Projeto 30 Anos Alunorte
Entrevista de Felipe Alessandro Monteiro Picanço
Entrevistado por Lígia Scalise
Barcarena, 20 de julho de 2025
Transcrita por Mônica Alves
00:18
P1 - Obrigada, viu Felipe, por receber a gente.
R: Obrigada vocês por estarem aqui.
00:23
P1 - Imagina. Eu vou pedir para você começar falando o seu nome inteiro, dia, mês e ano e a cidade que você nasceu.
R: Felipe Alessandro Monteiro Picanço. Nasci em 24 de setembro de 1982, em Castanhal, Pará.
00:37
P1 - Onde fica Castanhal? De Barcarena é perto ou longe?
R: Castanhal fica a 150 km daqui, de Barcarena. É mais próximo a Belém, fica a Nordeste do Pará, a 70 km de Belém.
00:49
P1 - De onde são seus pais, Felipe? Quem são eles?
R: Meus pais são também de Castanhal, naturais de Castanhal. O meu pai é Geraldo Picanço, é engenheiro civil. A minha mãe é Socorro Monteiro, ela é geógrafa, tem mestrado e doutorado na área e atua na educação do ensino médio, também em Castanhal.
01:11
P1 - Como é que eles se parecem?
R: Eu sou mais parecido com o meu pai, puxei os traços dele em termos físicos, mas, acredito que em gênio, mais parecido com a minha mãe.
01:20
P1 - Qual é o gênio da sua mãe?
R: Ela é bastante enérgica, muito positiva e sempre disposta a conversar, se divertir e ajudar as pessoas.
01:37
P1 - Você sabe como eles se conheceram?
R: A cidade era muito pequena, então, por volta do ano de 1978, entre 78 e 80, eles se conheceram ali, por Castanhal mesmo na rotina da cidade. Eles moravam próximos uns dos outros ali, era questão de atravessar uma rua e no dia a dia ali, acabaram se encontrando.
02:05
P1 - Quando você nasceu? Você é o primeiro filho, tem irmãos?
R: Eu sou o primeiro filho, sou o filho mais velho. E eu tenho um irmão mais novo, que é o Thiago Picanço.
02:13
P1 - Qual é a diferença entre vocês?
R: São cinco anos.
02:16
P1 - E quando você nasceu, te contaram como é que foi o dia do nascimento?
R: Sim. Foi bastante...
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Entrevista de Felipe Alessandro Monteiro Picanço
Entrevistado por Lígia Scalise
Barcarena, 20 de julho de 2025
Transcrita por Mônica Alves
00:18
P1 - Obrigada, viu Felipe, por receber a gente.
R: Obrigada vocês por estarem aqui.
00:23
P1 - Imagina. Eu vou pedir para você começar falando o seu nome inteiro, dia, mês e ano e a cidade que você nasceu.
R: Felipe Alessandro Monteiro Picanço. Nasci em 24 de setembro de 1982, em Castanhal, Pará.
00:37
P1 - Onde fica Castanhal? De Barcarena é perto ou longe?
R: Castanhal fica a 150 km daqui, de Barcarena. É mais próximo a Belém, fica a Nordeste do Pará, a 70 km de Belém.
00:49
P1 - De onde são seus pais, Felipe? Quem são eles?
R: Meus pais são também de Castanhal, naturais de Castanhal. O meu pai é Geraldo Picanço, é engenheiro civil. A minha mãe é Socorro Monteiro, ela é geógrafa, tem mestrado e doutorado na área e atua na educação do ensino médio, também em Castanhal.
01:11
P1 - Como é que eles se parecem?
R: Eu sou mais parecido com o meu pai, puxei os traços dele em termos físicos, mas, acredito que em gênio, mais parecido com a minha mãe.
01:20
P1 - Qual é o gênio da sua mãe?
R: Ela é bastante enérgica, muito positiva e sempre disposta a conversar, se divertir e ajudar as pessoas.
01:37
P1 - Você sabe como eles se conheceram?
R: A cidade era muito pequena, então, por volta do ano de 1978, entre 78 e 80, eles se conheceram ali, por Castanhal mesmo na rotina da cidade. Eles moravam próximos uns dos outros ali, era questão de atravessar uma rua e no dia a dia ali, acabaram se encontrando.
02:05
P1 - Quando você nasceu? Você é o primeiro filho, tem irmãos?
R: Eu sou o primeiro filho, sou o filho mais velho. E eu tenho um irmão mais novo, que é o Thiago Picanço.
02:13
P1 - Qual é a diferença entre vocês?
R: São cinco anos.
02:16
P1 - E quando você nasceu, te contaram como é que foi o dia do nascimento?
R: Sim. Foi bastante atribulado, até porque, naquele tempo, os recursos eram mais escassos e eu acabei nascendo na Maternidade do Povo, que é uma maternidade municipal. E no dia em que eu nasci, também foi parto normal e acabei nascendo com uma pequena deformação no pé direito e isso deixou eles bastante preocupados. Mas acabei tratando e desenvolvendo. Mas foi um momento um pouco tenso, porque quando se espera um filho, a gente tem a expectativa de que tenha a saúde perfeita e acabou tendo esse pequeno probleminha. Então teve um pouquinho dessa tribulação, mas acho que superável.
03:06
P1 - Seu pé nasceu tortinho?
R: Sim, foi, tortinho.
03:06
P1 - Sua mãe fala? Era pra dentro?
R: Era assim, virado, em vez de pisar aqui, virado assim. E aí tive que fazer cirurgia logo bebezinho ainda, né, fiz a cirurgia para voltar para a posição. Aí fiquei usando bota ortopédica por bastante tempo, vários anos, até uns sete anos de idade, para poder ir corrigindo à medida que ia crescendo.
03:32
P1 - E você sabe do porquê Felipe? O nome?
R: Eles me falam que tinha uma novela, na época, e aí tinha um ator que chamava Felipe, e aí a minha avó ficou indicando que queria Felipe. Só que Felipe, o ator, inclusive, era muito idoso, então passava a imagem de uma pessoa idosa e a minha mãe não queria. Mas ficou aquele conflito ali, também não queria dizer não. E aí a solução que ela achou foi colocar o Alessandro do lado. “Vamos colocar Felipe, mas a gente bota Alessandro. A gente não vai chamar de Felipe, a gente vai chamar de Alessandro.” Mas acaba que ninguém nunca me chamou de Alessandro.
04:10
P1 - Só Felipe?
R: Só Felipe. Ninguém nem sabe que meu nome é Alessandro, na verdade.
04:15 E você sabe que novela que era?
R: Não lembro.
04:17
P1 - Quando você nasceu, como é que estava a vida dos seus pais? Eles já tinham estudado? Eles trabalhavam? Estavam bem de vida?
R: Não. Eles estavam bem no início, eram jovens, tinham em torno de 20 anos. Então, meu pai estava na faculdade ainda, fazendo Engenharia Civil, a minha mãe estava também terminando os estudos. Então foi bastante difícil. A gente teve bastante apoio dos meus avós, dos meus tios, para poder ter essa estabilização. Então, não foi muito estável, não foi uma vida muito fácil no início, não.
04:54
P1 - Como que era a casa? Você lembra de alguma coisa?
R: Lembro. Então, como eles eram estudantes, praticamente, eles moravam na casa dos pais. Então, a gente iniciou a vida, eu morava na casa dos meus avós com eles, na casa da minha avó materna. E ficamos lá por muitos anos, em torno de uns cinco a sete anos, a gente morou na casa dos meus avós maternos. E depois, a gente mudou para a nossa própria casa.
05:23
P1 - Então esses avós têm uma participação na sua vida importante, né?
R: Tem, bastante. A gente foi criado muito próximo dos nossos avós. Como eu disse, as casas eram próximas, a gente ia para uma casa, ia para outra. Eu, quando ficava com raiva, pegava, arrumava umas coisas e falava que ia fugir para a casa da minha outra avó. A minha avó materna fazia muitas minhas vontades. Então, a minha mãe dizia que ela era a minha avó preferida. Então, qualquer probleminha que eu tivesse, eu pegava as coisas e: “Eu vou para a casa da minha avó.” Eu ia embora para lá e, lá, ela fazia todas as minhas vontades. Acabava ficando muito tempo lá.
05:58
P1 - Quem era essa avó?
R: A minha avó paterna era Maria de Lourdes, uma senhora muito carinhosa, muito religiosa, de muita fé. Ela sofria de uma doença, que era diabetes, uma diabetes muito forte. Então, ela fazia um controle alimentar muito forte. Ela já estava, apesar de ela ser relativamente nova, ela tinha entre 50 e 59 anos, faleceu com torno de 62, 63, não lembro ao certo, mas ela já estava em um avanço de diabetes, que já estava perdendo a visão. Então, assim, ela ficava muito em casa e a gente sempre estava junto com ela, porque ela não tinha muito essa facilidade de deslocamento. Mas o que era interessante é que ela sentia a presença das pessoas, então, quando a gente chegava, apesar de ela não conseguir ver integralmente, ela sabia quem estava chegando, ela falava pelo nome. E era sempre muito especial estar com eles, muito mesmo, todos os avós, os pais, tudo. A gente sempre foi criado com muita proximidade com a família, com os tios, com os avós e os pais, todo mundo junto.
07:14
P1 - E a avó materna, como era?
R: A avó materna era uma mãezona. Então, ela gostava muito de cozinhar. A paixão dela era cozinhar e ver os filhos ali reunidos na mesa. O nome dela era Josefa Mello Monteiro, mas o apelido era Gegé. Então, era Dona Gegé. E o que ela fazia de mais famoso, era o feijão da Dona Gegé, era um feijão meio paraense, ela botava jambu, botava jerimum, ficava bem gostoso. E a gente geralmente ia para a escola, que era próxima também e quando voltava, já parava lá: “Bora parar na vó Gegé, vamos almoçar.” Almoçava com ela. E a gente passou muitos bons anos juntos.
08:01
P1 - E os avôs, tinha participação também?
R: O meu avô materno, eu não conheci, na verdade, ele faleceu quando eu era bebê. Então, não tive muito contato com ele. Mas com o avô paterno a gente teve muita influência da criação dele, como a gente era muito próximo, todo final de semana, a gente estava com ele. Ele tinha um sítio também, que a gente, praticamente, todo sábado e domingo ia para o sítio dele. A gente sempre estava com ele. E era uma pessoa, um homem muito duro, aqueles senhores bem antigos, de querer dominar as coisas, os comportamentos. Então ele era sempre ali: “Não faz isso, não faz aquilo!”. E a gente tinha muito respeito por ele, mas também muito amor. Ele era uma pessoa muito amável, ele não demonstrava aquele carinho todo, mas estava ali sempre para dar suporte para a gente, para aproveitar a vida junto com a gente.
09:03
P1 - Já sei quem são alguns da sua família. E você, como você era enquanto criança?
R: Eu era uma pessoa muito, no início assim, introvertida. Eu era muito tímido, muito inseguro. E eu, no início, na escola, tive que começar a me adaptar para poder me envolver com as pessoas e ter amizades e tudo. Mas era um processo que eu fui aprendendo a construir, de ter relações com as pessoas, de criar amizades. Com os meus primos, era muito fluido, era muito natural, mas com outras pessoas eu já tinha um pouco mais de dificuldade. E acabei desenvolvendo ao longo do tempo esse comportamento e hoje as pessoas me veem como uma pessoa extrovertida. Então, quem ver esse vídeo vai falar assim: “Não, essa pessoa aí eu não conheci.”
10:01
P1 - E você lembra do que te fazia sentir vergonha? Ou você lembra de alguém dando algum conselho nessa época, para você se soltar mais?
R: Na verdade, assim, era meio natural, não tinha algo que me fazia sentir vergonha, mas é que as pessoas com quem eu convivia na escola, eram bastante diferentes, então acabava que não dava muito aquela liga, né. E isso era uma barreira, vamos dizer assim.
10:23
P1 - Era um jeitinho de se proteger, né?
R: É, também.
10:25
P1 - E essa você falou que foi até os seus sete anos mais ou menos usando botinho. O que você lembra? O que te deixou de marca isso?
R: Então, era muito incômodo, porque inicialmente, quando eu comecei a andar, eu usava aquela... No passado tinha uma bota que tinha um cinto que vinha um ferro aqui pela lateral e a bota era bastante desconfortável, era uma bota assim, dura, e assim, aquilo era um sofrimento. Então eu passei vários anos ali enfrentando aquele desafio. E era um negócio que parecia um mecanismo que te ajudava a andar, era tipo um exoesqueleto. Hoje você vê aquelas pessoas que têm paralisia usando aquele exoesqueleto para começar a voltar, era alguma coisa parecida com aquilo. E era feio, era desconfortável, né, a gente ficava com vergonha. Então foi um processo bem difícil. E eu acabei nem concluindo o tratamento, porque eu chorava e pedia para minha mãe para parar de usar. E chegou um momento que: “Não, vamos parar de usar.” Porque eu via as outras crianças ali usando tênis, sapatinho legal e eu sempre com aquela mesma bota, aquele negócio desconfortável. Então chegou um momento que...
11:42
P1 - E tinha que usar o tempo todo?
R: Toda vez que fosse para andar, tinha que estar com ele.
11:48
P1 - Ajudava.
R: Ajudava a posicionar as pernas e o alinhamento da perna e do pé, né?
11:54
P1 - Eu imagino que fazia calor, né? Aquilo devia esquentar.
R: É, com certeza.
12:07
P1 - E o que você lembra da sua infância além disso? O que você gostava de brincar, por exemplo?
R: Aquela infância, naquela época ali, em 1985, entre 1990, a gente era muito criado na rua, né. Então a gente brincava com os colegas nas ruas mesmo, nas casas das outras pessoas e eu ia muito para a casa dos meus primos jogar bola, brincar de uma maneira geral. Então, ia de manhã para a escola, de tarde, estava na casa de alguém, estava na rua, estava brincando, estava correndo, muito ativo. Era uma infância bem envolvente com crianças, de uma forma geral, não só na escola, mas com a família, com as pessoas que moravam perto. Era bem divertido.
12:50
P1 - E os finais de semana?
R: E os finais de semana, a gente ia para o sítio que o meu avô possuía lá em Igarapé-Açu. É uma cidade a 40 quilômetros de Castanhal. Tinha rio, igarapé, campo de futebol, campo de vôlei, tinha animais ali que a gente andava, cavalo, ia no pasto. Todo dia de manhã ali, sábado, domingo, meu avô fazia questão de acordar todo mundo cedo. A gente ficava chateado ali de, no final de semana, acordar cedo, mas às seis horas da manhã a gente ia para o pasto, estavam os animais ali reunidos. Aí ele pegava o vaqueiro para tirar leite, ele fazia a gente tomar leite da vaca ali naquela hora: “Toma isso aqui para você ficar com saúde. Isso aqui é força para você poder correr melhor.” Então os finais de semana eram geralmente assim, com a família, nesse sítio, aproveitando a natureza e esse espaço lá que a gente tinha.
13:38
P1 - Uma infância bem ativa, né?
R: Era bem ativa. Bem diferente da de hoje, né? Hoje em dia a gente vê as crianças muito fechadas, enclausuradas.
13:46
P1 - E as regras de casa, tinha? Mãe e pai davam regras? Tinha que cumprir alguma coisa?
R: Tinha. Então, como o meu pai, depois que se formou, começou a trabalhar, e a minha mãe demorou ainda a formar, ela acabou ficando como dona de casa por vários anos e veio a fazer o ensino superior já 20 anos depois. Então, foi por muitos anos como dona de casa. E era só ela, então, acabava que meu irmão e eu ajudávamos com as tarefas de casa. Então, era fazer a limpeza da casa, lavar banheiro, lavar a louça. E como naquele tempo, acho que o Brasil como um todo, tinha um contexto de desenvolvimento baixo, então, não tinha muito emprego, meu pai trabalhava, ficava desempregado, trabalhava, ficava desempregado. E a minha mãe ajudava fazendo encomendas de doces, salgados, bolos. Ela cozinha muito bem. E a gente ajudava quando tinha essas encomendas. Então a gente fazia junto com ela, ela preparava a massa, fritava, por exemplo, o pastelzinho, fritava ali aquele canudinho, a gente ia lá e ficava enchendo, ou ela preparava ali o brigadeiro e a gente enrolava, as empadinhas a gente ia enchendo. Então, a gente passava às vezes o dia inteiro ali preparando encomendas para poder vender. E ela ganhava um dinheirinho ali para poder ajudar também.
15:19
P1 - Você falou que você tem uma diferença de cinco anos do seu irmão.
R: Cinco anos, é.
15:26
P1 - Quando ele chegou, abalou alguma coisa para você? Como é que foi?
R: Quando ele estava para chegar, eu tinha uma expectativa muito grande, porque eu era só e queria ter ali um irmãozinho. Eu sempre falava para a minha mãe que eu queria ter um irmãozinho para brincar comigo. Então ele acabou chegando, no início foi bem tranquilo, mas depois o gênio dele era muito difícil e aí a gente brigava muito, tinha muito atrito. Ele era de um jeito, eu era de outro e acabou que a gente não ficou assim no início, como criança, brincando muito próximo, devido a essa diferença. E os amigos dele eram outros, os meus eram outros, então, foi um pouco assim, cada um crescendo da sua maneira. Mas depois que a gente ficou adulto, a gente se aproximou bastante e graças a Deus a gente vive em paz, assim, uma família muito unida nesse sentido.
16:00
P1 - Que bom. Quando você era menino, você tinha algum sonho? Você queria ser o quê?
R: Quando a gente é menino, a gente sonha em ser tudo, né. Então, eu já sonhei em ser policial, ser bombeiro, ser ator, cantor, a única coisa que eu não sonhava era de estar aqui, para falar a verdade. Mas faz parte, a gente vai construindo a nossa carreira, a nossa vida. Mas eu costumo dizer que eu sou um sonhador, eu falo para a minha esposa, que sempre que eu estou sozinho, que eu estou aqui aproveitando meus dias de folga, eu estou sonhando com alguma coisa, estou pensando em alguma coisa, estou vislumbrando um futuro que eu queira construir. Então, acho que sonhar faz parte de construir a nossa vida.
16:52
P1 - Você falou que sonhava também em ser cantor, ator, você gostava?
R: Gostava, eu gostava de cantar no chuveiro. Até hoje eu falo para brincar com a minha esposa, a gente vai viajar no carro, a gente está ouvindo uma música, eu começo a cantar com essa voz de taquara rachada, chata para caramba. Eu canto ali, desafino e falo: “Poxa, por que eu não virei cantor com esse talento todo?”. (risos)
17:22
P1 - O que você gostava de cantar quando você era criança? Você lembra de alguma música que você adorava cantar no chuveiro?
R: A gente gostava muito do Balão Mágico. Era aquela época que o Balão Mágico explodiu, então a gente cantava muito quando criança os hits do Balão Mágico.
17:33
P1 - E seus pais, eles apoiavam esses sonhos mais diferentões? Ou mandavam estudar para ser outra coisa?
R: Não, meus pais eram muito focados na questão do meu estudo. Apesar da vida difícil que a gente teve no início, eles sempre deram muita prioridade para estudo, buscaram sempre colocar a gente em escolas boas para que a gente tivesse acesso à educação de qualidade. E a minha mãe sempre falava que a gente tinha que realmente estudar para ser alguém na vida, porque a gente morava numa cidade do interior que não tinha muito recurso, muito desenvolvimento. E ela sempre falava assim: “Se você não estudar, você vai ser puxador de carroça.” O exemplo que ela dava era o puxador de carroça, que naquela época ainda, no interior, tinha bastante, que era sinônimo de pessoas que não estudaram ou que não tinham emprego. Então eles sempre apoiaram bastante e deram muita prioridade para essa questão de estudo.
18:36
P1 - E isso, quando você ouvia, devia dar um certo medo, né? “Não quero isso. Quero estudar.” Então, você era bom aluno?
R: Ela sempre falava que eu era inteligente, mas eu sempre fui um pouco preguiçoso para estudar. Então, como eu ia para aula, eu prestava atenção, aprendia, quando eu chegava em casa, eu não queria estudar, não queria gastar tempo ali, eu queria fazer outras coisas, brincar e tal. Mas as minhas notas sempre foram boas. Então ela falava assim: “Tu não estudas e tu tira nota boa?”. Eu falava: “Eu aprendo na hora da aula.” Então sempre tinha esse conflito com a minha mãe, porque ela queria que a gente chegasse depois da aula e fosse sentar ali para dar uma estudada ainda, reforçar. Ela queria ver a gente esforçado e eu nunca fui muito esforçado, eu sempre fui assim: “Já aprendi, já sei, não preciso mais estudar.” A gente sempre teve esse conflito ao longo do meu tempo de estudante.
19:32
P1 - Você falou que a sua mãe fazia uns bicos para vender, ganhar um dinheirinho. Você lembra de algum momento da sua infância, ali seus 10 anos, que te marcou? Você ganhou alguma coisa que foi simbólica para você?
R: Ah, sim. A gente sempre tem, quando é criança, né: “Eu quero isso, quero aquilo.” O que vê na televisão, né. Eu via muita televisão ali, aquelas propagandas. E o que me marcou assim, foi ganhar uma bicicleta nova. Então, a gente tinha sempre esse sonho e uma vez o meu pai foi lá, e: “Não, vou lhe dar de presente.” Acho que sempre que eu ganhava bicicleta eu ficava feliz.
20:06
P1 - Com rodinha ou sem rodinha?
R: Sem rodinha já.
20:09
P1 - Era uma bicicleta de que cor?
R: Era azul. Logo que lançaram a mountain bike, uma azul era da Caloi, era muito bonita.
20:18
P1 - E era uma data especial?
R: Sim, aniversário.
20:24
P1 - Então tinha comemorações nos dias de aniversário?
R: Sim, sempre teve. Sempre teve comemorações. A minha mãe fazia questão, meu pai também. Então assim, minha família sempre foi muito animada, muito de festa. E datas especiais nunca passavam em branco, pelo menos um bolinho, como a minha mãe já fazia mesmo, então era prático. Sempre chamava os primos, chamava ali os vizinhos, estava junto e era uma festa.
20:49
P1 - E o Natal, Ano Novo?
R: O Natal era sempre especial, porque o Natal era aniversário de casamento do meu avô com a minha avó, dia 25 de dezembro era o dia em que eles tinham se casado, meu avô e a avó paterna. E a gente sempre ia para esse sítio que eu mencionei anteriormente, a gente passava a véspera de Natal na casa deles e eles sempre providenciavam presentes para todos os netos. Aí tinha sempre um tio que se vestia de Papai Noel ali, aí ficava aquele clima para descobrir quem era o Papai Noel e era uma diversão. E aí passava a noite de Natal ali na casa deles, aquela troca de presentes e no outro dia cedo a gente ia para esse sítio, era uma festa o dia inteiro. Meu avô fazia questão de fazer grandes festas nesta data, trazia os parentes dele de Manaus, de Belém, de todo lugar e eram sempre muitas pessoas, mais de 200, 300 pessoas reunidas ali para comemorar. Então por vários anos o Natal foi essa representação. Sempre foi muito especial.
22:00
P1 - E isso foi até a sua adolescência?
R: Foi até a adolescência. Até praticamente minha avó falecer. Minha avó faleceu quando eu tinha aproximadamente 20 anos. Então até lá foi essa nossa vida de Natal.
22:16
P1 - A gente falou bastante da infância e adolescência. Como é que estava a sua adolescência? Como que você era um adolescente?
R: Adolescente, eu lembro de participar muito das atividades da Igreja Católica, porque a minha mãe tinha muito medo de acontecer alguma coisa com a gente, então ela não deixava a gente sair para muitos locais, ela não era uma pessoa de confiar muito nas outras. Então ela tinha medo da gente andar com outras pessoas. E, uma forma que a gente encontrou de ter um pouco mais de liberdade foi de estar nos movimentos da Igreja Católica, movimento jovem, ir para a missa, dia de domingo à noite. Então a gente ia para a missa à noite e aí eu falava para ela: “Depois da missa eu vou dar uma voltinha na praça. Depois eu volto.” Ela: “Mas 10 horas você tem que estar em casa.” E ai se não estivesse em casa, a gente estava lascado, porque no outro domingo já não saía. Então assim, de final de semana eram essas as programações de adolescente. Sábado e domingo. Sábado, geralmente à noite, a gente ia para o encontro com o movimento jovem. Eram muitos jovens, adolescentes ali, ficavam juntos, discutiam diversas questões, depois sempre ia dar uma voltinha na praça e pegava um lanche. No domingo ia na missa, à noite também, dava aquela voltinha na praça e voltava para casa. Era uma infância, uma adolescência relativamente simples também, sem muitas aventuras até então.
23:36
P1 - Você era obediente, você cumpriu o que sua mãe pedia.
R: Sim, eu sempre fui bastante obediente, sempre fui focado em regras e responsável nesse sentido.
23:48
P1 - E na adolescência você estudava? Chegou a precisar trabalhar?
R: Não, eu só estudava. Meus pais sempre, como eu disse, focaram muito nessa parte de estudos e nunca me permitiram trabalhar, para falar a verdade. Eu até cheguei a conversar com eles: “Eu queria trabalhar e tal.” Porque a gente tem sonhos, a gente quer possuir as coisas e tudo. Mas eles diziam: “Não. Você não vai trabalhar, senão você vai atrapalhar os estudos. Foca nos estudos.” E sempre foi assim.
24:22
P1 - E quando é que na adolescência você começou a desenhar o seu futuro? A estudar o que você trabalha hoje?
R: Então, quando eu atingi ali, mais ou menos o segundo grau, que hoje é o ensino médio… minha esposa é professora, ela sempre fala: “Até hoje tu falas segundo grau.” Eu comecei a refletir sobre o que eu gostava e o que eram as minhas habilidades. E eu sempre fui muito bom em matemática, física e química. E naquela época, quando você chegava no terceiro ano, você escolhia ali ciências humanas, ciências biológicas ou ciências exatas. Então eu escolhi de imediato as ciências exatas, por ter mais afinidade. Cheguei a testar a ciência biológica, mas não gostei. Aí mudei para as ciências exatas, era aquilo mesmo que eu queria. E comecei a refletir qual seria a minha formação, o que eu faria no meu curso superior. E lá em casa, como as coisas sempre foram muito difíceis, meu pai era engenheiro civil, e a gente sempre escutava dele e da minha mãe: “Faz qualquer coisa, menos engenheiro civil.” E pra mim seria até mais fácil, porque meu avô trabalhava com construção civil, meu pai se formou engenheiro civil, mas eles: “Não, engenheiro civil, sai dessa que isso é furada.” Aí me botaram num beco sem saída e eu fiquei vários meses pensando no que eu faria. E aí eu comecei a olhar pelas engenharias, o que tinha de mais afim com as minhas habilidades. E aí eu passei por todas, passei pela civil, eles já tinham descartado, passei pela mecânica, mas eu não gosto muito dessa parte de mecânica, até eu chegar na engenharia química, eu falei: “Acho que é essa aqui que eu vou.” E é curioso, porque a gente não tinha na cidade nenhuma indústria química, não tinha nenhum tipo de perspectiva no sentido de, “Onde eu vou trabalhar, o que eu vou fazer.” Nem imaginava vir aqui pra Barcarena. Mas acabei escolhendo engenharia química. No primeiro ano que eu fiz o vestibular, eu concluí o convênio, o ensino médio, e não passei. Eu era muito autoconfiante, como eu falei anteriormente, eu não era uma pessoa esforçada pra estudar, para mim, eu já sabia tudo. E aí eu não passei, foi uma decepção muito grande pra mim e principalmente pra minha mãe, ela ficou realmente muito chateada. Meus pais, de uma forma geral, porque a expectativa era grande e tinha um gasto grande também com escola, era muito difícil na época, muito limitado os recursos. E acabei não passando e fiquei bastante decepcionado. Depois que eu fiz a prova, no dia que eu fiz a prova do vestibular, eu sabia as questões, mas fiquei nervoso, acabei não conseguindo desenvolver, e não passei. Depois que eu peguei a prova, eu falei: “Nossa, como é que eu consegui fazer isso aqui? Isso aqui eu sabia fazer tudo.” Então eu entrei num cursinho no ano seguinte, e aí eu tive que mudar um pouco minha rotina, meu comportamento. Então aquilo que eu falava que eu não precisava estudar, eu tive que mostrar que eu tinha que estudar, porque eu não tinha passado.
27:27
P1 - Isso lá na tua cidade mesmo?
R: Na minha cidade, sim. Então eu acabei me esforçando bastante nesse outro ano, e no vestibular seguinte, o segundo que eu prestei, eu acabei passando, e passei em segundo lugar, inclusive, no curso. E já entrei num outro ritmo de estudos, já levando mais a sério, e com bastante foco nessa questão de concluir o curso.
27:55
P1 - Qual foi a faculdade?
R: Eu estudei na Universidade Federal do Pará, em Belém. E aí, inicialmente, eu saía de Castanhal todos os dias, pegava o ônibus lá meio-dia, uma hora de viagem, assistia a aula geralmente até nove, dez horas da noite, voltava, chegava em casa meia-noite. E aí, passei um ano assim. No segundo ano, eu já consegui uma bolsa para ajudar nos custos, já mudei para Belém, dividi apartamento lá com alguns amigos e amigas. E assim fiquei até o quarto ano da faculdade, quando eu consegui um estágio aqui na Alunorte.
28:32
P1 - E para você sair da casa pela primeira vez, da cidade, como é que foi esse impacto? Ir para Belém, que imagino que seja diferente de Castanhal.
R: Sim, Castanhal era muito pequena, a gente praticamente andava lá de Castanhal para qualquer lugar, andando ou de bicicleta. E para ir para Belém foi um medo muito grande, porque a gente tinha que pegar o ônibus de uma cidade para outra. Lá dentro, também, o deslocamento tinha que ser via transporte público, de ônibus. E a gente teve que aprender, teve que ir. Inicialmente, eu fui com meu pai, ele falou: “Pega esse ônibus, vai por aqui, vai por ali.” Foi me ensinando. E sempre, medo de se perder, aquela tensão ali de perder a parada, passar direto, não saber onde vai parar, mas a gente foi aprendendo.
29:18
P1 - O que te marcou na fase de universidade? Amigos novos, cidade nova, o que vocês faziam?
R: Então, uma das melhores fases da minha vida de estudante, foi na universidade, porque a gente acabou por morar em outra cidade, por estar em outra cidade, ter mais liberdade. A gente acabou fazendo amigos com pessoas totalmente diferentes daquelas que a gente estava acostumado a conviver. E o que marcou mesmo foi essa fase de querer concluir o curso. Eu tinha um medo muito grande de não concluir, porque a situação financeira era difícil, eu tinha que manter essa viagem, a passagem, os gastos ali, não era fácil. Então, eu tinha um receio grande, ficava com aquele negócio na minha cabeça. Tanto é que até alguns dias atrás, eu ainda sonhava que eu estava na faculdade, eu acordava assim, como se eu não tivesse terminado o meu curso, sabe? Tinha uma preocupação grande. Então, apesar de ter uma relação grande de amizade, de estar ali com outras pessoas, mas a gente sempre se juntou ali em um grupinho muito estudioso e a gente focava muito em concluir as matérias e terminar o curso.
30:32
P1 - E você sentia saudade de casa?
R: Sim, a gente sentia. Mas por outro lado, também, a gente sempre vinha. No período que eu morei em Belém, todo final de semana eu ia para casa, ficava lá com a minha família, recuperava as energias e voltava de novo.
30:50
P1 - Imagino sua mãe, que devia ficar muito preocupada, né?
R: Ficava, ficava assim. Mas tinha que confiar, né? A gente tinha que também passar tranquilidade e mostrar que a gente estava fazendo a coisa certa, né?
31:03
P1 - E o curso, você foi gostando do conteúdo?
R: Inicialmente não, porque na engenharia química a gente estuda nos dois primeiros anos, muita física, muita matemática e pouca química. O pessoal brinca comigo, falam assim: Ó, chegou o químico.” Eu falo: “Eu sou tudo, menos químico, porque o que eu estudei mais foi matemática e física.” A gente tem pouco de química, então acaba que frustra um pouco no início ali, aquelas disciplinas que você esperava que seriam um pouco diferentes, mas do terceiro ano para frente, a gente entra realmente muito profundamente na engenharia química em si, a gente olha muito processo, a gente olha bastante disciplina legal.
31:42
P1 - E nessa época, você já começou a ter alguma perspectiva do que você ia fazer da vida?
R: Sim. Logo no segundo ano da faculdade, eu entrei num estágio, a princípio, era um estágio voluntário, que chamava, mas fiz amizade com um professor lá, chamado Emanuel Negrão, e aí ele me orientava e me dava algumas atividades ali para eu ir aprendendo, para eu ir desenvolvendo. Com seis meses que eu estava lá com ele, ele conseguiu uma bolsa para mim e a gente começou a desenvolver um projeto de pesquisa, ainda no segundo ano de faculdade. E aí eu fiquei até o último ano desenvolvendo projeto de pesquisa com bolsas de Iniciação Científica, junto com o professor Emanuel. E para mim, estava muito claro na minha cabeça que eu ia seguir aquele caminho ali na faculdade, de fazer mestrado, doutorado e virar um professor universitário. Esse era o meu projeto de vida até então. Até que apareceu o estágio da Alunorte. Foi um frenesi danado na universidade como um todo, porque em 2004 a Alunorte estava executando o projeto de expansão, até então ela tinha três linhas de produção, ela estava iniciando a construção das linhas 4, 5, 6 e 7, e aí eles estavam levantando mão de obra para poder vir operar essas novas unidades. E aí eles fizeram uma grande divulgação na UFPA do programa de estágio. Meus amigos ficaram todos agitados com aquele negócio, comentando, mas eu não dei bola nenhuma, eu: “Isso aí não é para mim, isso aí não tem nada a ver comigo, meu caminho é aqui na universidade, e é aqui que eu vou ficar.” E até o último dia da inscrição, eu saí para almoçar com o meu orientador, a gente estava conversando, ele sentou em uma mesa com outros colegas e os colegas comentando: “E aí, já se inscreveu? Já se inscreveu?”. Aí alguém perguntou para mim: “E aí, já se inscreveu?”. Eu falei: “Não, não me inscrevi não.” Aí o meu professor deu um pulo: “O quê?! Tu não se inscreveste?”. “Não, eu vou me inscrever para quê? Não vou para a indústria, não vou trabalhar na Alunorte.” “Não, mas tu tens que ir!”. Eu fiquei até assim, espantado com o comportamento dele, porque eu esperava que ele fosse me incentivar a continuar lá com ele. “Não estou te entendendo, você quer que eu vá para a indústria? Não é para eu ficar aqui e seguir esse caminho?”. “Não, não, você tem que ir lá, para você poder pegar uma experiência na indústria. É importantíssimo para você complementar a sua formação de engenheiro químico.” Ele me orientou e falou assim: “Saindo daqui você vai direto lá para se inscrever nesse estágio. Você vai se inscrever.” Então eu fui lá e me inscrevi no último dia, no último turno, porque ele me chamou a atenção de que eu deveria participar.
34:45
P1 - Um pouco a contragosto, né?
R: A contragosto. Eu falei: “É, tá bom, vamos lá.” E aí eu me inscrevi no processo, deu tempo, quase que a moça estava para sair lá do local onde estava fazendo a inscrição, fui o último a me inscrever. E em determinado momento me chamaram para me fazer a entrevista, eles tinham visto meu currículo, eu já tinha experiência de laboratório há praticamente 3 anos e meio. Então, quando você tem essa experiência, você mora em outra cidade, você estuda, você vai buscar um estágio, chama a atenção em relação àquele esforço. Então acho que isso destacou um pouco o currículo que eu apresentei e eles me chamaram para entrevista. Então eu vim um dia, peguei o ônibus dos funcionários, na época a gente pegava, para vir fazer entrevista, a gente usava os ônibus dos funcionários. Então eu já tive aquela primeira experiência, quando eu entrei naquele ônibus, eu já senti um clima legal, eu falei: “Pô, já vim.” Os funcionários todos dormindo, e eu acordado olhando o caminho, nunca tinha vindo para cá. E ainda tinha muita floresta, era bastante mata fechada, muito bonito. Eu falei: “Nossa, esse caminho é muito legal. Bacana.” Então comecei a mudar um pouco até o meu interesse. E quando eu entrei na fábrica pela primeira vez, que eu vi aquele mundo de equipamentos, eu falei: “Nossa, meu Deus! Eu nunca imaginei que esse negócio era assim.” Aí eu já comecei a querer ficar, sabe? E aí eu fiz uma entrevista muito legal, fiz uma entrevista com um amigo meu, que hoje é muito meu amigo, se chama Sandro Cunha, ele também trabalha na Hydro. E aí eu fui o estagiário do Sandro Cunha, acabei sendo selecionado, eu e outros cinco colegas, para o programa de estágio. Acabei ficando um ano e três meses como estagiário, inicialmente eram seis meses, aí foi renovado por mais seis meses. E depois eu estava para me formar, com essa questão de greve, atrasou a minha formatura, e a Alunorte ainda fez um aditivo no meu contrato por três meses para guardar a minha formatura. E logo em seguida eu fui contratado.
36:31
P1 - Então vamos voltar um pouquinho aqui, porque é muito legal todo esse trajeto, mas eu quero entender antes. Quando você passou nesse estágio, primeiro, o que você sentiu, como foi o dia da entrevista? E como é que foi começar o estágio? Você vinha para a Barcarena, voltava para Belém, você fazia todo dia o caminho?
R: Sim, é. Bom, o dia da entrevista foi como eu falei, quando eu entrei no ônibus, eu já senti aquela vibe, entrei na fábrica, falei assim: “Nossa, olha o que eu ia perder se eu não viesse.” E aí eu já fiquei assim: “Agora eu quero.” Aquele dia foi o dia que eu falei: “Não, eu quero ficar aqui.”
37:03
P1 - E você foi confiante, né?
R: Foi. E acabou que eu fiz uma preparação também, dei uma estudada no que eram os processos da área. Então, eu fui bastante preparado, foi um dia bem longo, a gente passou o dia inteiro lá. Eu acho que eles estavam com algum problema, porque eu só via eles entrando e saindo, entrando e saindo. E a moça do RH falou assim: “Olha, você vai fazer entrevista com esse rapaz aqui.” “Tá bom.” Eu só via ele entrar e sair, entrar e sair. A gente passou o dia inteiro, o dia inteiro, sentado na frente da sala dele, de 08 da manhã até por volta de 16 horas. Então, no final do dia, ele chamou a gente. Aí a gente fez a conversa, fez a entrevista e saímos. Eu pensei que ia ter o resultado ali logo de imediato, acabou que não teve e eu voltei um pouco frustrado. Aí já fiquei pensando: “Nossa, vou aproveitar essa viagem aqui, porque se eu não voltar aqui, eu quero deixar isso bem marcado na minha memória.” Aí voltei para casa acompanhando o caminho, no ônibus dos empregados. E logo depois eles me ligaram dizendo que a gente tinha sido selecionado.
37:59
P1 - Você sabe quantas pessoas tinham tentado e quantos passaram?
R: Não sei, não sei, mas eram muitos estudantes. Como eu falei desde o início, esse processo virou um frenesi muito grande na universidade. Então, muitos alunos se inscreveram. Da minha turma de 50 alunos, por exemplo, da Engenharia Química, apenas cinco ficaram como estagiários.
38:24
P1 - Então, era bem concorrido.
R: Foi bem concorrido. Eram bons alunos, muitas pessoas boas mesmo.
38:30
P1 - Qual que era a promessa? O que vocês enxergavam ali de futuro, de, por que eu quero isso?
R: Depois que eu entrei, que eu vi o tamanho da fábrica, eu vi que a gente tinha muita oportunidade de aprendizado. Então, para mim era assim: “Nossa, eu preciso aprender isso. Eu vi aqui na teoria, mas eu preciso ver na prática.” Então, o que me motivava muito era essa parte de aprender mesmo e de ver as coisas acontecendo no mundo real. Sempre foi isso, sempre foi a questão do aprendizado para mim, foi aquela oportunidade que eu vi, de realmente ter essa experiência.
39:06
P1 - E era uma empresa que estava crescendo também.
R: Era. Mas na época, ela já era grande, sabe? Não era uma fábrica pequena, era uma fábrica grande que estava crescendo ainda mais. Então, impressionava só de você entrar e ver aquele tamanho de empresa.
39:25
P1 - E o que te marcou no estágio?
R: Primeiro, o cuidado que eles tinham com a gente. No primeiro dia que eu cheguei, eu tive uma reunião com o gerente geral da área, que se chamava Otávio Monteiro, ele fez uma reunião com a gente e a primeira coisa que ele frisou foi: “Olha, aqui vocês precisam cuidar da segurança de vocês, então, vocês vão receber equipamento de proteção individual que você precisa usar com bastante disciplina. Você precisa primeiro cuidar da sua segurança para você ter sucesso aqui dentro.” Então, essa parte de cuidado sempre foi muito especial. E eu estava muito afoito para ir para a área e para conhecer os processos, mas a gente acabou passando por um treinamento longo. Então, esse programa de treinamento também era muito extenso para a gente poder ir para a área com segurança. Isso me marcou bastante. A gente não chegava e era logo lançado a área para poder trabalhar, vamos dizer assim, a gente tinha um processo de preparação, as pessoas eram preocupadas com a gente. E também o tratamento que eu tive do meu próprio tutor, o Sandro Cunha, em relação a estar sempre junto com a gente: “Vai para a área? Bora comigo. Olha, isso aqui é assim, isso aqui é assado, cozido, explicava direitinho.” Então, foi uma preparação muito especial.
40:52
P1 - E o que você via ao seu redor? Os funcionários, o clima, o ambiente, tinha mulher, tinha muito mais homem?
R: Esse é um ponto interessante, porque eu entrei como estagiário em 2005 e era um mundo totalmente diferente, porque era muito masculino. Diferentemente da universidade onde eu estava habituado, onde a gente sempre tinha muitos homens, mas também tinha muitas mulheres. O meu curso de engenharia química tinha muitas mulheres, eram 50 e 50 e a gente ficava num bloco próximo da pedagogia, da comunicação, então sempre muitas mulheres. E quando eu entrei na fábrica, aquilo me impactou, porque não tinham mulheres, era um público quase 100% masculino, as únicas mulheres eram as secretárias, deveriam ter umas cinco secretárias e algumas mulheres na comunicação. Então era um ambiente bem diferente do que eu estava habituado. Mas as pessoas sempre muito felizes, um clima muito legal e pessoas educadas. Outra coisa que me marcou bastante é que a gente passava na universidade ali, na cidade de Belém, e as pessoas não falavam umas com as outras. Você passa numa cidade grande e ninguém chega e te cumprimenta: “Bom dia! Boa tarde! Boa noite!” Dentro da fábrica eu falava uns 300 bom dia, porque passava: “Bom dia! Bom dia! Bom dia! Bom dia!” E todo mundo falando com todo mundo, um clima bastante agradável.
42:19
P1 - Você fez bastante amigos nesse começo?
R: Sim, a gente fez muitos amigos. Meus amigos, hoje em dia, são todos provenientes da fábrica e daqui da região de Barcarena.
42:30
P1 - E tinha muita gente de muitos lugares ou era o pessoal do Pará?
R: Esse é outro ponto também bastante curioso, porque no início tinha muita gente de fora, muitos mineiros, o maior público era mineiro. Tinha muita gente do Maranhão, São Paulo. A gente conheceu bastante gente do Brasil afora e muita gente de fora também do país, americanos, canadenses e noruegueses. Também foi outro choque de encontrar com tantas culturas e com tantas pessoas diferentes.
43:03
P1 - Você namorava na época ou você estava dedicado ao estudo e ao trabalho?
R: Eu namorava, tinha uma namorada em Castanhal, mas eu era muito focado nos estudos e acabava que o namoro ficava para o final de semana.
43:13
P1 - E o que você falava para os seus pais nesse começo de carreira? O que te impactava ali que você queria compartilhar?
R: Então, como eu falei, meu projeto de vida era professor universitário. Quando eu pisei lá dentro, eu falei: “Eu quero ficar aqui o resto da minha vida.” E aí eu tive que falar isso para eles. Eu falei: “Acho que eu não vou mais fazer mestrado ou doutorado, eu quero ficar aqui.” Então, um ano e três meses ali do meu estágio, foi de muito aprendizado, de muita dedicação, porque eu falei: “Essa aqui é a minha oportunidade e eu vou buscar por ela, eu vou lutar por ela.” Mas também foi de muita angústia, porque eu costumava falar assim quando eu acordava: “Hoje é mais um dia? Ou será menos um dia?”. Eu sempre ficava assim: “Será que eu vou continuar aqui ou vou, no final do meu estágio, sair? É mais um dia ou menos um dia? Eu vou para mais um dia.” E aí eu ia com toda a energia, com toda a raça para poder fazer a minha história. E eu falava isso para os meus pais, eu falava que eu queria continuar lá, eu queria ser contratado. E a gente foi seguindo esse caminho.
44:21
P1 - E vocês se divertiam também nesse trabalho? Tinham festas que a empresa proporcionava? Tinha essa parte social?
R: Tinha. Sempre teve uma relação muito grande com as pessoas fora do trabalho, o pessoal sempre marcava alguma coisa durante a semana ou durante o final de semana. A gente fazia churrasco ou aqui na Vila dos Cabanos, às vezes eu vinha, às vezes fazia em Belém. Fui várias vezes na casa do Sandro, na casa de outras pessoas confraternizar e a gente se relacionava bastante. Tinha muita relação pessoal, sim.
45:09
P1 - E a própria cidade, o que te interessava?
R: Aqui em Barcarena, nessa época, eu não tinha muito contato, porque eu morava em Belém, então eu acabava indo e voltando. No tempo de estágio, eu saía de Belém e pegava o ônibus às seis da manhã e aí voltava no ônibus dos estagiários, saía daqui duas da tarde e chegava em Belém às 16 horas e ia para a universidade. Finalizei meu último ano de curso assim, saía às 22 horas, chegava em casa, dormia e já vinha para cá de novo. Então acabei não vindo muito para cá, para a Vila dos Cabanos, em Barcarena durante esse período. Quando eu fui contratado, eu vim morar aqui em Barcarena, então eu acabei aproveitando mais a cidade. A gente ia muito para a praia do Caripi, a gente ia muito ali na pracinha que tinha a praça de alimentação, ficava por lá conversando e tudo.
45:53
P1 - Felipe, então você terminou o estágio e em que momento você soube a boa notícia que era mais um dia, que você ia continuar?
R: Então, quando cresce a empresa, aumenta o número de vagas, então a Alunorte estava em um momento de expansão, eles tinham criado uma outra vaga de engenheiro de processos na área que eu estava trabalhando, que era a área da utilidade, até então, o único engenheiro de processo da área era o Sandro Cunha. Eles criaram uma outra vaga para a vaga de expansão e contrataram um engenheiro que era o Clauderino Batista. Hoje ele também é professor da Universidade Federal. E ele ficou por alguns meses, mas logo depois ele tomou a decisão de não continuar, de voltar para a universidade. E foi muito próximo do momento em que eu me formei. Então na hora que ele decidiu sair para voltar para a universidade, abriu a vaga e aí eles me chamaram para ser contratado.
47:00
P1 - Então foi rápido? Você se formou e logo já foi contratado?
R: Foi, foi rápido. Inclusive, na verdade, quando eu completei um ano de estágio, ele saiu. Só que eu não tinha ainda concluído o curso, devido aos atrasos que eu tinha. Eles me pediram uma previsão. Eu falei: “Olha, três meses eu vou estar concluindo.” Então eles seguraram por três meses. E aí quando eu concluí, eu peguei uma declaração na universidade, levei e aí eu fui contratado.
47:30
P1 - Ah, não, mas me conta essa notícia, deve ter sido muita felicidade, né?
R: Com certeza, foi emocionante.
47:38
P1 - O que você lembra desse dia?
R: Foi o dia que eu mais esperei na minha vida, recente, em relação àquele ano, como eu falei, o meu estágio foram meses de muito aprendizado, alegria, crescimento pessoal e profissional, mas também de muita angústia. Então naquele dia que eu recebi a notícia, realmente eu fiquei muito feliz e pude relaxar e falar assim: “Pô, consegui.”
47:53
P1 - Comemorou?
R: Bastante. E depois eu tive que chegar lá para o meu professor, na universidade e falar: “Olha, tu me mandaste vir, agora eu não vou voltar para cá, viu? Esse projeto de mestrado e doutorado vai ficar para frente.”
48:06
P1 - E ele?
R: Ele até hoje manda mensagem para mim: “Olha, abriu a vaga do mestrado.” Todos os anos ele me manda mensagem para eu voltar. Inicialmente, quando eu fui contratado, ainda tentei fazer o mestrado, mas ficou muito pesado, porque tinha que voltar para Belém, a gente estava no meio da construção lá das linhas de produção, 4, 5, 6, 7. Então acabei não concluindo. E aí depois vieram outras prioridades, né, esposa, filhas, mas está guardado para o futuro, um dia a gente vai chegar lá.
48:38
P1 - Você saiu do estágio e já virou funcionário trainee?
R: Eu virei engenheiro de processo trainee. Então eu entrei em 2005 como estagiário e em 2006 eu fui contratado como engenheiro de processo trainee, em 11 de março de 2006.
48:57
P1 - E aí já era funcionário com todos os benefícios? Tudo certinho?
R: Sim. Todo funcionário na Alunorte já é contratado tendo direito a todos os benefícios.
49:08
P1 - E aí quando é que você se mudou para a Barcarena? Me conta essa transição para começar a carreira como efetivado.
R: Então, eu morava em Belém e voltava para a Barcarena no início da minha jornada aqui. Fui contratado e continuei nessa ida e vinda. Eu dividi um apartamento com outros 5 colegas, era um apartamento de 2 quartos ali na Almirante Barroso e a gente convivia lá, basicamente à noite, porque todos tinham suas atividades. À noite a gente se reunia ali, fazíamos um jantar juntos, dormia, descansava e no outro dia todo mundo saía cedo. E como eu disse, eu estava na expansão das linhas de produção, eu estava na área de utilidades, que é a área que é responsável pelo tratamento de água, geração de vapor. E aí eu fui designado para acompanhar o comissionamento das caldeiras a carvão que estavam iniciando, elas se chamavam Caldeiras Alstom, eram caldeiras de fabricação americana. E era muito desafiador, era uma tecnologia nova. Então eu fui designado para essa função. E foi muito difícil no início, porque como era uma tecnologia nova, ninguém conhecia, a gente teve muito problema. A gente entrava na fábrica às 08 horas da manhã, saía 10, às vezes 11 horas da noite, ia para Belém, chegava em Belém, meia noite, 01 hora, dormia, 06 da manhã estava de volta, quando não, pediam para a gente ficar final de semana. Comecei a ficar muito, ou ficava indo e voltando muito tarde da noite, o que era uma viagem até perigosa, e quando não, a gente ficava muito em hotel, ficava muito ali no hotel Equinócios, cheguei a ficar mais de 30 dias lá, a gente, dedicado nesse processo de expansão. E aí o meu chefe, na época, me perguntou se eu não queria vir morar para cá, perguntou como é que eu morava. Eu falei: “Eu moro num apartamento, divido quarto com outras pessoas.” “Pô, você não quer vir para cá? Eu vou te dar um RAM.” RAM é como se fosse uma vila de apartamentos que a empresa tem, era uma habitação empresarial. Eu falei: “Eu quero. Eu moro com outras pessoas, para mim vai ser bem melhor.” E aí, em 2007, eu vim para cá. Eles reformaram todo esse apartamento, era um apartamento de um quarto, uma sala, uma cozinha, mas ficou tudo novinho, muito legal. E eu vim embora para cá. Fiz minha mudança dentro de um Fiat Uno, eu só tinha um colchão e um ventilador. E estamos aqui até hoje.
51:50
P1 - E nesse RAM você morava vizinho de outros colegas de trabalho?
R: Sim, todos eram funcionários. Aí a gente já passou a não ter que acordar tão cedo, porque não tinha viagem de Belém para cá, já dormia um pouquinho mais, era um pouco mais confortável.
52:05
P1 - E podia até poupar dinheiro também, né?
R: Sim.
52:12
p1 - E aí: “Mãe, agora estou me mudando para a Barcarena. Vocês que me visitem.”
R: “Estou me mudando para a Barcarena.” Mas eu ainda continuava indo e voltando para Castanhal todo final de semana. Ainda fiquei vários anos indo e voltando e ia muito para Castanhal, todo final de semana eu ia para Castanhal. A maioria dos meus amigos ainda estavam lá. Até 2010, quando eu encontrei a Renata e casamos e viemos morar para cá.
52:34
P1 - Tá, então como é que foi esse encontro? Ela era de Barcarena?
R: Não, a Renata é de Castanhal. Ela trabalhava com uma prima, ela é professora de português em uma escola em Castanhal, Escola Estadual. E além dela trabalhar com uma prima, ela trabalhava com uma amiga que eu conheci através de um outro amigo. E quando eu encontrei essa pessoa, que ela se chama Nancy, ela olhou para mim e falou assim: “Tu és a cara do marido da Renata.” Eu pensei que ela estava falando de outra pessoa. Ela: “Não, tu vais casar com a Renata.” A primeira vez que ela me viu, ela falou isso. E eu era solteiro, então eu falei: “Tá bom, eu vou casar com a Renata. Cadê ela? Me apresenta a ela.” “Não, eu vou te apresentar a ela. Ela mora lá em Castanhal.” Aí a gente foi nessas conversas aí, se encontrou, me passaram o telefone dela e eu liguei para ela: “Olha, eu sou o Felipe e a Nancy falou que eu vou ser teu marido.” Aí, ela: “Ela falou isso para mim também.” “Então tá bom, bora se encontrar aí.” A gente se encontrou e começou a namorar.
53:07
P1 - Gente, que cupida! E vocês sendo da mesma cidade, não se conheciam?
R: Não se conhecia. Nossos pais se conheciam, meu pai tinha trabalhado com o pai dela, mas eu particularmente não conhecia ela.
53:24
P1 - E qual foi a confirmação para você, (Renata tá ouvindo), que você falou: “É isso mesmo, vou ser o marido dela.”
R: Então aí a gente foi, se conheceu, começou a namorar, era junho, então Festa Junina, era Copa também, Copa de 2010, assistia jogos juntos, ficava junto, eu estava de férias, então fiquei bastante tempo lá em Castanhal, a gente saía bastante. E como ela também era solteira, ela tinha feito um processo para fazer mestrado em Santa Catarina, e aí ela chegou para mim e falou assim: “Olha, eu fiz a prova do mestrado e eu passei. E agora, o que a gente faz?”. Eu falei: “Ah, você vai então, a gente fica namorando à distância, né?”. E aí assim ela foi, em julho, agosto, ela foi para Santa Catarina, nessa época, era em 2010, eu estava no processo de trabalhar de turno, então eu trabalhava seis dias, folgava por quatro, e aí logo que ela foi, eu comprei uma passagem, e fui visitar ela no feriado de 07 de setembro de 2010. Então a gente tinha começado a namorar em junho, em setembro eu fui lá e visitei ela, em outubro ela veio, me visitou, e ela já estava grávida da nossa primeira filha, da Ana Letícia e em janeiro de 2011 a gente casou.
54:14
P1 - Aonde vocês casaram?
R: A gente casou em Castanhal.
54:19
P1 - E aí ela saiu lá de Santa Catarina, ou continuou?
R: Ela veio no recesso, a gente casou, ela voltou, terminou as disciplinas do mestrado, grávida, e em 31 de maio de 2011 a Ana Letícia nasceu, lá em Santa Catarina, eu tirei férias no período, fui pra lá aguardar, e a gente com sete dias da Ana Letícia e veio embora pra cá.
54:49
P1 - Pra cá?
R: Pro RAM, a gente morava no RAM. Em 2011 mesmo a gente deu um jeito, comprou essa casa aqui e veio morar pra cá.
55:00
P1 - Mudou tudo, né?
R: Mudou tudo.
55:01
P1 - E como é que foi pra você a notícia de que você ia ser pai?
R: Primeiro foi assustador, né? Eu tinha 28 anos, eu acho, na época. Mas pra mim assim, eu já estava no tempo, sabe? Mas eu não esperava que fosse acontecer naquele momento, foi inesperado, foi não planejado, mas por outro lado também foi de grande alegria. Falei: “Poxa, eu vou ter uma filha.” E foi de muita felicidade.
55:32
P1 - E você já estava estável no seu trabalho?
R: Já, já estava estável, já tinha cinco anos de empresa, eu já tinha sido promovido várias vezes. Na Alunorte eu cresci muito rápido, sempre fui muito dedicado, trabalhava muito, pra mim não tinha questão de horário, eu era workaholic mesmo. Então as promoções vieram muito rápidas, praticamente eu recebi uma promoção por ano. Então quando eu casei, eu já tinha um nível de gerente de área. E a gente casou em 2011 e dois anos depois eu já fui promovido para gerente geral. Então eu já estava bem estabelecido, tinha bastante confiança da empresa, conhecia todos os processos, eu era muito dedicado, foi bem tranquilo.
56:26
P1 - Felipe, você cresceu muito rápido, você via isso acontecendo ao seu redor com seus colegas ou foi algo na sua carreira que foi diferente?
R: Algumas pessoas tiveram crescimento rápido, eu tive amigos que chegaram a se tornar gerente de área em três anos, então assim, não eram todos, mas acontecia. E a Alunorte sempre deu muita oportunidade de crescimento para as pessoas que se destacavam.
56:59
P1 - Você viu, então, você viveu a transição da Vale para Hydro?
R: Vivi, sim.
57:02
P1 - O que que te marcou nessa época?
R: Bom, foi uma gestão muito diferente. A Alunorte não era muito representativa para a Vale, era um negócio secundário, tanto é que a Vale vendeu depois. E ela não tinha muita influência, não tinha muita presença, os executivos da Vale não vinham muito aqui, geralmente os resultados eram reportados trimestralmente, eles davam parabéns ou faziam algum comentário e era só isso. Então não tinha muita presença, era uma gestão assim meio à distância e eu percebia que tinha muito desperdício, como não tinha muito controle ali, tinha muito desperdício, tinha muita perda de produção, tinha muita perda de materiais que eram comprados e que não eram aplicados, então tinha muita oportunidade nesse sentido. E quando a Hydro chegou, ela mudou muito isso, então ela chegou realmente. A Alunorte para a Vale era muito pequena, mas a Alunorte para a Hydro era muito grande. Então a Hydro veio com muitas pessoas pra cá, muitos noruegueses e realmente passou a fazer uma gestão muito mais próxima, trouxe a cultura norueguesa muito forte pra cá pra dentro. Todos os funcionários foram treinados no Hydro Way) muitos não se adaptaram à mudança, muitos saíram, mas também muitos permaneceram, porém foi uma mudança muito positiva, uma cultura de realmente gestão humanizada, foco nas pessoas, respeito ao meio ambiente, respeito às legislações e compliance de uma forma geral muito forte.
58:50
P1 - Você consegue me trazer pra gente entender na prática um exemplo do que você viu que era melhor, que era positivo dessa nova cultura?
R: Sim, a gente tinha, por exemplo, quando a Hydro chegou, a gente tinha a fama de ser indisciplinado, nós como Alunorte, que eu falo de uma forma geral, porque nós tínhamos vários procedimentos, mas muitos não eram seguidos, por exemplo. Então ela trouxe essa cultura de compliance, ela falava muito em compliance, que é conformidade com as normas, com os procedimentos, e independente do que acontecesse, a gente deveria cumprir com os procedimentos. Mas para dar um exemplo muito claro, se você estivesse enfrentando uma perda de produção ali, mas tinha um procedimento que você tinha que seguir e que aquele procedimento, por você seguir, estenderia aquela perda de produção, a Hydro falava: “Siga o procedimento, independente da perda.” Então ela abria mão daquela produção que representaria lucro, por cumprir com o procedimento, para reforçar a cultura de que a gente precisava ser disciplinado com o procedimento. Quando a gente era Vale, se a gente tinha a perda de produção, tinha ali um procedimento, falava: “Mas se eu quebrar esse procedimento e ir por esse caminho, eu paro essa perda de produção imediatamente.” Então a gente ia, quebrava o procedimento e parava a perda de produção. Então a gente tinha muito mais foco na produção do que nos procedimentos, do que na cultura de uma forma geral. E a Hydro veio com essa outra visão, de falar: “A gente não quer a produção de curto prazo, a gente está aqui para ficar por muitos anos, e para isso a gente precisa ter uma cultura de seguir procedimentos, seguir normas e ser disciplinado com a questão da conformidade.”
01:00:39
P1 - E em relação aos funcionários, ao tratamento, ao respeito ao funcionário, mudou alguma coisa?
R: Mudou bastante. O tratamento lá era muito ríspido, chegava a ser até ignorante, os gerentes, de uma maneira geral, eram cativados a serem duros. E mudou da água para o vinho, não de um dia para o outro, foi um processo que levou vários anos, mas o respeito passou a prevalecer. Então a Hydro trouxe a questão do Hydro Way os valores muito fortes, e um dos valores era o respeito, ela pregava bastante. No início eram palavras, que eram ditas, mas que não eram compreendidas e praticadas, mas à medida que as mudanças foram ocorrendo e novos processos foram se estabelecendo para avaliar a questão do comportamento, a questão da liderança. E aqueles que tinham mais alinhamento foram permanecendo, os que tinham menos alinhamento foram convidados a uma reflexão. Aqueles que se adequaram continuaram e os que não se adequaram foram saindo, porque realmente não conseguiram se adaptar a essa questão de tratar as pessoas de maneira respeitosa.
01:01:46
P1 - Você lembra de algum tratamento que você sentiu, que você recebeu na pele, que para você foi: “Isso aqui foi diferente.”?
R: Eu tive um caso onde eu estava em um restaurante jantando com os amigos. A gente estava tendo um problema de produção lá na planta, mas a gente saiu tarde e foi jantar, na hora que a gente pagou a conta, eu estava saindo, eu passei por uma mesa e estava o nosso diretor industrial na época. A gente se viu, perguntei para ele: “Tudo bem?”. Aí, ele: “Tudo bem.” Aí deu um tempinho, ele pensou, olhou para mim e falou assim: “Tudo bem, nada, está uma merda, aquela tua área está uma merda!”. no meio do restaurante, sabe? Eu falei: “Ué, mas a gente está trabalhando para restabelecer.” “Ah, mas está uma merda, vocês não estão dando conta daquele trabalho.” E começou a discutir ali, e eu comecei a discutir com ele também, eu perdi um pouco a cabeça, a gente começou a discutir lá na frente de várias pessoas, por volta de 2009. Então aquilo foi bastante chato para mim, várias pessoas depois começaram a falar que eu ia ser desligado, porque eu tinha brigado com o diretor no restaurante. Eu falei: “Eu não briguei com ele, ele que brigou comigo.” Mas acabou que não aconteceu nada, eu acho que ele relevou e eu também relevei. Mas, era mais ou menos assim o clima, era bastante puxado, muito foco nessa parte de entregar resultado e pouco foco no tratamento das pessoas. Isso não existe mais, isso é inadmissível, inaceitável.
01:03:04
P1 - E aí depois, isso nunca mais aconteceu? E o tratamento era diferente?
R: Depois, com a chegada da Hidro e com a questão de fazer o aculturamento das pessoas, principalmente da liderança, a maioria desses líderes que não tinham esse tipo de tratamento, esse tipo de comportamento e conduta, eles foram saindo mesmo, e novos foram chegando e as pessoas foram percebendo que não era mais admissível ter esse tipo de postura.
01:03:30
P1 - Eu escutei de algumas pessoas, alguns exemplos, a roupa social para sair da empresa, para não sair com roupa suja, me dá mais alguns exemplos que você foi vendo acontecer?
R: Sim, nosso uniforme foi mudando. A gente tinha um uniforme marronzinho da Alunorte e para nós era comum a gente trabalhar o dia todo, principalmente quem trabalhava na área operacional. O pessoal que trabalhava em escritório já tinha uma roupinha social, mas nem todos os funcionários tinham essa roupa social. E também não era uma regra sair com a roupa social, quem tinha, a gente saía com a roupa operacional mesmo, às vezes estava sujo, de bauxita, de matéria-prima e era normal a gente sair, a gente ia para o restaurante, a gente ia para o supermercado. E uma das coisas que a Hydro mudou quando chegou e comprou a empresa foi mudar o uniforme e estabelecer essa questão da roupa social para 100% dos empregados. Primeiro que todos os empregados têm os dois uniformes, tanto o social quanto o operacional, a gente tem que chegar e sair com o social, garantindo que esteja limpo, porque tem todas as regras de conduta, e a gente tem o operacional, quando a gente usa para andar na área. E além disso, esse operacional precisa ser lavado dentro da empresa, tem uma lavanderia lá dentro para lavar 100% do uniforme, porque lá tem tratamento do resíduo, do fluente, para garantir o controle ambiental e que não saiam as roupas sujas de lá.
01:05:03
P1 - Então você começou a ver esses exemplos que também eram de acordo com os teus valores, imagino, né?
R: Sim, com certeza. A gente viu o tratamento que a empresa passou a dar para os funcionários, não só no dia-a-dia, nas relações interpessoais, mas também nos benefícios, em todo tipo de compensação.
01:05:22
P1 - E aí como foi começar a criar uma família, uma filha?
R: Foi bem desafiador, porque a gente estava muito acostumado a só trabalhar, trabalhar e no final de semana estar com os amigos, na praia. E aí a gente teve que mudar o comportamento, mudar a rotina pra poder chegar em casa mais cedo, ajudar a esposa, dar atenção para os filhos e se adequar. Mas foi muito gratificante, porque quando a gente sente o amor das filhas e da família, a gente se reenergiza. O trabalho não precisa ser pesado, quando a gente trabalha com o que a gente gosta, com o que a gente ama, o trabalho se torna leve, também se torna, às vezes, até uma diversão. Mas tem altos e baixos, e a gente passa por algumas crises, e às vezes fica chateado com algumas situações, e nessas situações, quando tem a família do lado, a gente consegue forças para enfrentar qualquer desafio. E isso foi muito marcante pra mim, nesse sentido, porque foi uma experiência totalmente nova, ter uma filha, ter uma família pra cuidar. A responsabilidade aumentou bastante, então, a dedicação que eu tinha, eu tive que aumentar pra poder dar continuidade no meu trabalho e poder também dar condição de cuidar das minhas filhas e da minha família. Eu sempre fui um pai muito presente, acredito que sempre dei muita atenção, eu nunca fui assim ausente de deixar: “Ah, fica aí, Renata, com as meninas, que eu vou fazer outra coisa, vou jogar bola, eu vou...” Eu nunca deixei as minhas filhas assim, nem a minha família. Então eu sempre busquei juntar as coisas e conciliar, então, no momento de trabalho, eu tô trabalhando, no momento de lazer, eu tô com elas. Eu costumo dizer que, quando alguém faz um convite… às vezes eu faço um convite pra vir alguém aqui em casa, aí às vezes a pessoa pergunta: “Esse convite extensivo é a minha família?”. E eu sempre penso assim: “Se você tem família, como é que você vai estar separado dela?”. Quando alguém me convida também, subentende-se que eu só vou se a minha família for. Isso mudou bastante, mas também é muito prazeroso.
01:07:37
P1 - Então, você teve a Ana Letícia em que ano? E depois as outras?
R: A Ana Letícia nasceu em 2011, em 2015 nasceu a Ana Marília e agora em 2025 nasceu a Ana Patrícia.
01:07:55
P1 - Me explica agora os nomes, que nem eu te perguntei do seu, da decisão desses nomes.
R: A Ana Letícia foi um processo. Todos os nomes foram sempre um processo de discussões muito intensos com a minha esposa, a Renata sempre fez questão de buscar nomes com significado. E aí a gente começou com essa Ana, que é cheia de graça, Ana é cheia de graça. E aí cada um tem, Letícia é alegria. Marília representa Maria. E a Patrícia é nobre, mas a Patrícia na verdade foram as duas que escolheram, a Renata queria a Ana Vitória, eu queria a Ana Beatriz, mas aí a gente agora tem duas meninas adolescentes que têm mais vontade do que a gente e acabaram escolhendo a Ana Patrícia.
01:09:02
P1 - E como é que é criar essas meninas em Barcarena? Como é que foi isso?
R: Eu acho que foi muito bom. Barcarena é um lugar muito bom para viver, eu adoro morar aqui, eu não tenho vontade de morar em outro lugar. A gente tem, apesar dos problemas sociais, que é natural de qualquer cidade brasileira, a gente ainda tem muita segurança, nós temos escolas boas aqui, essas escolas foram trazidas pelas empresas. A gente tem acesso a muito contato com a natureza, as praias, rios e para a gente é muito confortável viver assim. A gente gosta muito de práticas esportivas, de estar em contato com a natureza, então para nós é uma vida muito boa. A empresa traz muita estrutura para a cidade, são empresas grandes que geram muita movimentação na economia, geram muitos tributos, provém muitos recursos para o município também estruturar a cidade. Barcarena ao longo dos últimos 15 anos teve a sorte também de ter bastantes gestores públicos responsáveis que deram uma melhorada significativa na cidade, na infraestrutura como uma forma geral, nas praças, nas avenidas, mas também nas escolas, nos hospitais. Então é uma cidade muito bem estruturada e que dá condições de uma vida muito boa.
01:10:31
P1 - Hoje você não mora mais numa vila de trabalhadores, né?
R: Não, aqui foi uma vila de trabalhadores bem no início, mas depois a empresa vendeu as casas, apesar desta ser uma casa original construída pela Albras ainda em 1985, mas ela foi vendida anos após.
01:10:31
P1 - Então você vive como qualquer pessoa que mora em Barcarena?
R: Sim.
01:10:36
P1 - E você falou bastante, que você foi vendo ao longo dos anos o impacto da empresa com a comunidade, me fala um pouquinho.
R: Sim. A Alunorte veio dos grandes projetos da Amazônia, junto com a Hidrelétrica de Tucuruí e a Albras, na época a intenção era fazer com que o desenvolvimento da Amazônia fosse impulsionado. Então esse projeto iniciou em 1975 com a construção da usina hidrelétrica, a usina era em Tucuruí com o intuito de fornecer energia elétrica para Belém e para as fábricas. Em 1985 iniciou a Albras e em 1995, 10 anos após, iniciou a Alunorte. E eu acredito que ela trouxe sim esse desenvolvimento socioeconômico, hoje em dia já temos vários empregados que estão aposentados das empresas, que cresceram suas famílias e se desenvolveram dentro das empresas, viveram aqui em Barcarena por muitos anos, ainda vivem e formaram seus filhos e são muito gratos a empresa até hoje. Assim como nós também. Então a gente reconhece muito, a gente vê muito essa questão do desenvolvimento social, não adianta a gente ter só educação, ter boa formação, se a gente não tiver um local para trabalhar, não tiver emprego, emprego digno, justo e essas empresas provém essa questão dos direitos humanos e do trabalho digno muito fortemente. É um valor muito grande da empresa, não só com os empregados, mas com a comunidade em geral. A empresa é muito justa na questão do pagamento dos tributos para os governos e esse recurso é muito bem aproveitado na cidade, mas também a empresa desenvolve muitos projetos sociais, porque apesar de trazer uma massa grande de empregos, hoje as empresas do Grupo Hydro geram mais de 15 mil empregos no Brasil, diretos, além da movimentação da economia. Mas ainda não é o suficiente para a sociedade que a gente tem, a gente ainda tem no Brasil uma sociedade muito desigual, as empresas reconhecem essa desigualdade e trabalham forte com projetos de desenvolvimento social para buscar que a gente consiga fazer também uma transição justa. Então a empresa Alunorte tem muitos projetos sociais, trouxe muito desenvolvimento em Barcarena. Vários exemplos: escola técnica, hospital, tem um hospital Adventista que auxilia, não é o principal hospital para o município, mas desafoga um pouco o hospital municipal e estadual. Tem a questão das escolas também, é a mesma coisa, é uma escola privada, mas desafoga um pouco do município e do estado e traz qualidade de ensino também, traz emprego. Tem os projetos do Terpaz que estão sendo construídos. A unidade de triagem seletiva. O próprio fundo Hydro que abre editais para que as comunidades possam aplicar para desenvolver projetos de desenvolvimento socioambiental. Então a empresa é muito preocupada com a questão da comunidade e trabalha muito, investe muito forte. Desde a criação do fundo Hydro, já foram mais de 400 milhões investidos em projetos sociais para desenvolvimento das comunidades. E a tendência é que a gente continue. A Hidro é uma empresa norueguesa que tem atuação em mais de 44 países, a maioria dos países são países desenvolvidos. Então quando a gente visita essas unidades, visita esses países, a gente percebe a intenção da empresa de investir no desenvolvimento social, mas já não tem mais tanta oportunidade nesses países, ou seja, não tem tanta desigualdade social. Então acaba que o Brasil atrai muito essa atenção e a maioria dos recursos da empresa, como um todo, é aplicado aqui no Brasil nos projetos sociais, principalmente aqui em Barcarena e na linha do Mineroduto.
01:15:02
P1 - Na questão socioambiental também, meio ambiente?
R: Sim, meio ambiente também. As empresas de uma maneira geral mudaram bastante, principalmente agora, dos anos 2000 para cá, as empresas têm evoluído muito em relação à preocupação com o meio ambiente, mas a Hydro sempre saiu na frente, sempre foi uma empresa pioneira nessa questão socioambiental. E desde que a Hydro assumiu o Alunorte, ela tem dado um olhar diferenciado para essas questões, os processos da empresa como um todo, todo o processo produtivo foi revisado desde que a Hydro assumiu e foram feitos investimentos de mais de 1 bilhão e meio em adequações ambientais, em tecnologias, aumento de capacidades para que a gente tenha realmente muita robustez nos controles ambientais dessa refinaria. E mais recentemente também foram feitos grandes investimentos na questão da descarbonização do processo, na transição energética, mudando o óleo combustível para o gás natural e reduzindo bastante a emissão de carbono.
No ano passado, a gente reduziu mais de 1 bilhão de toneladas de emissão de carbono com esses projetos, não só da troca do combustível, como também de novas caldeiras elétricas, uso de biomassa. Então a Hydro é uma empresa diferenciada, no setor do alumínio é a empresa que tem a menor emissão de carbono por tonelada de alumínio e segue com a ambição muito grande de continuar esse caminho, sempre muito preocupado com o meio ambiente, com a sociedade. De fato, isso é uma declaração da missão da empresa, que é contribuir com o desenvolvimento social a partir dos recursos naturais que a gente tem no planeta, de maneira muito responsável e consciente.
01:17:13
P1 - Nesses anos que você está lá dentro, quais foram as tecnologias, as inovações que você participou ativamente, que você tem orgulho, que você quer contar?
R: A gente sempre, na Alunorte, sempre buscou tecnologias de ponta. Desde a minha entrada na fábrica a gente tem enfrentado com bastante coragem essas inovações e trazido para dentro da empresa em escala industrial mesmo, não em escala laboratorial e nem piloto. Inicialmente a gente trouxe as caldeiras a carvão, naquela época o carvão era um insumo aceitável, vamos dizer assim, e foi desafiador, mas era uma tecnologia nova que estava sendo expandida para todo o mundo. Depois a gente trouxe o filtro prensa, que era uma tecnologia nova de filtragem do resíduo, fazia uma lavagem melhor, uma secagem e advindo também a construção do DRS2, que é um modelo de empilhamento totalmente diferente que reduz em três vezes a área necessária para o resíduo. A gente também fez o Fuel Switch, que é a troca do combustível óleo e BPF para gás. Trouxe ano passado novas caldeiras elétricas com uma tecnologia nova também, uma tecnologia em parceria com empresas norueguesas, empresas da Eslovênia. Também é a primeira caldeira elétrica nesse porte. Então a Alunorte é isso, é uma história de sucesso, história de coragem para investir em novas tecnologias, coisas que as outras empresas demoram ou ficam avaliando em outras escalas para fazer, a gente faz, e faz em escala industrial, em grandes quantidades e grandes tamanhos também.
01:19:10
P1 - E nesse seu tempo de trabalho, de carreira, você se sentiu valorizado em algum momento especial? Teve algum reconhecimento que é importante?
R: É difícil até selecionar um reconhecimento, porque a gente pratica bastante essa questão de reconhecer e valorizar as pessoas e eu não posso reclamar de nenhum momento que eu tenha sido desvalorizado, não consigo lembrar se teve algum momento que eu fui desvalorizado. Eu não consigo lembrar porque, talvez a quantidade de momentos felizes e de reconhecimento positivo que a gente teve são tão maiores que tornam qualquer visão negativa desprezível. Então a gente sempre foi muito valorizado na empresa, as pessoas são valorizadas e sempre tive muito reconhecimento da minha liderança, das pessoas com quem eu trabalho, das pessoas que respondem para mim também. Eu sempre sinto muito esse carinho das pessoas. Hoje mesmo, antes de iniciar aqui, eu fui ali na padaria e comprei alguns docinhos, pães e um café e encontrei algumas pessoas da empresa, que a gente sai aqui na Vila dos Cabanos e sempre encontra com alguém da empresa e sempre que a gente encontra, as pessoas falam: “Poxa, você está fazendo falta. Quando é que você volta?”. Sempre perguntam quando é que termina essa minha licença paternidade. Isso é muito legal, é um reconhecimento que não é só da empresa, não é só da liderança, mas das pessoas com quem você se relaciona ali, e isso te torna assim, incluso, participante, pertencente.
01:20:18
P1 - Você teve três filhas ao longo dessa história, os três momentos são parecidos? Algo mudou?
R: Mudou. A Ana Letícia, como eu disse, nasceu em Santa Catarina, nasceu em Florianópolis, então foi bem desafiador. Já quando a Ana Marília veio, a gente já estava bem estabelecido aqui nessa casa. Quando a Ana Letícia nasceu, a gente não tinha nossa casa própria, eu morava no RAM da empresa. E a gente foi construindo, quando a Ana Marília veio, já estava bem mais estruturado, assim como com a Ana Patrícia.
01:21:00
P1 - Mas eu digo até das licenças paternidade.
R: Sim, quando a Ana Letícia nasceu, a licença era cinco dias, eu tive que tirar férias de 30 para poder acompanhar. A mesma coisa a Ana Marília em 2015. E agora com a Ana Patrícia, a empresa já há uns dois ou três anos assinou o memorando para ser uma empresa que a gente chama social.
01:21:31
P1 - Empresa cidadã.
R: Empresa cidadã. E aí essa licença aumentou para 28 dias. Então eu tirei férias de 20 dias e mais a licença, então estou ficando 50 dias aqui com a minha família. A princípio eu fiquei preocupado, porque a gente sempre fica pensando como é que vai estar o trabalho, mas a turma que está lá está me dando um bom suporte, eu tenho um time muito forte, comprometido, está lá o Leonardo, a Luciane, o Everton, trabalhando bastante. Eu pensei que eu ia ser mais acionado, pensei que eles iam precisar mais de mim, mas graças a Deus eles estão indo bem. De vez em quando eu é que fico: “Ei, e aí vocês esqueceram de mim?”. Mas está sendo bem legal, porque eu estou conseguindo me dedicar bastante para essa nossa nova integrante da família e está bem próximo desse processo de desenvolvimento dela, de criação dela, porque não basta ser pai tem que participar, tem que acordar de madrugada, tem que dar apoio e tem que estar junto.
01:22:34
P1 - E você falou que quando você começou era um ambiente predominantemente masculino, isso mudou?
R: Mudou. A gente buscou bastante ao longo dos anos a questão da diversidade, inclusão, pertencimento. A empresa como eu disse, a Hydro é uma empresa pioneira nas questões sociais, então desde muitos anos ela já vem trazendo essa questão de aumentar a diversidade no ambiente de trabalho, antes até de outras empresas começarem a falar, ela já falava, já começava a trazer pessoas de gênero diferente, orientação sexual diferente, raça diferente. Independentemente disso, a Hydro sempre trabalhou com a gente, então o ambiente de trabalho mudou muito. Hoje a gente tem 25% de mulheres no nosso quadro próprio. A gente já tem iniciado a influência com as empresas contratadas também, a maioria das contratadas já estão chegando em torno de 13% a 14% de mulheres. Então isso aí, em um ambiente de 8 mil pessoas a gente já vê muitas mulheres, a gente já vê muitas pessoas ali que a gente não via antes. O ambiente mudou completamente.
01:23:49
P1 - Você tendo meninas como filhas, imagino que é algo muito importante, né Felipe?
R: Com certeza, porque o ambiente se tornou mais leve, como eu falei no início, o ambiente era muito duro, era ríspido, tratamento de homem com homem era realmente muito pesado e à medida que as mulheres foram chegando, elas começaram a inibir esses comportamentos e as coisas foram se adequando, as pessoas são muito mais respeitosas. E é um ambiente que a gente realmente está construindo para o futuro, para que realmente nossos filhos e filhas possam ter cada dia um ambiente mais saudável para poder trabalhar e viver bem.
01:24:25
P1 - Para você, olhando na perspectiva de 19 anos de empresa, por que é uma empresa que você ainda quer continuar?
R: Primeiro, porque ao longo desses anos todos, eu aprendi a ter amor por essa empresa. Eu sempre vi a importância que essa empresa tem para a sociedade paraense e brasileira. É uma empresa que desenvolve pessoas, que traz recursos para o Estado e para o município. Então essa empresa tem importância vital para a nossa sociedade. E o meu trabalho eu reconheço que impacta muito na sobrevivência dessa empresa. Então eu quero continuar contribuindo para o sucesso dessa empresa, para a sobrevivência dessa empresa. Além disso, é uma empresa que respeita as pessoas, que respeita o meio ambiente, trabalha de uma forma diferente, então busca evolução e busca cada dia mais crescer e aprender. E a gente quer contribuir com esse aprendizado, com esse crescimento. Eu quero continuar trabalhando para desenvolver pessoas, para desenvolver a empresa e tornar cada dia mais essa empresa mais robusta.
01:25:49
P1 - Eu vejo que lá dentro tem um ambiente até familiar, muito pai, filho, irmão, muita gente trabalha assim.
R: Tem sim. Aqui em Barcarena nós somos 120 mil habitantes, a gente emprega lá na Alunorte, só na Alunorte, cerca de 8 mil pessoas. Então a maioria, 80% é daqui da região, é de Barcarena, e Abaetetuba. Então é difícil você não ter pessoas próximas, é difícil não desenvolver relacionamentos lá dentro. Muitas famílias iniciam lá dentro, as pessoas se conhecem, se apaixonam, se casam, tem muitas histórias assim, tem filhos, crescem, os filhos se desenvolvem. A empresa tem os benefícios escolares e de universidade também, os filhos se formam, aí as oportunidades aparecem, os filhos vêm. E assim a gente vai vivendo como uma grande família mesmo.
01:26:37
P1 - É um futuro que você imagina, se as suas filhas, obviamente, quiserem seguir por esse caminho, você apoia?
R: Sim, com certeza. Diferentemente do que eu vi dos meus pais: “Não faça Engenharia Civil!”. Apoio plenamente, ficaria bastante orgulhoso se elas quiserem seguir o caminho que eu segui. E a gente está lá construindo o ambiente para que, quando chegar o dia, esteja cada dia melhor, para que elas possam também crescer e se desenvolver.
01:27:01
P1 - E o que que significa para você participar desse símbolo que está aí no seu peito, esse aniversário de 30 anos?
R: Eu sinto muito orgulho de poder estar nesse momento aqui, participando dos 30 anos da Alunorte. Como eu disse, desde que eu pisei aqui pela primeira vez, eu tive o sentimento de que era o meu lugar, que eu deveria pertencer a isso e trabalhei todos os dias da minha vida nessa empresa, fazendo o meu melhor e buscando dar o melhor resultado para que ela pudesse sempre crescer, se desenvolver e ter longevidade. E quando eu entrei em 2005, como estagiário, eu entrei em março, poucos meses depois, em julho, 15 de julho foi a partida do Moinho. Então, poucos meses depois da minha entrada, teve uma comemoração de 10 anos da Alunorte, a empresa trouxe o A-ha aqui para fazer um show, acabou que não deu certo o show, o cantor ficou com rouquidão, acabou não cantando. Tinha uma estrutura enorme lá dentro da fábrica. Mas ele foi lá, bateu foto, foi um evento que ficou reservado para os funcionários que completavam 10 anos. Então, eu fiquei de fora e fiquei babando por aquilo e ficava pensando: “Nossa, que eu possa ser contratado aqui, que eu possa completar 5 anos pelo menos, depois 10. Mas, para mim, o tempo sempre parecia muito longe, mas o tempo foi passando, as coisas foram acontecendo e hoje, olhando para trás, eu vejo que, dos 30 anos, eu estou 20 anos lá dentro e contribuindo para essa empresa cada dia mais. Então, é muito orgulho poder estar aqui nesse momento, falando da minha vida, falando da Alunorte, porque a Alunorte faz parte, realmente, da nossa vida.
01:28:54
P1 - Não teve show?
R: Não teve show, em 2005, não teve show, só teve fotos. Mas, em 2015, depois, eles trouxeram o A-ha de novo, nos 20 anos, e aí, sim, teve show e foi bem legal.
01:29:06
P1 - Olha, eu não sabia desse detalhe. Que interessante. E ser escolhido, como você acabou de me falar, o tanto de gente que trabalha lá dentro, então, ser um dos escolhidos para contar a sua história nesse projeto, como é que você se sente?
R: Eu me sinto privilegiado, porque, realmente, são muitos funcionários, com certeza, muitas histórias maravilhosas, também, de superação, de desafios, de sucessos, e eu espero estar aqui representando todos eles, também. A gente sempre lembra com carinho das pessoas que trabalham com a gente, e eu sou apenas mais um, mas eu estou representando esses funcionários todos, tanto os próprios quanto os contratados. Espero poder estar com eles aqui juntos.
01:29:56
P1 - Tem alguma história, algum causo que você viveu nesses quase 20 anos, que você não esquece que você quer contar? Vamos registrar.
R: Tem vários casos, muitas coisas. O principal, acho que o que me marcou mais, foi, realmente, quando teve a mudança da gestão na Alunorte. A Hydro é uma empresa, como eu disse, que respeita muitas pessoas, ela comprou os ativos da Vale em 2011, mas ela, realmente, só fez uma grande mudança na gestão a partir de 2013. A gente estava vivendo uma crise muito grande, tanto de produção quanto de segurança e foi necessária uma intervenção um pouco maior. Ela trouxe muitos gerentes, muita liderança experiente de outras empresas, e isso foi um choque cultural. Apesar de que, quando ela chegou, fez muitos treinamentos do Hydro Way, mas era, assim, muita conscientização e acabou que, acho que a gente que estava lá não entendeu aquela mudança e não começou a realizar aquela mudança junto. Foi necessária uma mudança um pouco mais profunda, e aquilo, realmente, gerou um choque cultural, eram pessoas, realmente, muito diferentes e a gente teve que ter uma mudança de postura muito forte. A gente realmente cresceu profissionalmente muito, a gente passou a ter ainda mais dedicação e atenção aos detalhes. E foi traumático por um lado, mas muito positivo por outro, porque tudo aquilo que a gente queria realizar em termos de resultado, a gente depois conseguiu, porque realmente toda a empresa se uniu em prol de um bem comum, de um objetivo comum, e a gente conseguiu realmente fazer uma mudança cultural, comportamental, e esses resultados vieram muito fortes. Foi um processo difícil, começou em 2013, que teve seu auge em 2016, em 2017, onde a gente conseguiu, finalmente, atingir as produções nominais que a planta foi desenhada. A gente desde 2009, quando concluiu as expansões, nunca tinha conseguido, cerca de sete anos depois a gente conseguiu chegar lá. E foi bastante desafio, foi bastante luta, e muitas superações.
01:32:29
P1 - E na tua vida pessoal, algum momento que você pôde contar com a empresa que fez diferença, que foi marcante?
R: Essa empresa é um background para a nossa vida pessoal. Então, tudo que acontece na nossa vida, a gente acaba contando com ela, por alguma coisa, seja na educação dos nossos filhos, seja num momento mais crítico de saúde. Então, a gente tem um plano de saúde muito bom, que cobre o Brasil todo, os melhores hospitais da região. Então, em todas as situações, desde o nascimento da nossa filha às situações de emergência, a gente sempre foi muito bem amparado pelo plano, pelos profissionais da área de saúde, a gente tem uma área de saúde muito forte na Alunorte, sob a gerência da doutora Helen, a gente tem assistentes sociais, hoje a Sandra também é muito próxima. Então, em qualquer situação pessoal, a gente sempre pode contar com elas, com a empresa suportando.
01:33:29
P1 - E na época da pandemia?
R: A pandemia foi realmente muito desafiadora, a gente teve que fazer, em alguns momentos, de home office, a gente teve muita mudança no ambiente da fábrica, como um todo. Eu tive uma semana de home office, mas eu não consegui ficar fora. Então, eu cheguei para o meu chefe e falei que a minha área estava muito ruim, que eu não poderia ficar fora, eu contei uma história para ele, para ele não me botar de home office. Acabei ficando direto lá. Acabei pegando COVID com isso, fiquei gripado na segunda semana, eu acho, da pandemia, logo no início e aí, como eu tive sintomas, voltei para o home office. Mas eu falava para a Renata: “Não, não estou com COVID, estou só gripado.” E aí eu ficava ali no computador trabalhando todos os dias ainda de home office. E foi um momento que eu fiquei com medo, não por mim, mas pela Ana Marília, pela minha filha mais nova, porque eu ficava trabalhando e, às vezes, dava vontade de espirrar, eu espirrava, virava para o lado, espirrava e ficava trabalhando, e aí quando eu percebia, a Ana Marília estava andando aqui, por perto. Mas eu: “Não, isso aqui é só uma gripezinha.” Porque eu estava trabalhando, mas a gente tinha feito um esquema de revezamento com os funcionários, o grupo de risco a gente tinha deixado em casa, os funcionários, a gente mudou o turno para reduzir a quantidade de pessoas na fábrica, mas mantendo a produção, teve um esquema muito grande. Então, assim, a fábrica estava um pouco mais esvaziada e eu não tinha muito contato, para mim, eu não tinha pego. Mas, no terceiro dia, eu senti aquela perda do olfato, então, quando eu perdi o olfato, eu falei: “Meu Deus, nunca tinha sentido isso na minha vida!”. E aí nesse dia eu fiquei com medo, porque a Ana Marília estava muito próxima de mim. Aí eu fiquei com medo de perder ela. Então eu fiquei desesperado! Acordei de manhã sem olfato, cedo ainda, fui para o hospital, hospital lotado, lotado, passei o dia inteiro no hospital. Quando a Renata acordou, que me ligou, eu falei: “Estou no hospital, perdi o olfato, estou com Covid. Eu vou ficar para cá, vou me internar.” Acabou que não teve nem como eu ser atendido, porque era tanta gente. Voltei para casa, me isolei e passei esse período ali. Não tive muitas complicações, só os sintomas de gripe mesmo, graças a Deus, mas fiquei mais preocupado pela minha família, sabe? E, assim, a gente foi vendo aquelas pessoas perdendo entes queridos e foi um momento muito difícil. Mas a gente teve muita união ali com a empresa, com a área de medicina. A área de medicina foi muito forte, eles trabalharam muito para manter as pessoas vivas, para cuidar das pessoas que estavam doentes. A empresa também deu muito apoio nas questões municipais. A gente fez a doação de um prédio aqui para transformar em um hospital de campanha, fez muita doação de equipamento, oxigênio, máscara, a gente fez uma parceria com uma comunidade, para a comunidade fabricar máscaras e a gente comprava na comunidade. Então foi um momento de muita união também, muita força.
01:36:48
P1 - E você teve viagens ao longo desses anos? Você foi para lugares que você nunca imaginaria?
R: Sim. Inclusive, a minha primeira viagem de avião foi para um curso em São Paulo em 2007. Eu nunca imaginei ir para São Paulo, nunca imaginei sair do Pará, era uma coisa, um menino do interior, a gente nem sonhava com isso, era um negócio que passava muito longe. E na Alunorte a gente teve muitas oportunidades de viagens, de treinamentos. Eu conheci o mundo pela empresa, vários países, vários estados, treinamentos, fui para São Paulo, fui para Noruega, fui para Austrália, Estados Unidos, Portugal, Amsterdã, vários países da Europa. A empresa Hydro tem muita presença na Europa. É sempre muito desenvolvimento pessoal, eventos de summit, viagens maravilhosas. E depois, também, com o nosso próprio desenvolvimento pessoal, a gente também começou a levar a nossa família para conhecer alguns lugares também que a gente não conhecia e realizar sonhos.
01:37:48
P1 - Qual o sonho que você realizou?
R: Essa é engraçada. O maior sonho que eu tinha… desde criança eu tinha um amigo lá em Castanhal, que era muito rico e ele falava muito que participava do Rally do Piocerá. É um rally que acontece no Nordeste. Piocerá é do Piauí para o Ceará, ou Cerapió, que é do Ceará para o Piauí. E vai pelas praias do Nordeste, é um negócio muito bonito. E eu tinha esse sonho de realizar. Então, em 2023, eu combinei com a Renata, falei assim: “Eu quero realizar um sonho, eu quero ir para o rally.” Aí a gente foi, preparou um carro 4x4, se inscreveu e foi a família toda. E foi muito legal! Eu, a Renata, a Ana Letícia e a Ana Marília, participamos desse rally por quatro dias, várias praias, várias cidades nordestinas. E foi muito bonito. Esse foi um sonho que foi bem marcante, né? E foi bem legal. Foi bastante aventura, realmente a gente passa por várias dunas. E teve um momento bem engraçado, quando a gente passou por dentro de um lago, aí o carro virou assim de lado, aí a Ana Letícia caiu por cima da Ana Marília lá atrás e a Ana Marília começou a gritar: “Pai, esse é seu sonho?! Esse seu sonho era me matar?! Seu sonho era me matar?!”. E começou a ficar desesperada, eu: “Calma, menina! Já voltou para cá.” Aí ela ficou assim, assustada e começou a brigar comigo: “Não, bota o cinto aí, vocês estão sem cinto, bota o cinto, senão vocês vão se balançar aí atrás.” Foi bem legal. Depois elas ficaram me cobrando, né: “Olha, a gente realizou seu sonho, agora tu vais ter que realizar o nosso.” E aí ficou uma brincadeira aqui em casa, que tudo, elas falavam: “Ah, pai, meu sonho, meu sonho.” Tudo que elas queriam fazer, falavam que era sonho, porque elas tinham realizado o meu, eu tinha que realizar o delas.
01:39:48
P1 - Tem algum em especial?
R: Tem, tem sim, tem o da Renata, que ela queria conhecer a Europa, e ano passado a gente foi lá, conheceu Portugal, Amsterdã, Bélgica. E a Ana Patrícia também é um sonhinho que elas tinham.
01:40:07
P1 - Que legal, elas queriam uma irmãzinha. E agora, qual é o próximo sonho?
R: Tem vários ainda, né? Tem muita coisa para se fazer, para se realizar. Mas agora o nosso principal objetivo é que a Ana Patrícia cresça, que ela está recém-nascida ainda, que ela cresça com saúde, que ela possa ficar bastante fortinha, pra gente realizar esses outros sonhos. Mas um sonho que eu tenho grande ainda é de fazer um tour pela Europa de bicicleta, eu tinha vontade de conhecer várias cidades ali, pedalando, passar bastante tempo. Mas é um sonho que está distante ainda, preciso ter bastante planejamento, mas está vivo ainda. E outro sonho é voltar pra universidade, fazer meu mestrado, meu doutorado. Um dia ele vai acontecer ainda, mas não agora.
01:40:57
P1 - São metas, né?
R: São.
01:40:58
P1 - Você imaginava que o menino do interior ia chegar onde chegou e fazer tanta coisa?
R: Não fazia nem ideia. Meus sonhos naquela época eram muito pequenos, para o que a gente conseguiu. Apesar de a gente olhar as outras pessoas realizando, mas a nossa realidade não permitia a gente achar que aquilo era possível, sabe? Mas é possível, a gente, dando um pouquinho de sorte, contando com Deus e com as pessoas que amam a gente, a gente consegue.
01:41:34
P1 - E você continua indo bastante pra lá visitar seus pais? Ou eles vêm mais pra cá?
R: É, a gente vai lá em alguns momentos, já não vai mais tanto, a gente não vai todo final de semana como ia antes. Eles vêm aqui também, a gente mantém uma boa relação com a família, que é muito importante. Eu valorizo muito a paz de espírito, sabe? Eu acredito que a gente tem que ter paz na vida para poder realizar nossas atividades, trabalhar de maneira adequada, estudar, desenvolver. Se a gente não tiver paz na nossa família, com as nossas esposas, com os nossos filhos, a gente não consegue fazer as coisas, porque a cabeça está todo o tempo pensando em problemas e outras coisas. Então eu valorizo muito a união, a harmonia, não só na família, também no nosso trabalho, no dia-a-dia. Eu sou muito conciliador, eu vejo um conflito, eu: “Não, pera aí, bora ver. O que tu queres?”. Fico conciliando. Sempre foi assim, porque eu acredito que a paz é fundamental para gente poder dar o nosso melhor, sabe?
01:42:44
P1 - Felipe, você é muito jovem, tem muito ainda pela frente, mas você chegou onde você se sente realizado? Como é que está hoje no seu momento atual?
R: Eu sempre me senti realizado depois que eu comecei a trabalhar nessa empresa e depois que eu tive a minha família. Então, quando eu conheci a Renata e a gente teve a Ana Letícia, eu sempre, a partir daí, eu acho que eu já me sentia realizado, sabe? Eu sempre falava pra ela que até nem queria outra filha, porque eu pensava que eu nem ia conseguir dar amor para outra filha, o quanto eu dava para Ana Letícia. Mas a gente não conhece as nossas próprias limitações, né? Depois que veio a Ana Marília, eu ficava pensando: “Nossa, como é que eu pensava em não ter outra filha? Eu não ia conhecer a Ana Marília e eu tenho tanto amor por ela!”. Depois eu não queria ter a terceira, né, e a Renata insistiu, e hoje eu olho a Ana Patrícia e falo: “Nossa, como é que eu pensava que não queria ter a Ana Patrícia? E hoje eu tenho tanto amor por ela!”. Então, eu sempre me sinto realizado, sabe? Eu não tenho, assim, um pensamento de: “Ah, falta isso pra eu realizar, falta aquilo.” Eu vivo o momento, sabe? Eu acho que a gente tá realizado e as coisas vão acontecendo à medida que a gente se dedica ao nosso trabalho, se dedica à nossa família, coisas maravilhosas vão acontecendo e a gente vai olhando pra trás e vai pensando: “Nossa, ainda tinha tanta coisa pra acontecer que eu nem imaginava.” Mas não tenho muito pra pedir, não, só para agradecer.
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P1- Como é que foi pra você abrir seu baú de memórias e contar um pouco da sua história pra gente?
R: Foi emocionante, né? A voz tá embargando um pouquinho, o olho está entrando num cisco aqui de vez em quando, mas é sempre muito bom reviver, recordar, pensar desde meus pais, meus avós ali, toda a história que a gente viveu e construiu. É muito emocionante, gratificante e dá um orgulho grande do que a gente conseguiu fazer até hoje, né?
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P1 - E imaginar que essa história fica lá num acervo, né? Que todo mundo vai ter acesso daqui, você, suas filhas maiores.
R: Eu acho que essa é a maior recompensa, né? A gente poder depois olhar isso e falar que: “Poxa, olha só, pude participar disso.” Né? É um orgulho muito grande. Fiquei muito feliz com o convite que vocês fizeram, que a área de comunicação trouxe, me senti muito reconhecido e valorizado.
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P1 - É isso. Obrigada, viu!
R: Obrigado a vocês.
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