Memória dos Trabalhadores da Bacia de Campos
Depoimento de Heitor Garcia Júnior
Entrevistado por Douglas Thomaz
Macaé, 18 de junho de 2008
Realização Instituto Museu da Pessoa.Net
Entrevista PETRO_CB423
Transcrito por Michelle de Oliveira Alencar
P/1 – Queria que você começasse falando o seu nome completo, o local e a data do seu nascimento.
R – Tá, o meu nome é Heitor Garcia Júnior, eu nasci em Santo André, no dia 08 de junho de 1954.
P/1 – Qual a sua formação?
R – Eu sou formado engenheiro civil, fiz uma pós-graduação dentro da Petrobras, em 1980, em engenharia de petróleo durante dois anos. E depois de uns nove anos, em 89, 90 eu fui pra Unicamp e fiz um mestrado, pela Petrobras, um mestrado em engenharia de petróleo na Faculdade de Engenharia Mecânica da Unicamp, me formei mestre.
P/1 – Tá. Heitor, eu queria então agora pra gente começar que você falasse um pouco de quando e como você entrou na Petrobras, o seu ingresso na Petrobras.
R – 1979 eu estava me formando na Faculdade de Engenharia da Fundação Armando Álvares Penteado em São Paulo Capital, e era um momento muito difícil pra carreira de engenheiro na época. Eu me lembro muito bem que, nessa época, arranjar um emprego era uma coisa muito difícil, e eu estava no final do meu curso de engenharia civil procurando lugares pra trabalhar, e eu me lembro muito bem que a melhor proposta de emprego foi pra ganhar 10 mil unidades de dinheiro, na época que eu não lembro se era Cruzeiro, eram 10 mil alguma coisa pra trabalhar como fiscal de obra, de obra civil. E ao final do ano um amigo meu que estudava junto comigo falou assim: “Heitor, tá tendo um concurso pra Petrobras, vamos fazer?” Eu falei: “Ah vamos”, eu nem sabia do que se tratava, né, na época. Naquela época a Petrobras começou a descobrir algumas coisas aqui na Bacia de Campos, né? Eu me lembro até que o Shingeaki Ueki, que era o Ministro das Minas e Energia, ele chegou a fazer uma...
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Depoimento de Heitor Garcia Júnior
Entrevistado por Douglas Thomaz
Macaé, 18 de junho de 2008
Realização Instituto Museu da Pessoa.Net
Entrevista PETRO_CB423
Transcrito por Michelle de Oliveira Alencar
P/1 – Queria que você começasse falando o seu nome completo, o local e a data do seu nascimento.
R – Tá, o meu nome é Heitor Garcia Júnior, eu nasci em Santo André, no dia 08 de junho de 1954.
P/1 – Qual a sua formação?
R – Eu sou formado engenheiro civil, fiz uma pós-graduação dentro da Petrobras, em 1980, em engenharia de petróleo durante dois anos. E depois de uns nove anos, em 89, 90 eu fui pra Unicamp e fiz um mestrado, pela Petrobras, um mestrado em engenharia de petróleo na Faculdade de Engenharia Mecânica da Unicamp, me formei mestre.
P/1 – Tá. Heitor, eu queria então agora pra gente começar que você falasse um pouco de quando e como você entrou na Petrobras, o seu ingresso na Petrobras.
R – 1979 eu estava me formando na Faculdade de Engenharia da Fundação Armando Álvares Penteado em São Paulo Capital, e era um momento muito difícil pra carreira de engenheiro na época. Eu me lembro muito bem que, nessa época, arranjar um emprego era uma coisa muito difícil, e eu estava no final do meu curso de engenharia civil procurando lugares pra trabalhar, e eu me lembro muito bem que a melhor proposta de emprego foi pra ganhar 10 mil unidades de dinheiro, na época que eu não lembro se era Cruzeiro, eram 10 mil alguma coisa pra trabalhar como fiscal de obra, de obra civil. E ao final do ano um amigo meu que estudava junto comigo falou assim: “Heitor, tá tendo um concurso pra Petrobras, vamos fazer?” Eu falei: “Ah vamos”, eu nem sabia do que se tratava, né, na época. Naquela época a Petrobras começou a descobrir algumas coisas aqui na Bacia de Campos, né? Eu me lembro até que o Shingeaki Ueki, que era o Ministro das Minas e Energia, ele chegou a fazer uma palestra na minha faculdade, né, falando nesta questão do petróleo. E eu fui fazer esse concurso assim sem muitas pretensões, e quando veio o resultado eu fiquei até surpreso que acho que no final de outubro, em novembro de 79 eu vi o resultado do concurso e tive a felicidade de ver que eu tinha entrado na Petrobras. E pra ganhar 30 mil alguma coisa naquela época, é quase três vezes o que eu iria receber como fiscal de obra, né? E ao longo desses 29, quase 29 anos, né, passei por muitas experiências dentro da Petrobras, trabalhei em vários lugares. Eu saí de São Paulo, fui trabalhar em Salvador onde nós fizemos nosso curso de formação. Nesse curso de formação tinha um período de nove meses que a gente trabalhava como peão nas plataformas, hoje isso não existe mais. A gente trabalhava como plataformista, como torrista, como sondador, fazia o revezamento de turma, andava nas caçambas de caminhão no Recôncavo Baiano, passava frio nas madrugas baianas, e ficava em alojamentos precários. A questão de SMS era muito mal tratada naquela época, a gente se preocupava muito com as sondas perfurando em terra, com os dejetos sendo jogados de maneira descuidada nos diques, né, de perfuração. Embora a gente já como recém-formado, já tendo uma certa consciência ambiental, a gente se preocupava que as coisas não caminhavam muito bem. E hoje a Petrobras já tá querendo ser assim uma excelência em termos de cuidados ambientais, né?
P/1 – E quando você veio pra Bacia de Campos?
R – Ah sim, isso. A minha história dentro da Petrobras ela teve vários caminhos. Depois desses dois anos que eu passei na Bahia me formando, eu vim pro Rio de Janeiro trabalhar na sede, e fazia alguns embarques eventuais aqui na Bacia de Campos, isso foi em 1982. Era uma espécie de formação que a gente tava tendo, né? E depois de um ano no Rio de Janeiro havia a necessidade de profissionais em várias partes do Brasil, inclusive na Amazônia. Aí eu fui pra Amazônia, em 83, e fiquei até 87 quando houve a descoberta lá dos poços de Rio Ourucu, até trabalhava na perfuração nas sondas de selva, na costa do Pará e Maranhão, cheguei a trabalhar até no Acre, né, uma distancia enorme. Pra você ter uma idéia saindo de Belém pro Acre era mais distante do que de Belém ao Rio de Janeiro, né, parece incrível mas. E se não fosse eu estar trabalhando na Petrobras jamais teria conhecido aquelas regiões tão distantes, né? E depois eu vim, vim pro Rio de Janeiro, foi a época que eu fiz o mestrado também em Campinas. E a coisa de uns 10, 11 anos atrás eu vim trabalhar embarcado aqui na Bacia de Campos e estou aqui até agora, eu não embarco mais, agora eu coordeno uma equipe de 15 engenheiros e estamos aí na...
P/1 – E qual foi a sua função quando, desse primeiro momento de embarque que você fazia?
R – Aqui?
P/1 – Aqui na Bacia de Campos, é.
R – Eu embarcava como técnico de pescaria.
P/1 – O quê que era um técnico de pescaria?
R – A pescaria quando você tem alguns problemas em poços que se perfuram, em poços que se completam, às vezes alguns detritos ficam dentro dos poços impedindo que você desça novos equipamentos, ou que você consiga produzir esse petróleo dentro desses poços. Então você tem umas técnicas pra desobstruir esses poços, por isso que é chamado pescaria, os pedaços de ferro que ficam dentro do poço é chamado de peixe, né, por isso a gente tem que ir lá e pescar, então eu trabalhei nessa área. Depois a coisa de uns seis, sete anos é que eu me voltei pra área de perfuração direcional.
P/1 – E o quê que é exatamente essa perfuração? Dá pra você explicar um...
R – Perfuração, especificamente perfuração direcional é você conseguir alcançar um ponto no reservatório que os profissionais da área de reservatório, da área de geologia determinam pra ser drenado um poço, por exemplo. Então, imagine que você tenha que perfurar a partir de um ponto e navegar, como se fosse um avião mesmo, né, um avião você navega mexendo as asas, né, mexendo o bico e fazendo essas curvaturas, e esse tipo de navegação é feito dentro da rocha com equipamentos específicos, né, são brocas, são ferramentas chamadas defletoras que vão se direcionar num determinado direção que a gente precisa que ela seja perfurada. Só que a velocidade de navegação é infinitamente inferior a de um avião, né, a gente perfura 10, 15 metros por hora.
P/1 – Uma navegação vertical, horizontal?
R – É, você navega em qualquer direção dentro da rocha perfurando.
P/1 – E esse processo lá desde o início até hoje teve muitas mudanças em termos de tecnologia e de trabalho mesmo?
R – A tecnologia ela ajudou bastante tanto pra você direcionar essa ferramenta dentro da rocha, nós temos ferramentas modernas que conseguem com sensores computacionais fazer com que algumas valetas empurrem a broca lá embaixo, a coluna de perfuração e vá na direção que você precise. Antigamente pra se determinar qual era a posição da broca eu precisava descer, dentro dessa coluna, descer uma ferramenta que tirava uma espécie de foto lá embaixo e essa foto ela utilizava a gravidade da terra, ela utilizava a orientação de uma bússola, por exemplo, né, e esses instrumentos lá embaixo eles tiravam uma espécie de uma fotografia que em cima ela era revelada e o técnico observava aquelas medições e sabia pra que direção e em que inclinação que estava aquele determinado ponto. Hoje em dia nós temos tecnologia que essa informação vem em tempo real, nós temos acelerômetros que são posicionados lá embaixo que eletronicamente enviam sinal através do fluído de perfuração, e na superfície computadores eles captam essas informações como num código Morse, decodificam isso e dão informação em tempo real pro perfurador direcional. Então a tecnologia ela tá permitindo que se façam trajetórias complicadas, né, dentro da rocha, coisa que a uns tempos atrás não era possível, né?
P/1 – E, Heitor, desse tempo seu de embarcado como é que era a vida na plataforma, a coisa da distância, saudade da família?
R – Você trabalhar embarcado você tem que ter um equilíbrio emocional muito grande, porque você vai estar privado de encontrar os seus amigos, os seus familiares, né, e você sabe que são, na maioria das vezes, são duas semanas embarcadas e você tem que conviver com um número fixo de pessoas. É quase que um Big Brother só que sem essa invasão das câmeras te filmando o tempo todo, mas você tem que conviver com um número fixo de pessoas e tem que se dar bem com elas, porque você vai tá almoçando, jantando, tomando café constantemente com essas mesmas pessoas. Se a pessoa que embarca ela focar a atenção dela no resultado do trabalho que ela tá executando o tempo passa bem tranqüilo, né?
P/1 – Você lembra de alguma história marcante que tenha ocorrido esses anos de trabalho?
R – O que marca muitas vezes é, às vezes, a perda de um ente querido e você está embarcado e você não haverá tempo de você desembarcar pra ir num funeral. Por exemplo, o pai da minha esposa eu não pude ir, né? Tenho vários colegas que tiveram filhos que nasceram e eles estavam embarcados. Tem esses problemas, né? Eu me lembro uma vez que eu estava numa unidade de cimentação e estávamos deslocando lá uma pasta e era meia-noite e o operador falou assim: “Ei, Feliz Ano Novo!” (risos). Era a passagem do ano de 83 para 84.
P/1 – E não houve nenhum tipo de comemoração?
R – Não, naquele momento não, eu não podia sair daquela operação que a operação estava em curso, né, não dava pra fechar as válvulas “Vamos, vamos parar aqui e vamos comemorar!” Aí a gente ia perder o poço, né? O cimento ia dar pega e a gente não conseguiria fazer o trabalho, né?
P/1 – E, Heitor, qual foi o seu maior desafio encontrado até hoje, que você tenha enfrentado nesses seus anos de trabalho?
R – Olha, eu não consigo lembrar assim o maior desafio...
P/1 – Uma dificuldade, não sei.
R – Os grandes desafios é você ter que morar em lugares diferentes daqueles que normalmente você se familiarizou, né? Você ter que sair, por exemplo, eu saí de São Paulo, que era uma megalópole, né, e fui viver lá no interior da Bahia numa cidade que não tinha nem cinema, (risos), não tinha uma rua asfaltada, e a diversão lá era você tomar cerveja com amigos ou ir a igreja, né? (risos)
P/1 – Aí depois veio pra Macaé?
R – É.
P/1 – Na época como é que era Macaé quando você veio pra cá?
R – É, Macaé eu conheci em 82, que era uma época que a cidade, pra quem conhece, ela terminava ali na Costa do Sol e o Cavaleiro, e tinha algumas coisas espalhadas, era uma cidade infinitamente menor do que é hoje, né? Então, mas quando eu vim morar aqui, isso já fazem dez anos, ouvia-se dizer que a cidade ia dobrar de tamanho, e a gente achava meio difícil que isso acontecesse, e de fato aconteceu, a cidade cresceu e continua crescendo.
P/1 – E, Heitor, talvez não sei se você se lembra, qual a fase da produção da Bacia que talvez tenha sido mais marcante tanto pra Petrobras, quanto pras pessoas que trabalhavam aqui?
R – Olha, eu vou falar uma coisa que, pelo menos, marcou a mim particularmente, que foi um período em que foram descobertos os campos de (Malim ?) e (Albacora?). Eu me lembro de, eu tinha um amigo meu que se formou junto comigo na faculdade e ele trabalha na parte de reservatórios, eu me encontrei com ele acho que foi em 89, se eu não me engano nessa época, eu me encontrei com ele lá no Rio e ele trabalhava na área de reservatórios e ele falou pra mim: “Olha, esses dois campos que nós encontramos, (Malim ?) e (Albacora?), eles estão dobrando a reserva nacional de petróleo”. Então aquilo marcou muito, né, de saber que aquelas duas descobertas tinham dobrado toda a reserva de petróleo provada naquela época. E hoje nós estamos vivendo momento semelhante que nós estamos, praticamente, dobrando o que naquela época já tinha dobrado, que são essas novas reservas que estão sendo descobertas na área de pré-sal.
P/1 – Isso foi quando?
R – Qual?
P/1 – Essa de (Malim ?)...
R – De (Malim ?) e (Albacora?) acho que foi no final da década de 80, começo da década de 90.
P/1 – Você já tava, trabalhava em plataforma?
R – É, não, eu trabalhei, eu sempre trabalhei misto em escritório, em plataforma sempre.
P/1 – E, Heitor, o quê que é ser petroleiro?
R – É petroleiro é um orgulho muito grande de você trabalhar enfrentando dificuldades no mar, na selva, na terra e vivendo assim longe da sua família, né, e enfrentando essas dificuldades e vendo resultado, né, o resultado positivo das coisas que a gente faz nos faz sentir, assim, um pouco orgulhoso, né, no bom sentido, né?
P/1 – E você comentou no início de um idealismo da juventude, da coisa de tá recém-formado, né, e chegando lá na plataforma e no convívio com aquilo tudo. Ainda hoje persiste esse idealismo, essa coisa? Como é que tá isso?
R – Ah, o entusiasmo eu não perco nunca! Eu tô sempre pronto a novos desafios. E eu acho que o fato de eu ter morado em vários lugares demonstra essa minha vontade de estar querendo sempre enfrentar as coisas novas.
P/1 – E você comentou a questão do meio ambiente, né, hoje você vem, tá dizendo que a Petrobras é muitas mais preocupada quanto a isso...
R – É, hoje faz parte do negocio você cuidar da saúde dos trabalhadores, e segurança e do meio ambiente que a gente convive. Isso, produzir petróleo sem cuidar disso não tem o mesmo valor, né?
P/1 – E você percebe que hoje existe uma preocupação...
R – Sem dúvida.
P/1 - ... em relação àqueles anos bem diferente.
R – Sem dúvida, é bem mais arraigado, inclusive, na alta direção da empresa.
P/1 – E, Heitor, eu queria que, e a respeito do nosso projeto de contar um pouco a história da Petrobras, a história das pessoas que trabalham aqui. Eu queria que você emitisse uma opinião a respeito.
R – Ah, esse projeto é muito importante. Acho que qualquer grande organização deveria se preocupar com esse tipo de coisa porque, de uma certa maneira, daqui a alguns anos os empregados que estarão entrando na empresa eles vão poder ver, ter o contato com alguns outros empregados da, no caso aqui da Petrobras, que tiveram experiências, da importância, né, dessa história da Petrobras, dessa caminhada de sucesso, né, até agora.
P/1 – E, Heitor, pra terminar você teria alguma coisa pra dizer que tenha escapado, que você gostaria de falar?
R – Não, eu acho que estou satisfeito com tudo que eu faço, e reconhecido que se não fosse a Petrobras muitas coisas eu não teria conhecido e vivido, coisas boas, né?
P/1 – E dessas coisas que você tem vivido, a convivência com pessoas aqui na Petrobras tem muita gente de vários lugares, né?
R – Tem. Isso serve pra diminuir o nosso bairrismo. A gente, nós temos amigos que são nordestinos, são sulistas, que são estrangeiros, né? Hoje nós temos vários trabalhadores que vem da Venezuela, da Argentina, de Bolívia, Colômbia e estão todos trabalhando aí, vestindo mesmo o crachá, né, somos todos trabalhadores do mesmo ideal. E trabalhando nesse ambiente faz com que a gente não seja tão bairrista, né? Considere igualmente todas as partes do Brasil e do mundo, né, como importantes.
P/1 – Tá bom, Heitor, acho que é só isso então.
R – Tá bom.
FIM DA ENTREVISTA
Nomes com grafia em dúvida:
(Malim ?), pág. 07
(Albacora?), pág. 07
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