Projeto Memória Petrobrás
Entrevistado por Márcia de Paiva e Douglas Tomás
Depoimento Artemiza Bianchi
Rio de Janeiro 23/10/2008
Realização Museu da Pessoa
Depoimento nº PETRO_HV113
Transcrito por Maria Christina de Almeida Macedo
P1 – Boa tarde Artemiza.
R – Boa tarde.
P1 – Queria começar a entrevista pedindo que você nos diga seu nome completo, local e data de nascimento.
R – Antes de me casar meu nome era Artemiza Coelho de Andrade. Depois, muito tempo depois, passou Artemiza Andrade Bianchi. Eu nasci em 21 de fevereiro de 1940 em Floriano, interior do Piauí. Formam 260 quilômetros da capital, mais ou menos isso. Meu pais, você quer saber? Artur Coelho de Andrade e minha mãe: Semiramis Andrade. Daí vem meu nome porque eles, apesar de ter muita instrução, liam muito. E meu pai gostava muito da história do Rei Artur; a Távora Redonda. E minha mãe, Semiramis, era esposa de Nabucodonosor do jardim suspenso da Babilônia. Então escolheram meu nome: Artemiza; nome de uma deusa grega. Então isso aí tudo tem a ver. E também começava com o nome dele. E ele queria, como ele era comerciante industrial, ele queria ter uma firma só. Botou o nome dos filhos: Artulino, Abetiza. Só três nomes de filhos que foi promessa da minha mãe, porque disse que ia perder, e fez promessa. O resto todos levam o A, ACA. Artemiza Coelho de Andrade, Antônio Coelho de Andrade, Abetiza Coelho de Andrade e assim, pra poder...
P1 – São quantos irmãos?
R – Somos oito.
P1 – Oito?
R – Oito.
P1 – Artemiza, então como foi a sua infância em Floriano?
R – Em Floriano. Foi uma infância brava. Não tinha luz elétrica, não tinha água encanada, era tudo muito longe. A gente morava um pouco longe do centro da cidade, onde tinha os colégios, né? Aí a gente ia pro centro da cidade todo dia. Logo que meu pai...
P1 – Ia de quê?
R – O meu pai, em 1951. Não. A guerra acabou em 45, em 49 ele comprou o primeiro jipe Land Hover. Em 49....
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Entrevistado por Márcia de Paiva e Douglas Tomás
Depoimento Artemiza Bianchi
Rio de Janeiro 23/10/2008
Realização Museu da Pessoa
Depoimento nº PETRO_HV113
Transcrito por Maria Christina de Almeida Macedo
P1 – Boa tarde Artemiza.
R – Boa tarde.
P1 – Queria começar a entrevista pedindo que você nos diga seu nome completo, local e data de nascimento.
R – Antes de me casar meu nome era Artemiza Coelho de Andrade. Depois, muito tempo depois, passou Artemiza Andrade Bianchi. Eu nasci em 21 de fevereiro de 1940 em Floriano, interior do Piauí. Formam 260 quilômetros da capital, mais ou menos isso. Meu pais, você quer saber? Artur Coelho de Andrade e minha mãe: Semiramis Andrade. Daí vem meu nome porque eles, apesar de ter muita instrução, liam muito. E meu pai gostava muito da história do Rei Artur; a Távora Redonda. E minha mãe, Semiramis, era esposa de Nabucodonosor do jardim suspenso da Babilônia. Então escolheram meu nome: Artemiza; nome de uma deusa grega. Então isso aí tudo tem a ver. E também começava com o nome dele. E ele queria, como ele era comerciante industrial, ele queria ter uma firma só. Botou o nome dos filhos: Artulino, Abetiza. Só três nomes de filhos que foi promessa da minha mãe, porque disse que ia perder, e fez promessa. O resto todos levam o A, ACA. Artemiza Coelho de Andrade, Antônio Coelho de Andrade, Abetiza Coelho de Andrade e assim, pra poder...
P1 – São quantos irmãos?
R – Somos oito.
P1 – Oito?
R – Oito.
P1 – Artemiza, então como foi a sua infância em Floriano?
R – Em Floriano. Foi uma infância brava. Não tinha luz elétrica, não tinha água encanada, era tudo muito longe. A gente morava um pouco longe do centro da cidade, onde tinha os colégios, né? Aí a gente ia pro centro da cidade todo dia. Logo que meu pai...
P1 – Ia de quê?
R – O meu pai, em 1951. Não. A guerra acabou em 45, em 49 ele comprou o primeiro jipe Land Hover. Em 49. Eu tenho até um jipe, de 51. Ele comprou, importou direto. Ele ia a Parnaíba buscar, que vinha pra ele direto da Ingaterra por intermédio do Rolan Jacó, que era o cara que comprava. Então daí nós tínhamos condução. Mas antes era a pé mesmo! Naquela época não usava tênis. Era mesmo alpargatas, era chinelo. Ele chamava mesmo alpargatas.
P1 – Como é que era a cidade de Floriano?
R – Era muita atrasada, mas ao mesmo tempo era uma cidade desenvolvida pelo colônia árabe. Eram árabes os donos do comercio. E o meu pai, não era pra ele ter ficado na cidade. Quando ele desceu o rio Parnaíba com a minha mãe, aí ele teve febre amarela, ele teve tifo, ele quase morre. Os filhos foram nascendo no meio do caminho. Quando chegou em Floriano, que ele queria se estabelecer num lugar, mas não era Floriano que ele queria. Mas quando ele chegou lá, ele foi muito bem recebido pelos árabes, que sabiam que ele estava querendo se desenvolver na vida em 1932, 1931, um negócio assim. Não me lembro mais. Aí ofereceram tudo pra ele. Aí ele ficou. Ele se desenvolver lá e começou. Trabalhava muito, era um comerciante, não tinha medo de nada, se metia mesmo. E em 1940 quando estourou mesmo a guerra, foi a época que ele mais ganhou dinheiro. Que ele veio à São Paulo, levava três meses pra chegar em São Paulo. Ele veio a São Paulo buscar uma fábrica nova. Porque a que ele tinha era toda improvisada. A fábrica de bebidas: guaraná, até água gaseificada, vinhos. Ele tinha alambiques. Ele desenvolvia tudo lá.
P1 – Era uma fábrica de bebidas?
R – De bebidas.
P1 – Como é que era o nome da fábrica?
R – Fábrica de bebidas Artur Coelho de Andrade, ACA. Porque era minha era do meu irmão, era de quem tivesse ACA. Então era ACA, AC Andrade. Mas era Artur Coelho de Andrade. E a minha mãe era coadjuvante dele ali; ela que fazia tudo. Ainda dava tempo de cuidar da gente, de bronquear, de botar a gente de castigo, de dar palmatória, nem devia ter tanto tempo. Mas tinha.
P1 – O que ela fazia?
R – Ela as embalagens pra meu pai porque chegava os caminhões pra levar as bebidas, às vezes, 60 dúzias em quatro dias. Era tudo manual. Ele tinha vários empregados, né? Mas ai ele botava filho, todo mundo pra trabalhar, pra ajudar. E minha mãe fazia as embalagens, que é de lona, à máquina. E como eu te disse, ela cobrava, não era de graça não.
P1 – Aí ela ganhava um dinheiro.
R – Ah! Ele tinha que pagar. E ele não se negava a pagar,não.
P1 – Artemiza, e o que você se lembra da sua infância? Quais eram as suas brincadeiras?
R – (Riso) Não tinha nada dessas coisas de hoje.
P1 – Você é qual da escala entre os irmãos?
R – Deixa eu ver, tenho que contar. Terezinha, José, Artulina... Eu sou a quinta.
P1 – E como é que era?
R – Ah! Os mais velhos sempre dando rasteira nos mais novos, mas ensinando, né? Ensinou a gente a atirar de baladeira, atirar daquelas de caçar passarinho, subir em cerca e roubar o caju da cerca dos outros. E eu desde aquela época eu já fazia caminhadas sozinha, né? Às vezes, quando eu tinha companhia, andava até... Disseram até pra minha mãe que talvez eu tivesse algum problema que eu gostava muito de caminhar. Eu saia, pra ir da cidade até o aeroporto era muito longe. Eu tinha oito anos, nove anos, dez anos. Mas não era perigoso, então a gente ia. Só que marcava tantas horas de volta. Um calor! Piauí, minha cidade é muito quente. 40 graus é assim, mole.
P1 – E mesmo assim...
R – A gente andava. Eu ia. Às vezes, tinha companhias que ia comigo. Outras vezes não iam; eu ia sozinha. Mas não tinha problema, nunca teve problema. Meus irmãos levavam a gente pra tudo quanto era lugar. As meninas acompanhavam eles em tudo. Nas brincadeiras, a gente só era uma coisa. Eles jogavam futebol com aquela bola de meia, né, que eles faziam. Eu tinha que ficar num gol e minha irmã no outro. Às vezes, a gente saia pra conversar e era o gol. Eles ficavam muito bravos porque a gente abandonava aquele travessão. Ele botava uma pedra aqui, outra ali e eu tinha que tomar conta do gol pros outros não fazerem gol. E a minha irmã tinha que tomar conta do outro gol, que era mais nova que eu um ano. Porque a mais velha não queria participar muito não. Que a diferença era de um ano e oito meses, já tinha onze, doze anos; já não queria. Eu nove anos, a outra oito. E a gente tinha que brincar. Também brincava de castanha, de acertar. Ele botava uma castanha grande; a calçada era de cimento, a gente tinha que... Quem acertasse ganhava todas as castanhas que estavam lá. Eles eram desonestos porque eles nunca acertavam, eles deixavam ficar cheia. E a gente não tinha aquela noção de direção, depois pegamos, né? “Acertar o peru” que chamava; pra derrubar. Ficava com todas as castanhas.
P1 – Atirava uma castanha pra acerta o quê?
R – Uma outra castanha. A melhor. Que ficava em pé, num banquinho de areia. Ficava ali no meio. E ficavam três ou quatro que queriam participar. Todos que queriam participar tinham que ter uma reserva de castanha boa pra poder entrar na brincadeira, né? Então não podia entrar, por exemplo, tinha regras, não podia entrar com menos de dez castanhas. Se não tivesse pulava a cerca do vizinho e roubava. Capava os cajus.
P1 – Artemiza, retornando. Como eram as histórias que a senhora estava contando sobre as noites de lua?
R – As noites de lua, como não tinha luz elétrica e criança, sabe? Muita criança. Ah! Eu esqueci de dizer que nós éramos oito irmãos; e ele criava cinco sobrinhos de irmãos do mais interior que não tinham condições, não tinham dinheiro. Aí vinham lá pra casa, pra estudar. Agora eu me lembro do nome de alguns: o Júlio, o Francisco, o Tersino, teve um que se tornou até famoso lá. Entalhador de obra de arte. E o outro eu esqueci o nome, tem várias. Ah! Marcelina, o filho é até médico hoje na cidade.
P1 – Uma criançada.
R – Era uma criançada muito grande. Em noite de luar vinham crianças de outras casas pra brincar que tinha um areal, não tinha asfalto. Era um areal em pó nossa rua. Então a gente ia brincar. E vinha todo mundo contar histórias. Tinha umas histórias pavorosas, né? Hoje tem Chapeuzinho Vermelho... Mas tinha história de alma, de Saci Pererê que eu nem dormia, coitada.
P1 – Mas quem contava?
R – As pessoas antigas que iam lá pra contar histórias. Daí tinha outros que contavam mentiras que a gente sabia que era mentira. Tinha apanhado uma cobra cascavel, que a cascavel tinha mordido. Eu ficava: “Pô cara, você que salvou a cascavel?” E no dia seguinte a gente perguntava a meu pai, né? E tinha os vaqueiros, afilhado dele que, quando ele estava na cidade, ele mandava os vaqueiros contar como era no mato. E meu pai e minha mãe também não tinham muito juízo, quando chegava a época das férias da gente eles queriam que a gente tivesse contato com o povo da roça. Então o Júlio, meu primo que morava lá em casa, já sabia dirigir; ia levar a gente pra determinados lugarejos dessa gente pobre. E ele mandava todo o suprimento. E a gente ficava 15 dias de férias lá. Não tinha estrada, Land Hover não tem isso, Land Hover vai. E eu me lembro que eu peguei malária, eu estava com doze anos. Aí mandaram o... Eu estava na casa dessa gente pobre. Mas aí era pra apanhar feijão, milho, quebrar milho. Ele mandava a gente pra viver a vida do povo lá e aprender. Carregava água de longe nas cacimbas.
P1 – Pra dar valor.
R – E era pra dar valor. E era a época das desmanchas. Desmanchas. Era a farinha, a farinhada. Era descascar a macaxeira, mandioca. Que lá macaxeira não faz farinha, macaxeira se come. É totalmente diferente. A mandioca brava que tinha as mulheres pra descascar e os homens no caititu. Caititu era de madeira e tinha uma roda com a correia e rodava; o caititu ali passava, eles botavam a mão. Tinha gente até sem mão porque ali alguns distraídos, né? E eu aprendi até isso, a fazer farinha, né, descascar mandioca. Eu, meus irmãos e todos nós. E numa dessas eu peguei uma malária e quase que eu morro. Então...
P1 – E a escola? Com o que era?
R – A escola. Eu tive em escolas. Quando veio pra cidade escolas boas que foram... Vieram escolas boas. Veio a primeira de todas, das freiras. Mercedárias, só de meninas. Aí papai botou as filhas mulheres nessa escola. Tirou da escola e disse que era bom a gente ir pra escola melhor e deixar a vaga praquela gente que não podia.
P1 – A outra era pública?
R – É, era pública. Só tinha escola pública e tinha umas particulares assim. Todas eram escolas públicas. Menos o ginásio que era do Doutor Sobral Neto que era Ginásio Santa Terezinha. E o certo é que quando fiz o exame de admissão, porque tinha um exame de admissão pra entrar no ginásio. Eu fiz, mas minha mãe, meu pai não estavam satisfeitos porque eu não podia entrar no ginásio. Eu passei. Porque não caiu nada na prova de conta de multiplicar e dividir. Porque eu criei um bloqueio louco, não aprendia. Aprendia se tu me dissesses: “Soma tanto”. Mas na hora que eu ia dividir a desgraça não dividia. Então bloqueei. Me botaram numa tal de Nenê Preá. Nenê Preá era uma professora que usava palmatória. E eu e meu irmão entramos no ginásio sem saber fazer essas contas. Disseram pra minha mãe: “Ah! 15 dias eles aprendem”. Eu aprendi em uma semana. Porque a mulher quando me deu o primeiro bolo, foram seis bolos; ela assim: “Oito vezes oito, 64 dividido por dois, multiplicado, somado...” E era numa velocidade e eu não acompanhei aquele raciocínio. Ai quando eu levei os bolos...
P1 – O bloqueio passou.
R – Aí, caramba. Desgraçada.
P1 – O bloqueio passou foi na hora?
R – Passou na hora. Eu e meu irmão. Era uma coisa assim: era uma psicologia louca, né? Hoje eu sou mãe de um cientista matemático lá; mora nos Estados Unidos, que não tem calculo que ele não resolva. Então eu disse pra ele: “Eu tenho impressão que deve ter sido a genética aí que ajudou”. Ele até ri muito dessas histórias que eu conto. E aí eu fiquei descansada. Mas não foram muitos dias não. Tinha sabatina. A gente tinha que estudar pra sabatina.
P1 – Aí a senhora voltou pro...
R – Ginásio. Aí vim, era o... Era pago.
P1 – Isso já era nas freiras?
R – Nas freiras eu já sai pro ginásio. No ginásio era que... As freiras tinham preocupação que eu não aprendia; nem eu, nem o meu irmão. Não aprendíamos. “Mas por quê? Se eu ajudava meu pai na fábrica, se...” “Eu não sei”. “Eu não sei também”. Eu não sei se é porque eu disse pra mim que eu não ia aprender, eu não sei. Eu tinha um bloqueio. Eu e ele, né? Não era só eu não. Eu sei que aprendemos logo. E no ginásio não teve mais desculpa pra equações, essas coisas. Eu tinha uma irmã que nos ensinou, ela estudava em São Paulo. Essa sempre estudou fora, a mais velha. Meu pai tinha condições então tirou de Floriano. Ela e o irmão mais velho. E depois ela foi estudar em São Paulo. E ela era considerada na cidade uma cabeça. Então ela ensinava muita coisa. Ela vinha de São Paulo; na cidade não tinha uma biblioteca, não tinha livros. Eu li um livro, o livro chega a estar sebento porque passava pra todo mundo. Isso me criou uma espécie de um complexo que hoje eu tenho cinco bibliotecas na cidade, que eu mando.
P1 – Pra sua cidade?
R – É. Desde que eu entrei na Petrobrás que eu mando coisa pra lá. E a Petrobrás foi a primeira empresa que mandou cadernos, lápis, folhetos. Só não me mandou coisas que eu pedi porque diziam pra mim: “Mas lá não tem petróleo”. “Gente, não tem porque não acharam ainda. Mas deve ter porque o calor... É o deserto. O calor do Saara. Só está faltando o camelo. Vamos botar um camelo lá”. Mas não... Agora estão procurando lá. Estive á, as sondas estão lá.
P1 – Artemiza, e aí também depois a adolescência como é que era? E namoro?
R – Em Floriano ainda tive... Ah! Tive. Sabe que na minha cidade quando um rapaz estava interessado numa moça ele nunca chegava perto porque os pais de lá eram uns matadores, né? Meu pai era muito calmo, mas ele era, ele não gostava. E minha mãe também botava logo um defeito. Mas mesmo assim... Então a noite vinham os rapazes fazer seresta na nossa janela. A gente escutava, né? Era uma casa simples, muito simples. E eles combinavam com os colegas e iam cantar. “Na rua uma poça d´água, espelho da minha mágoa...” Era noite de luar, tinha seresta. Aí amanhecia o dia, meu pai não importava. Não podia, ele deixava acabar, ninguém podia acender uma lamparina, porque era vela, né? E nem olhar quem era. Mas pela voz a gente sabia. Aí dia seguinte: “Aqueles cabras. Quem eram aqueles cabras?” Aí minha mãe: “Pra quem era essa seresta?” Aí eram tantas, né, mulheres. Aí: “Eu não sei pra quem era, mas que eu gostei, gostei”. Ah, mamãe: “É, foi boa”. Porque ela também cantava, gostava de cantar. E depois a gente sabia porque na praça o cara vinha mandar um bilhetinho. “Aquela seresta, você gostou? A música que você mais gostou?” E tinha o alto-falante na avenida que a gente mandava recado: “Fulana, ganhou uma seresta ontem. Gostou da música tal e tal”. Mandava também de volta os recados e o namoro era bem diferente. Cinema. Era um cinema que era no Bar do Seu Leão, tinha um cinema. Era um cinema no Bar do Seu Leão chamava... Meu Deus, uma coisa tão importante na minha vida. A gente levava cadeira de casa pra assistir. Ele tinha lá umas cadeiras, mas era pras autoridades (riso). As autoridades eram aqueles abestados de lá. Era prefeito, vereador, o padre.
P1 – E tinha os bailinhos também?
R – Tinha o quê?
P1 – Bailes?
R – Tinha. Tinha o Baile no Clube Floriano, mas a gente não podia ir. Só depois de 15 anos podia. Até 13, 14 anos a gente ficava na janela. “Mamãe, deixa a gente serenar?” Serenar é ver um pouco o baile. Lá dentro, música, o povo dançando. Aí meu Deus! A gente queria tanto passar pra ali. Aí tinha uma cega, que minha mãe que sustentava a cega, e na juventude dela ela foi uma mulher bem alegre. E ela ensinava a gente a dançar. E ela sabia tudo de chorinho, dessas coisas, das músicas. E ela ensinou a gente a dançar, mas sem a minha mãe ver. Aí quando a primeira vez que eu fui pro baile, não fiz feio não. Aí dancei. Foi 15 anos, aí deixava a gente ir. Mas era rígido a educação, era muito rígida.
P1 – E seu pai, você disse também que seu pai tinha outras fábricas além da fábrica de bebida.
R – É. Depois ele desenvolvia porque ele quis na cidade. Ele não queria, por exemplo: quando alguém estava vendendo alguma coisa, ele não queria que saísse da cidade. E ele então comprava. Iam pra ele e vendiam. E ele tinha muitos sobrinhos pobres, parentes, irmãos. E ele teve uma fábrica, era uma pedra imensa, que ele comprou um jipe Willians que tinha tração e tinha o dínamo atrás, o motor. E ele adaptou pra puxar correia da pedra que era uma coisa imensa. Pra triturar o bago do coco babaçu. Aquele coquinho, você parte e dentro tem os maguinhos, quatro mais ou menos, quando o coco... Ele é nativo. Então ali você fazia o óleo de coco, que era comestível, o bagaço ele cozinhava aquilo transformava, misturava com a comida do gado. Porque tinha um terreno com vacas pra dar leite para os filhos ali. E o óleo, quando fervia, tinha uma parte, uma borra grossa que juntava com soda cáustica, com restos de animais e fazia sabão. E ele comprou essa fábrica, mas pra um sobrinho dele. Um afilhado, sobrinho, não era. Afilhado.
P1 – Tocar.
R – Tocar. Mas o afilhado quis embora. Queria ser tratorista, não queria ficar na cidade porque ele disse que queria ir pelo mundo. E foi. Ele foi trabalhar parece que... Ele escrevia pra gente, ele estava em Jacubina na Bahia. Aí meu pai desenvolveu, quando estava funcionando, ele vendeu. Contando que não saísse da cidade. Que ele queria ver se a cidade ficava mais... Aí ele teve o primeiro salão de cabeleireiro. Tinha uma sobrinha dele. Meu pai não tinha jeito praquilo, mas ele aprendeu. Veio a São Paulo, aprendeu. E comprou e levou, ensinou a fazer ______ ____, a fazer... Tinha uma cadeira bonita. Eu gostava da cadeira. Sentava naquela cadeira e via as pessoas. E a sobrinha dele era Dália. Desenvolveu o salão. Depois ela vendeu, casou, foi pro canto do Buriti Eu esqueci de dizer que meu pai, ele foi garimpeiro no Alto Araguaia. Em Conceição do Araguaia. Ele mais os irmãos, ele tinha onze irmãos. Sendo três mulheres, eram três mulheres ou quatro mulheres e eram homens. Era um monte. E ele tinha 17 anos, o irmão mais velho, que era o tio Nozinho, tio Zeca e o outro tio. Tio Alberto era o mais novo. E o primo Raul. Foram ser garimpeiros. 17, 19 anos, eram crianças, né? Saíram pelos garimpos, foram garimpar pra achar diamantes.
P1 – Acharam?
R – Acharam bastante diamante. E vieram pro Rio de Janeiro gastar o dinheiro. Vieram primeiro pra São Paulo; ficaram no melhor hotel de São Paulo. Papai tinha 17 anos com as pedrinhas dele. Naquela época ninguém roubava ninguém. Aí de lá disseram: “Agora vamos para o Rio de Janeiro”. Aí vieram para o Rio de Janeiro e ficaram no hotel Novo Mundo que era caríssimo. Venderam os diamantes; cada pedrinha dava... Meu tio Nozinho comprou um Ford Bigode aqui. E despachou; levou não sei quantos meses pra chegar á em Canto do Buriti onde ele já tinha deixado onde ele já ia ficar. Meu pai não, meu pai voltou pra Santa Cruz onde ele morava.
P1 – Com esse dinheirinho que ele começou a...
R – As coisas dele. E ele comprou... Ele era... Hoje ele seria até exótico. Ele comprou vários cavalos selvagens e deixou no pasto. Ninguém pegava, cavalo selvagem ninguém pega. Agora estão pegando muito, por esses rodeios. Estão formando muita gente. Meu pai tinha muitos cavalo e jumentos e bicos, mas tudo selvagem. Porque ele dizia: “Eu estou com 18, 19 anos”. E trabalhava, vendia. Depois ele gostava de tocar acordeon, gostava de seresta. E ele trabalhava na roça lá com o pai dele, com os irmãos. Mas ele só veio casar com 27 anos. Minha mãe também.
P1 – Artemiza, e você? Você casou quando também?
R – No dia 18 de setembro de 65. Já tinha estourado a redentora, já estava... 65.
P1 – Você tinha quantos anos?
R – 25 anos. Casei muito nova.
P1 – Casou lá mesmo?
R – Aqui.
P1 – Aí você já estava aqui no Rio?
R – Eu vim pro Rio de Janeiro em 57. Em 59 eu entrei na Petrobrás.
P1 – E Artemiza, como é que você veio pro Rio?
R – Eu tinha uma irmã que trabalhava na Sambra. Na Sociedade Algodoeira do Nordeste Brasileiro, que não tinha nada de Nordeste, não era nada de brasileira. Era a Sambra que fazia os óleos, os sabões, os tecidos. Você conheceu os lençóis Sambra, não? Conheceu? Eram roupas de cama e ela trabalhava aí. E eu lá não estava me dando bem e papai estava indo a falência. Aí o Banco do Brasil ofereceu empréstimo, mas ele não queria dever a ninguém. Ele falou: “Não”. E ele falou: “Não, as meninas podem ficar”. Mas eu estava doida pra me ver livre daquele julgo de lá. Aí vim pro Rio de Janeiro com essa minha irmã. Essa minha irmã estava aí, estava há dois anos. Me chamou. Chamou a mim e a meu irmão que era mais velho do que ela. E nós viemos juntos. Eu vim pra o apartamento que ela morava, que era com mais quatro moças. Alugaram o apartamento e eu vim praí. E eu trabalhei em vários lugares.
P1 – Onde era o apartamento?
R – Era aqui na Jornalista Orlando Dantas, perto da Rua Farandes. Chama ali Flamengo. É, Botafogo, Botafogo, Botafogo.
P1 – E Artemiza, você já tinha saído de lá?
R – Tinha saído de lá, estava no...
P1 – Não, mas você já tinha saído lá do Piauí, viajado?
R – Não. A única coisa é que eu conheci a capital que foi um presente de aniversário de15 anos, não, 13 anos. Me levaram pra conhecer Teresina, foi um presente, né, de 15 anos conhecer a capital. Achei tudo bacana, beleza. Depois...
P1 – E como é que foi chegar aqui no Rio?
R – Ah! Achei tudo deslumbrante. Porra, o cara do táxi, né? Eu disse, eu dirigia, né, lá. aí: “Ele está tirando um fino”. Porque lá tinha espaço pra tudo. A única coisa que eu atropelava era galinha, porco, peru, esses bichos que ficava na frente. E aqui: “O cara do táxi vai bater!” Pensei. Mas não, tudo bem. Eu vi que era assim mesmo. Foi muito bacana. E logo eu fui trabalhar e estudar a noite. Eu tive um colega que foi presidente da UNE (União Nacional dos Estudantes), o José Frejá, que era meu amigo de lá. Aí ele veio e me arranjou uma bolsa de estudo.
P1 – Pai do Frejá, né?
R – É, pai do Frejá. É, pai do Frejá. E ele me arranjou aí eu fazia refeições ali no restaurante, no Calabouço. Aí vim conhecer o pessoal da UNE. Aí passei...
P1 – Isso em que ano?
R – 57, 58, 59. Eu e a Bossa Nova, nós nos Becos das Garrafas com o pessoal da UNE. Com o Carlinhos Lira, com o pessoal. Me pediram, eu já trabalhava na Petrobrás, o Oduvaldo Viana Filho me pediu pra, algumas peças dele, datilografar em estêncil. Conhece o processo estêncil? Naquela época não existia xerox. Eu fiz o Ripió Lacraia, eu fiz o que ele me pedia. Eu dizia: “Fora do meu horário de trabalho”. Mas só que eu trabalhava, já na Petrobrás, quando essa gente me pedia. Porque o meu chefe era o Dalton Brecha. E o Dalton Brecha era aquele cara nervoso, mas era o cara mais humano de todos. Muito inteligente. Era um comunista daqueles. Mas era muito inteligente, muito esclarecido. O que tu quisesse o cara sabia.
P1 – Artemiza, vamos por partes.
R – É que eu já saí e já estou entrando na Petrobrás.
P1 – Quando é que você entrou na Petrobrás?
R – Em 59. 1959.
P1 – Como é que apareceu a Petrobrás? Você estudava?
R – Bom, a minha irmã... Eu estudava. Mas eu não queria vir pra Petrobrás pelo seguinte... Não, eu trabalhava quando eu vim pra Petrobrás. Eu tive oito empregos. Minha irmã que trabalhava e me tirou. Eu trabalhei na Sulamérica; eu trabalhei na Deltec, que foi o primeiro emprego sério. Vocês já ouviram falar? Foi o primeiro banco de investimento no Rio de Janeiro. Deltec AS. Que lançou ações no mercado, tinha umas ações da Willians Overland do Brasil. E eu trabalhava; foi aí que eu tive contato com mercado de ações. Aí quando a Petrobrás lançou as letras reajustadas do tesouro, que era quando tu compravas gasolina tu ganhavas um cupom pra trocar pelas obrigações da Petrobrás, pra no futuro trocar por ações. E aí eu tive umas ações porque meu pai me deu essas coisas. Porque ele comprava a gasolina e ele tomou conhecimento e exigia o cuponzinho. Depois deram as obrigaçõezinhas pra ele. E eu troquei por ações da Petrobrás. Primeiro lançamento de ações da Petrobrás foi em 59; 250 mil ações. Eu não trabalhava na Petrobrás, eu tomei conhecimento pelos jornais. E naquela época eu não comprei. Mas eu já tinha as obrigações que meu pai tinha me dado. E eu troquei por ações.
P1 – Aí você trocou?
R – Troquei. Troquei por ações nominativas. Naquela época só nominativas, né?
P1 – Mas aí você estava contando que trabalhou em vários lugares e estava estudando...
R – É. Eu trabalhei na administração do edifício da Praia Vermelha que era de militar. Eu tinha, não tinha 18 anos completos. E o Coronel lá, o Antônio Vieira Ferreira. Eu tenho mania de saber o nome das pessoas; aprendi desde pequena. Aí ele era o Coronel, ele era o Comandante, era tudo lá. Naquela Praia Vermelha ninguém entrava fácil não. O bonde tinha que fazer a volta ali antes de chegar lá na Praia Vermelha. Aí era ali que eu descia porque tinha a Universidade Federal. A Faculdade de Medicina era ali. E os estudantes, mas eles eram briguentos com o Coronel. E um dia o Coronel me viu junto com os estudantes, lógico, eu estava onde estava a juventude ali brincando comigo, né? E ele veio e disse que ia me suspender. Eu disse (riso): “Eu não estou servindo o exército. Aqui eu sou datilógrafa. Eu não estou servindo o exército. O senhor não pode me suspender”. “Eu posso! Porque você...” Mas não me suspendeu nada. E ali, depois dali eu fui pra Sulamérica, da Sulamérica fui trabalhar com um conterrâneo meu que era o dono da construtora Inúbia. Manoel de Souza Santos, que era irmão; irmão não. Era primo desse deputado federal; era o Souza Santos. Mas ele até morreu também. E ele construiu muitos prédios no Rio de Janeiro. Quando eu saí de lá, aí um dia eu disse pra ele que a minha irmã trabalhava na Petrobrás e disse: “Vai pra Petrobrás!” “Socorro, eu não vou pra Petrobrás. Eu estou esperando que vai sair uma bolsa de estudos pra mim. A Casa do Brasil em Paris. Eu vou entrar na Petrobrás e vou sair. Eu sei que está saindo a bolsa”. José Frejá tinha entrado com pedido e ia sair, saiu pra tanta gente. Aí: “Ah! Eu vou!” Então eu fui. Fui lá. Quem fez a prova comigo foi a Maria Amélia; quem trabalhava na divisão de pessoal. Naquela época, não era divisão, naquela época foi um dos serviços gerais da Petrobrás. Era o Waldir Miller de Campos e quem cuidava era a Celina.
P1 – Era Oswaldo?
R – Não, era Waldir Miller de Campos. Aí o Gurgel do Amaral que era o assistente dele que tomava conta dessas coisas. E eu fiz a prova com a Maria Amélia. Datilógrafa. Eu disse pra ela: “Maria Amélia, eu vim fazer porque a minha irmã está me chateando. Eu vou fazer essa prova”. Aí foi, vim fazer. E ela disse assim: “Basta 120 minutos, 120 batidas por minuto”. Era uma carroça. Mas eu era datilógrafa que me cobravam diariamente, não sei quantos BCs, não sei quantas cartas. Ela me deu lá. Eu tirei de letra, bati 160. Ela falou: “Pó, você bateu muito além. Olha, pode vir logo”. Eu disse: “Não, vê aí o que é que precisa que eu ainda tenho que dar...” Naquela época era obrigado a dar aviso prévio; não sei se agora é. Aí: “Não! Pode dar o aviso prévio.” Aí eu fui na minha empresa, dei o aviso prévio. Aí o cara falou: “Não, você não vai sair. Eu estou construindo ali na Rua Assunção um prédio, um dos apartamentos eu vou vender pra você. Você vai pagar e você ainda vai receber dinheiro...” E eu: “Por que tu não me ofereceu isso antes? Agora eu vou pra outra empresa”. Eu fui ganhando 500 reais a menos pra Petrobrás. “Ah não! Eu te dou isso”. “Ah, agora não”. Eu era meio chata. Aí fui pra Petrobrás.
P1 – Aí você foi pra que departamento? Que área lá?
R – Me deram um temporal desgraçado. A presidente vaga 534; aí recebi um envelope. “Entrega isso. Tem uma foto ______. Segundo andar. Que lá estão precisando de uma datilógrafa nas tuas condições. Com curso, com ginásio, com escola técnica e não sei o quê”. Tá. Aí cheguei lá no segundo andar, quem me atendeu na portaria foi um contínuo, Manuel Fernandes de Freitas, que eu já dei o nome pra chamá-lo. Que hoje eu sou comadre, eu sou madrinha de uma filha dele. E José Rodrigues Ferreira; esse morreu num desastre de automóvel. E o chefe era Walter Moteje Maciel, que era o chefe. Mas a comunicação social não era nada. Não era um setor imenso não. Era ligado a presidência, era quase que uma... Era uma assessoria. Não tinha status assim não. E disseram pra mim, e a secretária que eu dei o nome, Dirce Vera Ferreira Coltim, pra você chamar pra ela vir. E disseram assim: “Você vai trabalhar, eles estão precisando de uma datilógrafa na sala vip”. Era a sala que tinha os jornalistas. Eu dei até o nome da primeira vez, mas vou dar o nome novamente; era o Nelson José Nacif, era o Lourival Coutinho, escritor, que defendia a Petrobrás, escreveu vários livros; e eu acho até por gratidão, a Petrobrás o contratou. Era Horácio de Almeida, escritor; era o Gerardo de Mello Mourão, morreu há pouco tempo.
P1 – Gerardo ou Geraldo?
R – Era Gerardo.
P1 – Irmão do Geraldo? Deve ser, né?
R – Não sei. Aí, ele era nortista. Mas escrevia. Porque a Petrobrás, mesmo depois da lei assinada e depois dela funcionando e dela perfurando; ela recebia uma carga diária nos jornais. Era o Gustavo Corção, era Eugênio Gudin, Roberto Campos, o Almirante Pena Boto, Carlos Lacerda, até o Austregésilo de Ataíde teve coragem de escrever. Naquela época, eu não sei, depois ele até veio pra lado da Petrobrás, mas combatendo o monopólio. Então tinha que ter aquela gente ali, aquela sala pra responder. A comunicação social não existia assim em termos de... Depois é que botaram lá, por exemplo: o Dalton Brecha; trouxeram ele, ele era ______ cultural da embaixada, na Argentina, em Buenos Aires. Ele veio porque precisava de uns caras desses que saia pro pau. Então ele fazia as conferencias dele; era pra Escola Superior de Guerra, era pra Universidade. Ele era nível alto.
P1 – O Dalton substituiu o Walter?
R – Não. Ele não era chefe de serviço de comunicação social. Ele foi depois, muito tempo depois. Quem substituiu o Walter foi o Doutor José Guimarães que era um afilhado político, não sei se isso vai sair, mas agora todo mundo também já quase morreu, ele também; era do Lomanto Júnior. Era senador. Não é desse Lomanto Júnior. Era o Lomanto Júnior velho que botou; e o Doutor José Guimarães, ele era um médico, ele era... Eu não sei a especialidade dele.
P1 – Não tem importância.
R – Mas ele não era, ele era só era político. Ele só era político, sei lá. Ele foi candidato a deputado e perdeu as eleições, então ele ganhou com... E tinha o Tumel, o Doutor Tumel. Era o Armand Altair Mello Tumel, ele parece que era o número um; número um da Petrobrás. E empregado. Eu quando entrei já era 1208, ele parece que era numero um, um troço assim. Ou era número três? Eu tinha que nessa sala, e o Borba Tourinhos, José Borba Tourinhos trabalhava no Diário de Notícias e era jornalista nosso. Quase todos trabalhavam em revistas e jornais. Mário Pontes, Mario Bezerra Pontes e o Helver Araújo era em outra sala. Eles recebiam os torpedos e aqui é que era feita, escreviam. E eu tinha uma máquina melhorzinha, mas era tudo carroça, tinha que fazer. Eles faziam a revisão, escreviam, faziam a revisão, faziam os discursos pro Idálio Sardenberg; o que o Idálio tinha que dizer. Porque eles que liam os jornais, né?
P1 – E respondiam.
R – E respondiam. O Globo não era esse jornal que é hoje não. Ele era, mas o Correio da Manhã, Última Hora. Última Hora porque recebeu muita ajuda do Juscelino, né? Juscelino gostava muito do Wagner. Ele era muito bacana pra escrever a favor da Petrobrás.
P1 – O Última Hora?
R – O Última Hora. E o Carlos Lacerda era na Tribuna, ele mandava; tinha dia que ele acordava com a macaca e ele defendia. Tinha dia que ele botava pra quebrar. Era o diabo, era o diabo engarrafado.
P1 – E a _________ além de responder essas críticas no jornal, ela tinha outras atividades? O que ela fazia?
R – Tinha. Nas escolas, nas exposições, a Petrobrás estava naquela de: tinha uma esquina que tinha uma encruzilhada, ela mandava botar... “Ah! Vai ter o dia da criança”. Criaram em São Paulo. Botava, mandava esse desenhista nosso; Francisco de Assis Veras Fortes era o desenhista, fazia os croquis, ia pros colégios, fazia as exposições na Cinelândia. Até me botaram de recepcionista lá. Porque a gente trabalhava pra ganhar um extrazinho, pagar colégio, pagar essas coisas. Mas a gente escolhia com 20 anos, 21 anos, né? Qualquer pessoa vai bem. Aí era voltado para escolas. A Petrobrás estava voltada pra esclarecer a juventude. Meninos, nós fazíamos folhetos. Não tinha nada desse negócio de o cinema. Nós tínhamos filmes feitos pelo Jean Manson, pelo Carlos Niemeyer. Tínhamos muita coisa feita por Jean Manson. E tinha também o Amaral Neto; isso já foi em... A Petrobrás já, 61, 62, 63. E 59 nós tivemos Jean Manson, nós tivemos o primeiro documentário. Dalton Brecha quando entrou foi ciscando pra tudo quanto é lado.
P1 – E ainda continuava depois? Esse ataque você acha que melhorou quando?
R – (Riso) Não melhorou. Quando teve (pausa). Eu me lembro de uma palestra na ADI; eu fui, mas eu fui... Não. Quando Henrique Teixeira Lote era candidato e Jânio Quadros. Eu era Henrique Teixeira Lote; ia tudo o que era comício. Mas também ia do Jânio que eu queria ouvir as opiniões. Quase que eu mudo meu voto na última hora. Graças a Deus eu não votei. Não votei em Jânio, votei no Henrique Teixeira Lote. Ali a gente ainda tinha que usar muita faixa em defesa do petróleo. Porque tinha muito, muita gente ainda botando em dúvida. E a Petrobrás já tinha a região de produção da Bahia, já tinha mostrado o petróleo lá. Nós estávamos com o poço. Não. O Mapele, Mapele dois pegando fogo. Que coitado. Mapele pegou fogo durante...
P1 – É PL?
R – Mapele, o poço de Mapele foi o nosso primeiro poço que pegou fogo na Petrobrás.
P1 – Lá na Bahia.
R – Na Bahia. Aquilo ali agora é um fogarelzinho qualquer um vai lá e apaga. Mas naquela época veio até gente de fora e não apagou. Teve que acabar mesmo sendo... É, quem apagou mesmo foram aqueles candangos de lá.
P1 – Até mesmo você pegou os americanos ainda.
R – Eu peguei na época aqui dentro eles falavam muito: “Ah! O Walter Link, no Walter Link! Argh! O Walter Link!” Peguei. Eu me lembro que até o Doutor Emerson Cerbeto de Barros era um dos defensores do Link. Porque ele era chefe do Departamento de Exploração, Doutor Ceabra Morgi. Era do CPs, eu não me lembro... Do CPs. Olha, agora as divisões aí eu não me lembro. Os nomes eu me lembro. Eu me lembro que tinha uma guerra contra esses chefes que defendiam o relatório Link, que defendiam...
P1 – Mas o Link já tinha voltado?
R – Já tinha, já tinha. Já tinha voltado. Mas eu ainda assisti uma palestra do Link, mas não era funcionária da Petrobrás. Quer dizer, eu assisti por causa dos estudantes; não era por causa da Petrobrás não. Entendeu? E eu sei que a Petrobrás recebia muita crítica, mesmo depois que ela... E o Dalton Brecha (riso) o dia que ele chegava batendo mesa, chutando gaveta, porque ele era nervoso. Chutava a gaveta e dizia: “Eita! Está bom! Hoje vai ter boa coisa”. Porque aí a única pessoa que trabalhou com ele fui eu porque ninguém queria. Disseram pra mim assim, quando eu entrei, né? Ele pegou fichas lá dentro de gente, aí escolheu com a Ruth; Ruth Gonçalves, que eu dei o nome, está viva. A Ruth: “Quem serve pra trabalhar com o senhor é a pessoa que está aí: Artemiza”. “Bota aqui!” Pegou a ficha. “Eu quero ela”. Aí disse, veio a Rita que era secretária do presidente. Iolanda Rezende, que era secretária: “Não vai. Esse homem é um cavalo, ele é louco. Ninguém quis trabalhar com ele”. Porque ele trabalhou lá na presidência. Quando ele veio, ele veio pra trabalhar. Porque ele é que redigia. Tu desses uma palavra pra ele: sapato. E não dizia. Eu quero que você escreva só sapato. Tu ias e pronto! Ele enchia uma página. Não era aquele Juquinha das piadas. Ele enchia a páginas. E fazia a maior revolução naquele troço. Então ele foi chamado pra trabalhar na presidência. Da presidência mandaram ele pro ______ que precisava de um neguinho daqueles. E a Rita veio: “Artemiza, você não vai trabalhar com ele. Ah! Você não vai!” “Ah! Mas é gente assim que eu quero”. Aí fui. Aí ótimo, né, foi amor a primeira vista. Quando ele veio com grosseria, eu digo: “Deixa comigo. Amanhã sou eu”. Deixei, ele fez lá um monte de grosseria. Aí quando todo mundo veio ver ele pá, quebrando. Não tinha importância. Quando foi o dia seguinte eu cheguei cedo, ele chegava muito cedo, né? As gavetas eu tinha deixado tudo aberto. Tudo aberto, ninguém roubava nada. Aí fui eu: peguei, bati, chutei gaveta, peguei. “Pó!” Ele ficou assim: “O que é que houve? Você... Algum problema?” Eu digo: “Não. Os problemas que eu tenho são os mesmos que tu tens. Aí de agora por diante eu não quero mais grosseria”. Aí pronto. Eu fui assistente dele, fui indicada pra secretária de presidente, diretor; eles faziam as palestras. Quando ele tinha umas palestras bravas eu tinha que ir junto. Eu tinha que escolher os slides dele. Sabe como eram os slides? Eram de vidro, dois vidros. Era seis por seis, assim. O projetor de slides era uma coisa, era um verdadeiro elefante. E era o Cezinho que acompanhava; porque eu escolhi o Cezinho pra acompanhar a gente. Aí quando ele tinha uma palestra pesada, ele dava o tema pra mim, eu passava a máquina e ia escolher. Foi aí que nós começamos a achar que tínhamos que ter fotografias pra ilustrar. Porque era tudo só gráficos feitos pelo desenhista Mathias. Você conhece Mathias aqui, não? É um que foi pro Depcs. Depois veio o Assis Forte, veio o Rodrigo de Andrade Vieira, Carlos Alberto Mendes de Oliveira, que morreu; o João Batista Cordeiro de Mello; tinha outro desenhista, João Camilo Teixeira. Faziam pra tudo, diretores, presidente, que fazia. Chamava umas coisas imensas. Hoje eu fui assistir uma palestra do meu filho, que ele faz palestra lá nos Estados Unidos; entra na sala, a palavra ele vai dizendo, a imagem vai aparecendo e eu nem via ele mexendo naquilo; não sei como é que é. E o professor Dalton era municiado. Ele dizia: “Eu quero essas fotos”. Aí José Vieira Trovão era o nosso fotógrafo. O Vieira Trovão ele não tinha aquela, ele não tinha nem equipamentos. Então nós passamos a comprar cromos daquela empresa, era francesa: Agência (pausa). Oh meu Deus, até hoje tem essa agência.
P1 – _____________, não?
R – Não. Diga outra aí. Era caro os cromos que a gente comprava. De fotos. Quando a gente queria falar, quando queríamos falar da Venezuela, queríamos falar da Arábia Saudita, queríamos falar de... Lá do Norte não porque foi quase acompanhei. (Pausa) Eu vou me lembrara até o final. Não, eu me lembro! E aí então começaram a contratar trabalhos. Aí veio o fotógrafo do Cruzeiro que até outro dia teve uma exposição dele. Eu falei que ia, não fui, mas eu vou ainda. Aí começamos. Foi o Flávio Dan a fornecer fotos. Porque era Agência Imagem que era do Flávio Dan. Tinha fotos maravilhosas.
P1 – Começaram a contratar a agencia?
R – Não. Começávamos a contratar até o fotógrafo e o professor Dalton começou a fazer contratos só de serviços, prestação de serviços. Ficava todo o acervo pra Petrobrás, entendeu? E tinha empresas que não aceitavam. Eu queria me lembrar, estou a cabeça aqui na imagem.
P1 – Mas daqui a pouco volta.
R – E as fotos boas vieram depois nessas contratações. A Petrobrás tinha imagens de sondas na região de produção com pôr-do-sol. Depois vieram os fotógrafos contratados nosso mesmo. Aí veio o Júnior, daí Laerte Machado, que viajava, sobrevoava e fotografava. O Urucum, as primeiras fotos.
P1 – Essas fotos vocês já usavam também em publicação?
R – Em publicações.
P1 – O que vocês tinham em publicação?
R – Nós tínhamos relatório da empresa. No começo o relatório era uma porcaria, mas era o que tinha. Era papel jornal praticamente. Depois não. Aí em 1961. Não. Em 61 a capa era coche alemão. 61 eu me lembro porque achei lindo aquilo. E eu até ajudei na distribuição.
P1 – E a _____ ajudava a fazer?
R – Não, ela quem fazia.
P1 – Era quem fazia.
R – Era quem fazia. E a Imprensa Nacional, que era o Diário Oficial, pra economizar; fazia. Mas depois viram que o relatório da empresa, com a meta sendo atingida; porque a meta era 100 mil barris naquela época. 100 mil barris, não precisa ser dois milhões de barris. 100 mil barris. Mas o Sardenberg, ele era... Ele queria atingir aquela meta. E então o relatório começou a ser feito bonito, mas era a _____ que fazia. Nós fazíamos concorrência, os cromos, quem escrevia. Mas é lógico, a parte contábil era a divisão financeira, né? Aí ficava voltada para o relatório da empresa, né? E a _____ dando só, redigindo. Você viu? Na Biblioteca Central tem. Relatório desde o primeiro. O primeiro, coitadinho, era até papel jornal. Parece até um jornalzinho.
P1 – Artemiza, e como é foi a mudança da Pub pro Serpub?
R – Eu nem me lembro aqui a data exata dessa mudança. Mas eu na época...
P1 – Mas o que mudou assim?
R – Eu acho que aí começou... Não. Aí a empresa começou a fazer folhetos que eram folhetos pra colégios. Era folhetos que era até em roto-gravuras, que faz rotativa. Que faz 200 mil exemplares, 500 mil. Então nós precisávamos; era feito em rotativa. Era na Rio Gráfica Editora, era na Block. A Block se adaptava pra gente. E era quem trabalhava melhor na época. Ela cobrava mais, mas justiça seja feita. Algumas vezes fomos, eu não, eles foram até criticados porque cobraram mais. “Ah! Escolheram a mais cara”. Mas a empresa estava precisando entrar com coisas boas. Aí passou a fazer um relatório, uma revista Petrobrás que era impressinha. Primeira revista que chegou ao extremo do Brasil foi a revista Petrobrás. Porque tinha as unidades da empresa e as unidades da empresa distribuíam. E nós é que fazíamos isso. Você chegou a conhecer aquela endereçamento litográfico? Que era feito na chapinha. Era o Francisco Martins que eu te dei o nome. Essa gente é que começou, mudou tudo. Nós saímos do mimeografo; fomos pro cachaçinha, que era aquela folha meio esquisita, mas que imprimia em azul. Da cachaçinha nós saímos pra... Essa xerox foi muito tempo. Termofax! Termofax. Depois é que veio pra xerox. E era assim mesmo: não podia usar tantas máquinas, tantas folhas por dia, tinha um limite! Esse limite quem dava pra nós era o serviço do Waldir Miller de Campos, que era serviços gerais. Porque tinha um aluguel. Aí quando começou a crescer, e que nós fomos independentes, não uma assessoria, diretamente ao presidente; é como se fosse uma secretária do presidente. Que foi, passou a ser... Tudo ligado ao presidente. Porque a presidência tinha os seus serviços, a diretoria tinha os seus departamentos, seus departamentos tinham seus... Entendeu? Que nós fomos independentes. Eu tenho a impressão que foi com _______. Quando passou a ser serviço.
P1 – Você acha que foi um crescimento maior? Não teve muita modificação.
R - E aí foi um crescimento maior. Partiram pra folhetos mais ousados. Olha, mas eu acompanhei a VHS; foi muito tempo depois. Não tinha. Era tudo feito cinema, documentário. Ia pras escolas, ia pras conferencias, ia pras palestras. Quem era mais esclarecido, chefe de serviço. Por exemplo: tinha que falar sobre exploração. Pegava o... Quem era o chefe do departamento de exploração? Quando eu entrei na Petrobrás eu acho que era o Estéfano Prochnik, mas eu não me lembro agora se era ele.
P1 – E me diz uma coisa: e quem que mandou pra ditadura?
R – Iiiii!!! Cacilda. Olha, agora daquela música: “Daquele amor nem me fale”. Olha, a Petrobrás estava naquela... Nós estávamos num verdadeiro (pausa). Era sindicalista. Nós estávamos todos querendo que a empresa encampasse... Tu passasses na rua encampava você. Nós queríamos tudo encampado. Nós todos. E lógico, não é assim. No mais, eu fui ao comício da central, eu estive na... Como é que era mesmo? Já era até casada. No Cem Mil. Eu fui nas Diretas. Meu filho, eu tinha que pegá-la, minha filha, eu tinha que pegar na escola, mas eu dei uma passadinha. Porque se não, pó, eu falhasse... É, não dava. Quando falava em algum problema, alguma coisa, alguma defesa de alguém aí eu estava. Então as pessoas diziam: “A Artemiza estava”. Entendeu?
P1 – E aí com a ditadura?
R – A Ditadura deu uma chapuletada. Deu nas pernas de todo mundo, sabe? Só que a ditadura errou demais. Errou porque começou a perseguir intelectuais que nós precisávamos deles. Começou a prender intelectuais. Nossos diretores que eram as cabeças. Oh, porra! É cassar por dez anos. Professor Hugo Regis dos Reis que era uma cabeça. E era um homem, era diretor da Petrobrás. O Doutor Jairo José Farias foi o explorador, foi o cara, foi o que fez a departamentalização da Petrobrás. Cassaram esse homem. Eu me lembro.
P1 – E o Hugo está vivo ainda?
R – Não. Ele morreu já.
P1 – E esse outro que você falou?
R – Foi o que você disse que recebeu o filho, foi lá receber o 50 anos da Petrobrás.
P1 – Ah tá.
R – A medalha dos 50 anos. E eu vou lhe dizer: a revolução não queria saber. Era qualquer um. Eu sei que eu cheguei na Petrobrás disseram assim, eu cheguei tinha um carro pegando, botando colegas dentro. Eu dei o nome da outra vez do César Augusto Dembe Correia pra vocês chamarem também. Ele foi o cara que eu cheguei, estavam botando ele dentro de um camburão. Aí eu ainda falei: “Escuta!” Aí o cara, né, deixou eu falar. Eu falei: “Não! Mas espera aí!” “Não! Bota você também”. Eu digo: “Bom, vai chegar a minha vez”. Mas não chegou. Eu trabalhava na Buenos Aires, 40 quando estourou a... Ele, todo mundo. E o certo é que levaram muita gente. Às vezes, colegas que tinha até raiva de outro; dedurou, fez um monte de...
P1 – Mário Pontes foi uma coisa assim, né?
R – Foi. Mário Pontes, Manuel da Rocha Borges.
P1 – Também foi...
R – Não, o Manuel foi por causa daquela reportagem que ele escreveu. Ele não escreveu, ele pegou a canção do Vandré e fez uma reportagem que diz: não se faz guerra com armas, se faz guerra... Aí quando chegou ele já tinha dez anos. Naquela época não existia fundo de garantia, ele já tinha dez anos de empresa e não puderam manda-lo embora. Mas o Mário Pontes não tinha... Mandaram. O Assis não tinha; mandaram. Mas mandaram muita gente. Eu trabalhei com pessoas que... O professor Dalton, ele tinha que ter sido preso, mas não deveria ter feito tanta barbaridade que fizeram com ele.
P1 – O professor Dalton foi preso...
R – Ele foi preso porque ele se confessava comunista. Mas ele nunca destruiu nada na empresa; pelo contrário, ele defendia essa empresa. Mas ele defendia era no... Olha, eu fui assistir uma palestra dele que eu até me arrependo até hoje. Foi na Universidade... Eu sei que foi pra universitários. E ele começou a falar das empresas multinacionais que estavam... Eram os laboratórios, os frigoríficos e ele foi pra falar de petróleo. Mas ele antes quis falar fazendo um apanhado desse troço. Do que era o Brasil. Era da Colgate, era disso, era daquilo. E ele estava falando, de repente, um daqueles, que depois se soube, parece que era sobrinho do Almirante Pena Boto, diz que o cara, ele levantou e disse assim: “Escuta aqui! Eu vim aqui pra ouvir falar sobre petróleo. E você até agora?” Aí o cara... Eu me arrependi. Ele ficou vermelho, amarelo, subiu na mesa e disse: “Eu vim aqui pra falar sobre petróleo e sobre tudo no Brasil! Agora se tu permaneceres aí; tu vais comer, tu vais beber, tu vais suar petróleo! Porque agora eu vou te enfiar petróleo e eu vou te dizer o que a gente está fazendo”. Mas cara, foi a maior palestra que eu vi na minha vida. Mas o cara deu um show. No final ele foi carregado pra fora, nos braços até... Eu só me lembro que ele gritava assim: “Artemiza! Pega minha pasta!” Eu falei: “Eu não vou pegar nada; eu vou também nessa”. E fui com ele.
P1 – Isso era aonde, Artemiza?
R – No auditório.
P1 – Isso lá na Petrobrás?
R – Não, não. Essas coisas quando pegava fogo não era dentro da Petrobrás. Eu não me lembro se era na Associação Comercial. Eu sei que era num auditório. Porque eu assisti muitas palestras. Tinha o auditório da UNE que era imenso. Mas não foi na UNE nesse dia. Eu fui na ABI, na Associação Comercial, na Associação dos Engenheiros, na Rio Branco eu fui também em palestras lá. E eu faltando em aulas pra acompanhar esse miserável; porque eu também fiquei empolgada. Aprendi muito com ele. Muito, muito, muito, muito.
P1 – Artemiza então só pra gente entender...
R – Você estava falando sobre a revolução.
P1 – Pois é, ai o General Barros Nunes...
R – Não, esse só substituiu o Brigadeiro Ari Neves. Que veio na revolução, que veio quebrando tudo. Fechando, rasgando...
P1 – O Ari Neves veio depois do Boechat.
R – Boechat? Esquece Boechat. Depois teve Fernando Souza Costa, teve... Depois do Doutor Fernando, teve Carlos Pacheco Dávila, Adolfo Cabral Barroso. Meu Deus! Adolfo Cabral Barroso era adjunto e passou a ser chefe por pouco tempo. Mas espera aí. O Barros Nunes só veio quando nós já estávamos na Avenida Chile.
P1 – Avenida Chile?
R – Eu acho que era. Espera aí. Porque na Buenos Aires, 40 o meu chefe era o... Aquele filhinho de Ari Neves. Foi pouco tempo.
P1 – Mas o primeiro militar...
R – Pó, ele foi ao meu casamento pra prender colegas. Porque ele sabia que iriam colegas. Mas eu liguei pra todo mundo, ninguém ia...
P1 – Seu casamento foi como? Fala.
R – No dia 18 de setembro de 65. Colegas que estavam clandestinos, que iriam ao meu casamento. Aí eu telefonei pra não irem. Porque o adjunto, Vinicius Barcala, me disse: “Artemiza, eu vou ao teu casamento e Ari Neves vai também”. E me deu lá uns nomes. “Vai ao teu casamento”. Falei: “Pó, mas eu não convidei ele”.
P1 – O Ari Neves era o chefe?
R – Era o chefe. E ele foi. Aí eu pedi a uns colegas que ligassem. Dei os telefones das pessoas que poderiam dar o recado pra não ir. Depois disseram: “Olha, eles foram ao teu casamento. É, foram embora antes de terminar o casamento!” Porque não queriam ver casamento, né?
P1 – Queria ir lá...
R – É, bisbilhotar. E tinha isso mesmo.
P1 – Me conta, vamos fazer uma quebrada, me conta sobre teu casamento. Você conheceu seu marido aonde?
R – Aqui no Rio de Janeiro. Um dia, saindo do gabinete de diretoria...
P1 – Como é que o nome dele?
R – Jairo. Miserável, ele vai saber disso. Ele chegava mais ou menos umas dez horas da manhã na Petrobrás; e eu chegava cedo porque tinha que preparar toda a pauta. Todo dia tinha reuniões com os departamentos. As pautas, o que ele ia falar pro presidente. E eu preparava isso, chegava cedo. Na hora de ir embora, era a hora que acabava o expediente e vinham os chefes. Que eram: o Estéfano Prochnik, Carlos Santana; o David, já morreu. Eu chorei muito com a morte dele. É, e o Doutor Garcia. Eu não me lembro do nome dele completo; era um magro, alto. E eles se reuniam lá e ficavam conversando; e eu ficava ali até tarde porque eu tinha que pegar a pauta do dia seguinte pra preparar, entendeu? Chefe de gabinete dele era o Franklin de Oliveira, que foi também cassado político. Ele foi cassado político, mas na clandestinidade. Ele ficou clandestino muito tempo. E escrevia pro Globo.
P1 – Mas aí seu marido era...
R – Não. Era do Banco do Brasil, Banco do Brasil, Banco do Brasil.
P1 – Banco do Brasil?
R – Eu conheci uma vez saindo... O motorista foi me levar porque era tarde e eu morava na Casa da Comerciaria, hoje é o Hospital de Cardiologia de Laranjeira. Ali só moravam moças, 420 moças. Eu tinha perdido a aula. Não tinha ido, cheguei tarde. Quando eu estou saído do carro, que eu estou entrando; uma amiga minha do meu andar, porque lá era um quarto pra cada uma, era um apat hotel. Foi o primeiro apart hotel que existiu no Rio de Janeiro. Porque tinha restaurante lá em baixo, tinha lavanderia, tinha assistência médica, tinha tudo. E eu ia entrando assim e ela me chamou. E eu fui lá. Ela estava com o namorado dela e esse que hoje é o meu marido.
P1 – Como é que o nome dele?
R – Gilberto Bianchi. Aí ela me chamou e disse assim, pra me apresentar. Eu falei: “Bom”. Aí me apresentei e fui andando porque, puta, eu estava cansada, doida pra ir embora. E eu tinha terminado um namoro que eu era apaixonada e não estava nem aí. Aí ela chamou. Me chamou num canto e disse assim: “Oh! Eu gostaria que tu saísses com a gente porque eu combinei de sair com meu namorado porque hoje eu ia terminar com ele. Aí não dá para eu terminar se ele trouxe um amigo”. E esse namorado não queria terminar. Trouxe um amigo pra não ter, né? Falei: “Caramba Teo. Eu vou fazer o seguinte: então espera um pouco que eu vou lá em cima tomar um banho, trocar de roupa”. “Está bom”. Aí eu saí, desci. Aí fomos. Existia ali no Leme várias boatizinhas, a gente ouvia música, né? Aí nós ficamos. Não, eu acho que nós fomos pro Beco das Garrafas. Já existia o Beco das Garrafas. Aí fomos ouvir música. Nisso eu estou vendo que ela está doida pra terminar e ele está entrando na conversa. Está entrando na conversa. Aí não terminei. Eu sei que eu viajei, pra ver a minha mãe que estava muito mal. Quando eu voltei ele começou a ligar, ligar e eu sai nessa de... E estou até hoje.
P1 – (Riso) Você tem quantos anos de casada?
R – 43 anos.
P1 – Mas aí então o filho nasceu logo? Como é que foi?
R – Não. 11 meses depois é que eu fiquei grávida. 11 meses. Aí veio o Marcos Vinícius em 67, Ângela em 69, eu tive uma temporã que viveu 9 meses só, mas se engasgou não teve tempo e faleceu. Ah! Foi um... Acabou comigo aquela... Aí, graças a Deus, eu trabalhava na Petrobrás, a Petrobrás me cercou lá no Sercom. Me botaram numa sala durante o tempo que eu precisasse. Porque você precisava chorar, né? Aí eu fiquei. Mas todo dia, de hora em hora, chegava um colega e ficava comigo até passar. Porque é horrível, viu? Aí passou; aí eu vim pra frente de novo, né? E não é que esqueça não, viu? Isso vai pra vida toda. Mas aí a Petrobrás, comunicação social era assim.
P1 – Tinha uma união entre vocês.
R – Era uma... Você não podia sofrer um problema que todo mundo vinha te ajudar. Eu me lembro que quando eu tive acesso... Porque o General Barros Nunes, quando ele foi ser chefe, eu era chefe do setor administrativo. E ele pediu ao General Carlos Pacheco Dávila, que trabalhava comigo desde 61, que ele entro quando o Jânio entrou. Ele era do Instituto do Café, né? E ele me conhecia. Aí ele queria uma assistente. Aí o General Dávila disse pra ele: “A única pessoa que eu posso lhe dar como assistente; dizer que pode trabalhar com você, porque você quer alguém que eu conheça o serviço todo, né, do serviço daqui. É uma pessoa que já esteve aí pra você cassar, você demitir, né? Mas com as justificativas”. Aí ele falou, ele falou: “Não, aquilo tudo já passou. Não quero saber”. Aí eu fui. Fui falar com Barros: “Ah meu Deus! Chegou a minha vez”. Aí fui. Pensei que eu fosse receber também uma... Aí ele disse que queria que... Ele não queria assinar papel na empresa que comprometesse ele, a imagem dele; que ele não era corrupto, que ele não era isso. E ele queria assinar. Tudo o que ele assinasse ele queria saber o que ele estava assinando uma coisa. E quem conhecia os manuais da empresa era eu. Aí eu falei: “É. Tudo bem. Agora, o senhor sabe, eu tenho dois filhos pequenos”. Eu fui ser assistente dele em 74; não me lembro. Aí ele falou: “Não, vamos esquecer isso. Aquilo ali; olha, já pegou quem tinha que pegar”. Eu digo: “Não. Até pegou quem não tinha que pegar”. Ele falou: “Olha, esse papo não vai sair aqui”. Eu digo: “Então está tudo bem”. “Então de agora por diante você vai ser a minha assistente, vai sentar aqui na anti sala e ver toda a correspondência que eu tiver que assinar”. “Tudo bem”. Chegava correspondência que, por exemplo, uma coisa que eu falei: “Olha, isso aqui não está dentro dos manais. Olha, isso aqui o senhor não pode assinar”. Aí: “Tudo que eles trouxerem tem que ter sua rubrica”. “Está bom”. Então ele assinava. Quando eu entrava de férias eu chegava e tinha uma pilha de assim. Que ele podia até mandar seguir o processo com uma condição: de que eu visse depois. Aí eu via. Era negócio de pagamentos, era negócio de carta-convites, tomadas de preços, concorrências. E eu via, sabe? Ele tinha muita confiança nessa parte; porque eu trabalhava nisso. Lá dentro do setor administrativo eu já fazia isso. Eu mandava sempre no bilhetinho: “Atenção, isso aqui não está dentro do manual de contratação. Isso aqui foi feito de ontem pra hoje. Isso não pode ser feito. Mas...” Aí botava: “Estão dizendo que devido a urgência...” Aí passei a ser assistente só pra isso. Não era pra mais nada. Tinha a Neuza, a secretária, que eu também dei o nome dela pra chamar. A Neuza é que via a parte pessoal dele. Também de chefia. Via quem ele podia atender, quem ele não podia. Era o ______ ________, telefonava pra atender determinadas pessoas. Teve uns dias que nem o _______ _________ ele atendeu. Estava uma confusão danada. Não sei o que era, também não era da minha alçada.
P1 – A senhora não se lembra o que era?
R – Não sei. Era uma coisa aí. Não sei o que era.
P1 – E ele ficou um bom tempo, né?
R – Aí ele pegou até um avião, foi pra Brasília. E quem era o chefe da casa civil naquela época era o Goberildo Gomes Silva, que era do General Geisel. Aí depois foi todo mundo bem.
P1 – Mas ele ficou muito tempo, né, o Barros Nunes, né? Ficou uns dez anos lá.
R – Depois. É, ele ficou bastante tempo. Sabe que esse tempo assim eu não sei porque na Petrobrás eu tinha um negócio: eu chegava pra fazer meu serviço, depois que eu saia dali eu não me lembrava de nada. O que eu tinha que fazer no dia seguinte, se eu estava me... Eu não tinha preocupação. Porque eu tinha, até hoje, qualquer coisa, eu não levo, eu não tenho... Encerrou a minha coisa.
P1 – Não leva pra casa. Está certo.
R – Encerrou, encerrou. Acabou, acabou. Mas eu não me lembro quanto tempo ele ficou. Eu só sei que ele te dava plenos poderes quando ele te dava um serviço pra fazer. Ele te dava todo o recurso. Depois eu pedi pra sair, depois eu não quis voltar pro setor administrativo. Aí o Joaquim Paulo pediu pra mim pra ir pra parte de cinema. Porque estava estourando o audiovisual, vídeo na Petrobrás.
P1 – Eram vídeos feitos lá? Como é que era?
R – Também muitos vídeos feitos pelo Carlinhos. Fazia os filmes...
P1 – Qual Carlinhos?
R – Carlos Alberto Mendes de Oliveira. Ele faleceu, ele teve um aneurisma. Ela fez muito vídeo, muito cinema, muita coisa.
P1 – Ele era contratado da Petrobrás?
R – Não. Ele era funcionário, era bem antigo.
P1 – Era funcionário da Petrobrás. Ele que criava.
R – Era, era. Ele não. Quem fazia os roteiros pra ele era o _________. Pedia pra ir pra Amazonas fazer filmes. Aí ele contratava a equipe e todo o equipamento era nosso. Tinha nosso copião. Rinha o ______ ainda tem lá o ______ antigo. E era feito na Herbert Richers alguma coisa, na _____________. Ele ia, pagava. Até a Taiko, nós estivemos lá. A gente alugava o material lá pra fazer os cortes. Até a TVE nós tivemos fazendo trabalhos lá. Entendeu? Era muito espalhado, não era assim uma coisa só não. Aí eu fui para a área de atender os departamentos, de fazer as cópias de VHS. Naquela época nós usávamos o Umatik, não era nem o VHS. Tínhamos o VHS, mas o Umatik era a Globo Vídeos que fornecia, nós fizemos para as plataformas, pras unidades no exterior pra mandar coisas modernas nossas. Para eles não ficarem por fora. Mandávamos pra shows, filmes.
P1 – E propagandas? Vocês faziam?
R – Propagandas. Todo o filme que eu copiasse tinham 17 monitores pequenos. Mais ou menos desse tamanho. E VHS era uns seis VHS e Umatik, tinha uns quatro Umatiks. E tinha aquela outra fita. Antes de chegar na VHS nós chegamos a usar, eu não me lembro mais. Depois eu te digo. Aí eu copiava e mandava pras plataformas. Aí vinha da Globo Vídeos a relação de filmes. Vinha com antecedência pra gente escolher o que mandar. A plataforma queria muita pornografia porque só tinha homem, aquele negócio todo. Aí selecionava, mandava muita cultura. Mandei muitos shows. E botava os filmes que eles queriam porque não podia dizer que não, né? Tinha que mandar. Tinha uma determinada, era uns pacotinhos assim e a gente mandava. Esse: confidencial. Que ia ser distribuído pras salas lá especiais. Aí depois começaram a botar mulheres nas plataformas e diminuiu muito a pornografia lá. Eu visitava as plataformas. Agora eu estou sabendo que tem bibliotecas, salas de jogos. Naquela época não tinha muita coisa não.
P1 – E depois entrou o Rabaça, né? Você chegou a pegar?
R – Cheguei. É, foi com a chegada do Rabaça que eu sai e fui trabalhar com o Joaquim Paulo.
P1 – No áudio? No áudio visual?
R – No áudio. É. Mas o Rabaça ficou pouco tempo.
P1 – Mudou muita coisa assim? Já estava maior?
R – Ah não! A empresa já tinha estrutura. Não. O Carlos Alberto Rabaça, né? Não. Ele tinha idéias maravilhosas. Eu não sei se tudo aquilo que ele tinha de idéias foi implantado. Eu não sei. Eu tenho impressão que muita coisa foi. Ele deixou por escrito qualquer coisa. Depois veio o... Ah meu Deus do céu! Do Rabaça foi quem? Depois. Eu não me lembro.
P2 – Guilherme Duque Estrada.
R – Ah! Guilherme Duque Estrada. Esse eu sai quando ele era chefe. Eu saí.
P1 – Você se aposentou quando?
R – Primeiro de maio.
P1 – De que ano?
R - Quer dizer, eu escolhi o dia 29. Me botaram como sendo 29 de abril, pra não ser primeiro de maio. Mas eu tinha pedido. De 88. Eu esperei completar. Eu ia esperar completar os 30 anos. Mas aí eu estava com umas viagens programadas. Eu fiquei com catarata precoce por causa dos vídeos que eu trabalhei. A Petrobrás foi bacana. Quando teve um senhor da Bandeirantes que entrou na sala de vídeo e viu aqueles monitores falou assim: “Esses monitores já têm o protetor da...” Eu não sei. De lá, de uma determinada coisa. Falei: “Não. Esses monitores são antigos”. Aí chamei o Joaquim Paulo. Ele falou: “Esses monitores não prestam. Tem que mandar recolher ou mandar botar uma proteção”. É, uma coisa qualquer. O Joaquim Paulo imediatamente, no dia seguinte. Aí foi uma compra lá feita pelo departamento de compra fora de concorrência porque tinha que botar os monitores. Mas aí já era porque você sabe: contra a luz vem a catarata. Aí foi quase eu já perdendo a visão. Teve gente, a Petrobrás mandou substituir, o Joaquim Paulo falou o que precisava. Precisava de nada. Fui operada, quem operou foi o Fatorelli, que era o bam bam bam do Brasil. Ele até já faleceu. Ele que trouxe a operação de catarata da lente implantada. Então a Petrobrás pagou tudo. Mas já pagava pra qualquer um; porque assistência médica era assistência médica, não se pagava nada.
P1 – Artemiza, eu queria que você contasse uma história engraçada desses seus quase 30 anos lá na Petrobrás. Conta uma coisa que tem assim na lembrança.
R – (Riso) Ah, eu tive muita história. Eu tive uma história, eu brinco até, o pessoal não se esquece. Quando eu entrei pra Petrobrás em 59; eu entrei, eu dizia até cheguei pra Ruth que era chefe do setor administrativo e era muito minha amiga. Foi: eu, a Ruth e o Eduardo dos Santos que inventamos sem querer, nem saber a Happy Hour. Porque toda sexta-feira a gente saia de lá, ali na Ruy Barbosa tinha um posto de gasolina, que hoje é um prédio maravilhoso, em cima tinha uma boatizinha que a gente ouvia música cedinho. Sete da noite começava. E tinha no Leme, no Frederico Mello, nos postos dele que hoje é o Meridian, em cima tinha a boate do Frederico Mello que eu nem me lembro o nome. A gente ia pra uma, pra outra. Era sexta-feira, a gente sempre deixava um dinheirinho. Era barato porque não se gastava muito. E a gente ouvia as músicas. Lá que eu conheci a Ellen de Lima; estava começando. Nessa boate, Nossa Senhora de Nazaré. Olha o nome da boate. Nossa Senhora de Nazaré. Aí a gente dançava, não tinha namoro, era dançar, conversar sobre petróleo. Eles diziam que o que estava escrevendo. Isso foi em 61, 60, 61. Ia pra lá. E a gente pedia, eles botavam na mesa. Porque tinha uma consumação (riso): era o amendoim; era aquele, eu odiava, mas era o que eu podia, era aquele Martine com a cereja. Que tem até a filha do Dorival Caymmi canta, a Nana Caymmi canta: “A cereja e o Martine”. Vem dessa época, né? Porque não tinha dinheiro. E a gente ouvia música e tinha sempre alguém tocando. Aí deixava uma gorjetinha pro cara do violão ali (riso). Se ele não tivesse era a bolacha que tocava lá. E a gente ia lá botar.
P1 – E aí ia a turminha lá da comunicação? Só vocês?
R – Não. Só nós, só nós quatro. Depois, depois com muito tempo a gente toda sexta-feira tinha os bailes. Por exemplo: na Associação Comercial, na Associação dos Bancários. Aí a Ruth dizia assim: “Olha, vai ter o baile assim”. Eu peguei ela: “Vamos lá?” “Vamos”. Aí ela começou a aumentar. Aí já ia mais. Mas tinha um pessoal que corria pra casa, morava longe. Pessoas que namoravam, que o namorado não deixava. Meus namorados não se importavam não. Depois eu saia no sábado, no domingo com eles. Mas eu me lembro que foi quando estourou a música do Dorival Caymmi: “Depois de trabalhar toda semana o meu sábado eu não vou desperdiçar. Já fiz o meu programa pra essa noite”. Aí a gente ouvia esse pessoal cantar. “Opa, nós estamos no lugar certo. Nosso programa está depois do trabalho”. Só que não era no sábado, que a Petrobrás fez o seguinte: nós trabalhávamos aos sábados. Mas pra não trabalhar aos sábados do ano de 61, 62 pra cá, criaram a gente trabalhar 15 minutos por dia a mais para não trabalhar aos sábados até meio dia. Entendeu? Então a gente saia na sexta. De qualquer maneira a gente saia na sexta. Se no sábado trabalhasse, se danasse. Não tinha importância. E eu trabalhei muitas vezes sábado e domingo pra Petrobrás quando era distribuição do relatório. Que queriam que o relatório fosse, pra chegar na mão de determinadas pessoas. Saiu os contínuos. Ah! Esqueci de dizer. Que existia um press release feito diariamente pelos jornalistas praquela gente. Não em 59, foi 60. Quando o professor Dalton foi pra lá. E começou a ter diariamente pra imprensa, com o logotipo da Petrobrás, a logomarca e tudo direitinho. Tudo que se acontecia a impressa desse ou não. Aí saia os contínuos. Era o Alzemiro Caetano de Souza, José Rodrigues Ferreira, Manuel Fernando de Freitas, era o Cezar Conrado da Silva Vieira e tinha mais um que eu esqueci o nome. Eu me chateio quando eu esqueço o nome desse pessoal.
P1 – Não tem importância.
R – Mas é porque é um pessoal que me viu ali dentro começando. Foi um pessoal que estava lá quando eu cheguei. E tinha informação pra imprensa que interessava. Pouca gente, pouca não. Às vezes, a Última Hora botava em primeira página: “Petróleo! Indícios de petróleo no campo de Catú, de Mata, de Candeia”. A gente dizia: “Indícios coitadinhos”. Saia lá, pra sair na imprensa, né? Que tinha que sair notícia da gente. Toda sexta-feira tinha notícias pros jornais. A Última Hora. E o dia que saia de noite era dia que o Diário de Notícia dava notícia. Correio da Manhã. Bom, o JB (Jornal do Brasil) era maravilhoso com a Petrobrás. O Globo saia porque tinha uns jornalistas lá que era muito da gente. Mas saia notinhas pequenas.
P1 – Até mesmo ia te perguntar também como é que você vê hoje também. Você que trabalhou desde aquela época.
R – Mas eu não vou lá há muito tempo.
P1 – Não, mas como é que você sente, vê a Petrobrás com toda essa...
R – Ah! Eu gosto, eu gosto. Eu gosto de saber que a empresa, a empresa está deslanchando. E está errando! E está acertando. E Está errando. E está acertando. Agora, eu achava que a Petrobrás tem que continuar a fazer como fazia antigamente. Eu não sei se ela está fazendo. Ela treinar o pessoal dela. Treinar muito. Nós éramos muito treinados. Nós éramos treinados, nós podíamos ocupar, naquela época, qualquer lugar. Eu fui na comunicação social nas relações publicas, eu me lembro, que o General Dávila chegava pra mim e ele sabia que eu conhecia a Petrobrás quase toda porque eu tinha irmã no Sermat, serviço material.
P1 – Como é que o nome da sua irmã?
R – Maria do Socorro Andrade Boscov. Ela casou com um russo.
P1 – Ela casou com quem?
R – Com um russo, é. Ele é filho de russo. Aí Boscov vem do russo, vem do lado de lá. E o Sermat foi assim um berçário de gente pra trabalhar. Porque ali era trabalho, era muito trabalho. Então vinha o General Dávila e dizia pra mim assim: “Artemiza, é minha filha eu estou precisando urgente de uma pessoa que escreva bem. Mas é urgente”. Eu falei: “Pode deixar comigo”. Aí eu conhecia outros departamentos, os chefes porque eu trabalhei na diretoria. Então eu tive muito contato, então eu fui apresentada a muita gente. Aí eu disse pra ele: “Eu conheço um cara”. Dei um nome. “O Cezar Augusto Correia. Ele é professor”. Ele escreve bem até hoje. Tu botas um ponto numa folha e diz pra ele assim: “Esse ponto aí eu quero que ele saia daí; uma matéria sobre hoje a Petrobrás”. Se ele tiver por dentro; ou se não tiver ele vai pegar a revista vai ler, vai ler, vai ler. Escreve, faz uma beleza. Então ele foi trabalhar no Sercom, naquela época, pra fazer muita coisa. O General Araquém. Mas ele já era. Ele não foi pro General Araquém, General Araquém foi em 74. Foi para o... Antes do Araquém foi o Mangabeira. Mangabeira, teve o Osvino. Mangabeira. Iiiii caramba! A cabeça está ruim. Aí teve lá os da revolução que veio. Da revolução ficou. Veio o General Araquém. Eu não me lembro mais. Eu sei que ele queria. “Não. Eu quero uma pessoa pra fazer isso assim”. Eu chegava pra minha irmã e dizia: “Quem no Sermat é muito bom pra fazer isso? Fazer volumes, pacotes, datilografias?” “Ah, mas eu não vou dar. Eu tenho, mas eu não vou dar”. “Ah! Você não vai fazer isso comigo”. Aí chegava a carta imediatamente, né? Mandavam buscar, né? Hoje essa gente se você chamar vai dizer que foram assim: escolhidos a dedo. A dedo.
P1 – Artemiza, a gente infelizmente vai terminar nossa entrevista
R – Que ótimo.
P1 – Queria perguntar, né? Você tem, tinha, né, já seus filhos? Seus dois filhos. Você tem netos?
R – Eu tenho um filho que mora nos Estados Unidos. Ele se formou aqui. Ele fez o Instituto Militar em Engenharia. A Petrobrás toda, toda não. A comunicação social conhecia muito ele porque ele estudava no São Bento. E ele vinha caminhando do São Bento até o prédio da Petrobrás. Ele e João Regis. João Regis hoje é um médico famoso que tem um programa na TV. Sei lá. Sempre estão entrevistando ele. E eles vinham pra Petrobrás me esperar pra horário. Ou então eles pegavam o metrô. Porque o São Bento só aceitava andar no ônibus até quando terminasse o primário. Terminou o primário não podia mais andar no ônibus. Aí tinha que se virar. E ele então como terminou muito cedo, ele vinha, se encontrava comigo. A gente pegava o carro, que eu tinha o carro na garagem e ia pra casa. Ele, João Regis. Ou então eles iam mesmo de metrô. E ele fez Instituto Militar, fez na Engenharia, na Mecânica, especializou-se na transferência de calor. Ele trabalhou na pesquisa nos Estados Unidos. E agora ele trabalha numa empresa particular porque ele diz que precisava ganhar dinheiro. Mas só que quem é da pesquisa nunca deixa. Agora o Governo do Colorado convidou pra ele trabalhar em fontes alternativas de energia; que é a especialidade dele.
P1 – Qual o nome dele?
R – Marcos Vinícius Andrade Bianchi. Ele está entrando lá, está entrando. Quer dizer, já trabalha nessa empresa ______ _________ _______. Ele já.
P1 - Ele tem uma filha?
R – Tem duas filhas: a Laura e a Olívia. A Olívia nasceu lá. A Laura nasceu aqui no Rio Grande do Sul. Porque como ele foi bolsista do Brasil, ele veio pro Brasil e pagou. Que ele tinha que ficar dois anos no Brasil. Aí ele veio, ficou na Universidade Federal dois anos. Nesses dois anos ele ficou liberado. Porque a maioria não volta. Todo mundo dizia lá pra ele: “Não volta, isso é besteira. Você vai voltar?” Ele falou: “Eu vou voltar até porque eu voltando eu quero ver como é que está. Que eu fico no Brasil”. Aí ele veio pra...
P1 – Artemiza, vamos só... Que a gente está quase terminando.
R – Ah! Vamos lá, vamos lá.
P1 – E sua filha?
R – A minha filha é também conhecida na Petrobrás porque ela foi capa da revistinha, ela pequinininha.
P1 – Qual o nome dela?
R – Ângela. Ela se formou em jornalismo; mandaram oferecer. Porque ela escreve muito bem. Ela fala inglês muito bem; quer dizer, se formou em professora, mas não é professora. E ela está na quarta faculdade, terminando. Já terminou a quarta faculdade. A minha filha ela fez Jornalismo na comunicação social, ela fez Marketing, ela já fez doutorado nessas matérias. Já fez, terminou Psicologia. Eu sei que ela fez mais uma aí. E ela faz consultoria pra empresa do marido dela que é essa empresa de informática, de grandes computadores. Não é computador pequeno não. É de ___ _______, ______, né? Do Governo. Trabalha pro Itaú, trabalha pra algumas empresas. É a América Tecnológica aqui do lado. Um prédio que tem aqui só de empresas.
P1 – E ela tem filhos?
R – Tem uma filhinha. Tem a Carolina.
P1 – Carolina?
R – É. A Carolina está com dois anos.
P1 – Queria saber o que você faz do teu tempo agora.
R – (Riso) Sim. Eu estou comprando o tempo. Por causa do seguinte: de segunda a sexta, eu na parte da manhã, das sete as oito eu tenho uma Ong, uma Ong não, uma terceira idade ali na Urca, na praia. Eu faço ginástica ali das sete as oito. E depois, de oito as nove, nove e meia, tem no Forte da Urca, tem uma Ong pra Terceira Idade. E mais tem psicólogos, tem ginástica, tem nutricionista, tem tudo lá. E é aberta ao público, já até ofereci à Petrobrás, não foram.
P1 – Do lado do Forte São João?
R – É. Eles dão a carterinha bonitinha. E é uma coisa linda, maravilhosa. Olhando aquele mar, fazendo ginástica ali. Isso de segunda a sexta. E tem no Fluminense, eu parei agora porque eu tive um problema, eu jogo tênis. Jogava, parei há algum tempo. E tem uma hidro do Fluminense que eu faço hidro. É mais pra... Tem dia que eu faço, tem dia que eu só vou pra conversar, jogar biriba. Desfile, vai ter o desfile de moda dia seis. Daí eu vou a gente conversa, almoça, fica até cinco da tarde, bota lá um cara tocando, a gente canta. E vou ao cinema; eu acompanho todos esses filmes nacionais, brasileiros, todos. Vou ao teatro, vou muito ao teatro. Muito, muito, muito. Uma vez o José Mauro da Cruz Gonçalves, ele trabalhava conosco, era jornalista da Última Hora. E ele disse pra mim: “Por que você não vai pra censura?” Eu falei: “Deus me livre, cara!” Na época quem freqüentasse o curso era censor. “Não, não. Não quero não. Censor não”.
P1 – Foi na ditadura mesmo?
R – É. Eu falei: “Está louco?” Porque eu via tudo. Eu via. Agora me casei. Oh, “me casei”. Me aposentei tive mais tempo. Aí mesmo que eu vou, por exemplo: passear. A minha filha diz: “Mamãe, vamos passear ali no barco Eduardo Batista”. “Vamos”. Vou lá. Se não é Eduardo eu vou na Marinha que é de graça com as amigas. Entendeu? Aí fui agora pro Canadá, fui pra o Alasca, fui pra Estados Unidos. “Ah! Mamãe vamos para as estações de esqui”. Me levou lá pra estação. Me levou a Aspe, eu não conhecia o espaço que tem, o morro que liga um ao outro. Quatro mil e tantos metros de altura. Eu fui, eu subi. Quer dizer, quase metade do Everest. Não, não é tanto. Mas alto, gostei achei lindo. É uma estrada só pra turista, entendeu? Eles adoram me levar pra lugares. Amanhã estou indo pra uma entrevista que a minha filha pediu pra eu ir. Eu não sei quanto tempo eu vou levar. Só que ela disse assim: “Mamãe é uma entrevista que você vai dar; tem tudo a ver comigo. Eu tenho certeza que você não vai amarelar”. Eu falei: “É pra descer algum morro alguma coisa?” Porque eu subo muitos morros. “Não, não é”. Então eu estou lá. Entendeu?
P1 – Faz caminhadas de subidas também?
R – Faço muitas caminhadas. Agora eu estou proibida por causa da perna. Tem que, realmente eu tenho que fazer urgente essa...
P1 – Artemiza, você tem ligação com a sua cidade natal?
R – Todo dia. Eu mando pra lá, desde que eu vim pro Rio de Janeiro com 17 anos, eu ajudo. Agora eu construí cinco casas pra Associação dos Vicentinos; porque papai me deixou uns terreninhos. Deixou pra todos os filhos. Os meus eu vendi e mandei construir. Porque ele era o presidente vitalício da Associação dos Vicentinos de lá. E ele e minha mãe também. E eles pediram pra não deixar morrer aquilo. Aí o que eu fiz? Eu disse pra ele: “Pai, eu vou mandar construir”. Porque as primeiras casas ele construiu em 1950, sei lá. Pra abrigar os velhos que não tinham ninguém. E eram umas casinhas bem simples, agora eu fiz. E o Assis, que é muito rico, teve lá e viu e disse assim: “Eu vou também construir mais cinco”. Aí construiu mais cinco. Eu tenho cinco bibliotecas que eu ajudo lá. Eu mando, agora mesmo a transportadora MJ Cargas, trabalha pra Itapemirim. Me levou os volumes pra distribuir na semana da criança. Eu sempre. A Petrobrás, quando eu trabalhava, mandava muitos cadernos. Porque eu pedia, né? Porque diziam assim: “Qual a sua cota?” Mandava pra o interior da Amazonas, pra Bahia. Pro Piauí não tinha petróleo, não tinha muito interesse. Era eu é que pedia, né? Mandavam sacolas plásticas. Uma vez, no Jornal Nacional, até liguei pro pessoal, que vissem Guaribas, que foi escolhida como a cidade mais pobre do pais, né? No Piauí. Foi a cidade padrão do Lula. O pessoal com a sacola da Petrobrás, com mantimentos. Que me deram e eu não sabia que ia pra lá. Eu mandei pra distribuir em Floriano, que tem muita gente pobre no interiorzinho; São Francisco, aqueles lugarezinhos. E a moça falou: “Pois é, nós mandamos um pouquinho pra Guaribas” E apareceu no Jornal.
P1 – Agora estamos chegando no final.
R – É. Achei bonitinho.
P1 – Artemiza, infelizmente a gente vai terminando. Eu queria terminar te perguntando o que você achou de ter participado aqui.
R – Não, eu achei bom. Eu achei maravilhoso porque eu achava que a história deveria inclusive, eu estou falando geral da Petrobrás, mas da comunicação social em particular, que não deveria deixar morrer, né? É a mesma coisa lá do samba do Cartola, né? Não deixa morrer, passa o anel de bamba pra outro, mas não deixa morrer a história. E eu estou a disposição enquanto eu não tiver. Que a turma diz que eu não vou ter porque eu vou morrer antes. É Alzheimer. Porque o avião vai cair porque eu viajo todo dia. Eu vou cair do morro e eu também vou ficar muito feliz. Então enquanto eu tiver com a memória boa, vocês podem usar e abusar.
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