Aos três anos de idade o meu padrasto, Antônio, conheceu a minha mãe, Luiza. Seu Antônio era uma das pessoas mais dignas que conheci em toda a minha vida. Me carregou pelo colo durante anos, exercendo uma função paterna cujas lembranças me alegram até hoje. No auge de mais de oito décadas de idade, com uma memória excepcional, uma destreza nas palavras cruzadas e um ritmo de conversa que me fazia ficar horas ouvindo a ele, realizou sua passagem nesta terra, vítima da covid-19. Seu legado me influenciou à busca incessante pela educação, pela pesquisa, pelo saber. Como um homem tão simples, mas tão imenso foi capaz de transformar em mim aquilo que de melhor poderia vir-a-ser? E veio! Hoje, estudo Psicologia. Há alguns anos, ainda vivo, testei sua lembrança etária ao questionar se já ouviu em tenra jovialidade falar em Sigmund Freud, o pai da psicanálise. Ele me respondeu com um leve \"ele era um médico, não é?\". Sim, ele era. Tenho a sensação que, assim como Freud, Seu Antônio nunca abandonou absolutamente nada do que acreditava. E eu, em minha pequenez, tive o privilégio em ouvi-lo por muitos anos. Ouvi muitas histórias, muitos causos. E que bom que me ative a parar, escutar e, atenciosamente, ir vagando pela história de sua vida que até hoje muda a minha. Conhecido por todos, não havia um minuto sequer em que pudéssemos andar nos centros urbanos sem que um conhecido o cumprimentasse com a alegria de quem cumprimenta um amigo. Que alegria! A gratidão que sinto por essa convivência gratificou, na verdade, a minha história de vida. Um ano antes de minha formatura, escrevo-lhe essas palavras para que o mundo conheça o Seu Antônio e que fiquem registradas as minhas palavras como rememoração à alma de alguém que sorriu tanto diante de minhas conquistas e riu tanto de minhas situações inusitadas, de minha ousadia, de minha vontade de vencer. A essas vontades de potência, atribuo a ele a força, a pulsão inicial, a qual - ou...
Continuar leitura
Aos três anos de idade o meu padrasto, Antônio, conheceu a minha mãe, Luiza. Seu Antônio era uma das pessoas mais dignas que conheci em toda a minha vida. Me carregou pelo colo durante anos, exercendo uma função paterna cujas lembranças me alegram até hoje. No auge de mais de oito décadas de idade, com uma memória excepcional, uma destreza nas palavras cruzadas e um ritmo de conversa que me fazia ficar horas ouvindo a ele, realizou sua passagem nesta terra, vítima da covid-19. Seu legado me influenciou à busca incessante pela educação, pela pesquisa, pelo saber. Como um homem tão simples, mas tão imenso foi capaz de transformar em mim aquilo que de melhor poderia vir-a-ser? E veio! Hoje, estudo Psicologia. Há alguns anos, ainda vivo, testei sua lembrança etária ao questionar se já ouviu em tenra jovialidade falar em Sigmund Freud, o pai da psicanálise. Ele me respondeu com um leve \"ele era um médico, não é?\". Sim, ele era. Tenho a sensação que, assim como Freud, Seu Antônio nunca abandonou absolutamente nada do que acreditava. E eu, em minha pequenez, tive o privilégio em ouvi-lo por muitos anos. Ouvi muitas histórias, muitos causos. E que bom que me ative a parar, escutar e, atenciosamente, ir vagando pela história de sua vida que até hoje muda a minha. Conhecido por todos, não havia um minuto sequer em que pudéssemos andar nos centros urbanos sem que um conhecido o cumprimentasse com a alegria de quem cumprimenta um amigo. Que alegria! A gratidão que sinto por essa convivência gratificou, na verdade, a minha história de vida. Um ano antes de minha formatura, escrevo-lhe essas palavras para que o mundo conheça o Seu Antônio e que fiquem registradas as minhas palavras como rememoração à alma de alguém que sorriu tanto diante de minhas conquistas e riu tanto de minhas situações inusitadas, de minha ousadia, de minha vontade de vencer. A essas vontades de potência, atribuo a ele a força, a pulsão inicial, a qual - ou quais - guardarei por toda a eternidade. Seu Antônio me lembra Clarice Lispector em \"A Paixão Segundo G.H.\", em que disse que \"dar a mão a alguém sempre foi o que esperou da alegria\". Seguros estamos, onde quer que esteja. Gabriel.
Recolher