Projeto Memórias de Serra Pelada
Entrevista de Gabriel Vieira
Entrevistado por Yara Oliveira dos Santos e Daniel Soares
Serra Pelada, 15 de agosto de 2024
Código da entrevista: MSP_HV008
Revisado por Nataniel Torres
P/1 - Qual o seu nome e data de nascimento?
R - Meu nome é Gabriel Vieira Santos, nascido no dia 11 de janeiro de 2006.
P/1 - Te contaram como foi o seu nascimento?
R - Na verdade não, porque imaginou que foi um nascimento bem normal. Então foi só uma criança comum nascendo em Serrra Pelada.
P/1 - Você sabe como escolheram o seu nome?
R - Não teve uma história muito profunda por trás do porque escolheram o meu nome, mas eu gosto bastante do significado dele, que significa “escolhido por Deus”. Então, acho que minha mãe escolheu ele por conta, talvez do significado do que ele carrega, ou eu gosto de imaginar dessa forma.
P/1 - Qual o nome da sua mãe?
R - Minha mãe se chama Gilza Vieira da Silva.
P/1 - Como você se descreveria?
R - Como eu me descreveria? Eu diria que eu sou um rapaz bem alegre até, gosto de imaginar o lado bom das coisas, de ser otimista, eu já fui julgado inúmeras vezes por conta disso. Gosto de aprender bastante, de fazer várias coisas ao mesmo tempo, apesar de que em alguns momentos isso acabe me complicando um pouco, de ter que acertar tanto as coisas ao mesmo tempo, de tentar administrar tudo isso, mas eu gosto bastante de estar sempre aprendendo, de descobrir coisas novas, de fazer novas experiências, conhecer pessoas novas. Eu acho que essa é uma das coisas que me definem bem, eu acho.
P/2 - Qual o nome da sua mãe?
R - Gilza Vieira da Silva.
P/1 - E como você descreveria o jeito dela, estilo?
R - Minha mãe ela é uma pessoa bem reservada, ela não gosta de sair tanto, mas ela é uma pessoa carismática, carinhosa, se preocupa muito com a gente, se preocupa muito comigo. E eu acho que o jeito dela, literalmente descrever a melhor pessoa que já pisou na face da terra, uma pessoa...
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Entrevista de Gabriel Vieira
Entrevistado por Yara Oliveira dos Santos e Daniel Soares
Serra Pelada, 15 de agosto de 2024
Código da entrevista: MSP_HV008
Revisado por Nataniel Torres
P/1 - Qual o seu nome e data de nascimento?
R - Meu nome é Gabriel Vieira Santos, nascido no dia 11 de janeiro de 2006.
P/1 - Te contaram como foi o seu nascimento?
R - Na verdade não, porque imaginou que foi um nascimento bem normal. Então foi só uma criança comum nascendo em Serrra Pelada.
P/1 - Você sabe como escolheram o seu nome?
R - Não teve uma história muito profunda por trás do porque escolheram o meu nome, mas eu gosto bastante do significado dele, que significa “escolhido por Deus”. Então, acho que minha mãe escolheu ele por conta, talvez do significado do que ele carrega, ou eu gosto de imaginar dessa forma.
P/1 - Qual o nome da sua mãe?
R - Minha mãe se chama Gilza Vieira da Silva.
P/1 - Como você se descreveria?
R - Como eu me descreveria? Eu diria que eu sou um rapaz bem alegre até, gosto de imaginar o lado bom das coisas, de ser otimista, eu já fui julgado inúmeras vezes por conta disso. Gosto de aprender bastante, de fazer várias coisas ao mesmo tempo, apesar de que em alguns momentos isso acabe me complicando um pouco, de ter que acertar tanto as coisas ao mesmo tempo, de tentar administrar tudo isso, mas eu gosto bastante de estar sempre aprendendo, de descobrir coisas novas, de fazer novas experiências, conhecer pessoas novas. Eu acho que essa é uma das coisas que me definem bem, eu acho.
P/2 - Qual o nome da sua mãe?
R - Gilza Vieira da Silva.
P/1 - E como você descreveria o jeito dela, estilo?
R - Minha mãe ela é uma pessoa bem reservada, ela não gosta de sair tanto, mas ela é uma pessoa carismática, carinhosa, se preocupa muito com a gente, se preocupa muito comigo. E eu acho que o jeito dela, literalmente descrever a melhor pessoa que já pisou na face da terra, uma pessoa amorosa, carinhosa, que cuida da gente, se preocupa. Então, acho que essa é a melhor descrição possível pra ela.
P/2 - E o seu pai?
R - Meu pai se chama Antônia de Carvalho Santos, e ele é bem gentil, ele é bem calmo, em algumas situações. Mas como pai dele também tem que ser rígido às vezes, puxar as rédeas. Então, ele é alguém que sabe se controlar muito bem, sabe tomar controle da situação. Eu admiro ele bastante por conta disso, de ser esse exemplo de controle, de calmaria, de saber dialogar. Eu aprendi, acho, que a conversar com pessoas por conta do meu pai.
P/2 - E você sabe como eles se conheceram?
R - Nossa senhora! A minha mãe, ela é de Ananás, no Tocantins. Meu pai é de Fortaleza, Ceará. Então, até os dois se encontrarem aqui em Serra Pelada, no Pará, é uma situação… Porque o meu pai lá de Fortaleza, minha mãe de Ananás, minha mãe já passou por várias coisas, várias coisas, morou em várias cidades próximas daqui, até chegar aqui. E meu pai, por conta do meu vô, ele também ter sido ligado ao garimpo de certa forma, meu pai veio com ele depois de um tempo, e aí aqui subitamente os dois se encontraram, e decidiram formar uma família. E é muito louco pensar que eles saíram de lugares completamente diferentes, talvez até opostos, e conseguiram se encontrar justo aqui. Então, isso é maravilhoso.
P/1 - Qual o nome do seu pai?
R - O nome do meu pai é Antônio de Carvalho Santos, mais conhecido como Júnior, ou professor Junior.
P/1 - Fale mais sobre a história deles vindo morar aqui em Serra Pelada, como foi?
R - A minha mãe, ela vem de uma família que já passou por algumas situações bem, bem delicadas. Então, eles saíram lá de onde eles moravam à procura de novas oportunidades, e minha mãe, ela trabalhou durante boa parte da vida dela cuidando de casa de outras pessoas, lavando roupa, sendo babá. E eventualmente ela morou em Marabá, fica próximo daqui, e aí ela migrou para cá também, tem até uma irmã dela que também mora aqui. E o meu pai ele acompanhou também o meu avô, ele não trabalhou certamente no garimpo, mas ele veio também um pouco depois da época do auge do garimpo, e ele não veio por um motivo tão específico quanto minha mãe, mas chegou aqui também a procura de novas oportunidades, como a maioria das outras pessoas. E aí, se encontram aqui e decidiram se unir de certa forma.
P/2 - E os seus avós, você conhece eles?
R - Eu conheço apenas as minhas avós, não conheci os meus avôs, que é o Seu Raimundo e o Seu Antônio. O Seu Raimundo é o avô materno, Seu Antônio avô paterno, eu não tive a oportunidade de conhecê-los, eles morreram quando o meu irmão mais velho, ele era bem novinho, então eu acho que eles morreram eu não tinha nem nascido. Mas os meus pais eles contam muitas histórias deles, de momentos em que eles até ficavam… Meu pai ele conta de quando eles ficavam sentados assim na frente de casa, e o meu avô, ele pegava uma caixinha de fósforo, e ele ficava tocando um ritmozinho de pagode, e ficava um monte de gente lá cantando, era uma alegria danada. E minhas avós, eu conheço elas, Dona Sebastiana e Dona Francisca. Dona Sebastião é minha avó materna, Dona Francisca minha avó paterna. Conheço elas, são pessoas maravilhosas, já estão já no auge da idade, e eu ainda pretendo passar um bom tempinho ainda do ladinho delas, enchendo a paciência delas.
P/2 - E os seus irmãos?
R - Meus irmãos? Eu tenho dois irmãos, que é o meu irmão mais novo, que é o Guilherme, que tem 16 anos, e o meu irmão mais velho, que é o Marcos, que tem 19 anos, vai fazer 20 anos agora em novembro. Eles dois são meus companheiros, meus melhores amigos, para vida toda. A gente já passou por muita coisa juntos, já aprontou coisa pra caramba. Então, eles dois são meus confidentes, eu acho, são os caras que eu consigo contar absolutamente tudo, pra conseguir fazer tudo. Apesar dos conflitos que todos irmãos sempre passam, mas eles são os meus melhores amigos, que eu sei que eu posso contar com tudo para eles.
P/1 - Tem alguma brincadeira que vocês gostavam de brincar no tempo da infância?
R - Nossa, a gente sempre brincou de muita coisa, muita coisa. Como a gente não tinha acesso ao celular, e nem muitos brinquedos, a gente tinha que se virar com o que tinha, e a gente gostava muito de brincar em quintal, e aí a gente morava numa casa que ficava tipo no fundo do… quase no fundo do quintal da minha tia, e o fundo do quintal da minha tia era muito grande, muito, muito grande, várias pés de árvores, vários pé de manga, pé de jaca. Aí, a nossa infância todinha foi basicamente brincando naquele quintal, a gente saía correndo, subindo em árvore, pulando, se machucando, eventualmente, que sempre acontecia, mas é maravilhoso, acho que a maioria das brincadeiras era sempre em quintal, correndo, arrancando tampão do dedo, jogando bola, era maravilhoso.
P/1 - Me conta mais sobre o seu pai?
R - O meu pai, ele é um cara que eu admiro muito, além do fato dele ser meu pai, que já é algo que eu o admiro por conta disso. Mas ele é uma pessoa em si, uma pessoa muito boa. O meu pai, quando eu o conheci, desde quando eu era pequeno, o meu pai passava por uma fase muito complicada, porque ele bebia bastante, o meu pai bebia muito, e eu já presenciei diversas cenas que ele chegava em casa tarde, e eu e meus irmãos, minha mãe, a gente ficava preocupados. Eu e meus irmãos, a gente ficava preocupados mais por conta da minha mãe. E em 2014, meu pai, ele largou a bebida, definitivamente, e ele virou uma pessoa completamente nova. O meu pai, ele também já foi professor, já deu aula de geografia, matemática. Quase todos os lugares que a gente passa, o pessoal fala: “Olha, o professor Junior. Tu é filho do professor Júnior, não é?” “Eu sou, sou filho do professor Junior”. Esse certo reconhecimento que o meu pai tem por uma profissão tão legal, que é o que eu também tenho vontade de fazer, de algum dia fazer pedagogia para ser professor, eu tenho uma grande vontade de fazer isso um dia. Eu admiro meu pai por conta disso, e hoje em dia eu vejo ele mais como um exemplo, sabe? Como alguém que me moldou, que moldou o meu caráter, moldou também o caráter dos meus irmãos. E eu consigo contar com ele para tudo, eu consigo ter um tipo de conversa tão fraca com meu pai, que eu acho que eu não teria com nenhum um outro tipo de pessoa, porque a maioria das pessoas ela tem um certo medo, assim, de ter um diálogo com o próprio pai, por medo de julgamento, alguma coisa do tipo, mas com o meu pai acho que não é assim. Há dois dias atrás eu tive que ter uma conversa com ele, me chamou para conversar, e eu achei que eu ia tomar nosso sermão, Nossa Senhora, que eu ia ser escorraçado, pai amado! Mas foi um diálogo tão simples. Apesar de que, óbvio, conversa com pai você sempre leva. Mas quando eu converso com ele é um diálogo tão simples, que as coisas fluem de uma maneira tão fácil. E que eu e ele, a gente tem uma ligação diferente que ele não tem com os meus outros irmãos. Que o pessoal também fala que eu sou a cara do meu pai, que eu sou igualzinho meu pai, Nossa Senhora, cagado e cuspido meu pai. E aí, eu acho que por conta disso, de eu saber que as pessoas já enxergam meu pai em mim, eu acho que eu consigo ter uma ligação muito melhor com o meu pai por conta disso.
P/1 - Você lembra da casa onde era pequena, como era?
R - A casa onde a gente morava, era uma casinha de madeira, bem pequena, tinha só três cômodos, tinha a sala, aí a cozinha e os quartos, o quarto, no caso, que todo mundo dormia junto. A sala não tinha muita coisa, eu me lembro que a gente tinha uma televisãozinha de tubo, que era maravilhosa, meu Deus do céu, era diversão da galera. E aí, a cozinha, ela era de chão batido, e o teto era de palha e lona, a gente tinha um banheiro que ficava bem no fundo da casa, e os quartos tinham só uma cama de casal, ficava a minha mãe e meu pai, e aí tinha as três caminhas de solteiro, que era minha e dos meus irmãos, e aí as camas de solteira a gente deixava elas separadas, ou a gente também fazia beliche, e quando a gente montava a beliche, Nossa Senhora, era uma alegria tremenda, porque era uma briga para ver quem ia ficar na parte de baixo, quem ia ficar na parte de cima. Geralmente eu sempre gostei de ficar na parte de baixo, porque eu só colocava um lençolzinho assim pendurado assim do lado, e eu falava que era o meu forte, era minha casinha, ninguém entra, aqui é a base do Gabriel, ninguém entra. E aí, a casinha era muito pequena, e na frente tinha várias plantas, flores, porque a minha mãe sempre gostou muito de flor, sempre gostei muito de planta. E aí, na frente tinham várias, várias, plantinhas, tinha uma graminha que eu e os meus irmãos, direto, a gente ficava brincando ali, a gente ficava rolando naquele chão, a gente ficava sujo, um monte de inseto grudava na gente, era óbvio. Mas a casinha era pequena, e Nossa Senhora, acho que foi o melhor ambiente possível pra que eu pudesse ter vivido os primeiros momentos da minha vida.
P/2 - A sua relação com a sua mãe é estável, é boa?
R - Eu tenho uma boa relação com minha mãe, sim, definitivamente. De vez em quando eu preocupa ela, em alguns momentos, mas a minha mãe ela é muito carinhosa, ela é compreensiva, ela tenta entender meu lado na maioria das situações, tem situações que eu sei que eu tô errado e ela não esfrega isso na minha cara, não fala: “Tu tá errado por isso, por isso, por isso, por isso, por isso” Ela senta, ela tenta entender, tenta ver o que está acontecendo, porque minha mãe ela é muito chorona, muito chorona, muito chorona, ela chora muito fácil, e quando a gente tenta ter alguma conversa com ela, pelo mínimo que for, ela já começa a chorar. Mas a minha relação com ela é maravilhosa, eu amo muito, muito, muito minha mãe, ela sempre me apoiei em absolutamente tudo, tanto ela como meu pai, eles sempre me apoiaram tudo que eu fiz na minha vida, tudo que eu ainda pretendo fazer, eles me apoiam, falam que eu tenho que correr atrás dos meus sonhos, tentar fazer as coisas que eu quero fazer, da forma como eu quero fazer. Então, a minha relação com a minha mãe é maravilhosa. É uma pessoa que eu também admiro de um jeito imensurável.
P/2 - Você foi nascido e criado aqui em Serra Pelada?
R - Isso! Nasci aqui em Serra Pelada, na Santa Casa de Misericórdia, e fui criado aqui durante toda a minha vida, nunca fui embora. Por enquanto ainda não pretende ir para outro lugar. Mas nasci e eu fui criado aqui mesmo em Serra Pelada.
P/3 - Como foi ser criado, nascer, viver aqui em Serra Pelada, dentro nesse cenário de ser o maior garimpo a céu aberto que envolve a história de Serra Pelada. Como foi ser uma criança aqui na comunidade de Serra Pelada?
R - Quando eu tive noção do que Serra Pelada significava, não só para os moradores daqui, mas também para as outras pessoas do Brasil e do mundo, foi um certo choque de realidade, porque como criança eu não tinha uma noção de tudo isso, do quão importante Serra Pelada foi em algum momento. Então, como criança eu não tinha uma certa noção, porque para mim é só um lugarzinho normal, que eu tenho os meus amiguinhos, tenho os meus colegas, então tá aqui, é Serra Pelada. Mas quando eu amadureci um pouco, eu percebi que eu vivi, talvez em um dos lugares mais ricos do mundo, e é um certo fardo, eu acho, saber um pouco desse dessa história, saber de fato dessa história. Não fardo por ter que imaginar uma situação em que eu vá ter que carregar isso pelo resto da minha vida, ter que lidar com isso pelo resto da minha vida, não. Mas um fardo de eu saber que talvez eu queira buscar uma mudança para minha comunidade, que ela seja vista de outra forma, mas que a maioria das pessoas já está com a mesma visão impregnada de o que é Serra Pelada, de que Serra Pelada foi só o maior garimpo a céu aberto do mundo, e que se limitou a isso. Então, acho que ainda… hoje em dia ainda tem uma certa dificuldade para tentar mudar um pouco dessa visão. Mas crescer em Serra Pelado foi maravilhoso, um lugar calmo, pacato, todo mundo se conhece. Então, ter crescido aqui foi simplesmente maravilhoso.
P/1 - Tem alguma comida da infância que te marcou?
R - Comida da infância? Nossa Senhora, acho que somente as coisas que a minha mãe fazia. Minha mãe nunca fez nada tão mirabolante, nem tão anormal, mas nossa, o arroz e feijão da minha mãe, o baião de dois da minha mãe, Nossa Senhora, acho que é a coisa mais maravilhosa, Jesus amado. Dá até um quentinho no coração toda vez que eu penso. A comida da minha mãe eu acho que é a coisa que mais me marcou. É a comida da minha mãe.
P/1 - O que você mais gostava de fazer quando era criança?
R - Quando eu era criança, eu e meus irmãos, a gente gostava muito de aprontar. Quando a gente estava em casa, a gente gostava muito de… como a minha tia sempre morou perto de onde a gente morava, a gente gostava de ir na casa da minha tia, ficar pulando a janela da casa dela, sem ela saber, obviamente. Tomara que ela ainda não saiba, que seja só nosso segredo. A gente ficava pulando a janela da casa dela, ficava correndo lá dentro, e acho que a maioria das coisas que a gente sempre fazia, envolvia correr em algum lugar, e provavelmente colocar a nossa vida em risco. Era a nossa maior diversão. E eu acho que a maioria das brincadeiras que eu fazia com meus irmãos, era exatamente isso. E na escola já era um pouco diferente, porque como era um garotinho tão… Era o quietinho, o menorzinho da turma, eu evitava ficar brincando tanto, porque eu estudei com o meu irmão mais velho, e eu era agarrado nele, 24 horas. E quando eu fiquei um pouquinho mais enjoado, lá para o terceiro, quarto ano, aí as brincadeiras já começaram a mudar.
P/1 - O que te motivou na escola, que te marcou?
R - Que me marcou? Bastantes pontos relacionados à escola me marcaram, porque começou… na creche eu fui avançado dois anos. Então, acho que não era nem para eu ter terminado o ensino médio ainda. E aí, eu comecei o primeiro ano do ensino fundamental junto com meu irmão mais velho, o Marcos, que ele é dois anos mais velho do que eu, e o primeiro ano do ensino fundamental eu comecei com ele. E eu me lembro vagamente ainda o primeiro dia de aula que eu comecei no primeiro ano do fundamental, porque o Marcos já estava acostumado já com a turma já, o pessoal era companheiro desde o primeiro dia que ele pisou na escola, eu nem me lembro do pessoal que eu estudei junto na creche, o meu Deus! Deus me perdoe! Aí, eu me lembro de quando eu cheguei, pisei na sala, professora: “Agora o coleguinha novo de vocês, que é o Gabriel.” Eu era minúsculo, meu Deus do céu, parecia uma pulga, eu era… eu acho que eu só tinha só a cabeça do tamanho de uma melancia, mas era pequenininho. E aí, cheguei lá, vi um monte de rostos diferentes, de pessoas que eu nunca vi na minha vida, um monte de criancinha minúscula que estava me olhando assim. “Quem que é esse aí?” “Ah, é o irmão do Marcos, filho do Professor Júnior” “Ah, irmão do Marcos, ah legal!” Eu cheguei lá todo quietinho, eu mal me mexia, eu ficava parado, estático, estático, eu não me mexia. E aí, depois de um tempo eu fui me dando melhor com o pessoal, que hoje em dia são os meus melhores da vida toda, boa parte da turma. E na escola eu sempre fui um garotinho que além de quieto, eu era dedicado. Pessoal falava: “Gabriel é o mais inteligente da turma” Não, eu era dedicado, é diferente. Porque todo mundo é inteligente da mesma forma, só que alguns não se dedicam, e nem tem esforço do mesmo nível que outros. E eu e o meu irmão, a gente sempre foi muito esforçado e muito dedicados para tentar fazer a maioria das coisas com mais condicelencia possível, então acho que eu carrego isso até hoje, de tentar fazer essas coisas com excelência, principalmente por conta da escola, porque ano passava, ano passava, ano passava, e aí o pessoal falava. “Caramba, o filho do Professor Junior, puta menino inteligente e tal, não sei o que, não sei o que…” Eu lembro até hoje de uma fala do professor de matemática, meu professor Jacó, eu não lembro em que série eu estava, eu era bem, bem pequeno, e aí ele falou em alguma situação, acho que foi depois de uma prova, eu não me lembro, que ele tinha entregado nota, alguma coisa do tipo. E aí, ele falou para mim e para o meu irmão: “Marcos e Gabriel, cara, o meu sonho, cara, é que eu tivesse filhos iguais a vocês, cara! Que tivesse uns filhos que fossem assim, inteligentes, consegue falar bem, é carismático, que não dá muito problema, queria ter filhos iguais a vocês”. Eu: “Caramba!” Isso é um certo fardo, ter que carregar isso de certa forma, ser reconhecido por conta disso. E na escola além das brincadeiras que eu fazia com o pessoal, porque aqui na Escola Rita Lima, essa belíssima estrutura que nós temos hoje em dia, antes era uma escolinha com as salinhas de madeira, e uma grande quadra de areia, Nossa Senhora, essa quadra de areia era a melhor coisa que inventaram na face da terra, que era uma areia fofinha, então na hora do recreio, saia criança, que eu não sei de onde surgiu tanta criança para aparecer naquela quadra de areia. Porque aí, ou a gente jogava bola, fazia dois timezinhos ali. Como tinha muita criança e as crianças eram pequenas, dava pelo menos umas cinquenta crianças de cada lado ali, suave, e o jogo não dava em nada, era uma decepção de olhar, mas era divertido. Ou a gente fazia a fatídica brincadeira, de os meninos ficavam atazanando a paciência das meninas, e as meninas corriam atrás dos meninos para tentar agredir eles. E essa era uma coisa maravilhosa, acho que era uma das melhores brincadeira que a gente sempre fazia. Mas como eu era pequenininho, eu era o café com leite, geralmente ou eu ficava do ladinho, ou eu tentava correr mais que todo mundo. “Eu não sou café com leite, vocês vão ver”. Corria, corria. Mas acho que a maioria das coisas que me marcaram foi as brincadeiras que eu fazia com o pessoal, e também a admiração que eu tenho pelos professores, da mesma forma como eles tinham essa certa admiração por mim e pelo meu irmão. Acho que são as coisas que eu mais carrego desse tempo da escola.
P/1 - Você quando era pequeno, você já tinha um sonho de quando crescer já ser… uma profissão?
R - Quando eu era criança, lá para os meus 7, 8 anos, eu recebia bastante o questionamento: “Gabriel, quando tu crescer, quanto tu tiver no ensino médio, quando terminar o ensino médio, o que tu quer ser?” E eu ficava assustado, porque eu nunca soube o que responder. Eu via todo mundo da minha turma. “Não, eu quero ser astronauta, eu quero ser jogador de bola, eu quero escrever livro, eu quero ser advogado, quero ser direto, não sei o que, não sei o que…” E eu nunca soube, nunca soube. Eu ficava, então tá Gabriel, tá na hora já de decidir alguma coisa, malandrão. E eu não sabia. Eu era uma criança até, mas eu ficava olhando para o pessoal da minha turma, todo mundo já sabia. E eu não sabia, eu não fazia ideia. Mas depois de um tempo eu fui crescendo, e eu acho que quando eu tava um pouquinho maior, lá para os meus, acho que 10, 11 anos, 12 anos, eu tinha uma grande vontade de ser professor. Tinha vontade de ser professor. Porque filho de professor Júnior, eu também tenho vontade de ser professor. E também boa parte da família do meu pai também são de pedagogos, tem uma tia que também é pedagoga. Acho que um dos primeiros sonhos assim, relacionados a algo profissional, alguma faculdade que eu queria fazer, acho que foi o sonho de ser professor um dia, de dar aula, de lidar com crianças, ou adolescentes, porque na sala de aula eu era quase o professorzinho da turma, eu era o menorzinho, mas também, o pessoal: “Ah Gabriel, me ajuda em tal coisa?” Eu ia lá ajudava e tal. Eu gostava de ensinar, eu gosto de ensinar, eu gosto muito. Então, acho que ser professor foi um dos meus primeiros sonhos assim.
P/2 - E na escola, você sempre estudou no Rita Lima?
R - Sempre, o meu fundamental todo, desde o primeiro até o oitavo ano, porque o Rita Lima ainda não tinha suporte para ter o nono ano aqui. Sempre foi Rita Lima, é a escola que eu carrego de paixão, desde a antiga estrutura, que apesar de que a gente não tinha estrutura para tanta coisa, mas Nossa Senhora, os melhores momentos da minha vida foram nessa escola, nessa escola. Eu me lembro que onde ficava o portão, bem aqui na parte de baixo, tinha uma cabaninha que ficava o vigia, e tinha um pé de jambo enorme. E aí, quando ainda o portão não abria, aí os meninos ficavam ali perto, ficava ali do outro lado da cerca, e o vigia, ele ficava ali conversando com a gente. E aí, geralmente ele ficava fazendo charadas, de o que é o que é. “O que é o que é não sei o que, não sei o que… De que lado que fica uma xícara? De que lado fica a asa da xícara?” Aí, a gente ficava. “Ué, de que lado que fica? Aí, a gente, não, é do esquerdo. Não, é do direito”. Ele falava: “Não, é do lado de fora.” Nossa, que cômico, muito obrigado! Parabéns! Mas o meu fundamento todo foi Rita Lima, e o nono ano eu fiz no Rangel Bezerra, onde eu terminei de conhecer a maioria da minha gangue, que eu tenho hoje em dia, a maioria dos meus melhores amigos, que eu carrego para a vida toda, três deles eu consigo citar aqui, que é o Reginaldo, o Emerson, que foi embora, tá morando agora em Santa Catarina, o pilantra, me abandonou, e o Pedro, filho do Fogoió, da Dona Baixinha, que tá morando agora em Curionópolis. Esses três são os meus meus irmãos, não de sangue, mas meus irmãos que eu também posso contar com eles para tudo. E todo mundo da minha turma, desde o Rita Lima, acho que eu considero parte da minha família, que são minha família.
P/1 - Você tinha uma matéria de preferência?
R - Eu era o esquisitinho da turma, que a minha matéria favorita sempre foi matemática. Eu sempre gostei de matemática no fundamental. Eu odiava matemática, mas eu adorava. Eu odiava porque eu olhava para o quadro, eu via aquele tanto de quadro, de números, de letras. “Caramba, que bagulho complicado. Eu vou aprender só de raiva, eu vou aprender”. E acabou que eu me apaixonei por matemática. E no ensino médio, eu sigo mais ou menos esse rumo, porque minha matéria favorita virou química, eu adorava química, eu era o único da sala que gostava de química. Todo mundo falava: “Gabriel, tu é maluco, tu é esquisisto!” “Por que?” “Porque tu gosta de química.” Ninguém entendia nada. Eu adorava, eu gostava muito, muito… Meu Deus do céu, trabalha com química orgânica, cadeias carbônicas. Adorava, adorava! Era maravilhoso.
P/2 - Como você era bom nessas matérias? Você participava de algum evento? Gincanas? Campeonatos?
R - Hanrã! Sim, sim! Na escola, como o pessoal falava que eu era o nerdzinho… Eu tinha dois apelidos muito característicos, que era o nerd da turma, e pequeno homem, ou tampinha. Não, grande homem, ou tampinha. Porque eu era o mais inteligente, e o menorzinho, sempre fui o menor da turma. Acho que só lá no segundo ano do ensino médio que eu fui dar uma espichada muito grande. E aí, eu era um menorzinho, e toda vez quando a gente fazia algum tipo de torneio, sei lá, de torta na cara, na sala de aula, ou perguntas e respostas, o pessoal ia puxar o grupo. “Não, o Gabriel vai pro meu grupo” “Não, eu já puxei ele.” “Não, o Gabriel vem. Gabriel venha!” Aí, como eu era o menorzinho, eu só ia, assim, arrastadinho para o lado. E eu lembro até hoje de uma gincana que teve aqui em Serra Pelada que foi muito legal, muito, muito, muito legal, que foi na Praça da Juventude, as três escolas lá, Rangel Bezerra, Rita Lima e Maria Belarmina. E aí, selecionaram os alunos para ir responder as perguntas, quem terminasse de responder primeiro ia ganhar um brinde lá, eu nem lembro direito o que aconteceu. E aí, quando eu estava selecionando. “Não, o Gabriel vai!” Aí, eu: “Não, gente, mas eu não quero, não tô muito afim” “Não, tu vai!” Não tive muito escolha. “Eu vou!” E essa gincana foi maravilhosa, fizeram uma pergunta de um conteúdo que a gente nunca nem tinha visto, era alguma coisa relacionada a adesão do Pará… O que é coincidência tremenda, já que hoje a adesão do Pará, Nossa Senhora! Isso é cinema meus amigos. Mas acho que foi alguma coisa relacionada a independência do Pará, alguma coisa do tipo. E fizeram essa pergunta pra mim, eu não fazia a mínima ideia, a mínima ideia. E aí, eu me lembro que o pessoal assim, na arquibancada, até o professor Cláudio, de Educação Física, ele tava lá. E aí, ele falou pra minha mãe. “Eu acho que o Gabriel não vai errar não. Gabriel não erra não!” E eu não fazia a mínima ideia, eu estava lá me tremendo. Aí, eu me lembro que eu escolhi a alternativa C. Eu não me lembro o que tinha na alternativa C, mas eu me lembro que eu escolhi essa alternativa. A alternativa estava certa, e eu fui correndo lá para os braços da galera. Mentira, eu fui andando, tava todo com vergonha. Porque eu sempre tive muita vergonha na escola, se eu tivesse ali fora do meu grupinho, eu ficava com muito vergonha, muita, muita, muita vergonha, só de uns anos para cá que eu fui conversar mais normalmente.
P/2 - Você tinha algum professor favorito?
R - Nossa Senhora! Eu acho que durante diferentes fases da minha vida eu fui tendo vários professores favoritos. Começou com a minha primeira professora, Professora Cássia, que eu adorava ela, Nossa Senhora. Acho que foi uma das primeira professoras que eu me lembro assim, de realmente gostar muito, muito, muito dela. Tive vários professores que eu adorei. Deixa eu ver. Professora Selma, que eu adorava ela. Professor Jacó, Professor Wendel, que foram meus professores de matemática. Professor Wendel, tenho um carinho muito grande por ele, porque o primeiro celular que eu ganhei na minha vida, foi ele que me entregou, porque ele tinha feito um… ele tinha falado um incentivo para os alunos. Falou: “Durante esse ano letivo, o aluno que tiver a melhor média, foi o aluno nota 10” O projeto era esse: Aluno nota 10. O aluno que fosse nota 10. “Eu vou entregar um celular.” Aí, eu: “É nada professor?!” Ele: “É, eu vou entregar um celular.” Aí, durante esse ano letivo, aí ele falou que eu tinha sido o aluno que teve o melhor desempenho. E o meu primeiro celular, meu próprio celular, foi meu professor de matemática que me deu, meu professor Wendel. Eu tenho um carinho enorme por ele, por conta disso. Mas também, deixa eu ver, tem a professora Aika. Jesus do céu, se eu esquecer algum professor aqui eu vou ser crucificado. Teve a professora Nuria, eu adorava a professora Nuria. Professora Graça, a Professora Marleuda, Professor Henrique, Professor Cláudio de educação física, meu Deus do céu, acho que todos os meus professores são meus professores preferidos. Agora que eu tô parando para pensar nisso, que todos foram meus favoritos. Além de aprender a matéria em si com eles, eles me ensinaram muita coisa que eu consigo carregar para vida toda, então acho que todos eles são meus favoritos.
P/1 - Como você ia pra escola?
R - Deixa eu ver. Como a minha casa, ela ficava perto aqui da escola Rita Lima, acho que fica só uns, deixa eu ver, uns 500 metros, eu acho, por aí, acho que até menos. Aí, eu vinha a pé com os meus irmãos, porque como eu estudava junto com o meu irmão mais velho, a gente vinha juntos. Aí, teve um tempo, que quando o meu irmão começou, meu irmão mais novo, também começou a estudar aqui, a gente também vinha os três juntos mesmo. E eu sempre vinha a pé. Quando eu comecei a estudar no Ângela Bezerra também foi da mesma forma, mas como era um pouco mais longe, eu e meu irmão, a gente tinha que sair um pouco mais cedo e tal, pra ir até lá, chegar. Quando a gente estava no ensino médio também foi da mesma forma, porque a nossa casa não era tão longe, algumas pessoas consideram que é longe, tem um amigo meu, o Reginaldo, que quando ele vai lá em casa, ele fala: “Pô meu, tu mora num fim de mundo! Mora na última casa de Serra Pelada” Ele exagera de uma maneira tremenda. Mas acho que pra mim e para os meus irmãos, como a gente está sempre acostumados a caminhar, fazer esse tipo de trajeto, a gente sempre foi a pé mesmo para a escola, e era o melhor trajeto da vida toda.
P/2 - E com quantos anos você começou a sair sozinho? Com seus amigos, para ir para festa, se divertir?
R - Cara, se eu te contar que eu tô começando a fazer isso acho que de um ano pra cá, que eu tô… Porque isso gera um… Tem background por trás disso. Porque como eu era o garotinho que era pequeno, quietinho e tal, que não podia fazer tanta coisa. Aí, acabou que eu era muito regrado, que eu recebia uma certa pressão até, e eu acabava me inibindo de muita coisa. No nono ano, eu acho que foi quando eu comecei a sair mais com os meus amigos, que eu tirava realmente um tempo para sair, para brincar, e aí depois de um tempo eu simplesmente parei com isso de novo, porque eu senti um pouco que eu estava fugindo do meu foco. Mas acho que de um ano para cá eu percebi que o meu foco é ser eu mesmo, é lidar com as coisas da forma que eu consigo lidar, da forma como eu estou pronto para lidar. Então, eu acho que quando eu completei os meus 17 anos, foi quando eu tive essa virada de chave. “É minha vida, é minha vida.” Esse pensamento de adolescente. “É minha vida, é só uma, eu vou curtir.” Sem nenhum tipo de consequência. E tem consequências sim, infelizmente tem, estou aprendendo isso da pior forma possível. Mas acho que realmente, de um ano e alguns meses pra cá que eu tô começando a sair bem mais com meus amigos, indo pra festas, brincando, curtindo. Acho que é por aí. Que durante toda a minha infância, a primeira parte da minha adolescência, eu nunca fiz nada, acho que até perdi parte da minha adolescência por conta disso.
P/3 - E como está sendo a liberação dos seus pais, como eles estão enfrentando essa nova realidade?
R - Recentemente eu tive alguns diálogos com eles, pra tentar entender também o lado deles dessa situação, porque gera uma certa preocupação, obviamente, por parte deles, de querer saber o que eu tô fazendo cem por cento do tempo, de terem um pouco mais de controle da situação, como sempre tiveram. Mas na conversa que eu tive com o meu pai recentemente, que exatamente foi sobre isso o diálogo com o meu pai, ele reforçou que ele confia em mim pra conseguir sair, me divertir e tal. Porque ele entende que eu sou adolescente, tô querendo viver, tô vivendo. Mas ele só falou para dar uma freada, pra me controlar um pouco mais, porque ele fica preocupado, minha mãe fica preocupada, então só pra eu dar uma freada e tal, ir com um pouco mais de calma, pra também não exagerar tanto. Mas eu falo pra ele que eu não tô nem maluco de fazer nenhum tipo de doideira, não ainda. Brincadeira, gente, pelo amor de Deus! Mas eu não estou nem maluco de tentar fazer algo tão surreal, que fuja do meu controle. Mas eu estou tentando também dar uma freada, para seguir o conselho deles, que eles são mais experientes que eu, então eles com certeza sabem bem mais.
P/1 - Como você está pensando em seguir nessa profissão, pedagogia?
R - Agora, como hoje eu tô trabalhando como auxiliar administrativo, eu fico pensando em como que a minha vida pode seguir daqui pra frente, porque como eu nunca tive planos muito concretos para o que eu queria fazer, pro o que eu quero fazer, acaba que a vida só só vai seguindo, a vida vai chegando, as coisas vão vindo, eu só vou aceitando: “O, que legal! Isso está acontecendo? Pô, legal, eu não planejei nada, mas pô, que da hora, viu!” Só vou deixando. “Deixa a vida me levar, vida leva eu!”. Então, agora como eu tô trabalhando na área administrativa, eu fico pensando acho que primeiro seguir a carreira da necessidade, e depois a carreira dos sonhos. Que agora é continuar mais nessa parte administrativa, ver até onde eu consigo chegar pra tentar crescer um pouco mais na minha área. E depois, quando eu tiver um pouco mais estável, tentar focar mais em seguir esse meu sonho de criança, que é ser professor.
P/2 - Gabriel, você falou que está na área de auxiliar, né?
R - Isso!
P/2 - Em qual empresa que você está?
R - Eu estou trabalhando com uma auxiliar administrativo na Empresa Bravo Mineração.
P/2 - Como é que é lá?
R - Lá, o projeto ele ainda é pequeno, tem um efetivo e uma média de 40 pessoas, e a convivência em si lá, é muito tranquila, porque parte das pessoas que trabalham lá, são pessoas que eu conheço. Mas quando eu comecei lá eu estava muito travado, porque eu fui o primeiro menor aprendiz que a empresa contratou, e aí eu tava lá com medo de julgamento, do pessoal me olhar errado, me interpretar errado em alguma coisa que eu fosse falar. Mas depois de um ano dentro da empresa, amadureci bastante, hoje eu brinco com todo mundo, todo mundo brinca comigo. Todo mundo tem uma convivência muito tranquila. E eu tento atender a maioria das demandas que mandam pra mim. Mas trabalhar hoje em dia na Bravo é, acho que foi um bom início para ser o meu primeiro emprego em si. É maravilhoso trabalhar lá.
P/1 - Qual a inspiração na sua vida?
R - Inspiração? Eu tenho algumas inspirações, até em diferentes âmbitos da minha vida. Como pessoas, minha maiores inspirações são os meus pais, minha mãe e meu pai, que são os exemplos que eu quero seguir, eu quero ser… Eu falo para mim mesmo, que algum dia eu quero ser um espelho para os meus filhos, da mesma forma que o meu pai é um espelho pra mim. De alguma forma eu quero puxar os melhores pontos do meu pai, pra eu tentar não ser um ser humano igual ao meu pai, mas ser até um ser humano melhor que ele, de certa forma. E no meio profissional, eu acho que eu nunca tive uma inspiração tão concreta assim, mas eu tenho algumas inspirações no meio artístico, uma dessas inspirações é o Leonardo da Vinci, que é um grande pintor, que era um Severino faz tudo, que ele fazia literalmente qualquer coisa, e eu admiro bastante ele. E outra é Vincent Van Gogh, que pintou A Noite Estrelada, Geração de Van Gogh, que é um artista também que as obras dele chamam bastante minha atenção, é um estilo muito lindo. Eu acho que em geral as minhas inspirações, maiores inspirações. [intervenção]
P/1 - E seu pai? Me fale mais sobre o seu pai? Em que trabalho ele está?
R - Hoje em dia o meu pai ele tá trabalhando no Conselho Tutelar, ele é Conselheiro hoje em dia, que é um cargo que eu admiro bastante, é um trabalho bastante lindo, que eu vejo que é algo bem nobre para se fazer, para cuidar da integridade da vida das nossas crianças e adolescentes. Então, o trabalho dele em si, é um trabalho que eu admiro bastante, que eu não teria coragem para fazer, definitivamente não, porque eu sei a correria que ele passa diariamente, constantemente, que ele sempre está acarretado de muitas tarefas. Mas é algo que eu admiro bastante, eu admiro bastante ele por conta disso, eu acho que também por conta dessa coragem, acho que ele segue sendo uma das minhas maiores inspirações por conta disso.
P/1 - Qual motivo levou os seus pais a morar aqui em Serra Pelada?
R - Eu acho que o principal motivo que levou os meus pais a morarem aqui foi oportunidade. Ir atrás de oportunidade, de melhorar de vida, porque acho que eles devem ter ouvido falar em algum momento sobre Serra Pelada, que era um lugar de fartura, de riqueza, e que lá com certeza eles iam obter uma vida melhor para eles, para os familiares deles, então acho que o ponto comum entre eles, que fez com que eles viessem morar aqui, acho que foi vir atrás de oportunidade, vir atrás de uma vida melhor, de minimamente tentar ter uma vida diferente da que eles já tiveram em algum momento. E tenta desenvolver a si próprios eventualmente. Mas eles não sabiam disso ainda, mas criar a família deles num lugar que fosse longe de tantos perigos. Que Serra Pelada é um lugar calmo até, de vez em quando tem uma coisinha aqui e ali, que é óbvio, mas é um lugar bem calmo, então acho que a oportunidade… Eles irem atrás de uma oportunidade foi a oportunidade perfeita, foi a chance perfeita para eles virem para o lugar perfeito.
P/1 - Em relação a sua infância até hoje, qual a visão que você traz de Serra Pelada em desenvolvimento cultural e profissional?
R - Hoje em dia eu falo que estou acompanhando uma fase muito importante de Serra Pelada porque eu estou vendo que a mudança está acontecendo. E de certa forma eu e o meu grupo, a produtora, no caso, a gente está contribuindo para a mudança, de certa forma, porque eu presenciei uma grande diferença que havia de Serra Pelada, de sei lá, de dez anos atrás, quinze anos atrás pra Serra Pelada que a gente tem hoje. Então, a minha visão, a minha perspectiva de Serra Pelada mudou bastante, eu não carrego mais com tanto pesar a ideia de que eu tenho que levar para sempre a ideia que Serra Pelada é o lugar do garimpo, o lugar que foi marcado… De fato foi marcado por conta disso, mas que não tem obrigação de ser levado, de levar esse nome pelo resto da existência, que pode ser sim lembrada por outras coisas, pode ser lembrado por uma juventude forte, uma juventude criativa, que tem objetivos, que tem foco. E eu me sinto determinado a participar dessa mudança, a contribuir pra que essa mudança aconteça de certa forma. E eu tô vendo isso acontecer, de pouquinho em pouquinho, mas a gente tá vendo isso acontecer.
P/1 - Em algum momento da sua vida você pensou em sair de Serra Pelada para provar coisas novas? E por que?
R - Eu já pensei em sair de Serra Pelada pra ir atrás de outras oportunidades, já! De tentar alcançar novos ares, que aqui eu sei que eu não consigo, porque ainda falta bastante oportunidade ainda para os jovens daqui, que a gente tenta fazer algo diferente, mas que a gente não tem suporte para conseguir fazer isso. Então, já pensei ir embora de Serra Pelada para conseguir estabelecer melhor minhas ideias, colocar… tirar do papel as ideias que eu tenho, de talvez conseguir estabelecer alguma… algo bem mais concreto do que eu tenho hoje em dia, de conseguir idealizar muito melhor as coisas que eu quero. Então, já pensei em ir embora de Serra Pelada, principalmente pra conseguir crescer como pessoa, e como profissional. Mas em contrapartida, com essa minha ideia de ir, o meu plano seguinte é voltar. Voltar pra cá! Porque eu tenho em mente se eu fui embora de Serra Pelada para conseguir mudanças, eu quero trazer essa mudança de volta. Eu quero trazer essa mudança para os jovens que também estão aqui, que talvez tenham a mesma ideia que eu, de ir embora por não ter oportunidade, então de alguma forma quero trazer oportunidade de volta para eles. Então, se isso acontecer eventualmente eu vou estar realizado.
P/2 - E faculdade, você planeja cursar alguma? Você falou de pedagogia, né? Quer ser professor? Tem outra que você tem em mente?
R - Agora eu vou começara a fazer Bacharelado em administração, pra já engatilhar na questão da necessidade mesmo, porque é uma área que eu já tô trabalhando, então fica bem mais tranquilo para mim, pra conseguir administrar tudo melhor, não só o trocadilho de palavras. Meu pai amado! Para conseguir lidar melhor com tudo isso. Mas acho que a faculdade dos sonhos no momento acho que é pedagogia, que eu almejo fazer eventualmente, mas no momento acho que é focar em administração, no momento.
P/1 - Então, no caso de casar, qual religião você deseja casar?
R - Eu tenho um sonho de me casar, em algum dia da minha vida, eu tenho esse sonho, que eu também tenho um sonho muito, muito, muito grande de ser pai, tenho muita vontade de ser pai. Eu me dou bem com criança, então quando eu vejo uma criancinha pequeninha eu falto endoidar, que eu tenho muita vontade de ser pai. E eventualmente eu quero me casar, eu não quero apressar esse processo, quero que seja algo natural. Mas eventualmente eu quero me casar. Como eu sou evangélico, sou cristão. Mas eu ficava também… Ia depender da minha cônjuge, da maneira como ela também se sentiria confortável, porque se fosse pra… “Ah Gabriel, vamos casar num campo aberto aí. Vamos chamar o pessoal para para, sei lá, fazer um churrasco, qualquer coisa…” To brincando gente. Mas não necessariamente casar na igreja, até, mas fazer alguma festa que fosse… Porque o evento em si ia ser memorável pra mim, mas a questão de… acho que é a religião em si não ia ser um impasse tão grande. Mas eu tenho um sonho muito grande de me casa um dia, muito grande.
P/2 - Tem uma pretendente?
R - Infelizmente não tenho uma pretendente, infelizmente. Já tive, mas… Ó meu pai amado! É até triste falar dessas coisas, cara! Mas ainda… ainda, não tenho uma pretendente, mas eu também não tô tão apressada ainda, eu sou novo, tenho só 18 anos e tal, então não quero apressar tanto isso.
P/1 - Na sua filosofia de vida, pretende passar essa história de Serra Pelada para os seus filhos?
R - Quando eu tiver os meus filhos, meus netos, meus bisnetos, que eu quero conhecer meus bisnetos também. Quando eu tiver meus filhos, eu quero muito contar toda essa história para eles também, de alguma forma eu vou tentar dar um jeito para conseguir fazer isso. Mas eu quero muito contar para eles a história de como esse lugar surgiu, de onde veio, como era, como está hoje em dia, em comparação ao futuro, pra conseguir contar para eles todas as histórias boas que eu já vivi, também as histórias tristes que eu já passei, as dificuldades que eu já passei. E eu quero compartilhar parte dessa história com as pessoas que estiverem dispostas a ouvir, porque todo mundo gosta de ouvir história, isso é fato. E compartilhar uma história, independente de qual for, é algo gratificante, é maravilhoso de se fazer.
P/2 - O garimpo de Serra Pelada e todas as suas histórias, de alguma forma te influenciou?
R - O garimpo de Serra Pelada, ele não só me influenciou, mas também me inspirou de certa forma, porque é algo de peso, é algo que carrega muito peso, é história, é história para contar. Apesar de que essa história já foi contada, mas talvez não tenha sido contada da perspectiva certa, sabe! Talvez tenha sido contada de uma visão um pouco distorcida. Então, o garimpo de Serra Pelada, ele me motivou a contar novas histórias também, a buscar novas histórias para serem contadas. Porque eu vejo… Quando eu chego ali próximo da cava, de onde foi o garimpo, me dá um arrepio tão grande ali, eu chego perto ali me dá um arrepio, que eu penso, caramba tem inúmeras, inúmeras, inúmeras vidas, bem aqui debaixo dessa água. Inúmeras vidas. Vidas essas que talvez nunca vão ser contadas. Pessoas deixaram de existir ali, literalmente deixaram de existir ali. Então, se eu tenho uma oportunidade…. literalmente a oportunidade nas minhas mãos de conseguir contar as histórias que ainda não foram contadas. Então, nada melhor do que as histórias que não foram contadas para me motivar. Então, acho que isso me motivou bastante.
P/2 - E o covid 19, como impactou na sua vida?
R - Nossa, a época do covid, cara, foi um período tão maluco. Porque, eu me lembro que a gente estava na sala de aula, estava no primeiro ano do ensino médio, tinha acabado de entrar no ensino médio. E eu e minha turma, nossa, a gente estava com inúmeros planos para fazer durante esse período, porque “nossa, ensino médio vai ser do balacobaco, a gente vai viver, vai aprontar, vai fazer não sei o que”. “Bummmm… Pandemia, lockdown, ninguém sai de casa”. Putz grilo! E agora? A gente ficou… Quando chegou a notícia de que… “Nossa, tem um vírus chinês aí que está fazendo um alvoroço aí, rapaziada, vamos ficar esperto” A gente pensou. “Não, pô! O vírus, saindo lá da casa do cachaprego, lá onde Judas perdeu as botas, vai vir aqui em Serra Pelada, meu irmão? Tu tá de sacanagem!” E chegou, infelizmente chegou. E a gente estava na sala de aula, e falaram: “Ó, pessoal, como vocês sabem aí, a gente já está usando máscara, está usando álcool em gel, tudo certinho. Mas vocês vão ter uma semana sem aula, tá! Para vocês ficarem em casa, para a gente se prevenir tudo.” A gente, “Nossa, aqui vencemos rapaziada, vencemos, aqui é o melhor momento da nossa vida, sem escola, pronto! Vamos aproveitar!” E virou duas semanas, virou três semanas, virou um, dois meses, três meses, quatro meses. E o segundo ano do ensino médio completo, tipo, a segunda metade do primeiro ano do ensino médio, e o segundo ano inteiro do ensino médio, foi tudo EAD. Nossa, foi terrível! Terrível, terrível! Porque a gente ficava o dia todo em casa, não tinha nada para fazer. E aí, batia o horário, a gente pegava o celular, tinha que ouvir lá a professora falando: “Hoje nós vamos ouvir sobre o período neolítico, paleolítico, entender como isso afetou no desenvolvimento da sociedade”. Eu não quero saber sobre o desenvolvimento da sociedade. Tem um vírus que está matando a rapaziada aí gente, bora viver, não sei o que, não sei o que. To brincando, gente. Mas a pandemia em si, foi um evento que me marcou muito, que eu pensei: “Caramba, eu estou presenciando uma pandemia Global”, isso vai ser uma história e tanto para eu contar para os meus filhos, porque eu vou aumentar bastante. Vou falar: “Nossa, eu saia assim na rua, eu saia com as máscara assim rapaziada, eu saía com um serrote na mão, e aí eu ficava andando, procurando mantimento para a minha família.” Eu vou aumentar bastante essa história para os meus filhos, com certeza! Eu vou contar essa história para os meus netos, eu vou falar:... Eu vou chegar neles e vou falar: “Eu presenciei uma pandemia Global.” “Não vovô, você está brincando?” “Eu presenciei, senta aqui que eu vou contar.” Mas na realidade eu só fiquei o dia todo sentado em casa, só fazendo nada, literalmente nada. E o bom é que pelo menos eu tirei o tempo da pandemia pra conseguir focar um pouco mais em mim, porque ali como eu tinha bem mais tempo pra conseguir fazer as coisas que eu queria, eu tive bem mais tempo para ler, tive mais tempo para voltar a desenhar. Porque eu sempre gostei de desenhar também. Então, eu tive mais tempo para voltar a desenhar, pra começar a fazer exercícios em casa, então eu comecei a fazer calistenia durante alguns meses. E aí, eu foquei bastante em mim. Então, quando a gente voltou da pandemia eu estava bem diferente, porque eu dei uma espichada muito grande, eu cresci bastante. Eu saí do ensino médio menor que todo mundo, literalmente menor que todo mundo da turma, e voltei um dos maiores. “Ah pronto, o covid 19 tinha fermento que entregaram para esse menino? Que que isso, meu?”
P/3 - Qual lição que o covid 19, na sua visão, deixou para o mundo?
R - Uma lição? Caramba! Acho que uma das coisas importantes que o covid 19 ensinou para a gente, é que a gente tem que se preparar, pra literalmente qualquer coisa, porque foi algo muito repentino, que a gente não estava esperando. E menosprezou isso de certa forma, menosprezou. Isso tirou muitas vidas, por conta do desleixo que a gente teve de certa forma. Então, acho que uma grande lição que o covid 19 deixou pra gente, é a gente aproveitar cada minuto, porque a gente nunca sabe quando vai acabar. E passar um tempo com as pessoas que a gente ama, e se prevenir acima de tudo, e se precaver, que a gente nunca sabe quando uma segunda pandemia possa acontecer de novo.
P/3 - Você perdeu amigos?
R - Graças a Deus eu não perdi nenhum amigo, nenhum familiar direto. Mas a minha mãe, ela perdeu alguns familiares, que não são meus familiares direto, mas alguns conhecidos dela, ela perdeu por conta do covid-19. E eu tive alguns amigos que também tiveram perdas, então eu vi de perto o que que aquilo marcou na mente de uma pessoa, o que é perder alguém que você ama porque não tem oxigênio suficiente para aquela pessoa. Isso é surreal. É surreal pensar nisso, que alguém morreu porque não tinha oxigênio suficiente. Nossa, isso é terrível de se imaginar.
P/1 - Quais são as coisas mais importantes para você hoje?
R - As coisas mais importantes pra mim são minha família, acima de tudo. Os meus amigos, priorizar também a irmandade que eu tenho com eles, porque teve um momento da minha vida que eu deixei eles de lado, deixei os meus melhores amigos de lado, porque eu fui ingênuo, por deixar eles de lado, então hoje em dia eu priorizo eles o máximo que eu posso, tento aproveitar o máximo do meu tempo com eles também. Minha família, meus amigos, os meus projetos, as coisas que eu quero fazer. Os meus projetos estão igualados com o meu trabalho, de lidar bem melhor com a questão profissional, de lhe dar bem melhor com a minha imagem, com as coisas que eu quero fazer, com as produtora, com o meu trabalho, as coisas que eu quero tirar do papel eventualmente. Mas acima de tudo as coisas que eu mais priorizo, são realmente as experiências que eu tenho junto com essas pessoas, de aproveitar cada minutinho, de tá perto, de estar junto, de rir de qualquer besteira, de chorar por qualquer besteira. Então, as coisas que eu mais priorizo hoje em dia são as experiências e as memórias que eu vou carregar por conta disso.
P/1 - Quais são suas metas na área que você está atualmente?
R - Hoje em dia um sonho, um objetivo, uma meta que eu tenho no meu trabalho é crescer bem mais no meu trabalho de alcançar talvez um cargo maior, de me formar nessa área para ajudar conseguir esse objetivo, de ajudar no desenvolvimento do meu trabalho, de auxiliar outras pessoas que também venham a ser contratadas eventualmente. Eu quero ajudar também para que aquelas pessoas também aprendam da forma como eu aprendi.
P/1 - Você gostaria de acrescentar algo mais? Algo que gostaria de falar?
R - Posso dizer um pouco mais sobre… principalmente sobre medos. Como eu falei para vocês que eu sempre fui muito quieto, fechado, eu sempre tive essa característica só em relações pessoais mesmo, sabe, de conversar com algum familiar meu, eu sempre fui muito fechado por conta disso. Mas na escola, em alguma apresentação do teatro, eu sempre fui falante, eu falo com todo mundo, eu gostava de fazer piada com qualquer coisa. Um dia numa apresentação, que foi até aqui no Rita Lima, que era uma apresentação sobre piadas, literalmente sobre piadas. E eu peguei um caderninho, eu anotei algumas piadinhas que eu tinha, e eu contei as piadas pro pessoal, e tudo rachando o bico. A minha mãe literalmente chorou de rir naquele dia. E acho que a partir desse momento da escola em si, que eu aprendi a conseguir me comunicar bem melhor com as outras pessoas, eu consegui desenvolver muito melhor essa habilidade de conseguir entender melhor a outra pessoa, de ter empatia pela pessoa que eu tô conversando, de entender o lado dela, e também conseguir me expressar bem melhor. Mas um medo muito grande que eu sempre tive, foi de falhar, isso, de falhar, porque como tinha essa pressão, o medo de desapontar os meus pais, de sair da linha que eles escreveram pra mim, isso gerava um medo tremendo, gerava um medo terrivel, terrivel, terrivel. E eu não entendia isso, porque uma criança de 6 anos não vai entender o que é pressão, não vai saber o que é ser cobrado, só depois que eu fui entender o que era isso, o que foi isso, porque que eu sentia tanto medo, depois de um tempo que eu fui entender isso. E isso me privou de muitas coisas, me limitou muito, porque eu não conseguia fazer nada, nada que fugisse do meu controle, porque eu tinha medo de arriscar, tinha muito medo de arriscar. E o medo de arriscar me fazia ter medo de falhar naquilo. Que eu não conseguia tentar fazer nada, eu nem tentava fazer alguma coisa, pelo simples medo de falhar. Mas com o tempo a gente vai aprendendo que a principal coisa pra que a gente… quando a gente quer que algo aconteça, a principal coisa é tentar, não tem mistério, é colocar a cara a tapa, e ir, é arriscar. E por conta disso eu consegui fazer várias coisas, coisas que eu nunca imaginei que eu ia conseguir fazer. Mas acho que uma das coisas que me marcou bastante, foi o medo de falhar, tanto comigo mesmo, e falhar com as outras pessoas que confiavam em mim de certa forma. Eram pensamentos de criança, esse era um pensamento que eu tinha desde os meus oito anos de idade, e era um pensamento que eu tinha e eu não sabia da profundidade que isso era, não sabia o que isso significava, do que significava para mim. Mas acho que superar os medos de… superar as angústias e conseguir fazer bem melhor as coisas que eu quero fazer, é o que consegue me libertar muito mais da prisão que eu mesmo construí na minha própria mente.
P/2 - Gabriel, qual é o seu maior medo?
R - Meu maior medo? Hoje o meu maior medo é perder as pessoas que eu amo. Meu maior medo. Fugindo completamente de qualquer âmbito profissional, qualquer coisa, qualquer coisa voltada para projeto, meu maior medo é perder as pessoas que eu amo, meu maior medo, porque nada é pra sempre, isso é fato! Nada vai durar para sempre. Eu fui pensando. Cara, nada vai durar para sempre, as pessoas que eu amo também não vão durar para sempre. Eu já perdi já algumas pessoas que eu amo já, e eu sei da angústia que isso é. Eu perdi uma tia minha que ela falava que ela era minha fã número um, de tudo que eu fazia, de qualquer projeto que eu fazia, ela falava que era minha fã número um. E ela estava com câncer de mama, e eu lembro do dia que ela faleceu, que a gente tava lá em casa, eu estava dormindo com os meus irmãos, e aí a gente acordou com a minha mãe falando: “Gabriel, Gabriel, acorda, porque a tua tia faleceu. Eu e teu pai a gente tá saindo agora pra ir lá no velório dela”. E eu nunca soube lidar com perdas, nunca soube lidar com perdas. Porque de imediato, o que alguém faria, pô, é chorar. Chorar descontroladamente. Mas a princípio eu não conseguia, eu me forçava a chorar, eu não conseguia. Porque eu pensava: “Cara, eu nunca mais vou ver minha tia, cara!” E alguns meses atrás de quando ela tinha morrido, eu e ela, a gente tava assistindo um filme que eu tinha feito. E nunca mais eu ia ver a minha tia, cara! Nunca mais! Nunca mais ia conseguir contar para ela de uma apresentação de teatro que eu tinha feito. Que ela também adorava ver. Nunca mais ia conseguir. E eu acho que o medo que eu senti naquele momento, de quando eu parei e pensei, “cara, a gente não vai ficar aqui para sempre, a gente não vai conseguir segurar isso aqui pra toda nossa vida, que em algum momento isso daqui vai acabar”. Então, eu tenho muito medo, muito, muito, muito, muito, muito medo de que isso aconteça de novo, que eu sei que vai acontecer, minha mãe não é permanente, meu pai não é permanente, meus irmãos não vão ser permanentes. Mas eu tenho muito, muito, muito, muito, muito medo que isso aconteça de novo. Acho que perder as pessoas que eu amo, mesmo que não por morte, mas até minimamente me distanciar das pessoas que eu amo, acho que uma das coisas que eu mais tenho medo hoje em dia, é uma das coisas que eu não desejo nem para o meu pior inimigo, ter que sentir o sentimento de perda, de ter a certeza de que nunca mais vai ver a pessoa que ama de novo. Ter essa certeza dói muito. Nossa senhora! Essa certeza é terrível.
P/1 - E o que te faz mais forte?
R - O que me faz mais forte? Também tá muito ligado com as pessoas que eu amo, também tá muito ligado. Porque são as pessoas que me motivaram desde sempre, são as pessoas que me acompanharam desde sempre. O que me faz forte é ter a certeza de que o que eu faço pode ajudar eles algum dia, o mínimo que for, talvez isso possa ajudar eles algum dia. Isso me faz levantar todo dia da cama, independente que eu esteja morto de cansaço, independente, independente. É o que me motiva para levantar. Eu penso, cara, Gabriel, por mais que não seja agora, mas tem pessoas que vão ser dependentes de ti em algum momento, seus pais vão precisar de ti, tua mãe vai precisar de ti, teu pai vai precisar de ti, teus irmãos vão precisar de ti em algum momento. Então, levanta essa bunda dai meu irmão, e vai trabalhar! Levanta e vai trabalhar! Me faz forte ter esse pensamento e pensar que há poucos anos atrás, sei lá, dois anos atrás, eu não conseguiria fazer nada do que eu consigo fazer hoje, nada, nada. Porque eu tive uma transformação muito brusca, tanto de corpo, quanto mente. Tive uma transformação muito brusca. E aí, eu fico pensando no Gabrielzinho de 10 anos, fico pensando. O que que o Gabriel pensaria agora? Ele estaria satisfeito com o que tu está fazendo? O Gabrielzinho de 8 anos, aquele Gabrielzinho que teve a primeira ideia de medo, de pressão, do que era ser cobrado. Será que ele estaria orgulhoso hoje? E sempre, sempre, a resposta é não. Porque se eu falar sim eu vou ficar acomodado, e eu não quero ficar acomodado, do jeito nenhum. Então, toda vez a resposta é não, eu sempre digo não. Não é suficiente, não quero que seja suficiente. Até que eu esteja lá em cima, nunca vai ser suficiente para mim. Porque se não for suficiente pra mim, não vai ser suficiente para nenhuma das pessoas que eu amo. E eu quero que seja suficiente para elas também, de alguma forma. E eu acho que isso me mantém forte todo dia.
P/1 - Como foi contar a sua história?
R - Foi bem difícil, para ser honesto. Muito difícil! Porque eu não tô acostumado a contar quem eu sou, a contar as minhas angústias, meus sonhos, meus medos. E é difícil a gente ter uma ideia de quem a gente é. Eu nunca tive uma ideia de quem eu era. Se alguém me perguntasse: “Gabriel, me fala quem tu é?” Eu não vou saber responder. Hoje dia eu consigo. Contar minha história gera um pesar, porque acaba que eu me lembro das coisas que eu não quero me lembrar direito, me lembra das coisas que eu inconscientemente me nego a lembrar. Mas é como eu gosto de dizer, que uma história, é uma história, e ela merece ser contada, independente de qual for. Então, não tem história melhor para começar, do que a minha própria história pra conseguir contar. Porque se eu não conseguia contar a minha própria história, então eu não sou nenhum comunicador. Então, se eu quero ser um comunicador, então tenho que saber de onde é que esse cara começou. Então, hoje em dia com isso, eu consigo contar bem melhor quem eu sou, de onde eu vim, e para onde eu quero ir. São as principais coisas que eu quero contar.
P/2 - É isso, Gabriel! Foi lindo você contar a sua história, seus momentos difíceis, felizes. Sua família. Esse projeto que a gente está fazendo vai ser bem bacana a gente contar a sua história pro mundo, que a gente está fazendo esse site. E a gente só tem a agradecer.
R - Eu que agradeço!
P/2 - Vou disponibilizar o seu horário, que amanhã você vai trabalhar.
R - Isso aí eu resolvo depois
P/1 - Daqui a 20 anos você vai estar olhando essa história aí e vai estar se orgulhando. Uma história de vida, filosofia de vida. Você está de parabéns.
R - Agradeço imensamente.
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