As descobertas de uma menina de 11 anos

Tudo era tão diferente nos anos de 1970, não havia internet, celular, tv a cores e tantas outras novidades. A cidade ficava muito distante da minha realidade, morava no bairro de Vila Nova Cachoeirinha e lá era outro mundo, rua sem asfalto, água de poço, brincadeiras na rua. Ir ao centro da cidade era um acontecimento!, colocar a melhor roupa, o melhor calçado e tomar o ônibus - esse o melhor momento!

Aquela semana seria muito diferente, tinha recebido o convite da madrinha da minha irmã para irmos ao cinema! Eu nunca tinha ido a um cinema, foi uma grande emoção! Os dias não passavam, a quinta feira nunca chegava, e eu ficava imaginando como seria o cinema que ficava lá na "cidade" ! Poucas vezes tinha ido ao centro da cidade ela me encantava, guardava em minha memória o cheiro do ônibus, as luzes, os carros... Finalmente chegou a quinta feira e eu, com meu vestido xadrez vermelho, minha sandalinha branca estava radiante esperando a dona Terezinha para irmos ao cinema na cidade!

A viagem de ônibus foi radiante, muitas coisas pra ver até que chegamos à Av. Rio Branco, era lá que ficava o cine "Rio Branco" com seu lindo carpete vermelho e, sua porta de vidro. Quantas novidades! quantas informações!. Estava radiante, alegre, feliz e entramos naquela sala escura! O filme!!! finalmente o filme! E ele começo - legendado, não conseguia acompanhar a imagem e a legenda. O que eles estavam falando? Mas não importava, o que importava era que eu estava no cinema na cidade!

Lembro que quando saímos do cinema já estava escuro, talvez seis horas da tarde, a cidade estava iluminada! linda! Um monte de carros passavam, pessoas andavam apressadas, elas não estavam encantadas como eu! Como é possível? Andava pela calçada de mãos dadas com a dona Terezinha e tudo meus olhos quardava cada detalhe daquela cidade tão distante da minha vida, da minha história. A volta foi de imaginação, de sonhos, de uma alegria enorme, tanta coisa pra contar!

Chegamos, minha mãe estava atarefada cuidando da casa e dos meus irmãos - ela não queria saber das minhas emoções, meus irmãos eram pequenos também não entendiam a minha euforia. Já era muito tarde e minhas amiguinhas não estavam me esperando... Não havia ninguém com quem pudesse compartilhar as minhas descobertas... e assim fui dormir, sonhando com tudo aquilo que eu havia vivido! No dia seguinte a minha realidade voltou... a minha rotina...as minhas brincadeiras. As emoções, essas ficaram guardadas na memória!! Quanto ao filme somente anos mais tarde fui rever, conhecer a história, os personagens e assisti-lo acompanhando a imagem com a legenda e finalmente saber que se chamava "Ao mestre com carinho! Tinha que ser "Ao mestre com carinho", porque foi assim que olhava para aquela mulher que havia me levado a viver tamanha aventura, ela foi a mestra que com carinho mostrou àquela menina de um mundo tão pequeno que havia uma imensidão a ser explorada!

Hoje, quando passo na Av. Rio Branco não posso deixar de sentir uma triste nostalgia ao ver a degradação do centro de São Paulo, como tudo perdeu o encanto e se transformou num lugar triste e feio. Mas a cidade que guardo na memória ainda é o lugar mais lindo que meus olhos viram!