Minha Infância Que o Diga
Autor: Robson de Andrade
Introdução
Minha infância foi marcada por dor, abandono e resistência. Desde pequeno, enfrentei situações que nenhuma criança deveria vivenciar. Meu pai era extremamente violento. Acreditava em tudo que os vizinhos diziam, sem nos ouvir, e nos agredia fisicamente com vara de goiaba, pedaços de sofá (chulapa) e até com fio de máquina de costura. Eu e meus seis irmãos vivíamos com medo, sem proteção e sem afeto.
Ausência de Apoio
Entre os anos de 1984 e 1994, dos meus 8 aos 18 anos, o sofrimento foi constante. Nunca ouvi falar em Conselho Tutelar. Não havia ninguém para denunciar meu pai. Éramos invisíveis aos olhos da sociedade.
Minha mãe participava de um programa do governo que distribuía sopa no posto para famílias em situação de vulnerabilidade. Contudo, com tantas bocas para alimentar, a sopa não durava uma semana. Vivíamos de pão duro, angu e restos de comida descartados pelo antigo mercado Cristal, localizado em Edson Passos, Mesquita - RJ.
Desigualdade e Sacrifício
Enquanto eu e meus irmãos passávamos fome, meu pai oferecia conforto e recursos para outra família. Meus irmãos e irmãs por parte de pai — pelo que sei — nunca enfrentaram necessidade. Inclusive, até a neta dele, dessa outra família, tinha tudo: alimentação, roupas, brinquedos e atenção. Já nós, nunca tivemos nada.
Os irmãos e irmãs de meu pai, que também são nossos parentes por parte de pai, jamais se dispuseram a ajudar. Observavam de longe, em silêncio, enquanto minha mãe e nós, seus sobrinhos, enfrentávamos dificuldades extremas, sem qualquer tipo de apoio ou solidariedade familiar. Não faziam absolutamente nada.
Sem alternativas, minha mãe foi obrigada a trabalhar em casas de família, em condições análogas à escravidão. Ela saía de casa ainda de madrugada e voltava tarde da noite. O pouco que ganhava mal dava para comprar comida....
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Minha Infância Que o Diga
Autor: Robson de Andrade
Introdução
Minha infância foi marcada por dor, abandono e resistência. Desde pequeno, enfrentei situações que nenhuma criança deveria vivenciar. Meu pai era extremamente violento. Acreditava em tudo que os vizinhos diziam, sem nos ouvir, e nos agredia fisicamente com vara de goiaba, pedaços de sofá (chulapa) e até com fio de máquina de costura. Eu e meus seis irmãos vivíamos com medo, sem proteção e sem afeto.
Ausência de Apoio
Entre os anos de 1984 e 1994, dos meus 8 aos 18 anos, o sofrimento foi constante. Nunca ouvi falar em Conselho Tutelar. Não havia ninguém para denunciar meu pai. Éramos invisíveis aos olhos da sociedade.
Minha mãe participava de um programa do governo que distribuía sopa no posto para famílias em situação de vulnerabilidade. Contudo, com tantas bocas para alimentar, a sopa não durava uma semana. Vivíamos de pão duro, angu e restos de comida descartados pelo antigo mercado Cristal, localizado em Edson Passos, Mesquita - RJ.
Desigualdade e Sacrifício
Enquanto eu e meus irmãos passávamos fome, meu pai oferecia conforto e recursos para outra família. Meus irmãos e irmãs por parte de pai — pelo que sei — nunca enfrentaram necessidade. Inclusive, até a neta dele, dessa outra família, tinha tudo: alimentação, roupas, brinquedos e atenção. Já nós, nunca tivemos nada.
Os irmãos e irmãs de meu pai, que também são nossos parentes por parte de pai, jamais se dispuseram a ajudar. Observavam de longe, em silêncio, enquanto minha mãe e nós, seus sobrinhos, enfrentávamos dificuldades extremas, sem qualquer tipo de apoio ou solidariedade familiar. Não faziam absolutamente nada.
Sem alternativas, minha mãe foi obrigada a trabalhar em casas de família, em condições análogas à escravidão. Ela saía de casa ainda de madrugada e voltava tarde da noite. O pouco que ganhava mal dava para comprar comida. Muitas vezes, trazia apenas restos de alimentos. Mesmo debilitada física e emocionalmente, ainda era agredida.
A Luta pela Sobrevivência
Meu irmão mais velho, Rosivaldo, foi um verdadeiro guerreiro. Começou a vender salgados para ajudar nossa mãe a alimentar a família. Foi uma luz em meio à escuridão.
Quando meu pai ficou doente, já sem pernas, foi abandonado pela antiga esposa — aquela que ele tanto amava e com quem teve apenas dois filhos. Ela o deixou no portão da nossa casa, numa cadeira de rodas, sem roupas, apenas com seus documentos. Mesmo assim, ele dizia que não queria ficar.
Reconstrução e Injustiças
Como filho que sofreu tanto nas mãos dele, não aceitava sua presença. Quase entrei em conflito com minha mãe. Mas ela, cristã e usada por Deus, o acolheu.
No início, ele era como um estranho em um ninho que não ajudou a construir. A única contribuição que deu foi um caminhão de pedra para a construção da casa onde moramos atualmente. A obra foi iniciada por meu avô Jair. Eu e meus irmãos ajudamos nossa mãe a concluir. Aprendi a ser ajudante de pedreiro e a trabalhar com obras. Com muito esforço, conseguimos levantar aquele lar, onde alguns de nós ainda residem.
Denúncia e Reflexão
Apesar de tudo que fizemos por ele, fomos denunciados por maus-tratos e por supostamente tê-lo abandonado no hospital. A verdade é que todos os filhos da minha mãe, inclusive eu, estávamos trabalhando com carteira assinada, o que dificultava o acompanhamento diário. No entanto, minha mãe e minha irmã sempre o visitavam.
O mais triste é que os irmãos e irmãs dele, que nunca fizeram nada por nós, foram os responsáveis pela denúncia. É irônico que, após tudo que o irmão deles fez, só agora acharam o caminho da denúncia.
Conclusão
Este relato não tem o objetivo de causar pena, mas sim de mostrar a realidade de muitas crianças e mulheres que vivem em silêncio. Sou prova viva de que é possível resistir, mesmo quando tudo parece estar contra nós. Ao compartilhar minha história, espero que ela sirva de alerta, reflexão e, quem sabe, inspiração para quem passou ou está passando por algo semelhante.
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