Sou Isaías Borja, conhecido por meu nome étnico Xipu Puri. Sou historiador, escritor, produtor e músico experimental. Nasci numa família de músicos, no interior de Minas Gerais e atualmente moro em uma das maiores cidades do mundo, São Paulo. Sou Puri, mas nem sempre soube disso. Entretanto, cresci sabendo do meu pertencimento indígena, pelas memórias que chegaram a mim, pela minha mãe e meus avós. Fomos, como muitos parentes de outras etnias, sendo empardecidos, afastados dessa relação com nossas origens por conta dos estereótipos que buscaram cristalizar imagens do que faz uma pessoa ser autenticamente indígena. E por não sermos assim, engessados em tempos, representações e narrativas alheias à nossa realidade, não havia uma identificação em termos de autoafirmação nas novas gerações. Há uma linha tênue que separa descendente de pertencente e quando entrei na Universidade, para cursar História, compreendi muita coisa. Conhecer os movimentos indígenas pelo mundo e toda luta pela restituição de nossa própria episteme, no coração de nossos povos e territórios, foi o caminho para que eu me encontrasse no mundo como uma pessoa na história da humanidade. Antes, era tudo meio turvo, pois há ainda hoje um grande deslocamento entre o conhecimento desenvolvido nas universidades, em relação ao que chega nas escolas ou localidades mais afastadas dos grandes centros urbanos. Hoje, como artista que transita entre várias linguagens e como intelectual, compreendo “nosso corpo é memória de nosso povo” e tenho por princípio semear, como um passarinho, o que tenho aprendido desde menino.