Núcleo Ubatuba Museu da Pessoa
Realização Associação Cunhambebe
Entrevista de João Aramini
Entrevistado por Fabíola Lugão C. Viggiano e Telma Homem de Mello
Local: Ubatuba São Paulo
Data: 7 de setembro de 2023
Código: NUMPE_HV001
Transcrito por Telma Homem de Mello
Revisado por Fabíola Lugão C. Viggiano
Título: “Arranhado”
Mini bio - João Aramini nasceu em 22 de fevereiro de 1970, em Santos, foi adotado por Armando Aramini e Eleta Maria Pandória Aramini. Formou-se em administração com ênfase em propaganda e marketing pela Unicid, morou em Salesópolis, São Paulo e Ubatuba. Sempre desportista, apaixonado pelo surf, é um precursor do surf adaptado no Brasil.
Sinopse - João Aramini tem uma trajetória marcada pela superação, enfrentamentos e conquistas. Aos 19 anos de idade sofreu uma amputação decorrente de um acidente de moto, o que o moveu para o pioneirismo na luta pela inclusão social de Pessoas com Deficiência, especialmente na área do esporte. Hoje enfrenta o tratamento contra o câncer de pâncreas.
Tags - #Ubatuba, #museudapessoa, #salesópolis, #amputação, #equiperneta, #amputado, #câncer, #preconceito, #surf, #surfadaptado, #esportesradicais, #viralata, #inclusãosocial
∙
P1 - Ubatuba, 7 de setembro de 2023, entrevista com João. Vamos iniciar. Boa tarde, João.
R - Boa tarde.
P1 - Estamos em Ubatuba e eu gostaria muito de conhecer você. Comece iniciando para mim, falando o seu nome completo, data de nascimento e onde você nasceu.
R - É isso aí, vamos lá. Meu nome é João Aramini. Eu nasci em 22 de fevereiro de 1970, no litoral sul, que é Santos, né?
Na verdade, eu nasci lá, mas por conta de uma adoção. Eu sou filho adotivo. Fui descobrir isso, foi escondido pela família há mais de 30 anos por alguma questão que é um mistério. Então, me acho privilegiado por ser uma pessoa que foi adotada por uma família simples, mas que me deu alguma sustentação até hoje em...
Continuar leituraNúcleo Ubatuba Museu da Pessoa
Realização Associação Cunhambebe
Entrevista de João Aramini
Entrevistado por Fabíola Lugão C. Viggiano e Telma Homem de Mello
Local: Ubatuba São Paulo
Data: 7 de setembro de 2023
Código: NUMPE_HV001
Transcrito por Telma Homem de Mello
Revisado por Fabíola Lugão C. Viggiano
Título: “Arranhado”
Mini bio - João Aramini nasceu em 22 de fevereiro de 1970, em Santos, foi adotado por Armando Aramini e Eleta Maria Pandória Aramini. Formou-se em administração com ênfase em propaganda e marketing pela Unicid, morou em Salesópolis, São Paulo e Ubatuba. Sempre desportista, apaixonado pelo surf, é um precursor do surf adaptado no Brasil.
Sinopse - João Aramini tem uma trajetória marcada pela superação, enfrentamentos e conquistas. Aos 19 anos de idade sofreu uma amputação decorrente de um acidente de moto, o que o moveu para o pioneirismo na luta pela inclusão social de Pessoas com Deficiência, especialmente na área do esporte. Hoje enfrenta o tratamento contra o câncer de pâncreas.
Tags - #Ubatuba, #museudapessoa, #salesópolis, #amputação, #equiperneta, #amputado, #câncer, #preconceito, #surf, #surfadaptado, #esportesradicais, #viralata, #inclusãosocial
∙
P1 - Ubatuba, 7 de setembro de 2023, entrevista com João. Vamos iniciar. Boa tarde, João.
R - Boa tarde.
P1 - Estamos em Ubatuba e eu gostaria muito de conhecer você. Comece iniciando para mim, falando o seu nome completo, data de nascimento e onde você nasceu.
R - É isso aí, vamos lá. Meu nome é João Aramini. Eu nasci em 22 de fevereiro de 1970, no litoral sul, que é Santos, né?
Na verdade, eu nasci lá, mas por conta de uma adoção. Eu sou filho adotivo. Fui descobrir isso, foi escondido pela família há mais de 30 anos por alguma questão que é um mistério. Então, me acho privilegiado por ser uma pessoa que foi adotada por uma família simples, mas que me deu alguma sustentação até hoje em uma questão de batalha, de situações que muitos enfrentam. Então, eu acabei descobrindo isso depois de muitos anos. Tenho minha mãe como minha mãe mesmo e meu pai como meu pai mesmo, mesmo sendo adotado. Não conheci os pais biológicos, não me faz falta nesse sentido, nunca procurei saber porque a vida seguiu com muito amor, com muita dedicação por esses meus pais, que eu considero como pais, independente de ser biológicos, fisiológicos ou extraterrestres, não importa, eles são meus pais.
∙
Então, nunca eu busquei essa situação, não tive essa necessidade. Então tive o privilégio de ser adotado, que muitas vezes ficam entidades por aí, ainda mais na época com os critérios, com toda a burocracia, que realmente ela existe, é necessária, mas às vezes não é só uma questão financeira, é uma questão de aporte psicológico de pessoas que estão ali dedicadas a querer ter um filho. Então esse foi o meu caso.
P1 - Seus irmãos?
R - Eu não tenho irmão, sou filho único, sou adotivo e filho único. Então, não tenho irmão, não tenho irmã.
P1 - Nome dos seus pais?
R - Armando Aramini e Eleta Maria Pandória Aramini. Eu só sei da minha mãe e um edifício que eu vi em São Paulo que chama Eleta, nunca conheci outra Eleta na vida.
P1 - Sua formação escolar, como foi sua primeira infância?
R - Eu tive uma formação escolar, foi em escola pública, uma parte foi, aliás, foi totalmente em escola pública. Depois eu fiz faculdade, me formei em administração com ênfase em propaganda e marketing pela Unicid, atuei um pouco nessa situação, nessa questão da formação, mas depois procurei outros rumos, aí depois acabei utilizando no meu próprio negócio esse tipo de conhecimento.
P1 - Fala um pouquinho mais da sua infância em Santos, como era sua relação na rua
R - Então, eu acabei sendo adotado em Santos, mas foi por uma questão burocrática, né? Morei em São Paulo, então eu não tive uma infância em Santos. Foi protocolar o negócio. Eu fui pra Santos pra ser adotado, porque era mais fácil ser adotado por lá naquela ocasião. E aí eu vim morar em São Paulo e depois fui pro interior. Eu acho que essa transição do interior foi a mais interessante. Viver que nem hoje em Ubatuba, né? Você acaba vivendo dentro de comunidades, tendo proximidade com famílias, sabendo coisas de famílias. Aqui em São Paulo é muito corrida, uma cidade é uma metrópole. E aí você vai em pequenos lugares que você consegue ter uma relação maior com a comunidade. Então foi uma infância de quem hoje nasceu em 1970, era todo mundo na rua. Eu tive esse prazer de ter três anos morando em Salesópolis, que é uma cidade próxima aqui da região do Vale. E tive aquela infância de menino que pulava no rio, que nadava no rio, cidade pequena, todo mundo conhecia todo mundo, que queria namorar menina que tinha, dava pra contar nos dedos na cidade, então você contava aquela que você queria namorar, porque não sobrava muito. Então, foi essa história pequena que é gostosa também, né?
Acho que quem pôde vivenciar, eu acredito, em lugares assim, trazem uma memória muito afetiva, acho, porque você tem mais relacionamento com as pessoas.
P1 - E a sua volta para São Paulo, com que idade, como é que foi essa transição?
R - Essa transição é interessante. Eu morava numa cidade pequena, que tem pouca estrutura de hospital. Onde eu morava era tipo um vale, e eu vou contar da transição logo mais. Era tipo um vale, aqui era cidade e aqui eram sítios que foram loteados e construíram duas pontes. Para chegar no hospital e na igreja matriz, você tinha que andar dois quilômetros de carro, a pé, de bicicleta e voltar mais dois porque a direção da minha casa não era essa.
Meu pai foi tentar salvar dois filhos. Eu estava numa tarde com ele andando de bicicleta e o filho do prefeito e de outros, que eu não vou comentar o nome, na ocasião, fizeram uma certa curva, eu estava de bicicleta, e meu pai viu que a velocidade era grande, tinha acabado de almoçar, falou, "eles não vão conseguir fazer a curva". E eu falei, menino, eu não entendi aquilo, falei, "pô pai, vamos não, vai fazer, tal". E ali a gente teve uma discussão no sentido de sentido, “Vamos pra lá, vamos pra cá.” Ele falou, "eu vou voltar".
Ele salvou duas pessoas e teve uma congestão cerebral, bateu a cabeça na coisa. Não tinha estrutura na cidade. Infelizmente, parte da política é poderosa nesse sentido. Então, deram as costas pra tudo isso e os meninos sobreviveram e meu pai faleceu. Isso eu tinha 11 anos. E aí quando eu vim pra transição em São Paulo, se você pensar que hoje você tem... todo mundo praticamente tem que agir da mesma forma, não é porque tem que agir, mas o próprio sistema da internet que é favorável, etc, mas te remete a um comportamento.
Então, quando você sai de uma cidade do interior, você sai falando acaipirado, vamos dizer assim. Então, você tem até um certo preconceito naquela época em relação a isso. Então, é interessante essa coisa. Hoje em dia, você vai para um lugar, as pessoas notam isso, mas eu acho que, falando de preconceito, naquela ocasião já existia. Quando eu ia para Santos, que eu fui visitar parentes que eu tinha lá, tinha essa coisa do cara do interior. Que hoje não, hoje tem banda que é do interior, que hoje tem um monte de coisa.
Então, eu acho que a gente cresceu em algumas coisas e regrediu em outras nesse sentido. Se você pensar no detalhe da inclusão social, etc, que hoje passeia muito, até dessa regionalização, né? Se você pensar que você tem preconceito, que ainda existe, com o Nordeste, com o Sul, já nem tanto. Vamos falar que a gente estava a poucos quilômetros de São Paulo. Então, essa foi minha história de infância. Mas não vejo com tristeza.
Meu pai foi, pra mim, um herói nessa coisa. Então, é isso. [emocionado]
Então, aí teve essa situação com meu pai, como eu havia falado, essas pontes eram do lado extremo da cidade para você chegar na igreja e a Santa Casa que era logo atrás. Quando eu soube da notícia eu estava em casa, eu tinha que descer essa ladeira, eu nadei esse rio, cheguei molhado no hospital, todo molhado, menino de 11 anos, em busca do pai ali, que hospital não tinha nem UTI, aquela estrutura bem básica, meio parecida, um pouco, um posto de saúde, enfim. E deram, mandaram ele pra casa, ele tava, ele tinha tido um trauma, como bateu atrás, ele teve uma fratura craniana, não tinha nem raio-x. E aí ele foi em casa, passou mal, etc, e morreu logo em seguida. Então, teve essa história. Dá dó né? De você ter essa situação, de uma certa revolta pelo fato. Mas uma coisa que eu levei para a minha vida, coisas positivas e outras não, né? Você vai lidando com aquilo. Uma tia minha falou pra mim, não se revolte. Quando você se revoltar, vai ser pior pra você. E eu com 11 anos falei, puxa vida, né? Fiquei todo revoltado com toda essa história, já tinha mais ou menos. E você seria o homem da casa, né? Porque isso pesou um pouco no decorrer da vida, porque senti que correr atrás, pensando que era o homem da casa com 11 anos, né? Mas eu acredito que foi um alerta que me serviu para eu não trazer essa revolta em coisas que eu vou contar daqui para frente. Então, vamos continuar.
P1 - A sua juventude foi tranquila.
R - Eu fui até perto de 18 anos, como qualquer adolescente, fazendo coisas certas, fazendo umas não tão certas, aprendendo. Essa questão, voltando só a essa questão, eu fui discriminado nessa época por amigos que eram de São Paulo. E esses meninos tinham uma... o adolescente, enfim, eles têm... a criança, assim, ela tem uma bondade, etc. Óbvio, quanto menor, mais pura. Mas vai ficando aquele adolescente que a gente sabe como funciona, né? Então eu tive essas chacotas, moda de vestir. Hoje é tudo uniformizado, você não sabe quem é quem, de qual tribo
Então, aí teve essa situação com meu pai, como eu havia falado, essas pontes eram do lado extremo da cidade para você chegar na igreja e a Santa Casa que era logo atrás. Quando eu soube da notícia eu estava em casa, eu tinha que descer essa ladeira, eu nadei esse rio, cheguei molhado no hospital, todo molhado, menino de 11 anos, em busca do pai ali, que o hospital não tinha nem UTI, aquela estrutura bem básica, meio parecida, um pouco, um posto de saúde, enfim. E deram, mandaram ele pra casa, ele tava, ele tinha tido um trauma, né, como bateu atrás, ele teve uma fratura craniana, não tinha nem raio-x. E aí ele foi em casa, passou mal, etc, e morreu logo em seguida. Então, teve essa história, né? Da dor, né? De você ter essa situação, de uma certa revolta pelo fato. Mas uma coisa que eu levei para a minha vida, que uma tia, coisas positivas e outras não, né? Você vai lidando com aquilo. Uma tia minha falou pra mim, não se revolte. Quando você se revoltar, vai ser pior pra você.
E eu com 11 anos falei, puxa vida, né? Fiquei todo revoltado com toda essa história. E você seria o homem da casa, né? Porque isso pesou um pouco no decorrer da vida, porque senti que correr atrás, pensando que era o homem da casa com 11 anos, né? Mas eu acredito que foi um alerta que me serviu para eu não trazer essa revolta em coisas que eu vou contar daqui para frente.
P1 - Então, vamos continuar. A sua juventude
R - A juventude foi tranquila. Eu fui até perto de 18 anos, como qualquer adolescente, fazendo coisas certas, fazendo umas não tão certas, aprendendo. Essa questão, voltando só a essa questão, eu fui discriminado nessa época por amigos que eram de São Paulo. Eu fui morar com um primo até me estabelecer em uma casa que a gente tinha em São Paulo. E esses meninos tinham uma... o adolescente, enfim, eles têm... a criança, assim, ela tem uma bondade, etc, óbvio, quanto menor, mais pura. Mas vai ficando aquele adolescente que a gente sabe como funciona, né? Então eu tive essas chacotas, moda de vestir. Hoje é tudo uniformizado, você não sabe quem é quem, de qual tribo pertence, se gosta de x coisas, as coisas estão meio misturadas, tudo bem, foi um fato histórico.
Mas até o modo de me vestir tinha uma chacota, aí eu fui me adequando, o sotaque foi indo embora e as coisas foram acontecendo. Foi muito legal porque eu não imaginava São Paulo desse tamanho. Eu vim pra São Paulo, eu ia em circo, adorava circo, adoro circo até hoje. Eu tenho um veio com palhaços, etc. Lembro certa vez que um circo... Eu vou que nem o Beto Carreira, eu vou nos circos mais legais quando eu posso e os mais pobres. Ali tem umas essências muito legais. Eu lembro que em Salesópolis deixaram um leão. O circo não tinha dinheiro, o leão ficou abandonado. A prefeitura tinha que encampar o bicho. E virou uma atração.
Imagina uma cidade... Ubatuba tem em torno de 120 mil habitantes. Lá era um quarto disso e não acontecia nada. Um leão foi... Nossa! Foi um... Era fantástico lá, sei lá qual... Era um evento absurdo e todo mundo viu o leão. Acho que a atração do leão ficou maior do que o circo que veio. Então, isso... Mas aí voltando, são idas e voltas, né? Mas voltando à situação, fui pra São Paulo, então... Eu não imaginava, né, existir o tal do Playcenter, para quem é da minha época, que poderia existir.
Existiam parquinhos que vinham, eu sou da época que vinha parquinho no interior, que vinha com aquela estrutura. Existia um Playcenter, para quem é da minha geração, sabe que ali era tudo cimentado, a gente estava na terra, como é que poderia ser um lugar tão grande e cimentado? Então, São Paulo me trouxe essa coisa de grandeza. E que é, de fato, o estado que mais arrecada. Enfim, é uma referência gigante até, do tamanho de qualquer país do mundo.
P1 - Sua escolha de faculdade, como aconteceu?
R - Poxa, essa parte é complicada. Eu nunca fui um bom aluno. Tive uma época boa de leitura na faculdade, extracurricular, eu li mais, né? Mas a opção foi... falta de opção. Até como uma... falta de opção, de saber o que fazer. Como todo adolescente, às vezes vai de uma, duas, três faculdades e acaba indo para uma quarta e se identifica. A minha foi porque eu achava o marketing uma coisa interessante no sentido de venda, de como sobreviver também através do marketing.
No Brasil estava sendo implantado marketing de varejo, inclusive tinha poucos livros publicados em português. Existia um que me falha a memória agora, mas acho que é Philip Kotler. E existia muita literatura americana, esse livro veio para o Brasil. Eu me interessei nessa história de marketing de varejo. Mas foi mais assim, a história de um professor que eu vi famoso, que ele falou, como você chegou aqui, até aqui, como você conseguiu algumas coisas, o pouco que eu consegui, mas foi errando, eu fui chegando e errando, porque você só vai fazendo a experimentação até uma hora que você acerta o seu caminho. Então, foi essa minha experiência de faculdade.
Concluí esse curso e fiz alguns outros também, enfim, baseado nessa história toda.
P1 - E a sua história profissional?
R - Então, aí eu fui para o campo de na área de seguros, cheguei a virar supervisor, com status de gerente de vistoria técnica, que já não tinha nada a ver com o marketing, mas eu sempre estava ali, eu estava ali numa empresa paraestatal, uma época que eu fiquei mais tempo, e eu via uma situação do marketing crescendo lá. E isso que eu achei interessante, não cheguei, porque o departamento era pífio, eram poucas pessoas, e já tinham os agentes ali. Então, eu fiquei em um cargo técnico por muito tempo lá. Então, foi essa trajetória profissional, foi mais na questão da parte da seguradora, como técnico de avaliação de seguros de alta, etc.
P1 - A partir disso aí...
R - É, aí mudou, né? Eu tive um projeto que eu queria fazer. Eu achava inovador, porque eu tinha essa visão de marketing, e que de fato uma seguradora, uma das maiores seguradoras do Brasil fez, porque eram dois projetos, eu sou cheio de projetos. E esse projeto, eu estava no lugar errado na hora errada. Um era ter desconto para deficiente físico, porque essa seguradora, que eu não posso falar o nome, já fazia para mulheres. Eu falei, poxa, por que não?
E eu defendi isso na minha apresentação de conclusão de faculdade, porque como eu sabia muito da norma técnica, você conseguia isentar algumas coisas técnicas que você reverteria em desconto para o deficiente, como faziam para as mulheres. Então, eu apresentei esse projeto na faculdade, por coincidência, ou não, óbvio, que todo mundo está estudando um monte de coisas, etc., ao mesmo tempo, que às vezes vai sair hoje em dia, principalmente, cada um pode surgir com uma história. Essa seguradora, depois de três meses que eu fiz, implantou esse projeto por eles. E um amigo meu falou, caramba, que fazia a faculdade, mas eu não faço ideia. Não é minha ideia, a ideia é que era uma situação que surgiu, eu nem estava na história. Talvez se eu tivesse, eu faria parte disso. E a outra era uma parte que era de trazer também coisa técnica, que era a empresa usa o sucateamento para fazer reparos em automóveis, às vezes com peças novas, seminovas, e tinha um mercado meio negro de espanhóis nisso.
Eu queria implantar esse projeto para legalizar isso na segurança, e que muitas delas, quatros, abraçaram esse projeto, mas a empresa que eu estava não quis abraçar da forma que eu queria. E foi capengando, capengando, eu desisti desse projeto por pedir as contas, por conta desse projeto. Porque não é possível. É isso, essa mesma seguradora, que era a maior do Brasil, ainda é uma das maiores, fez esse projeto interno, mas eu queria fazer coletivo. Como a gente era prestador, eu queria que esse projeto, na época foram três seguradoras a aprovar, mas a empresa que eu estava não quis bancar essa situação. Então eu desisti da história.
P1 - Então, continuando…
R - Quando eu falo desses dois projetos, o primeiro era muito importante pra mim, que eu via com a minha história, porque eu fui amputado, sofri um acidente de moto, então traumático, que a gente chama traumático não congênito.
P1 - Com que idade?
R - Próximo de 20 anos de idade, né? Então, eu vim de um acidente traumático e não congênito, que é de nascença, né? Quando a gente chama que aquele deficiente veio amputado já ou com alguma deficiência em relação à genética dos pais. Eu não, foi traumático.
Então não foi diabetes, não foi algum outro problema circulatório, eu tive um acidente de moto. Aí sim veio a ideia do deficiente, desse primeiro projeto que não era um projeto social, era um projeto comercial. Eu estava inserido numa empresa para uma situação comercial. Como eu vivenciei essa história, então, da amputação despertou realmente essa coisa, né? "Poxa, cabe aqui", né? Então, bom, vamos voltar aí. Aí eu sofri essa amputação. Nessa amputação, o que aconteceu? Eu já era ligado ao esporte, o surf, já surfava antes, que era a minha paixão da minha vida.
Eu surfava antes de ser amputado, já trabalhando em São Paulo, etc. E comecei a praticar o surf, o surf adaptado. E que não existiam próteses no Brasil naquela época pra isso, pra entrar na água. E eu, com minha curiosidade, fui remontando essa prótese para que ela pudesse entrar na água, juntamente com o médico, que é o doutor Nelson de Luccia, que é uma referência no Brasil como médico cirurgião. Ele tinha uma clínica também. Então, ele apostava muito em mim como atleta, né? Então, eu me dei bem em algumas situações. Havia essa troca de testes de equipamentos, porque era muito deficitária no Brasil. E por não falar no mundo, em algumas situações, porque tinha corrida, tinha outros esportes, os que eram aquáticos, geralmente os deficientes não usavam esse equipamento. Então, nasceu essa história para mim, dessa coisa de estar portador de deficiência.
E aí o que acontece? Nesse período, aconteceu um fenômeno interessante de uma transição de próteses no Brasil, de tecnologia. As próteses eram mais cosméticas e se tornaram a ser mais dinâmicas e mais tecnológicas, vamos dizer assim, não se importando tanto com a questão estética. Óbvio que hoje já tem capas etc. que protegem, mas as pessoas escondiam as suas deficiências. Você não via muitos deficientes na rua, se parar para pensar, vários deles estavam nas suas casas, primeiro por limitação de transporte, limitação de acesso, limitação financeira. Então, a própria condição não dava condições da infraestrutura desses deficientes a saírem.
P1 - Sociais.
R - Sociais, perfeitamente. E um olhar meio estranho, porque já que você não vê aquela história, você não vê elefante passar. Na África, você vê elefante passar. O elefante passou. Aqui, passa o deficiente, é o elefante. Porque não se viu muitos deficientes, pela minha vivência, que se expunham, que ficavam expostos em algumas situações. Então criou-se essa história. Aí eu participei de um negócio chamado Equipernetas, que era um grupo de deficientes que fazia esportes radicais.
Já tinha os convencionais, inclusive olímpicos, etc. Nós fazíamos esportes diferenciados, que não estavam nesse hall, que inclusive é apoiado por associações, por entidades, e despertou curiosidade. Na época que surgiu o Teleton, feito pelo Silvio Santos, que foi uma ideia do Jerry Lewis, que era um comediante da época muito antigo, e que a Hebe Camargo foi para os Estados Unidos e trouxe essa história para o Silvio Santos, que encampou isso de forma muito bonita, ele mesmo bancando, porque outras emissoras não bancavam. E como eles conheceram esse grupo de deficientes, a gente cedeu essa história, porque a gente queria montar uma ONG voltada à orientação do deficiente, principalmente o traumático, que acontece do dia para a noite, você não sabe para onde está, o que fazer.
E a gente estava sendo apoiado por isso. E a gente participou de três Teletons, programas de televisão, e a gente ia fazer palestra em faculdade gratuitamente, às vezes recebendo de forma gratuita e espontânea, às vezes recebendo apenas o custo da ida e às vezes a gente pagando. E essa era a ideia de formar a ONG. E que não se tornou. Cada um tomou um rumo, eu tomei os meus, os meus amigos tomaram outros e foi assim que aconteceu lá atrás, né? Até os meus vinte e poucos anos.
Então esse grupo tinha o nome de Equipernetas, que foi uma ideia do meu amigo Claudio Tanaka, que é um cara que apoiava e ajudava muita gente, se tornou um empresário, fazia muita coisas sociais, muito legais. E ele teve uma ideia, como ele tem essa coisa de união de pessoas, ele teve essa ideia desse nome. E o P de Equipernetas é uma cadeira de rodas virada ao contrário, simbolizando o símbolo internacional que já foi alterado, dos deficientes, mas algumas situações são utilizadas. E o P era uma cadeira de rodas, então é um logo muito legal, porque era um grupo de amigos, focado em uma história. Então eu acho que essa união era interessante, porque um apoiava o outro, um com deficiência maior, outro menor, compartilhamos os mesmos problemas. É a história da grávida, né? Estou grávida, e vai falar com outra grávida e os problemas da gravidez, e as consequências, as alegrias e as tristezas eventuais. Então foi aí que se formou esse grupo, com esse intuito.
P1 - Foi um grupo que você poderia chamar de grupo de apoio ou de amigos do esporte?
R - Acho que tinha as duas vertentes. Era um grupo de amigos que passou a ser um grupo de apoio. Porque, querendo ou não, íamos em palestras voluntárias, que você, mesmo voluntário no sentido de tentar inspirar as pessoas, por causa de suas deficiências, acaba se espelhando de uma forma ou de outra, vendo que todos os problemas, todo mundo tem algum, e esses caras têm, além desses, esse da conta, esse problema. Porque esse problema não é só psicológico, às vezes é também um problema financeiro, porque essas próteses, essas órteses, esses equipamentos, são caros. Então, se você tem carro, você tem carro, mas ainda tem uma cadeira para pagar. Se você tem carro e precisa de prótese, tem que comprar carro e prótese, não são baratos. Então esse grupo visava isso. E também visava dar aporte ao esporte, um esporte que é desconhecido, de ter relevância, de poder para que pessoas com deficiência possam participar ou não, para se tornarem profissionais, como hoje existem. O grupo foi feito em palestras em faculdades, inclusive para ortopedistas, para médicos cirurgiões, porque eles viram casos de sucesso. Depois de uma entrevista, eles vinham perguntar: caramba, como você faz isso com um coto desse tamanho? Como você faz isso, não sei o quê? Então houve curiosidade. Há um fato muito interessante. Fizemos uma palestra para pessoas relacionadas a isso, eu nem sei o nome da pessoa, nem sei se ela me conhece, estou mais velho, mas uma delas tinha uma clínica e ela chegou e falou para a gente, "é interessante o trabalho, como é que você pode falar que uma prótese entra na água se isso não existe?" Eu disse, "não tenho comprometimento com isso. É por isso que estamos aqui, para ensinar esta possibilidade." "Mas eles vão procurar minha clínica." "Estamos à disposição para ajudá-la." Então, imagine no universo de 250 pessoas, você tem uma pessoa para falar isso, em uma causa dela, ao invés de perguntar. Então isso é muito interessante, como você tem pessoas que agregam, te perguntam coisas relevantes e tem coisas que você vê que não são relevantes. Ela está preocupada com o problema que terá. Ela não perguntou se há uma solução. A abordagem é muito importante. O deficiente não morde. O deficiente não passa a doença para o outro. Às vezes ele consegue passar conhecimento, pode passar traumas como outras pessoas. Mas a abordagem é muito importante, a abordagem é se você é deficiente ou não. Então eu acho isso interessante, né? Pra você ver como não dá para dar ouvidos a 200 e é uma que você tem que ficar com o ouvido tapado, de preferência com cera no ouvido, aí você não escuta um negócio desse tipo. Mas são experiências interessantes. Aí por fim ela se acalmou, por fim ela entendeu, e acho que isso valeu a pena. Então quando tem alguém que está fora da situação, é um esclarecimento, uma paciência para ter com essa pessoa, porque é um universo para ela que atinge, como qualquer outro, é uma novidade. Toda novidade assusta qualquer um.
P1 - Ela passou o conhecimento para um ouvido soberbo.
R - Sim, acredito que sim. E uma pessoa que tinha experiência na área. É interessante esse movimento, naquela ocasião achei inspirador e conseguimos fazer muitas coisas legais sem sermos profissionais nisso.
P1 - Bacana, João. Vamos seguir?
R - Vamos.
P1 - E depois disso?
R - Depois disso, essa equipe se desfez, esse pessoal, não como amizade, mas sim como um trajeto de vida. Agora, hoje, aos 53 anos, vou encurtar a história, mas direi algo interessante, uma das inspirações...
P1 - Fique à vontade, você pode falar.
R - São vários causos, casos, meus e de amigos, mas é muito extenso, mas uma coisa que eu contei para minha amiga entrevistadora. Eu estava surfando, já surfava na época, voltei a surfar, tinham dois amigos numa praia da Baleia, praia conhecida do litoral norte, e um senhor me abordou, pois já aconteceram várias outras coisas, que talvez possam ser contadas por outros, mas eu achei esta, colhi aqui na minha mente e achei legal. Eu estava indo surfar e esse senhor do interior tinha uma casa do filho, se não me engano, um sol de rachar, aqueles que racha até quase a prótese, o sol que tinha. Ele estava de calça jeans e sapato. Passei por ele e, curiosamente, achei estranho, pelo horário, ele estava daquele jeito, um sapato social e a gente estava se preparando para entrar no mar e meus amigos entraram e ele veio me abordar. E ele falou: "Poxa, você entra com prótese?" Estou falando de quando eu tinha 20 anos. Ele é um senhor que acredito, de 65 anos. Ele morava no interior, não lembro onde, não lembro o nome, foi há muitos anos.
E ele falou, “Poxa, você vai entrar aí com essa prótese na água? Como é possível isso? Você anda de bermuda, você não tem vergonha de alguma coisa?” Eu disse não. Ele disse, "você me desculpe". Ele levantou as calças jeans que ele estava. E ele, para surpresa minha, estava com uma prótese também. Então foi por isso a coragem dele de vir me abordar e as questões psicológicas. E ele disse, “Poxa rapaz, eu venho na praia, venho com meus filhos, vou sair, e eu fico de calça jeans" ou uma calça X, que não lembro, o sapato, fico de , ou de sapato X, não lembro. "Eu nunca pus uma bermuda de vergonha. Vendo você, amanhã vou colocar isso, vou vir de bermuda. Você vai estar aqui?” Eu falei, “infelizmente não, porque estou dependendo dos amigos. Mas eu acredito no senhor, acredito que amanhã o senhor vai vir de bermuda, pela sua convicção.” E eu ainda acredito que ele tenha ido de bermuda mesmo, que essa coragem não tenha fugido dele. Então, eu vejo que hoje em dia muitos deficientes colocam suas próteses expostas. E eu acho interessante por que você arranca aquela ferida que na ocasião existia, de mostrar a deficiência, não para impactar nem nada, mas para uma aceitação.
P1 - E porque não?
R - E porque não?
P1 - Vamos lá.
R - Teve esse episódio com esse senhor, que foi muito legal. Passado esse tempo, desde que eu vinha para Ubatuba já, eu resolvi mudar para Ubatuba. Estou há 18 anos em Ubatuba, porque era um lugar do surf, um lugar que eu curtia vir, praticar esporte. Fiz alguns amigos. Decidi montar um negócio próprio, uma parte de comércio, para trazer a família. Trouxe minha filha e a esposa para cá e fui tocando a vida aqui como se fosse aquela história do interior, Ubatuba já grande, mas com uma coisa mais de comunidade, conhecendo pessoas, foi bem interessante. É difícil montar um negócio, mas ele foi montado, está em pé todos esses anos. E o que acontece? A decisão de vir para Ubatuba foi a seguinte. Uma, foi essa coisa do problema, do projeto que eu tive, que não foi levado adiante e minha filha, de um ano de idade, teve um câncer. O que foi medido nisso? Ela teve um câncer, mas teve êxito. Parece só história triste, eu acho que tive, como todo mundo, as histórias são tristes e são felizes. Você vive a tristeza e a felicidade da melhor forma que você consiga. Minha filha teve esse câncer, foi tratado no GRAACC, o primeiro câncer do Brasil. A primeira criança do Brasil, então GRAACC encampou essa história. Essa lâmina foi levada para vários estudos, para vários estudos da própria situação, por uma doutora renomada, a Nájila, que foi uma fundadora do GRAACC, e que pelo destino, um médico de Ubatuba conhecia ela, e fez essa ponte, o Amatias, que se tornou amigo nosso, médico e competente, colocou Rafaela nesta situação, que era uma situação rara. e por sorte, ou por questão de Deus, ou por qualquer questão que você queira colocar na cabeça, que ela foi um caso de sucesso. Ela não fez quimio, não fez nada. Ela se transformou em uma situação que virou estudo, que foi para hospitais renomados, e para o próprio GRAACC, que é uma fundação de câncer, para quem não conhece, para crianças. Então eles vão acompanhando até o X, fundado por Petrilli, que é um doutor renomado nessa questão. E é um projeto muito bonito. Quando eu competia com os cadeirantes, etc., eles me chamavam de arranhado, porque a minha deficiência era menor. Eu me colocava mesmo como arranhado quando via os caras. Eu falava, "eu tenho um arranhão", os caras tem um problema, eu tenho um arranhão. E aí quando você se depara com essa situação com a sua filha, você vê que ela pode ter uma lesão muito grave, que ela passa a ser realmente uma portadora de deficiência, e isso não aconteceu. E aí, para uma vida mais tranquila, para ela, embora os recursos de Ubatuba sejam, na questão da saúde pública, não dá para comparar com São Paulo, ela se estabilizou. E a gente conseguiu dedicar mais tempo a ela, para recuperação dessa situação. Então uniu o útil ao agradável . Gostava do surf, olha que beleza. Minha filha teve esse problema, que realmente é um problema grave, mas pensamos em suavizar essa história. Uma cidade mais tranquila, uma coisa mais tranquila, ela já estava estabilizada, a decisão foi mudar para Ubatuba. Eu já tinha uma pequena casa aqui. Então foi essa a situação. E ela foi um caso de sucesso.
Passado todos esses anos, o arranhado aqui se encontra numa situação que contrai um câncer muito complicado. É um câncer de pâncreas, que de 1 a 3% sobrevive, isso é estatístico, não estatístico no Brasil, mas estatístico no mundo. Eu consegui me safar dessa. É uma cirurgia complexa, grande, pesada. Eu começo a me ver mais deficiente com a questão do câncer do que com a questão da amputação. Não pela cronologia da história do sofrimento, mas pelos efeitos. Um cadeirante tem muitos problemas, como infecção urinária, outros têm outras feridas, etc. Eles estão com isso, convivem com isso. Convive com essa história, em tratamento. Então, o que acontece? Essa correlação não existe com a minha filha com o câncer, com as doenças. Mas o que me trouxe para Ubatuba foi essa tranquilidade, de poder estar mais em um aconchego. Ubatuba é muito natureza, ainda que tenha seus problemas, ainda preserva essa situação. Então foi essa decisão de vir para cá e até onde estou hoje, nisto. Vou para Ubatuba, volto para São Paulo. E aí isso me veio uma história, porque como surfista eu tive apoio numa época, de empresas, eu estava dando essas palestras, puseram na minha cabeça pra eu correr um circuito mundial, que haveria condições disso, e aí o câncer tinha sumido e ele retornou
Ele retornou de uma forma um pouco mais agressiva.
Mas... Viralata é mais difícil de morrer do que quem tem pedigree. Então eu sou Viralata, e Viralata é mais resistente. Acho que eu vou estar nessa linha do Viralata e vou tentar agarrar com unhas e dentes essa história de um percentual possa vir e aumentar, que é uma perspectiva. E aí tem uma associação de surf há mais de 30 e poucos anos em Ubatuba, e estavam passando por dificuldades nisso. Foi minha muleta pra eu ter essa guinada de não ter ido surfar para o mundial, e sim trabalhar com uma causa, que é do portador de deficiência física, tanto na questão profissional, ele se tornar um atleta, que já é um terceiro setor, como um terceiro setor de inclusão. Ambos são inclusivos, só que um tem um braço para a questão da integração, vou dar um exemplo, o espectro autista, de nível alto, que ele pode ter contato com o mar, isso já foi feito com um amigo nosso, que é o Juan , muito bem feito na ocasião, e que está meio adormecido por algumas questões e ele tomou outros rumos também interessantes, mas pretendo retomar o que ele fez, uma parte do que ele fez nessa questão, e uma questão inédita, inédito não, inédito em Ubatuba, mais inovadora de profissionalizar, e que já está acontecendo no circuito municipal. E fortalecer essa história do deficiente, que eu voltei nela de novo. Queira pelo que eu já conhecia, queira pela minha filha, que passou por isso, queira por mim, que estou passando por essa questão do câncer, que realmente arrasta a família, arrasta amigos, porque é uma doença que arrasta para as pessoas, como a própria deficiência. As pessoas que estão ao seu entorno são afetadas também. Então esse cuidado tem que ser recíproco e tem que ser ponderado.
P1 - João, fala um pouco como está sendo sua vida, sua rotina hoje. São 18 anos de Ubatuba, você tem um comércio de grande relevância aqui na cidade. Atualiza para gente.
R - Então vamos. É setembro, certo? De 2023, certo? Então, para colocar no dia de hoje, é o seguinte. Hoje eu estou em tratamento, estou motivado por esta situação, que havia falado, de inclusão social com o deficiente. E então o que acontece? A ideia disso é realmente fomentar o esporte, linkar com alguns públicos daqui. A gente está num projeto de escrever um livro sobre a história passada que eu contei lá atrás. Queremos que este livro seja revertido para a causa do portador de deficiência física, integralmente. Então, minha vida é isso. Como falei, em torno do deficiente, mas tenho o outro lado, que eu fico ausente, um pouco inativo, porque a quimioterapia é muito pesada, e me deixa improdutivo por pelo menos 5 dias. Não vou contar muito a história triste disso, porque acho que é um sofrimento que não é meu, é de todos que fazem quimio. Alguns são mais pesados, outros são mais leves. Então se eu contar a parte do sofrimento, essa parte não fica restrita aos mais próximos, porque é meio chato. Mas ao mesmo tempo, quando eu retorno, eu me sinto produtivo porque eu sou ativo.
Então, nessa questão, me machuca um pouco, tirando as questões psicológicas, eu tenho que ir encaixando e virando botões a cada momento. A vivência no hospital me deu essa coisa, você tem que girar botões, tem que ter um comando de botões que você coloca imaginariamente na sua cabeça. E pode ser virado em uma hora, em um dia, em quatro dias, depende das circunstâncias em que você está. Nunca me imaginei virar um botão em meia hora. A gente vira automaticamente, a gente não pensa, mas em questões mais pesadas, mais fortes. Você pode até pensar no âmbito familiar. Mas aquele botão que você vira e fala, poxa, foi assertivo, e ele foi importante estar acionado naquele momento. Então administrar esses, o que eu chamo de botões, porque eles tiveram que ser ajustados muito rapidamente, das suas decisões ou decisões do médico, ou decisões conjuntas de risco. Então eu acho que isso é a minha vida hoje, nesse sentido. Virar esses botões de forma positiva, certo? Existem também os negativos, mas você encontra brechas e caminhos que te levam a uma qualidade de vida para quem está com você, ou para você mesmo, e para quem está no entorno. Porque se eu só levar sofrimento não adianta. Contei uma história, mas não é por isso que não estou feliz. Aliás eu sou o mais sortudo que existe, porque você contrai muita coisa, e aí vem o negócio da alma vira lata mesmo e vai sobrevivendo. E sua cabeça vai trabalhando essa história do melhor que você tem nesse espaço de tempo que todo mundo tem, o meu é um pouquinho mais grave, mas o outro também é, nesse momento estou realizando essa entrevista com muito prazer e vou realizar outras coisas com muito prazer e dedicação que é o que eu curto fazer, sabe?
P1 - Bacana João, muito obrigada, sua história é de superação evidente e vamos para mais.
R - É isso, muito obrigado, agradeço o convite. Espero que a minha história, assim como a de outras pessoas, não tenha peso de histórias, mas de histórias. Cada um escolherá a história que mais lhe cabe. Então eu acho que é isso que é legal. Parabéns pelo projeto. Achei muito interessante porque assisti uma peça que diz que todas as histórias do mundo foram contadas. E de fato, eles eram. As histórias, não existem histórias novas no sentido da história, historicamente, as guerras e outras coisas são transmitidas, mas a história das pessoas, como este projeto, se renova. É diferente. É diferente. É isso. Obrigado.
Recolher