. Manauro e mel. Porque isso aqui há 20 anos, 30 anos atrás... Eles produziam soja aí. 60, 70 sacos de soja sem adubo. Esse povo enriqueceu de um tanto de fora as madeiras que venderam. Teve um fazendeiro aí que comprou três fazendas para o lado de jardim com madeira daqui. Para o senhor ter uma ideia, isso aqui pode ter terra igual. Mas melhor do que essa aqui não tem. Essas 3.748 hectares. É, é incrível. Então o grande problema está aí. Ninguém quer sair porque é... É uma terra especial. De boa localização. Tudo, tem tudo. Cidade em cima. Universidade aqui. Aeroporto.
00:56:46 R/2 - Então...
00:56:48 R/1 - Esse é o problema. Só que eu acho que o governo... Ele tem que olhar os dois lados, né? Por que não senta na mesa e não vamos conversar? Não é simples. Aqui tem um deputado aqui, ele chama Jatexira, ele é do estado aqui. É um bandido aí também. Talvez, não sei se vocês conhecem ou não. Peço até desculpas aí. Mas é um cara que... Ele só é um lado. Ele é um deputado eleito pelo quilombola, ele é eleito pelo índio, ele é eleito por todo mundo, né? Todo mundo votou nele. Talvez nós não, mas outros votaram, né? Que é da mesma luta. Mas ele não, ele só é um lado. Senta, chamamos os dois lados, vamos conversar. Por que está acontecendo isso? O que é bom para vocês e o que é bom para os fazendeiros? Seria simples de resolver. Não querem. Mas contra o pior é o melhor.
00:57:47 R/4 - E vocês, como dessa geração que ainda está ligada à luta, que ainda tem.
00:57:52 R/1 - Essa expectativa, essa experiência, O que vocês.
00:57:56 R/4 - Gostariam de transmitir para os filhos de vocês? Como é que vocês gostariam que os filhos de vocês vissem essas lutas? Vocês se preocupam também com eles? Vocês acham que eles estão em isso?
00:58:13 R/1 - Eu particularmente, não sei eles aí, mas eu particularmente falo para o meu filho o seguinte, estuda meu filho, estuda e lute, porque tudo na vida é luta. Não vai achar o que você vai achar. Faça o que não vai achar. Tudo é luta. E isso aqui tem que dar continuidade. Porque senão seria vão a luta do nosso avô. Dos nossos ancestrais, né? Seria... Sem valor nenhum se nós, geração mais velha, acabar e eles abandonarem. Então essa luta tem que continuar e eu passo pra eles. Custe o que custar. Mas vocês vão ter mais sabedoria. Que nem a Eva Patrícia. Hoje ela é advogada. Ela já está no meio, já está entendendo bem melhor as coisas. Ela pode saber jogar lá em cima, né? É fácil para ela. E é isso que eu passo para eles. Meus filhos é isso. Não pode parar.
00:59:11 R/3 - A formação é importante para o ser humano. Porque você não depende só daquilo. A luta nunca vai ser desistida. Quanto mais você tem sabedoria, mais você vai lutar. Mas você luta diferente. Não é aquela ignorância. Tem ignorância, você partiu para tudo ou nada, não é? E aí o outro... Ah, uma diferença, né? Vai lá, tal... Não tinha uma placante, não é da minha, é reunião para mim... Até que pecha o círculo, né? Agora... Essa... Ignorância é nada. Vocês não devem passar porque não dá frutura.
00:59:45 R/1 - E se formar.
00:59:47 R/3 - Seja qualquer tipo de formação. Se você não trabalha pra depender do teu pão, o que faça? Esse aí a gente passa muito o auxílio da gente. E é respeitar as pessoas, né? E andar correto. É isso aí.
01:00:04 R/1 - Anselmo.
01:00:05 R/4 - Anselmo? É o... O dono do górpida. Que passou a rasteira na viúva aí. Eles têm nome, né? Eu trago de Elias Miran, Erotilde e Doutor Vadu.
01:00:20 R/1 - Valdemir de Souza.
01:00:21 R/4 - Valdemir de Souza. Esses aí que fizeram a trama aí, né? Que passaram a mão no resto das terras aí. Valdemir de Souza, Elias Miran e Erotilde.
01:00:35 R/1 - São esses aí.
01:00:36 R/4 - Os Cump.
01:00:37 R/1 - Ah, sim.
01:00:38 R/4 - Não pode falar. Somos cumpre do que aconteceu aí, né? Que todo mundo ficou aí na... na encruziada, hein? São esses caras aí.
01:00:51 P/1 - Eu ia perguntar como era o nome da sua avó.
01:00:55 R/4 - Maria Cândida Batista.
01:00:59 P/1 - E dos seus pais?
01:01:01 R/1 - José Pereira de Souza é meu pai. E Elisa de Oliveira Souza, minha mãe. Meu pai também era de Minas, mineiro também. Só que era mineiro branco. E meu avô era mineiro preto.
01:01:13 R/3 - Quando beijo, quando carregando, não mistura de nada.
01:01:18 R/4 - E dona Maria, o que acha dessa oração? O que teria que transmitir para os jovens?
01:01:25 R/2 - Não desistir, né? Levar em frente a história, né? A memória jamais perder, né? Porque um povo sem memória é como se fosse uma pessoa que tivesse uma... Uma grave situação de um azar em mim. Viveu, fez aquele monte, né? Perdeu a memória. Perdeu tudo. Não sabe quem eu sou, nada, né? Então é complicado. Heros isso não pode, né?
01:02:00 R/3 - É um pedaço da história que nós recebemos da terceira geração já. A gente não tem 100% porque esses outros Outra metade ficou com as que já faleceram, né? É que nem eu estava falando para vocês que é essa bebenda, essa história. Ali na biblioteca da faculdade, tem os livros lá. Que já foi o pessoal mais velho que fez essa reportagem aqui.
01:02:27 R/1 - Tem vídeos, né? Tem vídeos. É, tem tudo.
01:02:30 R/3 - E... E é isso aí. Aí vocês... Vendo o que foi passando. De geração.
01:02:40 P/1 - A gente tá num lugar rodeado de milho, né?
01:02:43 R/3 - Sim, mesmo.
01:02:44 P/1 - E a gente tá conversando antes de ligar a câmera um pouco sobre o veneno. Queria que vocês contassem um pouco como que é aqui quando passam veneno. Como é que fica a vida de vocês?
01:02:59 R/1 - Aqui é o seguinte... É isso que eu falei. Aqui, até uns quatro anos atrás, esse... Esse cidadão comprou essa fazenda aqui, do lado aqui. Qual o nome dele? É... Erineu. É Tadalar. É uma empresa muito grande. Ela é de Ponta Porantes. Ele toca umas quarenta mil hectares esse homem. É uma empresa. Então, o rapaz, até o rapaz que trabalha com ele, conhece de nós. E ele passou... Aqui um produto que eu nem... Sei o que que é. E tava um vento muito forte. Ele passou com esses... Tratorzão grande, né? Que passa o veneno. E o vento tava de lá pra cá. Mome do céu! Isso aqui, ó... Esses pés de planta aí... Sapecou tudo. As... As... As serolas ali da minha irmã. Os pés de pocã, mexerica ali. Sapecou tudo. Manga. Aqui o campinho de futebol que nós fizemos aí. Vixe, isso aí ficou amarelinho. Como se estivesse matado mesmo. Aí demorou um bom tempo. Veio chuva, né? Chuva e foi limpando de novo. Mas é complicado. Às vezes o vizinho aqui passa. Quando o vento, parece que eles... Não sei se faz porque quer ou não. Mas quando o vento está meio sul, é aí que eles vêm passar. Essa hora, aquele ventinho gelado sul, eles estão passando. Meu Deus do céu! Ninguém aguenta o fedor. E aqui você pode fechar a janela, uma entranha dentro de casa. e esse mesmo vizinho que passa aqui um professor da Universidade Federal aí tem um sítio ali ele... o professor é meio... meio arrojado o professor o cara é novo, mas arrojado ele já estava cansado de pedir para ele não passar que estava prejudicando o sítiozinho dele a lavoura desse cara aqui ele tem uma lavoura lá também isso é muito grande quatro, cinco mil hectares de terra Aí, ele foi falar pro cara, não passa aí, rapaz! Você tá me prejudicando, para de passar isso aí! Deixa essa beirada sem passar! O cara não tá nem aí. Aí, um dia ele chegou no sítio dele lá, as plantas dele estavam todas com frutas, com essas coisas tudo... no jeito ali, o cara vem com aquele negócio pra passar. Ele correu, saiu e desesperou. Correu, entrou na frente do tratorzão, o cara ia passar em cima dele. Aí ele pulou num estrifo, que ele tem um estrifo, né? Da pessoa descer e subir. Ele subiu e foi lá na cabine daquilo. E o cara não parou. Trancou a porta do trator. Passando. Passou em toda aquela área lá e o professor lá em cima.
01:05:39 R/1 - Não podia entrar lá pra pegar o cara porque ele tava trancado, né? O cara fechou as barras daquilo e veio embora. Pegou o asfalto e veio o professor em cima. Vai na polícia, vai onde você quiser. Quando chega ali no trevinho ali, vocês não passaram por um trevinho ali? Então, ali... Eu não sei o que que aconteceu ali que o cara derrubou o professor.
01:06:00 R/3 - Ele fez uma coisa seca, né?
01:06:01 R/1 - Não, acho que ele foi ali, abriu a porta e empurrou, né? O professor. Caiu no assalto, quebrou a perna. Quebrou a perna do professor. aí um tempo agora uma pessoa da universidade aí que é amiga do professor também da mesma da mesma profissão né vieram aqui fazer uma reunião com nós e ela estava contando entrar na justiça pois o cara o fazendeiro ganhou fez eles pagar 12 mil reais ainda o decreto juiz daqui de Dourados 12 mil reais de indenização aí eles recorreram né Nós não vamos pagar. Vamos recorrer. Recorreu, aí nós não vimos mais ele para saber o que virou. Agora, você imagina situação dessa? Esse que é o grande problema.
01:06:54 P/1 - A poeira que você falou também.
01:06:57 R/1 - Ah sim, essa é a poeira da colheta, né? A poeira da colheta é terrível. Porque aqui é em cima, né? E é por aí tudo, não é só aqui não. Onde os outros nossos parentes moram aqui, tudo. A lavoura é dentro de casa dos caras. Então é veneno, é poeira, é tudo. As carretas aqui, Deus livre, sim. Quando é época de agosto, que agora vai chegar agosto, né? É a colheita forte do milho. E aí, geralmente não tem chuva. Porque ele vira um pó. Úmido, assim, e você tampa. Porque aquilo é uma carreta atrás da outra. E ninguém tem a coragem de moiar, pelo menos.
01:07:32 R/2 - Porque as... JBS... JBS? JBS?
01:07:39 R/1 - O que que tem em JBS? Não tem aviário pra... Ah não, é BRF, né?
01:07:44 R/2 - Hã?
01:07:45 R/1 - BRF. Que tira frango aqui embaixo do rapaz, né? O cara é amigo da gente também, o dono do aviário aí. É outro que reclama muito da estrada, de veneno. É muito complicado. Então... Essa parte aí é... É difícil. É uma luta, é outra luta. Aqui são quantas famílias? Nós temos aqui dezenove famílias que moram aqui no quilombo, né? Ixi, tem um monte aí. Tem... Da Célia, dois da Marli, né? São quatro. Tem o Águeno, tem o Nenê. Mais dois. Acho que nós temos aqui uns quinze jovens. Ou mais, né? Uns quinze a vinte jovens que moram aqui. Criança não. Não. Criança não tem. Tem adolescente só. E tem muitos na cidade mesmo. É.
01:08:46 R/3 - Que mudaram pra lá.
01:08:47 R/2 - Criança tem.
01:08:48 R/4 - Qual? Do neném?
01:08:50 R/1 - Ah, é. É verdade. É duas, né?
01:08:54 R/2 - Um menino lá.
01:08:55 R/4 - Não. Fernando, né?
01:08:56 R/1 - Não, mas Fernando mora em Durango. São quatro. É, quatro crianças aí de... De oito anos abaixo.
01:09:07 R/2 - Dezesseis, dezessete.
01:09:10 R/1 - Eu queria...
(01:09:14) P/1 - Esqueci... Ah, lembrei. Eu queria perguntar que tem alguma tradição daqui do Quilombo ou alguma história que tenha marcado vocês. Vocês queiram compartilhar. Daí eu vou pedir pra cada um contar uma.
01:09:34 R/1 - Eu acho que nós... Eu acho que nós vamos ter duas só. Eu vou contar uma aqui. Eu acho aqui o meu avô, Desidério Filipe de Oliveira. Ele é mineiro de Uberaba, como eu falei. E segundo meus pais, meus tios falavam, ele tinha tradição de São Benedito. E a adoração dele era São Benedito. Até inclusive eu vi uma matéria do jornal em Minas Gerais, lá. Eu não me lembro se era Uberaba ou não. Eu vi essa matéria. Eles andando na rua cantando a... A São Benedito. Em homenagem a São Benedito. Aí ainda comentei com... Foi com a minha esposa. Falei, deve ser da família do meu avô. Esse pessoal aí. E tudo negro, sabe? Negaiado. Ele deve ser da raça do meu avô. São Benedito. E outra coisa que a minha mãe falava que ela gostava muito de... Catira. Dançar catira. Que é o catelete que eles falam. Entendeu? Que era aquele do taburado lá, né? Que bate o pé e a mão. É coisa de mineiro mesmo.
01:10:40 R/4 - Viola?
01:10:41 R/1 - É. Aí o Waldemar pode falar outras coisas aí.
01:10:46 R/3 - Essa tradição aqui do São Benedito ele trouxe, né?
01:10:50 R/1 - É.
01:10:50 R/3 - Aí depois aqui desenvolveu outro do São Sebastião. Aí teve essa tradição que está até hoje ainda. Só que a nossa geração, a maioria abandonou, outros morreram. Mas ficou os meninos mais novos que tomam conta. E eles fazem isso aí, todo ano tem. Essa tradição do São Sebastião.
01:11:11 R/1 - O de janeiro, é?
01:11:13 R/4 - É.
01:11:13 R/3 - É folia de reis que eles fazem, né? Então, ali do outro lado tem uma fazenda ali, moravam os mineiros. Eles tinham a tradição de Santo Reis. Que é dia 6 de janeiro. Então, eles... A prima daqui ia pra lá, ajudava eles. Terminava a festa deles Aí vinha pra fazer a de São Sebastião Era dia seis E aqui era dia vinte Então, uma equipe ajudava a outra Aí vinha de Itaporã, Canhadão Montese Montese E o.
01:11:44 R/1 - Outro filhinho lá é... Lá onde tem o Cartório, né?
01:11:48 R/3 - Isso! Panambi Panambi Eles vinham tudo ajudar Era muito bonito, era uma tradição legal, sabe? Flórica, muito... Eu fiz parte muitos anos desse grupo.
01:12:01 R/1 - Aí de... Cantarreios, né?
01:12:04 R/3 - É, cantarreios. Eu trabalhava mais com a caixa, né? Eu era caixeiro. Tinha eu mais outro primo meu. Dos dois. Líderes das caixas. Hoje eu não mexo mais com isso.
01:12:17 R/1 - E as festas aqui, ó... Aqui nesse barracão aqui. Chegou a dar quase duas mil pessoas aí. Isso tem uns três anos atrás. Os meninos não estavam sorteando esses fogos. É eles que mexem com isso agora. Eles fazem essa festa aí. Todo ano eles fazem. Dá muita gente e é muito bonito. É uma cultura muito boa que tem.
01:12:42 P/1 - Vocês querem acrescentar algo?
01:12:46 R/1 - Isso aqui era o cachê.
01:12:49 R/4 - É, eu bati muita caixa nas folhinhas de rede, né? Nós saía 5 horas da manhã Uma hora dessas nós tava chegando na casa da janta, né? Pra parar a bandeira, pra jantar E no outro dia eu seguia a viagem de novo Geogírio, né? Geogírio Era muito bonito E ali as pessoas daqui da casa da festa Passavam a roupa, toalhas, tudo e mandavam pro esfolião lá na frente trocar e seguir a viagem Aí eles traziam a roupa suja pra lavar de novo E era.
01:13:18 R/3 - Assim Era tudo a pé, isso aí. Isso aí era uma mata, era trieirão mesmo, assim, que você... Enchia, porque... dos outros, né? E aí, não enchia.
01:13:31 R/2 - Bom, você não comeu, porque era preto.
01:13:33 R/3 - Bastante, né? Estava com medo.
01:13:36 R/1 - Está gravando, Guilherme? É... eu... Eu acho que perdeu um pouco assim a parte da cultura, porque vai entrando outras religiões, vai chegando outras religiões, as pessoas vão demandando aquela tradição, vai se engajando nas religiões, então vai enfraquecendo, mas graças a Deus que continua ainda. Então, esse legado ainda é forte aqui.
01:14:05 P/1 - A última pergunta que eu queria fazer, eu vou, na verdade são duas, uma pequena e uma grega. É, eu queria saber se esses desenhos aqui tem algum significado.
01:14:17 R/4 - É da África, né?
01:14:20 P/1 - Quem fez?
01:14:22 R/4 - Foi um rapaz lá de Campo Grande, né? É o tal de Pablo, né? É ele que fez. Ele veio de lá e fez isso aí.
01:14:29 R/1 - É o símbolo, né? Da, da, da... Do Zego mesmo, né? É, descendência africana.
01:14:38 R/3 - Eles trouxeram e fizeram isso aí.
01:14:40 R/1 - É. Aqui, na verdade, esse clube foi feito para reuniões. Entendeu? É reuniões. Ele é um centro comunitário, né? Mas aí faz festa, faz aniversário, né?
01:14:55 R/3 - Até casamento.
01:14:56 R/1 - Até casamento faz. Aniversário de 15 anos de alguma menina aí que mora aqui. Quer fazer, né? Faz aí. E tem um campinho de futebol que sai um quebra-canela de vez em quando, hein?
01:15:09 P/1 - Dona Maria, e qual que é o cheiro da sua infância?
01:15:15 R/2 - O cheiro? De rosas. Minha mãe gostava muito de flor. Muito. Ela tinha um jardim dela. Onde ela ia, ela... trocávamos. E eu gosto da essência, do cheiro da rosa. Eu sinto o cheiro de rosa dentro de casa. Quando às vezes eu tô no quintal, eu paro assim, nossa, que cheiro de rosa. Nem rosa tem, mas eu sinto. Eu gosto do cheiro de rosa. E do mato, assim, quando chove, Eu não sei se isso é meu ou o que é, mas eu sinto um cheiro, depois que a chuva passa, aquele cheiro gostoso, parece que de um ar diferente. Muito bom, eu sinto esse cheiro. Agora, o cheiro que...
(01:16:16) P/1 - Como foi para vocês contar um pouquinho da história do Quilombo hoje, um pouco da história do Quilombo antepassadas, um pouco da história de vocês também. Queria que cada um falasse um pouquinho como foi.
R/1 - Não foi difícil não, porque tinha bastante ainda em 2005, 2006, 2007, até 2012 e tinha bastante dos mais antigos ainda, que bem mais velho que a gente. Então, eles... Deu as coordenadas melhor, né? Que eles tinham mais lembrança do que viveu, né? O que aconteceu aqui. Inclusive, a gente não contou pra vocês, mas a gente vai contar agora. Aqui, uns 200 metros pra dentro dessa roça aí, era... Na época era... Em 62, 64.
R/3 - Tá indo aqui um pouquinho, pai.
R/1 - Era... Tudo mato aí, tinha muita erva mate, né? Aí. E... Minha mãe morava aí desse lado e tinha mudado pra cá. Desse lado de cá. E saía muita festa. Tinha uns paraguaios, né? Que mexia com terra pra esses caras aí. E eram uns, tipo assim, amigos, né? Entre aspas da família. E saía uma festona aí. Mataram um boi. E uns primos nossos vieram no baile. Fizeram aquele bailão, né? E vieram, meu tio foi também, morava aqui também. Foi meu pai, foi lá. Eu era pequeno. Não me lembro dele, mas eu tô contando a história do que eles falavam, né? E aí veio uns paraguaios de Proto Tereirito, que é pra lá de Dourados ali. Eles tinham uma vila lá deles. Que tinha ligação com os paraguaios também que trabalhavam já aqui nessa fazenda no fundo ali. Mexia com derrubada aí de mata. E aí fizeram esse bailão aí, quando foi por volta de... Uma hora da manhã, duas horas, meu pai... Tava ficando muito forte a coisa, né? Bebendo muito. E meu pai falou, chamou os sobrinhos dele, né? Vambora! Isso aqui não vai dar certo, não. Os caras tão muito bêbados aí, tudo armado. E os meninos não tinham medo, moleque, né? Rapaz novo aí de 18 anos, 20 anos, não tinham muito medo não, não. Amanhecer não vale. Quando meu pai chega... Aquele tiroteio. Meu pai não tinha nem deitado ele quando andava. E aquele tiroteio, tiroteio, grito, grito e tiro. Aí ele desconfiou. Falou, será que é com os meninos? Ele levanta e vai. Quando ele chega aqui, cessou o tiroteio. E ele foi lá. Eu tinha matado os dois sobrinhos dele. Um é pai daquele menino que vinha aqui, o Noé. E por isso que era bom ele ter vindo que ele ia contar bem para o senhor essa história. O pai dele foi múrder aqui, ó.
01:19:11 P/1 - O pai e o tio.
01:19:12 R/1 - O pai e o tio, os dois irmãos. Os paraguaios mataram ele. Foi feio, uma coisa feia, feia que houve uma coisa assustadora. E aí meu irmão mais velho, ele serviu o exército. Ele, que na época era o exército mesmo, né? O exército militar. Vieram de Ponta Porã Prender um monte de Paraguai que estava escondido aí no brejo Tinha Paraguai baleado também, esfaqueado Meu tio furou muito Paraguai também aí Na faca, porque ele não tinha arma, ele só tinha faca Para defender o sobrinho, né? E... E aí no outro dia veio o pessoal da polícia, o exército aí Prenderam esses Paraguai e levaram Para Ponta Porã Pra ser preso lá, né? E aí ficou mais inframada a situação aqui ainda. Porque uns diziam que foi a mando dos fazendeiros. Que os paraguaios vieram pra fazer uma armadilha, né? Só que nunca foi comprovado isso, né? Mas isso roeu muitos anos. E um desses meus primos, ele matou um paraguaio. Ele tava armado. Com revólver. O paraguaio deu uma facada nele. Torou a barrigada dele inteira. Mas ele não morria daquela facada. Ele conseguiu sacar o revólver e... E atirou. Matou um Paraguai. E aí o outro Paraguai matou ele. Atirou no pescoço dele. Matou. E aí foi difícil isso aí. Uma coisa terrível. Aí polícia... Polícia mandou matar o resto dos Paraguai. Naquela época o Brasil não gostava de Paraguai, mãe. Deu óleo, mata tudo isso aí. Esse Paraguai acharam escondido debaixo da cama, né? Mas aí ninguém quis saber mais também, né? Foi anos e anos. Terrível! A gente não podia ver Paraguai, Paraguai não podia ver isso também. Ficou muito tenso a coisa aqui. Então é isso aí. É a história que a gente pode contar pra vocês, né? Que a gente lembra que os pais da gente falavam, né? Contavam.
01:21:30 R/2 - Acho que de Rio de Janeiro e eu. Perdeu pro tiroteio desse povo. Eu era criança, acho que eu tinha 12 anos. Na época. Uns 12, né? Menos 10, né? 12, eu acho. Você, né? Você tava com o pai lá na cesta? Você devia ter uns 12 anos. Ai, perna e longa. É... Gente, foi tanto tiro que a gente acordou e não tinha coragem nem de mudar os passos, sabe? Porque dormindo você acordou com aquele tiro. Era tiro, tiro de todo tipo. Parece que até tinha mais gente pelo tanto de tiro que aconteceu e pelo que a polícia ofendeu, né? A polícia do exército no outro dia. Nada estranho, parece que tinha muito mais gente do que aparentava no outro dia. Meu Deus! Foi horroroso, feio pra se ver. Porque você já vivia num mundo de medo, que você tinha medo de tudo aqui, né? Imagina! Só tinha violência, violência. O senhor encontrava com uma pessoa... Uma pessoa estranha, assim. O senhor já ficava olhando pra ele, assim. Tava armado, o que que tava. Tava com a cavalo, podia... Creio que ele tava com um negócio desse tamanho lá dentro. Era uma espingarda de assim, outra na cabeça do arreio. Então era assustador, né? A gente viveu num... Maria Bonita e Lampião, né? Mais ou menos assim. Aí, nesse dia, eu tenho um trauma de barulho de tiro até hoje. Não gosto. Parece que vem aquela lembrança, né, quando você ouve muito. Parece que você tá no meio daquilo novamente, tá vivendo aquilo de novo. Era feio pra se ver. E festa, festa que tinha por aqui, a minha mãe é que falava, eles vão fazer a festa deles e hoje eu nem durmo. Porque ela sabia que ia alguns sobrinhos, alguns, né? pras festas, e chegava lá sempre alguém e plicava com algum deles. Pra não... Quem que te convidou? Ou... Você veio aqui por quê? Quem que te chamou? Ou você não vai dançar aqui? Ou você não sei o quê? É... É umas histórias assim, que você dá risada até, né? Eles foram numa festa aqui na Picadinha, né? Aí chegaram lá... Diz que o dono da festa, parece que... O convidado, sei lá. Era um delegado, né? Um alemão. Aí... Perguntou pro meu primo. É um primo meu. Quem que convidou vocês? Ah, foi o fulano. Então vamos chegar. Chegar. É, mas...
R/2 - Vocês trouxeram... Mulheres pra dançar com vocês? Não. Imagina. Não, então... O que vocês estão fazendo aqui? Pode ir embora, senão vão avançar aquelas meninas daqui. Aí disse que o meu primo amarrou o cavalo no pé da barraca, né? Já pra fazer caçar confusão também. E na hora dele sair, ele atropelou o cavalo e o cavalo arrancou a barraca. do homem todinho. Aí eles saíram, tipo aquele cangaço, né? Vão pegar uma maia bonita com o pessoal. E assim era a vida aqui. Era assustador. Por isso eu falo. Tem trauma. Acho que todo mundo aqui dessa idade aqui tem um pouquinho de trauma, de medo. Só de lembrar do passado, né? Horrível. Muito. Pra você ir pra escola já era... um terror. Pra você voltar, pior, porque você voltava assim, tava começando a ficar assim, escurinho. Aí você vinha da escola, imagina, dentro de uma mata, cinco quilômetros. Sem a pé. Ali você sabia que tinha onça, tinha lobisomem, tinha, né? Tinha de tudo. Então era horrível. Mas, vivendo. Toma aí, né? Tivemos sarampo, cebra amarela, mas sobrevivemos.
(01:26:34) P/1 - Queria agradecer vocês pelo tempo de vocês, pela confiança na gente para contar a história de vocês. Eu vou depois precisar que vocês assinem um termo de uso de imagem para aparecer no Museu da Pessoa. Mas queria contar um pouco do... A Dona Maria chegou depois. A gente é do Museu da Pessoa. O Paulo é um parceiro nosso, que é da Universidade de São Paulo. E a gente tem 20 mil histórias no nosso acervo, histórias de vida. E conversando, a gente entendeu que a história de vocês é uma história coletiva. E deveria ser contada de uma forma coletiva. Por isso que a gente veio aqui e ouviu todo mundo junto. E essa história vai estar no Museu da Pessoa a partir de agora. Vai passar por um processo de edição, por um processo de transcrição. Mas em breve eu trago o resultado. Eu envio o resultado pra vocês.
R/1 - Ok.
P/1 - E aí vai ficar bem legal. Eu agradeço muito a sua confiança.
R/1 - Não, nós agradecemos a gente.
R/4 - Você participou da reunião que a gente fez?
R/1 - Sim, participei lá.
R/4 - A Eva e os parceiros, porque vocês mesmos decidiram que seria coletivo.
R/1 - Sim, sim.
R/4 - Uma história única, que todos vão contar a mesma história.
[Fim da Roda de Histórias]
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