VidaÉ engraçado como a vida só faz sentido diante da morte...
Meu pai foi um sobrevivente. Abandonado, desprezado, menosprezado por toda uma vida. No entanto, de bondade e integridade singulares. Nunca soube abraçar, pois nunca foi abraçado; nunca soube brincar, porque só trabalhou desde os 7 anos de idade, obrigado a ser responsável e cuidar dos filhos da família que o criara. Desconhecia que não era filho de sangue... Só sofria as injustiças de uma infância perdida...
A situação dele só piorou. Perdeu a mãe adotiva no dia de seu aniversário, o que o fez repudiar datas festivas até a sua morte.
Meu pai, foi de uma generosidade incomparável! Nunca comeu nada diante de outro ser, mesmo que fosse um animal, sem dividir. Caso, fosse um dos três filhos, deixava de comer para ceder a nós.
Trabalhava de sol a sol e, quando chegava em casa, fazia o possível para construir para nós, uma habitação decente.
Quantas vezes, o vi chegar do trabalho, com a marmita azeda... Sabia que, naquele dia, mesmo com o trabalho duro e suado, não havia se alimentando. Isso me doia a alma.
Poderia passar horas falando dessa pessoa incrível que foi meu pai, de cada sofrimento e de cada lágrima que derramamos, mas a morte dele foi emblemática para mim.
Meu pai nunca admitia sentir dor, por isso, só descobrimos o câncer quando ele não conseguiu mais esconder sua dor. Foram três meses de um sofrimento intenso. Ele chorava em silêncio por não conseguir engolir a comida; já não respirava direito e mal andava. Três meses... Em três meses...
Não tinha religião, dizia que acreditava em Deus e bastava.
No dia 1° de agosto de 2020, foi o último dia que o vi com vida... E, que dia!! Os três filhos, os genros e a nora ao redor dele. Além da esposa, parceira por 49 anos. Sem esperar, chegaram a irmã adotiva e os sobrinhos que não via há mais de vinte anos; a sobrinha querida por parte de minha mãe também apareceu na mesma tarde para...
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Vida
É engraçado como a vida só faz sentido diante da morte...
Meu pai foi um sobrevivente. Abandonado, desprezado, menosprezado por toda uma vida. No entanto, de bondade e integridade singulares. Nunca soube abraçar, pois nunca foi abraçado; nunca soube brincar, porque só trabalhou desde os 7 anos de idade, obrigado a ser responsável e cuidar dos filhos da família que o criara. Desconhecia que não era filho de sangue... Só sofria as injustiças de uma infância perdida...
A situação dele só piorou. Perdeu a mãe adotiva no dia de seu aniversário, o que o fez repudiar datas festivas até a sua morte.
Meu pai, foi de uma generosidade incomparável! Nunca comeu nada diante de outro ser, mesmo que fosse um animal, sem dividir. Caso, fosse um dos três filhos, deixava de comer para ceder a nós.
Trabalhava de sol a sol e, quando chegava em casa, fazia o possível para construir para nós, uma habitação decente.
Quantas vezes, o vi chegar do trabalho, com a marmita azeda... Sabia que, naquele dia, mesmo com o trabalho duro e suado, não havia se alimentando. Isso me doia a alma.
Poderia passar horas falando dessa pessoa incrível que foi meu pai, de cada sofrimento e de cada lágrima que derramamos, mas a morte dele foi emblemática para mim.
Meu pai nunca admitia sentir dor, por isso, só descobrimos o câncer quando ele não conseguiu mais esconder sua dor. Foram três meses de um sofrimento intenso. Ele chorava em silêncio por não conseguir engolir a comida; já não respirava direito e mal andava. Três meses... Em três meses...
Não tinha religião, dizia que acreditava em Deus e bastava.
No dia 1° de agosto de 2020, foi o último dia que o vi com vida... E, que dia!! Os três filhos, os genros e a nora ao redor dele. Além da esposa, parceira por 49 anos. Sem esperar, chegaram a irmã adotiva e os sobrinhos que não via há mais de vinte anos; a sobrinha querida por parte de minha mãe também apareceu na mesma tarde para apresentar o filho que ele não conhecia; o cunhado e a cunhada que haviam parado de falar com ele por motivo fútil, foram pedir perdão, e, meu pai que nunca havia falado de religião, pediu uma oração...
Infelizmente, não participei desse último ato. Tive que sair para comprar insulina para meu filho diabético. Depois que todos saíram, meu pai, que não admitia a dor, pediu para ir para o hospital...
Nunca mais o vi... Foram dez dias de internação hospitalar sem visitas, por conta da COVID. A única certeza que tenho é que a pessoa que mais merecia o céu, se foi em paz. Sem débitos nem pendências. Presenteado com uma família unida e amorosa...
Escrevo sobre meu pai por não ter me despedido como queria se soubesse que não o veria de novo. Arrependo-me de não tê-lo abraçado com força e dito o quanto o amava e admirava. Não disse que ele era meu herói. Não disse que ele era o meu sentido de vida, meu exemplo, meu pai. Não precisava do abraço físico durante a minha infância! Ele me abraçou com exemplos e com um amor silencioso que carrego até hoje.
Morte
Continuo a falar do meu pai. Como já escrevi na história anterior, ele morreu em agosto de 2020, quando não podíamos visitá-lo. Totalmente isolado e sedado. No dia anterior à sua morte tive um sonho: sonhei que chegava até a vidraça do meu quarto e via uma luz no portão e começando a subir as escadas. Acordei assustada. Sabia que era meu pai.
No dia da sua morte, o sonho se repetiu: a luz já estava bem mais perto da porta. Queria falar comigo. Despertei assustada novamente.
Descobri que, na primeira noite, foi a primeira parada cardíaca que ele teve. Quase morreu, mas voltou. Durante o segundo sonho, exatamente quando chegava perto da porta, ele morreu. Como me arrependo de ter tido medo e, pela segunda vez, não ter me despedido do meu pai...
Fé
Hoje, quando penso em fé, quando imagino na vida pós morte, quero ver meu pai. Quero encontrá-lo novamente e pedir perdão por ter medo.
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