Projeto: VLI – Estação de Memória: Porto & Pesca
Entrevista de José Luiz Mendes Junior
Entrevistado por Luiza Gallo e Ane Alves
Santos, 03/09/2025
Entrevista nº: VLI_HV006
Realização Museu da Pessoa
Transcrito por Arielle Oliveira Paro
Revisada por Ane Alves
P/1 - Queria te agradecer por estar aqui com a gente e queria que você começasse se apresentando, dizendo seu nome completo, a data e o local de nascimento.
R - Então, meu nome é José Luiz Mendes Júnior, nasci dia 18 de dezembro de 1974, em Santos, São Paulo.
P/1 - E te contaram como foi o dia de seu nascimento?
R - Minha mãe contou que eu dei bastante trabalho, nasci às duas da manhã.
P/1 - Às duas?
R - Às duas da manhã.
P/1 - Por que você deu trabalho?
R - É, porque ela falou que eu era, assim, muito chorão e dei então muito trabalho. Quando pequeno também dei muito trabalho. Fui muito arteiro.
P/1 - Desde pequeno?
R - Desde pequeno eu sempre dei trabalho. Ela sempre falou que eu fui o que deu mais trabalho dos irmãos. Dei mais trabalho que todos.
P/1 - E qual que é a história do seu nome?
R - Então, meu nome é do meu pai. Vem do meu pai, vem dos meus avós. Então eu puxei, eu herdei, na verdade, da família, meu nome.
P/1 - Mas o seu avô também tinha o seu nome?
R - Também. Não. O meu bisavô.
P/1 - Uau!
R - Já vem de família mesmo. Já vem de família.
P/1 - E quem que era o seu bisavô, você sabe?
R - Não. Ele era português, veio de Portugal mesmo, construiu um supermercado que chamava Joia, onde é o Joia, lá no Guarujá. Todos aqueles mercados que eram Jóias, ele tinha comércio lá. Então, eles foram comerciantes do Guarujá muito fortes. E quando tinha cassino no Guarujá, eles que tinham os táxis. Toda a frota de táxis que fornecia pro Casa Grande lá, que era o hotel, era deles.
P/1 - E seu avô?
R - Meu avô, pra mim, meu avô foi demais, foi uma pessoa assim sem palavras, foi muito bom. Como avô, ele foi espetacular. Ele comprou uma casa...
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Entrevista de José Luiz Mendes Junior
Entrevistado por Luiza Gallo e Ane Alves
Santos, 03/09/2025
Entrevista nº: VLI_HV006
Realização Museu da Pessoa
Transcrito por Arielle Oliveira Paro
Revisada por Ane Alves
P/1 - Queria te agradecer por estar aqui com a gente e queria que você começasse se apresentando, dizendo seu nome completo, a data e o local de nascimento.
R - Então, meu nome é José Luiz Mendes Júnior, nasci dia 18 de dezembro de 1974, em Santos, São Paulo.
P/1 - E te contaram como foi o dia de seu nascimento?
R - Minha mãe contou que eu dei bastante trabalho, nasci às duas da manhã.
P/1 - Às duas?
R - Às duas da manhã.
P/1 - Por que você deu trabalho?
R - É, porque ela falou que eu era, assim, muito chorão e dei então muito trabalho. Quando pequeno também dei muito trabalho. Fui muito arteiro.
P/1 - Desde pequeno?
R - Desde pequeno eu sempre dei trabalho. Ela sempre falou que eu fui o que deu mais trabalho dos irmãos. Dei mais trabalho que todos.
P/1 - E qual que é a história do seu nome?
R - Então, meu nome é do meu pai. Vem do meu pai, vem dos meus avós. Então eu puxei, eu herdei, na verdade, da família, meu nome.
P/1 - Mas o seu avô também tinha o seu nome?
R - Também. Não. O meu bisavô.
P/1 - Uau!
R - Já vem de família mesmo. Já vem de família.
P/1 - E quem que era o seu bisavô, você sabe?
R - Não. Ele era português, veio de Portugal mesmo, construiu um supermercado que chamava Joia, onde é o Joia, lá no Guarujá. Todos aqueles mercados que eram Jóias, ele tinha comércio lá. Então, eles foram comerciantes do Guarujá muito fortes. E quando tinha cassino no Guarujá, eles que tinham os táxis. Toda a frota de táxis que fornecia pro Casa Grande lá, que era o hotel, era deles.
P/1 - E seu avô?
R - Meu avô, pra mim, meu avô foi demais, foi uma pessoa assim sem palavras, foi muito bom. Como avô, ele foi espetacular. Ele comprou uma casa no litoral norte, onde a gente começou com a pesca, e eu tinha acho que 5 anos de idade, mais ou menos, 4 anos de idade. E eu lembro até hoje, que ele montou uma casa em Boracéia, e lá dava muito peixe, na época. Aí ele comprou o barco, tinha a Aeronáutica aqui no Canal 7, ele comprou um motor. Ele que colocou a gente na pesca. Aí, entrou meu pai também na pesca, entrou meus irmãos na pesca, entrou todo mundo na pesca, devido ao meu avô, por parte de pai, que são os portugueses.
P/1 - Você lembra desses primeiros momentos com ele indo pescar?
R - Com o meu pai?
P/1 - Com seu avô.
R - Não, meu avô não foi pescar. Meu avô já tinha uma certa idade. Meu avô bancou tudo. Meu avô era o patrocinador. Ele adorava a gente pescar, ele adorava ver aquilo. Então, era um prazer levar a gente pra pescar. Ele tinha prazer em pegar o carro dele e levar a gente lá pro Cantão. Chama o Cantão de Bora Bora, Canto da Boracéia. É um cantão maravilhoso, magnífico, super mansinho. E aí, o barco entrava por lá, a gente pescava e voltava com o peixe. Isso eu já tinha o quê? 9 anos, 10 anos de idade. Meus irmãos 12 e outro 14. Então, a gente começou a pescar todo mundo muito cedo, desde pequenininho a gente começou a pescar. E da pesca a gente fez nossa subsistência.
P/1 - E a sua avó, você chegou a conhecê-la?
R - Minha avó era uma excelente cozinheira, aquelas cozinheiras de primeira, que sempre se dedicou em casa. Sempre se dedicou, até porque ele dava o respaldo pra isso, então ela cozinhava muito bem pra ele e pra nós também. A gente comia muito bem, então foi muito bom minha avó, assim, minha avó foi uma pessoa espetacular que marcou minha vida também.
P/1 - Qual que é a comida da sua infância, dela?
R - Como?
P/1 - A comida da sua infância, que ela fazia?
R - Ah, ela fazia uma carne moída com bastante palmito, mas palmito do mato mesmo, palmito que o índio entregava. Isso eu tô falando de 40 anos atrás, 35 anos atrás, 40 anos atrás. Os caras traziam fardos, os índios traziam fardos de palmito. E a gente fazia, ela punha ervilha, ela punha carne moída, ela colocava de tudo, e a gente comia aquela comida com o maior prazer, porque ela fazia com muito capricho. E várias outras também, assados, também, patinha, ela era craque em tudo, tudo ela sabia fazer.
P/1 - E como que era essa casa?
R - A casa, ela tinha três cômodos, na verdade, um banheiro, uma suíte e a sala de estar, e uma sala, lá na Boracéia. A gente foi um dos primeiros moradores da Boracéia, então a gente foi pioneiro naquela área do litoral norte ali. Todo mundo conhece a gente muito lá hoje. A gente montou uma pousada chamada Pousada dos Pescadores, que era o sonho do meu pai. Quando o meu avô e a minha avó morreram, o meu pai herdou a casa. Aí, meu pai pegou a casa e transformou numa pousada. E essa pousada foi a vida dele durante anos ali. E a gente pescando o tempo inteiro e ele tocando a pousada. E ele brincando com a gente, porque ele tinha parado de pescar. Ele falava assim: hoje meus robalos, meus peixes, já entram pro quarto direto. Eu já ganho dinheiro assim. E vocês têm que ir lá buscar. Eu já não preciso buscar, eles já estão vindo até mim. Então meu pai brincava. Então foi muito bacana assim, minha infância. Foi muito bacana mesmo.
P/1 - Na natureza, contado direto?
R - Na natureza sempre 100%. Atrás da casa já tinha um galinheiro, então a gente já pegava os ovos, tudo era bem rústico assim, sabe? Bem bacana mesmo, eu fui criado muito na natureza.
P/1 - E você tem irmãos?
R - Tenho, mais três.
P/1 - Mais três?
R - Três homens.
P/1 - E todo mundo junto?
R - Todos pescadores até hoje. Todos os três pescam demais.
P/1 - E você é o mais novo?
R - Não, sou o terceiro.
P/1 - E me conta, será que você consegue lembrar quando você começa a pescar, mesmo que pequeno, com seu pai, como que era essa ida pro mar? Se era de noite, de dia, qual era a sensação que você tinha?
R - Então, assim, minha infância inteira eu fui criado na ponta da praia. Então, fiquei com 5 anos, 7 anos, meus irmãos iam pescar na balsa, debaixo da balsa, a gente pescava aqui no canal 7, pescava no canal 6. Então, assim, minha infância foi acompanhar meus irmãos. Então, automaticamente, que eu tinha 5 anos, o outro já tinha 9. Então, eu fui acompanhando essa história da pesca, acompanhando eles, acompanhando, acompanhando, acompanhando e nunca mais larguei. Eu fui crescendo mesmo na pesca, e a gente foi se profissionalizando cada vez mais. Tanto é que meu avô, chegou uma hora que meu avô bancou tudo, e falou: daqui em diante vocês vão ser pescadores mesmo. Vocês vão ter barco, vocês vão ter motor, vocês vão ter rede, vocês vão ter tudo. E na época era muito farto o peixe. Então, a gente ganhava dinheiro pra isso. Eu com 11, 12 anos já era praticamente um profissional da pesca. Eu já pilotava, já mergulhava, já fazia caça submarina, eu já pescava de tudo que era jeito. E eu matava só peixão, matava vários robalões de 18 quilos, 20 quilos. Eu tenho umas fotos depois pra mostrar.
P/1 - Sim.
R - Depois eu mostro pra vocês. E assim, eu nunca mais larguei porque eu consegui me bancar financeiramente, assim, bem. Eu conseguia comprar as roupas de melhor grife, eu conseguia ir no shopping com dinheiro, eu conseguia pegar minha namorada e levar onde eu quisesse. Nós compramos um carro com 15 anos de idade, já tinha carro. Mesmo não tendo carta, eu já pilotava o barco, já pilotava tudo, já pilotava barco, eu já pilotava tudo. E eu já ganhava muito dinheiro pescando. Então, eu fui me sustentando assim. E isso não parou até hoje. Até o momento que a gente, na frente, lá quando eu tinha 29 anos, nós rompemos as sociedades entre irmãos. Porque até então a gente pescava todo mundo junto, e meu pai administrando. Sempre. E meu pai administrando tudo. Do momento que meu pai deixou de administrar, ele falou: cada um agora por si. Aí, nós vendemos carros, vendemos umas coisas, e cada um comprou seu carro, e aí cada um começou a pescar por si.
P/1 - Vamos chegar, vamos chegar, vamos chegar. 29 anos, né? E a família da sua mãe? Você conheceu os seus avós?
R - Lógico, conheci, conheci.
P/1 - Como que eles são? Ou como que eles eram?
R - Não, então, eles sempre foram meio afastados da gente. Eu fui muito mais ligado à família do meu pai. Mas meus avós, por parte de mãe, sempre foram um amor de pessoa também com a gente. Sempre trataram a gente super bem. Mas como a gente tinha uma ligação com a natureza, e meu avô também tinha uma ligação com a natureza, a gente se apegou muito mais a esse lado da natureza. Por quê? Porque além de a gente amar aquilo que a gente estava fazendo, a gente tinha uma ligação assim... Meu, é uma ligação que não dá pra te explicar. É uma ligação que... Que é por Deus, assim, a gente fala foi Deus que deu esse dom, que é um dom. A gente tem. A gente tem um dom. E esse dom foi explorado ao máximo, assim, por mim, pelos meus irmãos. Todos eles são muito bem, bem de vida. Tão bem, assim, tão bem. Está todo mundo sossegado.
P/1 - Então vocês convivem mais com a sua família paterna?
R - Paterna.
P/1 - E sua mãe, quem que ela é?
R - Minha mãe foi aquela pessoa que sempre me incentivou. Ela amava. Tenho fotos até dela, quando chegava no barco, ela falava: meu Deus, quanto peixe! Ela ficava impressionada com os peixes. Ela sempre motivou meu pai a montar a pousada. Ela foi sempre aquela pessoa positiva e fundamental ali, como torre, assim, de uma família. Ela que sustentava, praticamente, a família de pé. Porque brigas entre irmãos sempre vão ter. Briga entre meu pai também, eu sou uma personalidade muito forte. E aí, eu brigava muito com meu pai, muitas vezes, porque eu achava errado algumas coisas que ele fazia. Então, porque ele beneficiava meu outro irmão, muito. E eu não achava certo, então a gente discutia muito sobre isso. Mas assim, quem segurava a onda era minha mãe. Então, minha mãe era o pilar. Minha mãe foi o pilar durante anos, assim. E até hoje é. Ela tá viva, só o meu pai que faleceu.
P/1 - E você se lembra desses primeiros momentos indo pescar com os seus irmãos? O que vocês gostavam de fazer? Qual era a atividade que você mais curtia?
R - Lembro como se fosse hoje. Lembro como se fosse hoje. A gente montou uma rede chamada Boeira, uma rede de Caceio. Chamava Caceio. É uma rede que ela pega muita tainha e sororoca. Ela trabalha na superfície. É muito discutido até hoje sobre essa rede. Porque é uma rede muito utilizada sobre caiçaras. Os caiçaras utilizam muito para capturar tainha, sororoca, anchovas,e vários outros peixes. Guaivira, várias outras espécies de peixe. É uma rede muito utilizada em todo o litoral, em todo o país, na verdade. Então a gente comprou a primeira boeira nossa. Quando a gente comprou a primeira rede nossa, que era grande a rede, a gente começou a pegar tanto peixe que a gente não tinha o que fazer. Então, o meu pai fazia, muitas vezes, a gente pescar um dia, parar o outro, pra fazer filé. Então, a gente era obrigado a fazer, filetar o peixe, colocar tudo por quilo, pra ele vender na Cosipa. A casa nossa tinha seis freezers, enchia até a boca de filé. Então, meu pai ganhava muito dinheiro. Ele ganhava, mas ele repassava pra gente, assim, bem menos. Ele dividia, ele tinha um caderno, tipo contábil, que ele mostrava ali quanto que ele ganhava o total e depois dividia entre os irmãos. A parte dele era 50% e os outros 50% era dividido entre os três. Um não trabalhava, não trabalhava na Cosipa. Era pescador, o Alexandre, o mais velho. Mas desistiu um pouco da pesca pra ficar mais na área da Cosipa mesmo.
P/1 - E o que você mais gostava de fazer nesse momento?
R - Eu era o cara, eu tinha um dom maior de ficar dentro d'água, pra ficar na rede, na pesca. Enquanto os outros ficavam mais no filetar, limpar o peixe, eu era o cara que tinha mais o dom de pilotar, eu tinha um dom a mais de pilotar carro, pilotar motor. Ser mais safo no mar. Então, meu pai me deixava mais responsável pelo barco. E meu irmão Ricardo, que é mais velho que eu, ficava mais responsável pela limpeza do peixe.
P/1 - Cada um tinha sua função.
R - Cada um na sua função. Meu pai que escalava. E ele mandava em tudo.
P/1 - E do que vocês gostavam de brincar?
R - Brincava futebol, brincava lê-lê-gol, ia muito nos clubes que tinha aqui, o Saldanha, Vasco, Internacional. Brinquei muito nessa ponta da praia aqui, muito, muito, muito, muito. Quando não tava brincando, tava pescando. Quando o mar dava condição, meu pai fazia a gente ir pescar. Então, assim, eu com 13, 14 anos, eu ganhei tanto dinheiro pegando polvo, polvo. Polvo nessa costa aqui, do Farol da Moela, no Guarujá. Dava pra comprar um carro em dois meses. Dois meses o que eu ganhei. Matei 2.500 quilos de polvo. Em dois meses. Só de polvo. Tinha um banco nacional na Trabulsi, o nacional do Ayrton Senna, que fazia propaganda e tudo. Meu pai depositava tanto dinheiro no banco e eu ia acompanhando o quanto que ele tinha, e tal. Eu sei que no final dava até pra comprar um carro zero. Em dois meses de trabalho. Dois meses e meio de trabalho meu. Meu outro irmão não tava pescando na época, também.
P/1 - Quer dar uma pausa?
P/2 - Não, eu queria fazer uma pergunta: é que eu fiquei meio perdida, porque vocês começaram a pescar lá em Boracéia, e está contando coisas aqui de Santos, né?
R - É, nós migramos, nós tínhamos casa aqui, tínhamos casa aqui.
P/2 - Ah, e quando foi essa migração?
R - Ah, logo em seguida. O barco, na verdade, quando ele veio de Boracéia pra cá, a gente trouxe logo em seguida. Como Boracéia não dava condição, porque eu tinha que estudar, eu era obrigado a trazer o barco. Quando a gente tinha férias, que eu contava, não ficava nem de recuperação, porque eu estudava tanto pra não ficar de recuperação, pra não matar aquele meu tempo em Santos, pra mim poder correr pra Boracéia rápido pra me ganhar dinheiro mais, porque lá dava muito mais peixe que aqui.
P/2 - Mas vocês migraram pra cá então pra vocês estudarem?
R - Estudar. A gente começou a trazer o barco pra cá, mas a pesca começou lá. A gente trouxe a pesca pra cá, na verdade, porque eu tinha estudo. Eu tinha que estudar. E automaticamente conciliava o estudo com a pesca. Entendeu? Então, eu tinha que fazer os dois. Eu tinha tanto que pescar num dia, quanto estudar no mesmo dia. Então, eu fazia os dois pra poder não parar de ganhar dinheiro.
P/1 - Mas a sua casa mesmo era lá?
R - Não, a minha casa era aqui, na ponta da praia.
P/1 - Ah, tá. Ali era uma casa de veraneio.
R - Lá era uma casa de veraneio.
P/1 - Tá. Certo.
R - Que depois se tornou uma casa definitiva da pesca.
P/1 - O que que é isso?
R - O que que aconteceu? Aos 18 anos, quando eu terminei o segundo grau, o que que nós fizemos? Nós juntamos um grupo de pescadores e mergulhadores, que eram o Rodrigo e o Alejandro de Bertioga, que eram dois mergulhadores muito bons. A gente montou uma equipe de pesca muito boa, que a gente pegava muito peixe. Então, só de mergulho, só de arpão, fora as redes.
P/1 - Mergulho.
R - Mergulho, caça submarina. Então, assim, a gente começou a se dedicar muito ao mergulho. Por que o mergulho? Porque o mergulho vai na parte nobre do peixe. Tu escolhe o peixe que tu quer pegar. Tu vê vários peixes lá. Peixe que não tem interesse financeiro. Paru, Sororoca, Tainha. Isso aí não interessa pra mim. É peixe de 10 mangos, 12 mangos, isso não interessa. Interessa pra mim peixe que custa R$50,00 o quilo na banca. O cara me paga R$50,00 o quilo de robalo. Então, eu queria robalo. A gente queria robalo. Então, o que a gente fez? A gente começou a se dedicar aos robalos. Então, a gente montou uma equipe, essa casa ficou base, nós mesmos cozinhávamos, nós limpávamos a casa, nós mesmos se organizava. A gente começou a fazer tudo, sem ter avó, sem ter pai, sem ter mãe, sem ter ninguém do lado. Era só nós e nós mesmos.
P/1 - Foram morar juntos?
R - Fomos morar juntos, quatro homens, só visando dinheiro e pesca.
P/1 - Quanto tempo?
R - Ah, durou acho que uns oito, dez anos. Oito, dez anos. Só pescando, só pescando. Ilhabela, Alcatraz, Montão de Trigo, as Ilhas, a Ilha do Gato, tudo que tu pode imaginar de São Sebastião, a gente varreu no mergulho. Tudo, tudo, tudo, tudo. A gente pegou muito peixe naquela área.
P/1 - Você conhece tudo?
R - Tudo na palma da mão e o fundo do mar também. Cada fundo, porque o robalo ele dá especificamente em cada lugar. Então, a gente vai decorando, a mente vai decorando onde eles estão. Então, a gente ficou craque.
P/1 - E como que são essas diferenças de pesca, de rede, por caça submarina, como você foi se especializando? Tipo, seu pai te ensinava, ou você tinha aula, você ficava observando? Como você foi aprendendo?
R - Então, meu pai tinha um amigo que mergulhava muito, e esse amigo do meu pai chamado Boto, Osmar, ele ensinou a gente a mergulhar. Meu pai aprendia a mergulhar. Meu pai dizia que sabia mergulhar, mas ele não sabia mergulhar. Mas o bom era o amigo dele. Mas o amigo dele ensinou pra gente. Como a gente era pequeno e tinha um dom muito forte, muito grande, muito rápido, a gente aprendeu e absorveu aquilo rápido. E logo de cara, meu primeiro robalo já tinha 19 quilos. Primeiro tiro que eu dei num robalo, eu já peguei um robalo de 19 quilos. Os caras já me colocaram como recordista. Então, eu já comecei a brincar, que eu dava sorte. E eu comecei a pegar muito robalo. E esses robalos que foi coisando, a gente foi se dedicando cada vez mais ao mergulho. Por quê? Porque financeiramente falando, o mergulho dava muito mais. Que nem o polvo, o polvo é só no mergulho. O polvo você não pega ele de outro jeito. Você pega ele com o bicheiro, você tem um bicheiro, você bicheira ele, você vira um anzol nele e puxa. Aí, você puxa e solta aquele líquido preto, que é pra ele poder se proteger. Aí, tu já põe a mão nele, já segura ele, já traz ele e já chama o barco. E já joga ele pra dentro do barco. E assim eu não parava de pegar um polvo atrás do outro, um polvo atrás do outro, um polvo atrás do outro.
P/2 - E onde você vendia esses peixes? Esses peixes que pegava com arpão, que mergulhava, tinha um lugar específico pra vender?
R - Então, a gente vendia muito em Bertioga, quando era Boracéia. E em Santos, entregava muito aqui no Box Santista. Entregava muito aqui, na ponta da praia. O polvo, a gente entregava em restaurante, o Paco. Você lembra do restaurante Paco? O Paco, era espanhol. A mão do cara era gigante. A mão do cara não dava pra pegar na minha mão. A mão do cara, o dedo do cara era gigante. E ele já ia no caixa e me pagava a vista. Eu recebia um bolo de dinheiro por dia. Eu levava na mão do meu pai, sempre dava na mão do meu pai e falava: pai, a pescaria de hoje deu tanto, tá aqui. A pescaria de hoje deu tanto, tá aqui. A pescaria de hoje deu tanto, tá aqui. E assim foi indo.
P/1 - Como você se sentia, pequeno, indo caçar desse jeito, caça submarina. Você lembra dessa sensação, assim, de pegar um polvo, de pegar um robalo?
R - É uma sensação que te dá de adrenalina, que não dá, você não mede idade, você não mede idade. A gente tinha vários mergulhadores de idades maiores que falavam assim: pô, mas é um garoto. Eu não me comparava com as pessoas mais velhas. Eu achava que eu tinha que ser cada vez melhor. Independente deles serem mais velhos que eu ou não, eu não me comparava. Por mais que eu tivesse 13 anos, para 14 anos, eu já me sentia um campeão no mergulho. Porque eu pegava muito peixe mesmo, de pequeno. Então, eu tinha várias pessoas concorrentes que mergulhavam do nosso lado. E os caras falavam: quem tá na água? “É o pessoal de Boracéia.” “Vixe, os caras são terríveis, os caras são embaçados. Os caras pescam demais.” Porque a gente não saía da água. O mar virava, a gente ia pro Montão de Trigo. O mar virava, a gente ia pros Alcatraz. O mar virava, a gente ia pra Ilha Bela. Ia para lugares fundos, a gente chegava até 30 metros de profundidade, 35 metros de profundidade. Então, a gente mergulhava muito mesmo, a gente era uma equipe de mergulhadores bons.
P/1 - Como que você aprendeu a fazer leitura do mar?
R - A leitura do mar é automática, é assim, como se fosse um dom, um dom automático. Não tenho como te falar como eu aprendi. Eu aprendi vivendo, vivenciando. Aquilo que eu vivi, que eu aprendi, foi vivenciando e sentindo que aquilo era um dom dado. O dom que eu tive de absorver aquilo tudo do mar, foi demais, foi tudo que Deus me deu assim de luz.
P/1 - E você consegue contar pra gente como você percebe o tempo virando, vento?
R - Lógico.
P/1 - Conta pra gente.
R - Só de sentir o ar ficando gelado eu já sei que é sudoeste. Se o ar ficar quente é noroeste, a água vai estar gelada do mar, não é bom pra peixe. Quando venta sudoeste é pior ainda. Tem que ventar leste para começar a dar peixe. A maioria das redes, quando a gente arma, o vento tem que estar de leste, lestado, vindo do norte.
P/1 - E a virada do mar?
R - A gente já percebe pela ondulação, a quebração da ondulação, a gente já sabe se o mar está com força ou não, de ver as ondas quebrar. Então, só de olhar o mar, eu já sei se o mar está com força ou não. Só de olhar o mar eu já sei se o mar tá com força ou não, se é bom de pesca ou não. Muitas vezes eu vou pra pesca, eu já falo pro pessoal, tem 50 pessoas lá me esperando. Hoje é arrasto de praia. Hoje envolve muita gente. É outra arte de pesca. Eu me envolvi quase em todas as artes de pesca. Eu me envolvi no arrasto de praia, eu me envolvi na rede de emalhe, que é a boeira. Eu me envolvi no mergulho. E que mais? Só, né? E no mergulho. E no mergulho. Quase todas as artes de pesca.
P/1 - Mas isso você foi aperfeiçoando ao longo da vida?
R - A gente foi percebendo que as outras artes também dava dinheiro quando o mergulho não dá. Porque o mergulho você depende de uma água limpa. Quando a água não tá limpa, você recorria à boeira. E quando não, ia pro arrasto de praia. Eu, na verdade, fui pro arrasto de praia quando eu tinha 29 pra 30 anos, quando eu separei a sociedade, eu montei um arrasto de praia. E o arrasto, chama arrastão de praia. Nessa reunião que eu estava hoje, da APALMC, da APA Marinha, ela tá rediscutindo uma nova lei. E eu preciso estar informado, porque como eu sou um pioneiro na pesca, eu já vim há 30 anos de arrasto de praia, eu fui chamado pra participar, pra estar ali junto com eles.
P/1 - E aí, hoje, por exemplo, com o arrasto de praia, você vai junto e qual que é a sua função?
R - Comandar tudo. Eu sou o verdadeiro comandante do arrasto de praia. Eu coordeno a largada da rede, eu coordeno a puxada da rede, como abre, como fecha, como solta os animais, protegido por extinção. Eu que faço tudo, eu que olho tudo, eu que coordeno tudo.
P/1 - E isso você foi aprendendo?
R - E às vezes tem cem pessoas lá. E eu tenho que coordenar pessoas muito mais velhas que eu, às vezes cabeça dura e tal. Você tem que se impor, entendeu? Tem pessoas ali que é difícil de se comunicar, quando você lida com muita gente. E na hora da divisão, existe uma oração. A gente faz uma roda, divide todo o peixe por igual, às vezes toneladas de peixe. Toneladas de peixe. A gente divide tudo em roda e divide o peixe. E por igual, todo mundo leva um monte igual. Eu só divido o peixe maior, para quem realmente é barqueiro, esses peixes maiores vão para os barqueiros. Para as pessoas mais específicas que estão mais tempo com você.
P/1 - E vocês têm algum ritual para entrar ou sair do mar?
R - Eu faço uma oração. Sempre faço uma oração, antes de entrar dentro do mar eu me benzo e peço para que Deus abençoar a nossa pescaria.
P/1 - Mesmo você sozinho?
R - Sempre sozinho. Aí é uma oração minha. Que eu faço sempre quando começa e quando termina.
P/1 - Desde menino você aprendeu?
R - Desde pequeno eu faço isso. Desde pequeno eu sou muito ligado a Deus.
P/1 - E foi uma coisa sua ou da sua família?
R - Uma coisa minha, pessoal. Eu faço isso por costume. Eu saio do carro, vou lá, lavo a mão, faço uma oração, agradeço. Vindo peixe ou não, eu faço uma oração agradecendo e venho embora.
P/1 - Histórias marcantes dentro do mar, de situações inusitadas, de medos, desafios, você tem?
R - Tenho. Fomos uma vez pra Ilhabela, quatro mergulhadores, num barco grande, de 10 metros, com motor de 90 HP. Aí, pegamos… Nós íamos passar dois dias, levamos barraca, levamos tudo. Desses dois dias que nós íamos passar no mar, nós lotamos os isopores todos, todos os isopores, mais de 300kg de peixe, num dia só. Então, o que aconteceu? Como a gente pegou tanto peixe, tanta anchova, lagosta, garoupa, só peixe bom, que a gente pegava no arpão, porque é uma pesca seletiva. E como a gente pegou tanto, a gente veio embora. Aí, eu lembro que eu estava com o pé no alto, bebendo uma Coca-Cola, eu que estava pilotando o barco, tal. E o motor deu aquela falhada. Aí, eu falei: meu, tem alguma coisa errada. O motor era novo. Tem alguma coisa errada. Era uma bomba injetora, que nem carro tem, que injeta gasolina pra dentro do motor. Essa bomba queimou. Bem no canal de São Sebastião, atravessando São Sebastião, cortando pelo meio, até Boracéia. Quando ele parou, ele deixou a gente no meio do oceano. Quando a gente jogou a âncora, a âncora não chegava nem no fundo. Não tinha âncora. A gente ficou à deriva. Jogado no mar. Era o que? Umas oito e pouco da noite, no escuro, caindo raio adoidado, trovoada, raio caindo do lado do barco, gente quase querendo chorar. Eu falei: meu, não tem o que fazer, cara, começa a rezar. Vamos deitar e vamos dormir, estamos cansados, trabalhamos o dia inteiro. Vamos ficar. Beleza. Quando amanheceu o dia, a gente estava duas vezes pra fora dos Alcatrazes. Os Alcatrazes já é quase 60 quilômetros da praia. A gente estava como se fosse duas vezes pra fora. Eu falei: ó galera, nós temos duas soluções. Ou a gente joga todo o peixe fora e se protege com os isopores, do sol, por desidratação. Ou a gente vai todo mundo morrer aqui. A gente tem duas opções. Ou joga tudo fora no mar agora. “Pô, mas vai jogar lagosta, vai jogar tudo fora?” Eu falei: ó, minha ordem é jogar tudo fora. Aí, vocês que escolhem. Então, quando ficamos à deriva... Conforme a ordem que eu dei, que jogasse todo o peixe fora, a gente tava duas vezes para fora dos Alcatrazes, a gente estava mais de 100km para fora dos Alcatrazes. A gente estava no pleno alto mar, alto mar total. O navio passava mais de 150km pra dentro da gente. A gente tava no oceano, jogado no meio do oceano. E eu falei: meu, é morte. É morte, a gente tem pouca água, a gente tem pouca comida, não vai dar pra gente se sustentar. Não dá pra gente se sustentar. O que que eu vou fazer? Jogo os isopores fora, jogo os peixes fora, aproveita os isopores para poder se proteger. O pessoal não queria, foi meio resistente. Falou: pô, mas a gente vai jogar tudo fora? Eu falei: é tua vida ou o peixe. Aí, o pessoal jogou tudo fora e começou a se enfiar debaixo dos isopores. E aí, demorou dois dias pra bater um sudoeste. Dois dias no meio do mar, sem beber quase água. Eu tinha um litro e meio de água, onde eu deixava o pessoal só molhar a boca. Tipo assim, eu molhava a boca. Eu, como capitão, eu segurava, molhava a tua boca e tirava. Eu molhava a tua boca e tirava. Molhava a tua boca e tirava. Eu não deixava ninguém dar golada. Era só pra molhar a boca. E aí, todo mundo se protegendo do sol. E assim foi dois dias. Eu sabia que tinha uma viração pra entrar. Eu sabia que tinha um vento de sudoeste pra entrar. E foi esse vento de sudoeste que salvou a gente. Porque o que acontece com o vento de sudoeste? Ele vem do sul. Quando ele vem do sul, ele pegou o barco e jogou o barco pra terra. Ele jogou o barco em uma velocidade grande pra ilha da Vitória, que é uma ilha que fica pra fora, quase na reta de Ubatuba, sentido Ilhabela, mas sentido Ubatuba. Quando eu percebi que eu cheguei nessa ilha, o que eu fiz? Que eu falei pro Rodrigo, o mergulhador. Eu falei: meu, só tem uma solução. O celular pega? “Não.” “É o seguinte, nós temos que pedir socorro. Aqui não tem socorro, nós vamos morrer aqui nessa ilha. É o seguinte, eu vi no Sobrevivi, na televisão, se subir no pico mais alto da ilha, pode ser que o celular dê sinal. Vamos subir? Eu e tu.” Eu era magrinho, estava todo trincado. Eu falei: vamos subir. Vamos subir, meu irmão! Vamos subir a ilha. Vamos escalar essa ilha até o fim. Vambora! Começamos a escalar a ilha. Escalou, escalou, escalou. Chegamos no último rochedo, o celular não pegava. Quando virou o celular, o celular deu um risco. Quando o celular deu risco, eu falei: para, vai ligar, vai ligar. Aí, nós ligamos. Quando ligamos, eu falei com a minha mãe. “Meu, mas é aniversário do teu irmão.” “Mãe, avisa que tem que vir socorrer a gente na Ilha da Vitória, o Ricardo conhece.” Que é um dos meus irmãos mergulhador, pescador também, criado comigo. Eu falei: meu, manda… “Mas é aniversário dele, ele está bêbado. “Mãe, não importa, eu vou morrer, eu tô morrendo aqui. Eu não tenho comida, não tenho nada. Manda ele vir buscar a gente. Pelo amor de Deus. Fala pra ele que é questão de vida ou morte. Entendeu? A gente vai estar na Ilha da Vitória, ele sabe onde é. É por fora de Ilhabela.” Aí, tudo bem, aguardamos, das três da tarde, duas da tarde, ele foi chegar na gente nove horas da noite. Nove horas da noite ele chegou na gente, pra puxar. Aí, comemos lá, trouxe comida, trouxe bebida, trouxe bastante coisa farta. Comemos tal. Aí, o pessoal já comemorando, que já estava tudo sossegado. Eu falei: ó, não vamos comemorar até chegar em terra. Porque a gente tá muito longe da praia. A gente tá longe demais da praia. Eu falei: quando chegar… Não deu dez minutos, o motor do meu irmão quebrou a hélice. A hélice saiu, quebrou o pino da hélice e a hélice foi embora com o motor e tudo. Ficamos dois barcos no meio do mar, à deriva de novo. Meu irmão mais velho começou a chorar. O meu irmão mais velho, o Alexandre, que é o mais medroso. Aí, ele começou a chorar, de chorar mesmo, de chorar. Querer brigar comigo, me dar umas pauladas e tudo. Eu falei: meu irmão, é o seguinte, ó… E eu já estava bravo. Eu falei: ó, nem toca em mim, hein, meu irmão. Eu já estava debilitado do sol. Eu já estava sentindo meu corpo com febre. Eu falei: ó, nem toca em mim. “É o seguinte: tu vai remar.” Eu falei: não, eu não vou remar, porque eu não tenho força para remar. Eu não vou remar! Aí, eles remaram a noite inteira lá. Chegaram numa praia chamada Praia de Eustáquio, onde o cara tinha um rádio. Um restaurante famoso, onde encosta as lanchas dos milionários, onde come só milionário. Um lugar de milionários que é atrás de Ilhabela, que é uma prainha reservada, que tem um baita de um restaurante cinematográfico, todo de vidro. A gente pediu socorro pra ele. Automaticamente, ele foi tão bacana, que ele socorreu, disponibilizou o barco dele pra nos ajudar. Aí, ele chamou minha mãe e meu pai pelo rádio, avisou que a gente tava tudo bem, pra gente ir pro porto de São Sebastião. Que ele ia levar a gente até o porto de São Sebastião rebocado, os dois barcos. Eu falei: pô, perfeito. Perfeito. Perfeito. Falei, então tá bom. Foi aí que a gente se salvou dessa daí.
P/1 - Quatro dias.
R - Quatro dias. Praticamente quatro dias sem comer nada, só fui comer no terceiro dia.
P/1 - Quando você chega em terra firme, qual que é a sensação?
R - Quando eu tirei a roupa… É assim, eu uso uma roupa que é uma roupa vedada, é uma roupa que, na verdade, é de borracha, mas não é borracha neoprene, que você acha uma borracha simples. Essas roupas de mergulho sofisticadas, é como se fosse uma câmera de pneu. Meu, quando eu tirei minha roupa, eu tava todo pintado. Como minha pele não respirava, eu estava tendo febre, não era devido ao sol, era devido às feridas que eu não sabia que estavam me ocasionando. Eu ia morrer com infecção, sem saber, porque eu não estava tirando a roupa. Como eu estava só com a roupa de borracha, e aquilo não deixava minha pele respirar, por a pele não respirar, ela estava causando feridas em mim. E aquelas feridas já estavam me gerando febre. Foi por Deus, assim, foi por Deus. Quando eu cheguei no meu banheiro, que eu tirei, que eu me olhei no espelho, tava um horror. Eu estava todo pintado, todo cheio de ferida já no corpo.
P/1 - E você demorou pra se recuperar, como foi?
R - Uns cinco dias, uma semana, passando pomada, se cuidando e tal, comendo bem, se hidratando.
P/2 - Todo mundo que tava, ficou bem?
R - Eles tiraram a roupa, eles estavam bem. Teve um que não, teve um que passou mal, teve um que vomitou muito, que ele criou um caroço na barriga. Um caroço. Até achamos que ele ia morrer a borda. Porque não tinha o que fazer. Não tem o que fazer, não tem o que fazer. O cara vomita, vomita, vomita, vomita, vomita. Tu não tem o que fazer ali. Tu não tem remédio, tu não tem nada. Tem que esperar que o cara melhore. E assim, aí de uma hora pra outra ele parou. Ele já estava vomitando há horas e horas. Ele criou um caroço na barriga dele, quando eu vi o tamanho do caroço, eu falei: meu Deus do céu. Severino o nome dele.
P/1 - Vocês eram quantos?
R - Quatro.
P/2 - Desses quatro, você, um irmão que estava lá e o que foi…
R - Não, nenhum irmão.
P/2 - Nenhum?
R - Não, o irmão ,depois juntou mais dois. De quatro virou seis. Dois socorristas. Os dois socorristas também viraram vítima. Então, assim, os dois que foram buscar a gente, os dois também ficaram à deriva. Só que aí eles ficaram um dia só, pra eles era moleza, porque eles tinham água, eles tinham comida, eles tinham tudo. Aí, nós estávamos abastecidos. Quando nós encostamos na Praia de Eustáquio, ali já estava tranquilo, porque a gente estava sendo amparado pelo restaurante, o melhor restaurante da praia. E o cara estava extremamente solícito com a gente. Então, automaticamente, ele deu o amparo que a gente precisava de comida, de bebida, mais água, mais tudo. Aí, a gente acabou se salvando.
P/1 - Você teve medo de morrer?
R - Tive, lógico. Você pensa, passa um filme na tua cabeça. É um filme que você pensa na tua família, tu pensa no teu filho, tu pensa no teu filho pequeno, tu fala, pô, e agora? Olha que situação que eu me encontro. Dá vontade até de chorar, porque você... Passa um filme. Só que você não pode transmitir isso pros outros. Você tem que segurar pra você. E pros outros você tem que mostrar a força que a gente vai vencer. Mesmo não havendo esperança, que estava difícil de viver uma esperança, realmente a esperança aconteceu, que foi o vento. O vento soprou até a gente chegar na ilha. Quando a gente chegou na ilha, o vento parou. A gente ancorou o barco na ilha, o vento parou. Eu falei: meu, é Deus, cara, é Deus, aqui é Deus. Deus salvou a nossa vida.
P/1 - Algo mudou pra você depois dessa experiência?
R - Não, muita coisa, assim. Mudou de eu ser mais precavido. Levar mais água, levar mais comida, se precaver muito mais. Hoje se a gente tiver que fazer uma viagem longa, a gente leva muita água, coisa que a gente não levava muito. A gente parava nas praias pra beber da bica, a gente achava que as bicas eram tudo corrente, tudo uma delícia. A gente viveu coisas lindas, lugares maravilhosos, magníficos. Lugares assim que, sabe, sem interação humana, praia sem interação humana nenhuma, cachoeiras, coisas lindas mesmo que a gente viveu. Então, aquilo ali dava amparo pra gente, a gente enchia tudo de água, só que ninguém sabia que um dia a gente ia ficar no mar. E nesse dia a gente ficou.
P/1 - E pensando nessas naturezas, assim, com uma paisagem sem interferência humana. Você já viveu algo muito mágico, assim, diferente?
R - Eu acho que na pesca, todo dia você vive algo diferente. A pesca, ela é dinâmica, é o que eu falo. Por mais que você saiba tudo, você nunca sabe. Você nunca sabe o que pode acontecer. Então, eu tive vários naufrágios também, graves. Naufrágios graves. De a gente tentar passar a ondulação e ir pro fundo, na hora. E pessoas que estavam do meu lado não saberem nadar. E eu salvar a vida dessas pessoas. Como eu sei nadar muito bem, muito bem, eu salvei a vida deles. “Só não segurando o pescoço. Não segurando no meu pescoço que a gente vai sair na praia. Calma, por mais que demore um pouco, a gente vai sair na praia.” Até o bombeiro que foi socorrer a gente, afundou também. Ele tentou salvar a gente, ele foi pro fundo também. E assim, foi uma experiência ali traumática ao extremo.
P/1 - Como foi?
R - Como foi? O barco estava navegando, se eu te falar, que de uma hora pra outra, de uma hora pra outra, a gente pegou uma onda lateral que não esperava ter aquela onda. O barco está navegando rápido, rápido, com velocidade máxima. De uma hora pra outra a onda cresceu, dei um tapa no barco, o barco virou de cabeça pra baixo, sem nem mais, sem nem menos. Eu só lembro de eu estar debaixo d'água, meio desmaiado, de eu lembrar que eu tava no fundo, eu tava afundando, eu ia morrer. Aí do nada, tu volta, a cabeça volta, aí tu volta à tona pra respirar. Quando tu vê, meu, o mar tá gigante, tu tá no meio de uma centrífuga. E uma das pessoas não sabia nadar mesmo, eu até brinco, que ele fazia... Ele parecia uma tartaruga respirando. E aí, eu falava pra ele: meu, calma, calma. Porque eu tinha que manter a calma ali, senão ele ia morrer mesmo. E ele... “eu vou morrer, eu vou morrer.” Eu falei: meu, você não vai morrer, eu tô aqui, eu sei nadar. Calma, calma, segura em mim. Só não segura no meu pescoço. Aí, eu puxava ele pro barco, eu segurava no motor, na hélice, que a hélice ficou pra cima. O barco ficou de bordo pra cima, emborcado. Eu segurava na hélice. E ali, aquela força na hélice, quando vinha onda, me arrancava. Eu tinha que nadar com ele e segurar na hélice de novo. Esperar o quê? 10 segundos, 15 segundos, pra poder se recuperar, e depois a onda arrancava a gente de novo. E assim foi durante horas. Quando o bombeiro veio socorrer a gente, que o bombeiro chegou perto, a onda subiu tanto, que jogou o bombeiro de costas. O barco do bombeiro foi jogado que nem papel pra trás.
P/1 - A gente tá falando de um mar que a gente não conhece, né?
R - Exatamente! É o que eu te falo, é dinâmico.
P/1 - Mas que é um mar de um tamanho que a gente que nunca foi pra alto mar nesse tempo não conhece.
R - Vocês não imaginam o tamanho das ondas. Tem ondas que crescem assim, que você pensa que é um poste. Um poste de onda. Você fala, meu, impossível, isso aqui vai quebrar em cima de mim, vai acabar comigo. E é verdade. Você tem que afundar. Você tem que fazer um mergulho, que nem prancha. Que nem os caras de prancha. Você tem que passar por baixo da onda. Você não pode deixar ela quebrar em cima de você. Você tem que passar por baixo dela. É o que eu falava pra eles. Vamos respirar o máximo que puder. Quando a onda for quebrar, eu vou falar já, todo mundo passa por baixo. Não deixa ela te pegar. Porque se ela te pegar, você vai entrar numa centrífuga. E assim foi. Aí eu salvei todo mundo.
P/1 - Como mantém a calma?
R - Eu sou um cara muito calmo, porque eu sei nadar bem. Então, como eu sei nadar bem, e eu via aquela situação, eu tinha que manter a calma. Sabe quando você já tem esse espírito de liderança, de manter a calma? Por mais que o bagulho esteja numa situação crítica, eu consigo manter a calma. Eu consigo manter a calma. Eu passei outra agora há pouco tempo também, que o bombeiro também veio me socorrer, todos os bombeiros vieram me socorrer também. O barco virou ao contrário. Se eu tivesse ficado no barco, eu tinha morrido na hora. Sorte que quando eu vi a onda aquecer, tanto, tanto, tanto, tanto, tanto… Quando eu vi que a onda ia estourar mesmo, eu pulei do barco. Se eu não tivesse pulado, eu tinha morrido. Porque o barco virou de cabeça pra baixo certinho. Se eu tivesse sentado, eu teria ficado embaixo do barco. Eu teria morrido.
P/1 - Alguém morreu?
R - Não, não. Não porque os outros dois já tinham pulado. Os outros dois já tinham abandonado. Eu era o único que tinha esperança. Eu fui até o último limite. Aí, quando eu vi que não dava mesmo, eu falei: meu, abandona e pula.
P/1 - Mas aí nessa situação, como você se comunica? Como que chega o bombeiro?
R - Eles chamaram o bombeiro, porque onde a gente fica, no canto do Itaguá, já tem um bombeiro lá, que é um canto extremamente perigoso. Já tem a placa do bombeiro dizendo que é perigoso, e o bombeiro já tá na guarita. É uma guarita feita de madeira.
P/1 - E é lá que tu gosta de ir?
R - É ali que eu entro. Na parte mais perigosa.
P/2 -
O bombeiro vê já fala ai..
R - De novo.
P/1 - Já te conhece
R - Já, a gente dá peixe pra ele, a gente tem uma amizade boa. Mas ele sabe que a gente, às vezes, ultrapassa o limite da natureza. A gente desafia a natureza, né? Coisa que hoje eu não quero fazer mais. Cheguei a essa conclusão. Hoje a gente tá entrando pelo canto do Itaguá, que não tem onda, canto do Bora Bora, canto de Itaguá é o canto que tem onda. Você olhando a Boracéia, o canto direito é onde tem onda, onde eu afundei. O canto esquerdo é onde não tem onda. Então, a gente está entrando mais pelo canto esquerdo, que não tem onda, que é um canto protegido.
P/1 - Mas tem os mesmos peixes?
R - Não, de lá a gente navega até onde dá o peixe. A gente anda 40, 50 minutos de barco até onde dá o peixe.
P/1 - Como você se prepara pra uma pesca nesse naipe?
R - Muitas vezes de manhã você já começa a sentir calafrio, dá aquele frio, dá aquela adrenalina. Quando você acorda de manhã, que você sabe que o mar está bravo, você sabe que o mar está em condições inapropriadas para poder pescar, e mesmo assim você quer pescar, você já vem aquela adrenalina no corpo inteiro, você já está um banho de adrenalina, você já fica acordadão, quatro da manhã. Pleno escurão, você já vem aquela adrenalina, vamos, vamos, vamos lá. Antigamente, enfrentava o mar, vou mostrar depois pra vocês o tamanho do mar. Meu, era uma coisa meio assustadora, meio macabra o bagulho. Não precisava daquilo, não precisava fazer aquilo. E hoje a gente chegou a uma conclusão que a gente não precisa mais daquilo. Meu irmão também, Ricardo, também chegou na mesma conclusão. Não vamos mais fazer isso. De um ano pra cá, a gente chegou a uma conclusão. Não vamos mais fazer isso.
P/1 - Depois dessa experiência?
R - Depois da minha experiência e a dele também.
P/1 - Ele tava junto.
R - Ele tava junto.
P/1 - Vou voltar então.
R - Tá.
P/1 - Escola. As suas primeiras lembranças de professor marcante, como que foi esse momento pra você?
R - De escola?
P/1 - Pequeno.
R - Eu tinha uma professora, Maristela, de matemática, que ela era terrível. Era aquela professora muito brava, muito brava, muito rígida. E eu aprendi muito, eu era muito bom de matemática. Então, eu me saía muito bem. E ela ficava meio inconformada, porque eu era bagunceiro. E ela pegava no meu pé. Mas eu era bom de matemática, então não adiantava. Porque por mais que ela pegasse no meu pé, eu era bom de matemática. Então, eu tirava sempre notas boas. Agora de português era o contrário. A professora também era ruim. Aquelas professoras antigas eram muito rígidas, era diferente do estudo de hoje, eu acredito. E elas pegavam firme mesmo. E a professora de português, a Marcinha, lembro até hoje. Ela era embaçada, ela era difícil. E eu fiquei várias vezes de recuperação nela e várias vezes me saí bem. Por quê? Por causa da pesca. Porque eu estudava tanto por causa da pesca, eu me trancava muitas vezes no quarto ou na sala. A gente tinha uma sala imensa. A gente ficava na sala ali estudando, estudando, estudando, estudando sozinho. E pedindo pra Deus entrar aqui na minha cabeça pra me passar de ano. Porque eu queria passar de ano, não ficar de recuperação. Porque eu queria ir embora rápido pra Boracéia, que era o nosso rancho de pesca. Então, eu passava, sempre passava. Então, nunca fiquei, eu sempre passei.
P/1 - E a juventude, assim, foi crescendo, descobertas, como você se divertia, os amigos, como que foi esse momento?
R - Ah, foi muito bacana, assim, eu tive amigos maravilhosos, assim, eu tive uma infância espetacular, assim, de futebol na rua, taco, lê-lê-gol, nadar até o farol. Eu sempre nadava em primeiro, sempre brincava com os caras, quem chega em primeiro. Porque a gente tirava disputa, eram 10, 15 garotos, e a gente tinha um farol aqui no Canal 6, que foi demolido pela metade. Tem aquele farol vermelho, que fica bem na reta do canal. E a gente nadava até lá pra subir lá em cima, pra pular lá de cima de cabeça. E era alto, era alto demais. E a gente pulava, a gente ia todo mundo até lá nadando e tal, só que a Marinha volta e meia corria atrás da gente. A Marinha não podia ver que ela vinha atrás. E eu era um dos primeiros a chegar na praia. E uma das coisas marcantes, uma vez, eu dei o braço pro cara da marinha, foi o primeiro, todo mundo foi pego dentro d'água. Só que eu não fui pego. Eu saí. Só que quando eu saí, o carro da marinha estava me esperando na praia. Quando eu olhei, eu falei: não, não é possível. Me lasquei. Mas beleza, vou sair, vou fingir que vou dar o braço… Porque o barco começou a me encurralar. O barco vinha pela água e o cara da marinha me chamando. Beleza, eu fui lá e fui dar o braço pra ele. Quando eu dei o braço pra ele, eu puxei com tudo e saí correndo pela praia. E aí, eu fui embora correndo, fui embora. Ele não ia me pegar. Eu já estava indo embora, já era. Eu já estava indo embora. Aí, os caras dos pedalinhos ali, do aquário, tinha os pedalinhos ali. Que os caras tinham os pedalinhos antigamente. O cara do pedalinho não me passou um rapo e eu caí de cara no chão. E o cara pisou em cima de mim. Aí, o cara da marinha me pegou. Aí, quando ele me levou pro capitão, ele falou: esse aqui é diferente, esse aqui tentou fugir, esse aqui nós temos que dar castigo. Aí, o capitão, com muito discernimento, falou: não, todos estão iguais, todos vão ser soltos. “Não, mas esse é diferente.” O sargento falando, sargento da marinha. Aí, ele falou: não, é tudo igual. Solta o menino, deixa o menino ir embora. Aí, eu falei ufa... Aí, eu fui embora.
P/1 - Jovem.
R - Hã?
P/1 - Jovem, menino.
R - Jovem, 13 anos, 12 anos de idade. 13, 12 anos. A gente fazia tudo isso, a gente era terrível. Os clubes, então, a gente causava nos clubes. Não tinha clube que aguentasse. A gente não era sócio, a gente pulava em todas as piscinas. A gente escalava os muros, muros gigantescos, a gente escalava os muros que nem gato. A gente entrava em qualquer piscina, de qualquer clube, sem ter carteirinha. Não tinha negócio de exame médico, nem de carteirinha pra gente. A gente entrava num clube.
P/1 - Seu lance é a água.
R - Meu lance é água. Sempre foi piscina também. A gente gosta mesmo. Eu fui muito bagunceiro, é o que eu te falo, minha mãe volta e meia era chamada. Teve uma vez que eu saí numa briga em cima da balsa com dois maloqueiros, de rua. Dois meninos de rua. E os meninos, assim, muito folgados, sabe, queriam roubar a gente. Aí, tava eu e o Rodrigo Otero. E aí, nós começamos a se confrontar, a gente. O moleque não pegou um ferro, eu corri pra barquinha, o moleque tacou o ferro, o ferro pegou na minha fonte. Quando bateu na minha fonte, um ferro quadrado da balsa, aquelas placas de aço quadrada da balsa, gigante. Ela quicou naqueles barquinhos azuis que atravessam. Quando quicou no barquinho azul, bateu na minha cabeça. Quando bateu, era sangue para tudo que era lado. Tinha dois policiais comendo pastel, porque ali tem um negócio de pastel, antigamente era muito mais, tinha muito mais, vendia muito mais do que hoje. Os dois policiais comendo pastel. E eu todo ensanguentado, mas todo ensanguentado, porque pegou a fonte. E voava sangue, quando tirava a mão, voava sangue. Então, eu punha a mão assim, ó, o sangue corria no meu corpo. E eu segurando com a mão e pedindo socorro pro polícia. O polícia falou: meu, mas eu não tenho como te pôr na viatura, você está sangrando tudo, você vai sujar a viatura inteira. Aí, um dos caras que estava comendo pastel, falou: meu, você tem que socorrer o moleque, o moleque tá morrendo, meu. Você vai socorrer o moleque agora. Coloca dentro da viatura sim. Aí, fui pro pronto-socorro. Depois eles foram me levar para minha mãe. Minha mãe quase infartou. Minha cabeça toda enfaixada, polícia com giroflex na porta de casa, eu descendo da viatura toda enfaixado. E minha mãe vendo aquela cena. Eu falei, pronto! Agora minha mãe morreu.
P/2 - Sua mãe quase infartou várias vezes.
R - Várias, várias, várias. Então, mas deu tudo certo lá com o negócio da minha mãe, deu tudo certo. Conversamos bem, o policial conversou bem com a minha mãe. Acabou tranquilizando minha mãe que não tinha nada a ver.
P/1 - Antes de eu te perguntar qual foi o ponto de parada pra essas histórias, você gostaria de contar mais uma dessa época?
R - Então, o ponto depois que eu dei uma parada com as amizades, que minhas amizades eram bem difíceis, assim, bem bagunceiras mesmo. A gente era bagunceiro mesmo. Então, o ponto de parada foi engravidar uma menina de 13 anos. Eu tinha 15, de 14 para 15, e ela tinha 13. Quando ela engravidou, eu fui chamado pelos pais. Só que os pais já sabiam que eu era bagunceiro. Só que os pais me chamaram na xinxa, falaram: ó, o negócio é o seguinte: ou você muda, você assume seu filho, ou você se põe da minha porta pra fora. E não queremos nem nunca mais saber de você, você não precisa nem assumir teu filho. A gente vai cuidar. Eu falei: não, vou cuidar, vou ficar. Vou ficar. Eu largo minhas amizades. Eu largo e vivo com a tua filha numa boa. Eu vou ficar de boa. Aí, ele falou: tu vai ficar de boa? Então tá bom, a gente quer ver você aqui dentro de casa, você vai ser criado como nosso filho, e você daqui em diante faz parte da nossa família. Eu falei: então ótimo. Dali foi um ponto de mudança. Da água pro vinho. Ali eu virei santo. Ali eu comecei realmente só a focar na pesca. E parei um pouco a bagunça da molecada. Então, quando eu não estava pescando, eu estava com a namorada, que estava grávida.
P/1 - Como foi se tornar pai jovem?
R - Assim, você não percebe. Você não tem essa responsabilidade. É difícil você assumir uma responsabilidade muito nova. Hoje eu tenho um filho de 15 anos e tenho um de 33. Então, o que acontece? Você vê o quanto você falha, o quanto você falhou na juventude, na criação de uma criança, na juventude, tudo dele, o quanto você falhou. Porque hoje eu tenho um filho que eu sei que eu dou muito mais carinho do que eu dei pro outro. E eu falo isso pro outro, ele até chora. Mas é questão de maturidade. A maturidade é tudo na vida. E a minha maturidade hoje é focada em família. Então, eu sou uma pessoa completamente diferente do que eu era. Então, ele sentiu muita falta desse pai mais próximo. E eu não, eu focava muito em estar junto com meus pais, junto com a pesca. A pesca eu fiz minha vida mesmo, sabe? Eu vivia para pesca. Quando o mar estava bravo, era o único momento que eu tinha pra eles. Fora isso, eu não tinha momento nenhum. Eu era 100% pesca. Eu lembro que eu saí de Boracéia para buscar ela, o mar virou. Eu vinha buscar eles, tanto o meu filho quanto ela. Eu vinha buscar eles aqui em Santos. Aí, eu levava eles para o Boracéia. Aí, o mar ia ficar bom, eu trazia eles de volta. Volta de novo que eu vou voltar a pescar. Eu não tenho tempo para vocês. Porque a pesca era muito exaustiva. A gente entrava às 6 horas da manhã e muitas vezes saía às 8 da noite. A gente fazia acampamento em Bertioga. A gente pegava um barco, saia de Boracéia ia para o Indaiá, lá para o Guarujá. O mesmo barco. E depois voltava raspando tudo. Tanto ia mergulhando, quanto voltava mergulhando. Então, a gente ficava o dia inteiro no mar sem parar. Era extremamente... Chegava a noite, eu não conseguia nem falar. Tão cansado que estava.
P/1 - Você fazia isso todos os dias?
R - Quase todos os dias. Antigamente. Só quando o mar virava que não. O mar dando condição de mergulho, o mar dando condição de pesca, quando a gente não estava na pesca de mergulho, a gente estava na pesca de rede. Então, era vice-versa. Não estava na rede, estava na outra.
P/1 - São filhos de duas mulheres diferentes?
R - Isso.
P/1 - Quanto tempo você ficou com a sua primeira, mãe do seu primeiro filho?
R - 14 anos. 14 anos com a primeira.
P/1 - Como foi esse… Não sei se foi um casamento, mas esse encontro?
R - A gente fala que foi só o tempo que errou. Assim, porque a gente se olha até hoje e a gente se gosta. A gente se dá super bem. Todos os meus casos de advogado, que eu tenho problema com advocacia, tal, isso e aquilo. Ela advoga pra mim, ela advoga pra minha família inteira. Então, assim, a gente tem uma relação extremamente boa. A gente conversa, a gente bate papo, tal. Que nem ela me defendeu numa ação agora há pouco tempo. Ela que me defendeu e, meu, ela é fantástica, assim, como pessoa. É uma pessoa muito pra cima, sabe? Aquelas pessoas pra cima. Então, ela é bacana, é uma pessoa bacana. E meu filho junto, tava do lado. Então, tava eu, ela e meu filho. Foi bacana.
P/1 - E aí, esse término se deu quando você já tinha quantos anos?
R - 27 ou 28.
P/1 - E aí como que muda a vida aí?
R - 27 ou 28.
P/1 - Como que é esse momento?
R - Eu fiquei sem chão. Eu fiquei sem chão, assim, fiquei bem baleado, o culpado era eu. O culpado fui eu da situação. Ela ficou sabendo de uma situação bem chata. Ela falou, ou a gente casa ou a gente separa. Eu achei que ela estava blefando, eu não acreditei. Na verdade, eu não acreditei. Aí, eu falei, não, ela não vai fazer isso. Beleza, vamos deixar tocar. Toca o barco. Aí, eu toquei o barco. Não é que ela separou mesmo. Ela bateu o pé e separou. Quando eu fui ver, ela tava numa balada, ficando com outro cara. Quando eu vi aquilo, eu fiquei em choque. A minha reação, nem ela esperava a minha reação. Fiquei maluco, assim, sabe? Sem chão. E ela levou aquilo a ferro e fogo, durante dois anos, até ela pedir para voltar. Mas quando ela quis voltar, eu já não queria mais. Porque eu já tinha sofrido tudo que eu tinha pra sofrer. E eu não queria passar por aquela experiência novamente, porque ela era o meu ponto fraco. Eu gostava dela, na verdade. E eu não queria mais passar por aquilo. Eu estava bem. Eu estava numa situação de balada, de zoeira, de amigo. Um monte de amigo, conexão. Pessoal todo mundo te ligando, todo mundo bagunçando. Todo mundo indo viajar para São Paulo, para interior, para tudo que é lado. Eu falei, meu, pra que eu vou sair dessa vida agora? Tá tão bom agora. Não vou. Aí, ela tentou voltar e eu não quis. Ela falou: então, eu não vou te incomodar nunca mais. Nunca mais eu te incomodo. E nunca mais ela me incomodou. Ela me chamou umas vezes para conversar, para conversar sobre o relacionamento dela com o cara. Pra pedir uma explicação pra mim sobre o relacionamento dela. Eu dei minha opinião, tal. Tudo bem! Tudo bem! Continuamos amigos, vamos continuar sempre amigos. Mas nunca levei na malícia para o outro lado. Sempre fui um cara muito sério com ela. Muito sério. E sou até hoje muito sério com ela.
P/1 - E qual que é o nome do seu filho mais velho?
R - Matheus Burger Mendes.
P/1 - Como que é sua relação com ele?
R - Maravilhosamente bem. Hoje já mandou mensagem pra mim. Toda vez que eu tenho festa em casa… Sábado agora ele já queria fazer um churrasco em casa. “E aí, pai, como é que tá aí as coisas? Posso ir pra aí?” Eu falei: filho, acabei de chegar de viagem, posso falar? Não tô legal, cara, tô cansado. Deixa eu ficar de boa esse final de semana, a gente faz semana que vem. Que eu sei que semana que vem vai chover. A gente já viu a previsão e tal, vai cair chuva. Eu falei: então, marca pra semana que vem, filho. Semana que vem a gente curte.
P/1 - A sua vida é em função do Clima Tempo?
R - É, a gente hoje tem um aplicativo chamado Surf Guru. Então, pelo Surf Guru, a gente sabe se vai ter onda, se vai chover, se não vai, o tamanho do mar, se vai ter força no mar, se o mar vai crescer demais. A gente sabe tudo por ali. Por ali a gente já faz a programação da semana.
P/2 - E como que é para o Matheus ter… A relação dele com o irmão com uma diferença de idade bem grande, né? Eles se dão bem?
R - Eles se dão extremamente bem. Mas a gente percebe assim, ele vê uma criação completamente diferente da dele. Então, assim, é meio difícil tocar nesse assunto, porque a gente vai tocar num assunto que a gente chorou muito junto. Pra mim, explicar pra ele que é diferente. O quanto é diferente você ter um filho mais velho, com uma idade mais velha. Eu hoje tenho 50, 51. Então, e ele agora 33. E assim, você ter um filho com 37, acho que 37 eu tinha, 30 e poucos anos, já tinha. É diferente de você ter um filho com 13 anos, 14 anos. É completamente diferente. 14 anos você quer jogar bola, você quer bater bola, você quer ir pros clubes. Hoje eu falo pra ele, “filho, o dia que você tiver um filho, você vai entender.” A maturidade é tudo. Você tendo maturidade, você vai dar carinho. Eu chamo meu filho pra deitar no meio, com 15 anos. Você enche de beijo. Teu filho vem, é carinhoso, ele te beija. Então, é uma situação completamente diferente. E ele vê isso. E ele fala: eu não tive isso. Ele falou pra mim. “Eu não tive isso. Eu jamais tive o que o José teve. Eu não tenho isso, eu não tive isso. Nem por parte de mãe, nem por parte de pai.”
P/1 - Você estava falando da diferença de idade dos seus filhos e da relação com eles. Se você quiser continuar desse papo que você teve com seu filho mais velho...
R - Então, a minha relação foi explicar para o meu filho mais velho o quanto é diferente você ter filho com uma certa idade, e muito mais novo. Quando você tem filho muito mais novo, você não tem uma experiência para saber lidar com aquela situação. E eu não sabia lidar com aquela situação, até eu aprender com o meu filho mais novo. Quando eu aprendi com o meu filho mais novo, eu tive uma conversa muito séria com o meu filho mais velho, que até os dois choraram, se abraçaram, tudo, pediram desculpas e tal, sabe? De não ter sido aquele pai que ele esperava. Ele aceitou, ele chorou também, me abraçou e tal. E aquilo ali morreu. Ele já ficou mais tranquilo ali. Mas ele tem ciúmes, sim, do meu filho mais novo, porque ele vê uma diferença muito grande da criação dele pro meu filho mais velho, pra ele.
P/1 - E como que chega o José na vida de vocês?
R - Então, aí é uma parte bem interessante, porque na época eu estava solteiro e era meio bagunceiro, bagunceiro mesmo. Quando eu separei, eu fui pra bagunça com os amigos. E aí, eu conheci várias mulheres, que eu ia pra vários lugares e tal. E uma delas, acabei conhecendo através de um amigo que falou, entra aqui no Moby Dick, nesse lugar. E eu acabei conhecendo uma pessoa. E essa pessoa gostou tanto de mim que ela ficava me ligando o tempo inteiro. E eu acabei saindo com ela várias vezes. Até um dia que ela me ligou e falou assim: Junior, tenho uma coisa pra te contar. Aí, eu falei: o quê? Ela falou: não, você tem que passar aqui pra me pegar pra tu saber. Eu falei: tudo bem, tô indo aí. Aí passei, peguei ela, tô andando pela avenida da praia. Aí, ela chegou pra mim, “eu tô grávida.” Aí, eu não sabia nem o que responder, eu engasguei e falei: meu, vamos comemorar. Então, vamos numa pizzaria bacana, que é uma pizzaria chamada Elis, onde o Robinho comia muito, o pessoal do Santos comia, que é uma das famosas do Canal 1. Eu falei: vamos comemorar, vamos comemorar a tua gravidez, tal. Mas estava engasgado. Sabe quando você fica engasgado? Eu falei: meu, e agora? Minha vida vai mudar. Novamente minha vida vai mudar, eu vou ter que mudar de vida. Porque eu assumi o compromisso com ela ali, de assumir o filho, ficar com ela. Tanto é que minha avó tinha um apartamento de frente pro mar nas Astúrias, ali. Um apartamento maravilhoso, minha avó tinha. Minha avó cedeu o apartamento pra gente morar. Então, eu fui morar num baita apartamento, super bem e tal. Mas eu comecei a perceber que eu entrei um pouco em depressão. Por ter cortado minhas asas, assim, sabe? Por você ter se separado dos teus amigos bagunceiros. Mas, automaticamente, o meu filho supriu isso. Do momento que eu comecei a cuidar do meu filho… Que ela era aeromoça, ela saia para trabalhar. E eu comecei a cuidar dele mesmo, aquele amor que vem de dentro, assim, é amor que você não consegue nem descrever. Aquilo tomou conta e preencheu. E é um amor que toma conta até hoje, quando eu vejo ele, assim. Eu sinto um amor imenso por ele, que é o meu filho mais novo.
P/1 - Hoje vocês não estão juntos?
R - Estamos. Moramos juntos. Moramos juntos. Vejo meu filho todo dia. O mais novo. Abraço ele todo dia e brinca todo dia. Todo dia ele vai lá, me beija. Brinca comigo. Comprei os perfumes que ele queria, que eu fui viajar. Ele é um parceirão pra mim, sabe? Amigão. Amigão. É aquele filho zen. Zen. Ele é mesmo signo que eu. Ele é genioso, mas assim, carinhoso ao extremo. Porque foi dado muito carinho pra ele. Então, ele retribui esse carinho também. Isso aí que é bacana.
P/1 - Eles vão pescar com você?
R - Não, não. Então, estava sendo discutido em várias reuniões, como eu participo de várias reuniões, e hoje eu estava em uma. A maioria dos pescadores hoje, devido às leis que estão acontecendo, que IN10, IN12, 166, várias leis, hoje, ela não prevalece para o lado do pescador, ela prevalece para o lado do meio ambiente. Então, o que acontece? Hoje, o governo federal, ele visa muito o meio ambiente e não o pescador, nem as tradições caiçaras. Então, o que acontece? Você vai querer que um filho teu vá viver da pesca, sendo que a pesca está se acabando? A pesca está acabando. É diferente daquela pesca que eu conheci quando meu avô comprou tudo pra gente. Hoje o que eu vejo na pesca, ela tá acabando aos poucos. Tanto de peixe, poluição. Poluição é o fator principal. Eu acho que a poluição hoje nos oceanos está sendo um caos total. Ninguém consegue controlar essa poluição, não tem controle. Por mais que o governo queira fazer vários incentivos de controle, que eu vejo que vai ter vários incentivos, ele não consegue controlar tanto lixo no mar. Então, isso vem acabando com o peixe, tanto de esgoto, quanto de lixo. A população vem crescendo demais e todo esse esgoto é jogado no mar. O esgoto de Santos é jogado dentro da Baía de Santos, então contamina uma baía inteira. Então, assim, eles não fazem nada para melhorar isso. Teria que ser feito um trabalho muito sério pela Sabesp, para melhorar tanto o tratamento, quanto onde vão jogar o esgoto. Porque o esgoto tinha que ser jogado muito para dentro do mar e não é feito isso. O esgoto é jogado muito perto da costa. Então, isso contribui muito pra quê? Pra que o peixe não se prolifere, pra que o peixe não se crie ali. Então, quem pesca em alto mar, que são os barcos industriais, esses estão bem. Agora o pescador artesanal que tem que buscar o seu peixinho ali na beira da praia ou buscar o seu peixe ali perto da costa, esse pescador está prejudicado hoje.
P/1 - Você tem esses anos todos dentro do mar, você percebe nitidamente essa mudança em relação à poluição? Vocês pescam lixo?
R - Nitidamente. Toneladas de lixo às vezes. Minha rede já chegou a sair 6 mil quilos de lixo, de encher um caminhão ou dois caminhões de lixo, cheio até a boca. De estourar a rede inteira e não conseguir tirar a rede e falar assim: é um absurdo isso acontecer. E você fala assim, como pode ter tanto lixo no mar? E tem. E tem. E eles sabem que tem. O meio ambiente sabe que tem. Hoje eu estava até falando hoje com a gestora da APA Marinha, ela coordena a APA litoral centro. Chama Maria. E a gente tá falando sobre lixo, que tem um projeto agora novo do governo, que inseriram agora, faz cinco meses, que eles vão pagar pelo lixo que você tira do mar. Eles querem incentivar o pescador a trazer aquele lixo que ele pesca. Se vier lixo na rede, eles te ressarcem. É tipo uma troca. Você dá o lixo, pesa o lixo, você recebe ressarcimento, ou financeiro ou de combustível.
P/1 - Isso que eu ia perguntar, vocês trazem de volta o lixo?
R - Não, esse lixo que eu pesco no mar, o próprio Prodesan, a limpeza da praia, recolhe. Por quê? Fica na areia. O lixo que eu puxo, o meu lance, é uma das pescas mais antigas que tem. É milenar. Chama arrasto de praia. Você dá o lance e puxa 10, 15 pessoas de cada lado. O que vier dentro da rede é peixe e lixo, a gente tira o peixe, o que tiver em extinção, eu sou obrigado a mandar soltar, que nem tartarugas e tal. Aí, o restante do lixo, a gente puxa pra cima e deixa que o lixeiro, o caminhão de lixo, passa um gadanho. Ele junta o lixo, aí vem a retroescavadeira, cata e coloca aquilo dentro de um caminhão. Então, todas as praias de Santos tem esse programa de limpeza. Assim, para aquele pessoal que vai andar de manhã na praia, pega a praia limpinha, limpinha, limpinha, limpinha. Por mais que eu tenha sujado, eu, Júnior, com arrasto de praia, a praia fica limpa. Tem um projeto da prefeitura de limpar a praia. Diferente de outras praias.
P/1 - Quantos metros tem essa rede?
R - Ela é obrigatória por lei, SMA 51, a lei chama SMA 51. 500 metros. A nossa tem 450 metros, 458 metros. Minha rede chega a 458 metros, com 12 metros de altura.
P/1 - E esse arrastão que você adquire quando você racha a sociedade?
R - Não, a gente divide todo o peixe que sai, menos o robalo e a pescada.
P/1 - Ah não, mas nos 29 anos?
R - Como assim?
P/1 - Que você tinha uma sociedade com sua família, né?
R - Já vem antes. Já vem antes. Eu já pescava com o meu irmão mais velho, porque ele tinha arrastão de praia, não eu. Entendeu? Mas eu ajudava ele, eu era ajudante dele, do Alexandre, do mais velho. Então, desde os 22 anos, 21 anos, ele já puxava arrastão, ele. Eu não, meu negócio era mergulho e rede de espera. Aí, aos 21 anos, quando eu não fazia nenhum nem outro, eu ia pro arrastão de praia. Então, foi onde eu fui adquirindo a expertise de aprender como se faz. Quando eu aprendi como se faz, ele não pescava aqui. Eu falei, vou montar um arrastão em Santos. Aí, foi onde eu comecei em Santos emplacar. Mas eu já sabia pescar de cabo a rabo como se fazia.
P/1 - E isso foi quando? Que você começou aqui?
R - Eu tinha… 2001, 1999, acho que desde 1999. 1999, 2000 ou 1998, alguma coisa assim.
P/1 - E como que funciona? Vocês são um grupo de pessoas? Onde você encontrou esses outros pescadores?
R - Então, essa é uma parte bem polêmica, assim, porque elas vêm das periferias, são pessoas que precisam desse peixe para comer. Então, a gente chama de pesca de subsistência, é onde a gente estava hoje discutindo isso na APA Marinha. O que vem acontecendo? A pesca de subsistência é aquela pesca que você vai, se dedica a pesca para poder levar um peixe para comer. Então, o pessoal vai lá, faz aquele esforço de pesca, a gente pesca das 7 até umas 10 e meia, aí cada um leva 20 quilos de peixe, modo de dizer. Eles levam para comer mesmo, porque eles vêm de periferias, vêm de lugares que realmente não tem amparo nenhum. Eles não têm o que comer. Então, são pessoas necessitadas. Aí, um foi avisando o outro, foi avisando o outro, “Junior, Junior, Junior, Junior.” E como eu sou uma pessoa, entre aspas, assim, que não quero briga, sou aquele cara da paz, sou tranquilão. Eu já, sabe, quando você consegue passar o pano em tudo. “Pô, Junior, mas toma uma atitude.” Não, eu acho melhor o caminho da conversa. O caminho mais amigável. Então, sou um cara da paz, total. E aí eles foram se chegando a mim. E os outros arrastões, que tentaram me copiar, não conseguiram ir pra frente. Enquanto eu, na verdade, consigo agregar o maior número de pessoas. Então, assim, um avisa o outro. Nós temos quatro grupos no celular. Quatro grupos. Cada grupo é de um ano. Tem os grupos agora que foi formado esse ano, tem o grupo do ano passado, tem o grupo do outro ano. E todos eles têm cento e poucas pessoas. Se somar ali, tem umas quatrocentas pessoas. Às vezes tu vai pra praia, tem oitenta pessoas pescando. Às vezes tu vai pra praia e tem 30 pessoas pescando, tem 40, tem 20, tem 30, tem 40, depende do tempo. Hoje vai ter bastante, porque hoje o tempo está quente.
P/1 - E como que é coordenar essa quantidade de gente?
R - Não, você coordena… Então, você divide 20 pra cada lado da corda, que a corda faz um arco, ela faz um arco, aí você vem me mandando puxar. Conforme você vem me mandando puxar, quando você vê que a rede tá chegando, você já manda um lado embarcar pro barco. Aí, quando chega o meio, eu olho o que que tem que ser solto. Se tiver alguma tartaruga, prioridade, solta a tartaruga. Raia, solta a raia, solta isso, solta aquilo. O que que sobrou? Só peixe? Tira a rede pra fora, abre a rede e recolhe o peixe que esse peixe vai ser dividido. É assim que a gente trabalha. Tanto é que os biólogos que hoje estavam com a gente na reunião, todos eles trabalham comigo no arrastão de praia. Os biólogos me acompanham.
P/1 - Eles vão junto.
R - Eles vão junto. Muitas vezes eles pedem para ir junto.
P/1 - E qual que é a distância…?
R - Quase um quilômetro de distância da praia, a gente joga a rede. A gente vai, solta mil metros de cabo, solta. Depende do dia. Se tu vê que a tainha tá muito no raso, você joga o lance no raso. A 300 metros. Se tu vê que o peixe não tem pulando, o peixe não tá, aí você já... É expertise. Se você vê que o peixe tá por fora, você joga um quilômetro, puxar o cabo inteiro. Fala cabo inteiro. Joga o cabo todo. Aí, joga o cabo todo, dá o lance e puxa.
P/1 - E ainda hoje você mergulha?
R - Mergulho. Tenho até foto aqui do robalão que eu matei esse verão.
P/1 - Como que é o seu dia a dia? Tem dias que você decide fazer um arrastão de praia, tem dias que você decide mergulhar, como que é?
R - Verão, mergulho. Eu me dedico muito mais no mergulho, porque a água é quente. Inverno não dá pra mergulhar, não dá nem pra pôr o pé na água de tão gelada que tá. Então, não tem como. Eu me dedico mais no arrastão e nas redes de espera. No inverno. Mas como o mar tem sido muito rigoroso, essas mudanças climáticas têm sido muito severas. O que aconteceu esse ano? Uma coisa atípica de qualquer outro ano que eu já vi em 40 anos de pesca. Esse ano quase ninguém conseguiu pescar. Por quê? Porque é uma ressaca atrás da outra. Você viu que o mar invadiu Santos o tempo inteiro. Destruiu toda a orla da praia. O mar tem quebrado tudo. O mar não tem dado condição nenhuma. Já vai entrar outra ressaca agora. Acabamos de sair de uma. Já vai entrar outra. E isso aí, sucessivamente. Então, quando a gente acha que vai pegar um peixe, que o peixe demora um tempo para encostar na costa. Já está entrando outra frente fria. Então, a gente não tá conseguindo pescar. A gente tá patinando. Chama patinando. Não só eu, como outros pescadores de arrastão de praia, como outros pescadores de outras artes de pesca também. De boeira, tudo. Tá todo mundo no mesmo balaio. Tá todo mundo dependendo das condições climáticas. E as condições climáticas não estão ajudando.
P/1 - E como que é isso pra você?
R - Dificílimo, dificílimo. Porque financeiramente falando, você começa a ter um declínio. Que nem, eu tive que vender um barco. Eu tinha sete. Eu tive que vender um. Depois eu tive que vender o outro. Então, eu já fiquei com cinco. Eu já tive que vender dois barcos montados. Porque eu separo. Que nem, eu tenho um barco em Peruíbe, eu tenho um barco na Praia Grande, eu tenho um barco em Santos, eu tenho dois barcos na Boracéia. Então, eu separei todo o litoral norte. Quando o peixe não tá num lugar, eu corro pra outro. Quando não tá num outro lugar, eu corro pra outro. E assim eu faço. Eu intercalo. Eu sou um dos únicos pescadores que fez isso.
P/2 - Mas acontece de você estar pescando aqui em Santos com um barco e ter uma equipe pescando pra você em outro lugar, ou você sempre faz parte?
R - Eu sempre fazia parte. Hoje o meu irmão mais novo, por estar numa situação muito difícil, pediu pra mim pôr um barco em Peruíbe pra ele. Mas esse barco pra ele, eu vou acompanhar de perto. Que nem eu mandei montar hoje um carro, uma Savero, já para ir buscar o motor no Claudio da Claumar. Eu acompanho de perto. Até eu sentir segurança nele. Mas ele sabe pescar demais. Mas ele é meio bagunceiro. E eu gosto das coisas muito certas. E aí, como eu gosto das coisas muito certas, eu gosto de acompanhar de perto aquilo. Então, eu foco em acompanhar. Por enquanto. Como eu tô montando agora, acabei de montar, o barco acabou de entrar, nós já fizemos uma pescaria de cento e poucos quilos de robalo. Cento e poucos quilos de robalo, vários peixes, várias pessoas, nós fizemos uma divisão e tal. E de lá pra cá não pescamos mais, o mar não deu condição. Faz dois meses já. Um mês e meio já faz isso aí. E o mar não dá condição de pesca, ele não dá trégua. Aí, ele vai dar trégua amanhã. Aí eu já liguei pro cara da Saveiro, já falei: meu irmão, prepara a Saveiro que a gente já vai pra Peruíbe já. A gente só vai pegar o motor e já vamos pra lá.
P/1 - Você está indo amanhã?
R - Amanhã eu tô indo pra lá. Hoje eu pesco em Santos, amanhã eu já pesco em Peruíbe. E depois eu pesco na Boraceia. Já vou no final de semana pra Boracéia.
P/1 - Não para?
R - Não para. Cada hora num lugar, quando dá a condição. Quando não dá, o negócio é assistir Netflix. Aí não tem outra opção.
P/1 - E normalmente você pesca de noite ou de dia?
R - Muitas vezes à noite, final de tarde para noite.
P/1 - Por que?
R - Porque é um horário que o peixe bate na rede. Porque de dia o peixe enxerga a rede. E à noite o peixe não enxerga a rede. Então, a maioria das vezes você pesca à noite. Você pode até armar uma rede de dia, você vai pegar 10 quilos. Se você arrumar uma rede à noite você mata 100 quilos. É assim que funciona. Robalo então, de dia é quase impossível, é difícil. O robalo é o peixe mais esperto que tem. Ele para. Ele não é um peixe que nada o tempo inteiro que nem a tainha. Ele é um peixe que para. Então, se ele ver a rede ali, ele para aqui, ele vira e sai na manha e não bate. Ele não pega na rede. De dia. Agora à noite ele pega.
P/1 - E quais são os nomes dos seus barcos?
R - Robalo, Robalo Primeiro, Mariela, José Luiz, Ângela, são esses barcos agora que estão...
P/1 - Quem que é a Ângela?
R - A Ângela é minha mãe. José Luiz eu coloquei em nome do meu pai, que é o mesmo nome meu e do meu filho. Meu filho também tem o meu nome.
P/1 - O mais novo?
R - O mais novo. Ele é neto. José Luiz Mendes Neto.
P/1 - Você tem alguma outra história com o mar que você queira contar?
R - Minha ligação com o mar, assim, referente? Não. É uma ligação muito forte que eu tenho, que eu amo o mar de paixão, assim, gosto do que eu faço, com todo o amor do mundo, faço por carinho, hoje. Porque está difícil de trabalhar, cada vez mais difícil de trabalhar, devido às condições climáticas. Mas é o que eu falei para o Rocha, desistir nunca. Vamos sempre estar tentando. “Rocha, nunca vimos isso acontecer. Nós estamos há quanto tempo aí sem pegar peixe, só lixo.” Mas vamos continuar pescando, uma hora vai melhorar, vamos acreditar. Porque muitos pescadores estão vendendo barco, embarcação, estão vendendo tudo e saindo da pesca. Aí, perguntaram numa dessas reuniões em São Paulo, agora, na Alesp… Eu fui pra Alesp, e lá foi falado, vários pescadores tiveram direito a fala na Tribuna. E muitos pescadores não querem que o filho seja pescador, porque não vê futuro na pesca. Então, como tu vai criar teu filho na pesca, sendo que tu não vê futuro na pesca? Você não vai querer aquilo pro teu filho. Tu vai querer uma coisa boa pro teu filho. E não vai querer a pesca. A pesca tá cada vez mais difícil.
P/1 - Você tem histórias com outros pescadores, colegas, assim? Alguma significativa que você queria contar?
R - Ah, eu tenho várias histórias de pescadores. Eu conheço muitos pescadores de todo o litoral. Eu sou uma pessoa que foi pra Brasília representar os pescadores, representei a Colônia, o Senhor Okida, que tinha uma mesa, que era o presidente da nossa Colônia, era japonês. Ele fez um cheque até pra doação para minha viagem, pra me representar Brasília, para mim representar a pesca, o quanto tava difícil. Que antigamente, eles fizeram uma lei que você só podia pescar uma milha da costa. Como você vai pescar só uma milha da costa? Você inviabiliza um monte de pescador artesanal. A pesca artesanal pela Marinha, você tem que pescar dentro de uma milha. Isso a Marinha fala. Aí, chega o governo federal e fala que você tem que pescar pra fora de uma milha. Não tem lógica. Um fala uma coisa, outro fala outra. Aí, se você pesca para dentro, a polícia ambiental te pega, leva tua rede, leva tudo que é teu. E se tu pescar pra fora, quem te leva é a Marinha. Aí, você fica entre o fogo cruzado. E nisso eu fui defender a 166. Nós fomos defender e ganhamos. O estado de São Paulo foi o único estado que conseguiu quebrar a regra. De uma milha para 500 metros. Junto com a APA marinha.
P/1 - E aqui? A sua relação com a Colônia?
R - Perfeita, desde pequenininho... Desde pequenininho eu frequento essa Colônia com a maior carinho do mundo. A Doraide me colocou como representante da APA Marinha desde 2008, na verdade 2008 já representava. 2009 mais ou menos. Como conselheiro da APA. Aí, como eu estava sendo muito visado, porque eu quebrava altos paus lá, porque é assim, você tem várias entidades, e as entidades se defendem ao máximo. Tem entidade que cada um defende o seu interesse. Cada um tem seus interesses ali. E nosso interesse é a pesca. Tem uns que querem defender a pesca. Eles recebem dinheiro da Petrobras para defender a pesca. Para defender a pesca. Eu não vou nem citar aqui os nomes, vou evitar de citar nomes, porque eu acho que eles fazem um excelente trabalho também. Independente das nossas diferenças, eles na pesca, a gente na pesca, eles na defensoria da pesca, eles fazem excelente trabalho. Só que existem lados opostos, e muitas vezes não entendem o lado do pescador. O pescador precisa pescar. Ele nasceu para aquilo. Tem muitos pescadores que nasceram na pesca, nas comunidades pesqueiras. Eles não sabem fazer outra coisa, a não ser ir pescar. Outros não, outros têm trabalho. Eles são diferenciados daqueles que são realmente tradicionais. Eu sou tradicional, eu vivo da pesca a vida inteira. Eu não tenho outra profissão a não ser a pesca artesanal. Então, minha relação com a Colônia vem desde os sete anos de idade, nove anos de idade, que meu irmão veio tirar carteira de pesca e eu tava aqui. A Doraide nem trabalhava aqui. Quando a Doraide veio trabalhar aqui, ela já me conheceu. Pergunta pra ela depois. Aí, eu fui representante. Tudo que eu preciso, a Colônia sempre está de braços abertos pra me acolher. Tu viu ela mostrando o áudio, você percebeu? Ela já discutindo comigo sobre leis ali. A gente já estava discutindo sobre o que a gente vai defender. Porque a gente trabalha junto, a gente trabalha em conjunto. Como eu sou um cara que eu entendo bem e o Rocha entende muito bem e fala muito bem. Rocha pescava comigo. Eu falei: Rocha, eu estou sendo muito visado. É o seguinte, você entra no meu lugar e fica representando no conselho a APA Marinha, você responde por mim e a gente vai conversando, eu vou te auxiliando, eu te ensino tudo que você tem que aprender e tal. Ele falou: ô Júnior, eu adoro uma briga. Ele fala: briga é comigo mesmo. Se tiver que brigar, eu brigo. Mas eu tenho o que perder? Eu tenho os barcos. Ele não tem nada. É o que eu falo pra ele, a minha diferença de você é que eu viro o alvo. Você não vai virar alvo. E eu falo pra ele isso. Eu não, pra mim é muito mais complexo o negócio. “Rocha, você representa?” Ele representou mas com uma excelência. O Rocha é uma pessoa espetacular para representar o Conselho da APA. Hoje aí, coloquei ele no GERCO também, ele representa o GERCO, Gerenciamento Costeiro, e ele representa a Praia do Góis também. Ele representa três entidades aí. Praia do Góis, a Colônia, na APA Marinha, dentro do Conselho, que eu estava hoje, e o Gerco, o Gerenciamento Costeiro, que é importantíssimo para a nossa Baixada Santista. Que eles fazem as diretrizes do que eles vão trabalhar. E para não atacarem a pesca, a gente tem que ter uma cadeira lá. E o Rocha é o nosso representante. Eu não quis mais ser representante. Eu falei: eu deixei disso, Rocha. Muita dor de cabeça, perseguição, bate-boca com pessoas que eu não posso discutir, pessoas poderosíssimas. E eu não quero mais discutir mais nada, nada. Eu não quero mais briga com ninguém. Eu quero paz. Eu quero chegar pra eles e cumprimentar eles numa boa. Pelo trabalho de excelência que eles fazem.
P/1 -Quais são os seus sonhos?
R - Meus sonhos é que essas leis realmente foram feitas sobre a pesca, eles reconheçam as comunidades tradicionais, assim como realmente pessoas que precisam da pesca, pessoas que necessitam, respiram a pesca. Então, eles precisam enxergar isso, que não adianta fazer lei, fazer lei atrás de uma mesa sem nem mesmo entender a profissão de pescador…
P/1 - Bora? Júnior, você estava falando dos seus sonhos. Se você quiser continuar a sua resposta...
R - Não, o que eu gostaria muito assim, do governo federal, como já tinha falado, é que ele visse um pouco mais o lado do pescador artesanal, dos caiçaras tradicionais. Devido a essas leis, realmente, sem nenhum empecilho para a pesca artesanal. E a pesca artesanal não ser vista, como foi falado em Brasília para mim, e a ação industrial é vista, porque a industrial tem sindicato, a industrial é muito forte e artesanal não. E por artesanal não ser vista, há essas leis que acontecem atrás do balcão por pessoas que não sabem realmente uma realidade do pescador. Então, o quanto fica difícil para o pescador entender tudo isso. São leis arbitrárias, como você pode pescar uma milha, sendo que a marinha proíbe você de uma milha. Então, como dá pra fazer uma lei dessa? Como dá pra fazer outras leis também, que agora eles estão fazendo, que são outros absurdos, que nem a Portaria 445, que proíbe quase todos os peixes? Peixes tradicionais, caiçaras, que nem a garoupa, que nem a anchova, vários outros peixes que foram proibidos. Fica difícil da gente poder entender no Brasil o que é promover a pesca, sendo que eles proíbem quase todos os peixes. Então, sem estudo, porque a gente não vê um estudo, ninguém procura um pescador para saber se tem estudo ou não sobre aquele peixe. Eles falam que a raia ticonha está em proibição, proibido. Uma das espécies da raia ticonha. A gente sabe que a raia ticonha tem demais, é um peixe que tem em abundância. Uma raia que tem em abundância. Entendeu? Então a gente sabe que tem coisas, assim, que no Brasil não acontecem. Eles fazem as leis e assim as leis prevalecem e acabam prejudicando o pescador artesanal. O industrial não, porque o industrial, o foco dele é outro. O foco dele, na verdade, é coisa grande. O sonar dos caras custa 2 milhões, 3 milhões de reais, a rede custa 20. Então, nós estamos falando de coisas astronômicas na pesca industrial. E assim, cada barco, o do Safe Junior lá, então, custa horrores. Ele acabou de fazer um barco agora que é cinematográfico. Ele gastou uma fortuna pra fazer aquele barco. É diferente do pescador artesanal. Isso quem tem que entender é o governo federal. E o governo federal não vê a pesca artesanal. Essa é a minha tristeza. Eu queria que realmente o governo federal visse a pesca artesanal como precária, porque está numa situação precária devido às condições climáticas, devido a tudo aquilo que a gente vem vivendo. E assim, ela tende a acabar. Se o governo federal continuar batendo na tese, e em várias teses que nem ele bate, em várias leis que realmente não condizem a realidade, a pesca artesanal tende a acabar.
P/1 - Júnior, quais são os seus maiores aprendizados em relação ao mar?
R - Referente ao mar, é o respeito. Em primeiro lugar vem o respeito. Porque o mar, ele te impõe respeito e você tem que respeitá-lo. Como eu te falei que eu afundei várias vezes, o mar é muito sério. Que nem eu contei em Ilhabela, três dias no mar, tudo que eu venho passando, tem muito mais ainda, muito mais história. Se a gente fosse contar história, a gente ficaria dias aqui contando história de pesca. Porque eu tenho muitos anos de pesca. Mas assim, é respeito. A palavra certa é respeito.
P/1 - E pra gente finalizar, como foi essa experiência pra você? De contar um pouco dessa história?
R - Muito bacana, muito legal a gente contar os impasses, os empecilhos, contar as partes boas da pesca, o quanto já foi abundante, o quanto a gente já pescou, viveu da pesca todo esse tempo, conseguiu sobreviver todo esse tempo da pesca. É muito bacana, muito bom. Foi muito bom. Muito bom.
P/1 - Eu te agradeço demais.
R - Obrigada. Obrigado vocês por tudo também. Obrigado por tudo.
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