Projeto Memória dos Brasileiros – Ação Griô
Depoimento de Otacília Pereira da Paixão, dona Sartíria
Entrevistado por Ana ___ e Claudia Leonor
Lençóis, Bahia, 10/08/2007
Realização Museu da Pessoa
Transcrito por Ana Lúcia V. Queiroz
Revisado por Paulo Ricardo Gomides Abe
P/1 – Pra começar se você puder dizer o seu nome completo, local e data de nascimento.
R – Eu moro no Pomar, eu nasci em ____, distrito de Areia Branca. Mas ___ mesmo, agora o arraial chama Areia Branca. Eu me criei ali, saí de Areia Branca com 13 anos de idade. Eu morava num arraial, no fundo da ___, distrito de ___ mesmo. Eu acabei de me criar com meu pai. Chamava Hilário. Acabei de me criar com ele. Então, porque eu me casei, vim morar em Pomares, em Pomares eu estou até hoje.
P/1 – O que os seus pais faziam?
R – Ele era lavrador, trabalhava de roça, carvão, piaçava. Cortava areia de metro. A vida dele era isso. Fazia mais carvão, meu pai lidava mais com carvão.
P/1 – Quando você era pequena, quais eram as brincadeiras, as coisas que você mais gostava de fazer?
R – Cantar roda. Meu pai era aquele meio carrasco, meio bravo um pouquinho, não deixava a gente ir pra lugar nenhum, a brincadeira era ali. É menina com menina. É brincar de roda, brincar de boneca. Nunca me botou pra estudar e se eu fosse estudar eu ia fazer carta pro namorado. Hoje em dia eu estou precisando de uma leitura e não tenho. Culpa dos meus pais.
P/1 – E por que ele não deixava vocês saírem?
R – Porque ele era carrasco mesmo. Mocinha assim não saía mesmo. Eu, no tempo de moça, era bem vistosa. (risos) Ele tinha medo de que eu me perdesse; não queria que ninguém se metesse com a filha dele. Eu era a filha caçula. Ele tinha todo amor por mim.
P/1 – Quantos irmãos você tem?
R – Hoje em dia só tenho um. Eram três irmãos, morreram duas, só tenho um irmão.
P/1 – E quais os nomes deles?
R – O meu irmão chama Inocêncio Pereira da Paixão. A minha irmã chamava Guilhermina Pereira da Paixão. A outra, falecida também, chamava Nica Pereira da Paixão.
P/1 – E quando vocês eram crianças, vocês eram bem próximos, brincavam muito?
R – Brincávamos muito, graças a Deus, nós éramos muito amigos.
P/1 – E essa mudança de cidade quando você tinha 13 anos por que aconteceu?
R – Porque meu pai se deixou da minha mãe e se casou com outra. Aí eu fiquei com a minha mãe. Adoeci, aí meu pai veio me buscar pra acabar de me criar. Meu pai tinha mais condições que a minha mãe. Aí eu fiquei com ele.
P/1 – Você adoeceu então?
R – Foi, eu fiquei doente. Estava no mato tirando piaçava, no tempo de verão, tempo de janeiro. Acho que vocês não se lembram daquela época que o dia virou noite – vocês não eram nascidas, não –, o dia virou noite mesmo. Virou noite, ficou tudo escuro.
P/1 – Como foi isso?
R – Aconteceu. Eu morava ali na Areia Branca, o lugar que estou falando. O dia virou noite, teve que acender velas. ____ energia. A mãe acendeu vela pra clarear tudo. A galinha subiu pro poleiro. Procure no mapa que tem isso.
P/1 – O que as pessoas falavam que estava acontecendo?
R – Acontecia que o mundo ia se acabar. Mas o mundo ia se acabar no dia que o dia virou noite. Diziam que o mundo ia se acabar. Nessa época a gente estava trabalhando mais a piaçava na fazenda de doutor Cícero, ali em cima o círio. Deu uma chuva tão grande, eu estava no mato tirando piaçava, nós fizemos aqueles carregão de piaçava, botamos na cabeça e viemos pro barraco, não tinha casa. A casa ____ era de palha, que ___________. A minha casa ___ era de palha, ___, eu não tinha cama pra deitar, a minha cama era forrada com palha de bananeira. Minha coberta era uma coberta de saco de ___. Tudo isso eu já passei na minha vida. Já sofri muito. Dia de procurar um punhado de farinha pra comer, porque não tinha. Tinha que sair pro mato pra comer coco verde. Trabalhando, batalhando pra tirar coco verde pra comer. Ainda esse dia deu essa chuvarada. Eu estava com galho de piaçava na cabeça, ___ ir embora pra casa. Quando a gente chegou em casa, estava trovejando e relampeando bastante. Nesse tempo eu não tinha ____. Joguei o carrego da piaçava lá e joguei a cabeça debaixo da torneira. Quer dizer, como o calor da piaçava, a tintura, eu ali debaixo falei: “Deixa eu por minha cabeça”. Meu cabelo era cumpridão, era nega mesmo, o cabelo batia aqui embaixo. Caiu todo, todo, todo. Eu fiquei em cima da cama mais de dois meses. Mandaram recado pra meu pai. Meu pai foi lá, quando viu as minhas condições... Primeiro foi a minha avó e a minha tia. A minha irmã que morreu. Minha avó morava perto dele também. Disse: “Olha, Tatá – ela me chamava de Tatá –. Tatá não apareceu aqui?” Fomos lá com mais de 15 dias. Era a pé, de Areia Branca pra Campinas ___ de ir a pé. O dia que _______ eu já sei bem onde vou comer. Vou comer na casa de meu pai ou de minha avó. ___. Eu comia e ainda trazia pra cá pra minha mãe. Eu demorei mais de 15 dias sem ir lá, mais de mês sem ir lá. Doente, em cima da cama não podia me levantar. ____ que minha mãe morava, era um carrasco, não deixava ela sair pra lugar nenhum. E eu doente em cima da cama, ia pro mato mais minha mãe e eu ficava sozinha no barraco. Sozinha ali. Não achava quem me desse um pingo de água, naquele tempo não tinha vizinho perto, não tinha nada. Até minhas colegas andavam pro mato e me perguntavam: “Cadê sua tia?” “Ah, ficou lá limpando piaçava, ela não veio pro mato hoje, não. Ela está com preguiça. Da freguesia.” E eu sofrendo, morrendo. Minha avó veio um dia mais minha irmã, então ______ a mão na porta, para. Aqui não tem ninguém, não? Aquele tempo as pessoas não vinham aqui, não. Ela chegou, meteu a mão na porta, abriu a porta e viu aquela menina lá, enrolada num saco de ___. Ela disse: “Vai ver meu Deus! Tua filha está aqui, e está doente, está morrendo.” Quando chegou na porte, a quentura da febre queimou ela. A febre estava demais. Minha avó que era parteira, andava com aquele xale grande, ela só saía com aquele xale, com o ___ dela na cabeça, levava comida. “Minha filha está morta!”. Meu pai estava trabalhando em ____. Nessa época ele estava fazendo carvão de um homem da campina. Ela chegou e disse: “Vamos embora pra casa.” Ela chegou, pegou eu, me deu um banho. Quando passava a mão assim, no meu cabelo deu piolho de ___. Minha cabeça era piolho e pulga. Eu estou viva porque o mistério de Deus é grande. Minha avó chegou mais minha irmã, catou um bocado de folha, de pitanga, um bocado de folha lá. Me deram banho, minha avó pegou o xale, forrou a cama e me enrolou no xale, deixou ali e foi-se embora. Agora vamos mandar recado pra Hilário, quando ele chegar ____ filha. Essa não vai escapar, não. Pegou e mandou o rapaz avisar meu pai. Quando foi no outro dia, meu pai chegou. Quando chegou lá, eles já tinham saído, que eles sabiam que meu pai era bravo, ____ ia ter qualquer coisa. Minha mãe saiu mais o marido dela e eu fiquei em casa sozinha. Quando meu pai chegou, que olhou, ele saiu e a minha madrasta disse: “Oh, Hilário, leva um mingau pra ela”. Ele disse: “Daqui pra lá como é que eu vou levar esse mingau?”. Não, eu passo num lugarzinho ralo e boto no bule, quando chegar lá você ___ pela boca de minha filha e traga ela pra cá. Não gosto nem de me lembrar. Meu pai chegou, meteu a mão na porta, abriu a porta. “Minha filha, você vai morrer!”. Pelo bule mesmo botou um pouquinho de mingau na minha boca, eu bebi. Ele disse: “Eu vou me embora, não vou lhe levar, não. Eu vim aqui pra ____. Mas diga a sua mãe que se eu chegar aqui e encontrar você ___ eu arranco o pescoço dela.” Quando foi no outro dia, foi um tio meu, chama Eugênio, irmão da minha mãe. “O senhor não trouxe ela? Mas eu vou buscar”. No outro dia __ em casa meu tio Eugênio chegou. Ele estava em Piripiri, ele pegou o trem, saltou na ___ e foi de a pé. Quando ele chegou lá, eles já tinham saído e eu estava em casa sozinha. Ele passou no armazém do ___, comprou um pão, comprou manteiga, comprou tudo e botou no pão e me levou. ______. Ele disse: “Cadê a sua mãe?”. Eu não tinha força nem pra falar. Ele saiu atrás de um primo meu que chamava Zeca. “Onde é que Zeca mora?” Saiu atrás dele, perguntando, ________, funciona o carvão. Seu ___ falou com o Zeca: “Zeca, cadê seu jegue?”. O transporte era um jegue. “Por quê? Pra que esse jegue, meu Deus?” “É pra levar Sartiria, ela está doente, não sei se vai aguentar chegar na Campina”. Disse o ___: “Espera aí.” Tampou as bocas do carvão e veio mais meu tio, eu e Zeca, chegou o ___ de Campina com a cangalha. Pegaram outro pau, escorado até a ___ da cangalha, outro na frente; me linharam assim, no meio, pra eu aguentar chegar na Campina. Um de um lado, o outro Zeca segurava o jegue e meu pai me segurando porque pro lado que ia eu caía. Até quando eu cheguei. Quando eu cheguei, meu pai, meu irmão, meu tio me pegou, botou na casa dele, porque ficava perto. No outro dia, meu pai me levou pra casa. E graças a Deus. Me deu muito remédio, purgante aguardente, Alemanha. Tomei três purgantes aguardente Alemanha. Tomei um mês, tomei outro, um mês tomei outro, então Deus me ajudou que eu melhorei. Mas meu cabelo nunca mais ficou bom. Ficou assim limpo, limpo, limpinho. Caiu todo, meu cabelo era bonito. E comecei a minha vida.
P/1 – E teve alguma reza pra senhora sarar?
R – Não, não. Precisou de reza, não. Era constipação, ele sabia o remédio que era. Me deu logo aguardente Alemanha, depois tomei um purgante de óleo de rícino com sena. E pronto, fiquei boa.
P/1 – Você foi morar com seu pai.
R – Então já fiquei morando com meu pai. Não fui mais pra casa de minha mãe.
P/1 – Você nunca mais a viu?
R – Não, nem ela foi lá mais. Eu vi ela depois que fiquei boa, que já podia andar. Eu digo, é minha mãe eu vou lá. Porque eu tinha muita pena dela, pois ela sofria muito com esse marido que ela tinha. Eu disse: “Vou lá ver minha mãe.” “Agora você que sabe, a mãe é sua, agora morar com ela você não vai mais.” Então eu continuei lá na casa dela. Quando ela arreou esse rapaz e homem que ela morava, eu já tinha a minha casa, meu marido. Tomei conta dela até quando Deus levou. Faz dois anos que minha mãe morreu.
P/1 – E a irmã da senhora ficou com a sua mãe ou ficou?
R – As minhas irmãs moravam tudo em casa, uma se casou, outra se casou e ficou eu sozinha. Ficou eu só.
P/1 – E lá nessa cidade que você foi morar com seu pai, como era? Eram outras pessoas, você não conhecia muita gente?
R – Eu conhecia os donos da fazenda. Era o finado Tico, o finado Galego, finado Tertuliano. Era pessoal de fazenda que morava lá, eu já conhecia. ___Teixeira. Esse pessoal todo eu conhecia, porque eles moravam em ____, mas tinham casa na fazenda deles. ____, tudo isso tinha fazenda lá.
P/1 – Você gostava de lá?
R – Ah, gostava. Até hoje eu adoro. Depois que meu pai morreu, um foi pra um lado, outro foi pra outro. A minha madastra foi pra ____ morar como o filho dela. A minha irmã foi morar em Camaçari, depois foi embora pra São Paulo. E eu fiquei sozinha por aí, com meu marido. Estando com meus filhos, todo ano tem um filho. E Deus abençoou, graças a Deus. Eu não vou dizer que foi mau, nem que foi bem, levou meu marido e ficou eu sozinha pra acabar de criar os filhos.
P/1 – E o seu marido você conheceu quando era jovem? Nesta fazenda mesmo?
R – Jovem, é nessa fazenda. Mas eles morando no coqueiro e eu morando na campina.
P/1 – Como vocês se conheceram?
R – Nós começamos a namorar pelos escondidos aí, escondidinho, escondido de meu pai. Aí ____ (risos). O que ___ do amor? O amor leva a gente longe, dava um jeitinho. “Eu vou na fonte pegar água!”.
P/1 – Por que tinha que ser escondido?
R – Porque meu pai não deixava de jeito nenhum encostar na porta. Quem ia encostar na porta pra namorar com filha dele?
P/1 – E ele pegou alguma vez vocês por acaso?
R – Não, não. Quando eu não aguentei mais, ele estava pegando demais no meu pé, eu fugi, fui embora.
P/1 – Com ele?
R – Ele mesmo. Com ele eu tive 14 filhos, ___ depois que ele morreu.
P/1 – Quantos anos você tinha quando ele e você fugiram?
R – Eu estava na base de uns 15 anos mais ou menos.
P/1 – Pra onde vocês foram?
R – Pra Coqueiro, nesse tempo chamava Coqueiro, hoje em dia se chama Pomares. A mãe dele morava lá, ele tinha casa. Vou ficar mesmo por aqui. Saí sozinha. Pus a trouxinha na cabeça, vou me embora. (risos) Ninguém é de ferro. Trabalhava demais também. Vou ver se acho uma melhora. A melhora que eu achei foi 14 filhos.
P/1 – Você trabalhava com o que nessa época?
R – Morando com meu marido? Piaçava.
P/1 – Como era esse trabalho?
R – Era ir pro mato tirar piaçava, chegava pra limpar e pesar. Pesava as arrobas. Vendia pro rapaz lá mesmo, do Coqueiro. Chamava seu José. Já é morto.
P/1 – O que faz com a piaçava?
R – Fazia vassoura de piaçava. Trabalhava com aquilo. Vendia pra ele, ele vendia pra outra indústria que já fazia a vassoura.
P/1 – E seu marido também trabalhava com isso?
R – Trabalhava, nesse tempo não tinha emprego, não tinha nada. Emprego era mais piaçava e carvão.
P/1 – E carvão como era?
R – Carvão era cortar as madeiras, aquele bocado mesmo vamos fazer aquela uma. Pegava uma enxada aí cavando o estradão, botava mesmo na parede assim até chegar em cima, de um lado e de outro. Em cima jogar palha, ou folha velha mesmo, jogar terra ali em cima e botar fogo. Bota fogo, queima, quando queima, sai o carvão. Vendia, ensacar no saco pra vender. Trabalhei muito, até hoje trabalho. É muito duro. Depois que meu marido morreu, que as meninas ficaram todas pequenas, dava três meninas, uma de cinco anos, outra de quatro, outra de oito.
P/1 – Você teve 14 filhos?
R – 14 filhos.
P/1 – Quando você teve o primeiro?
R – O primeiro eu estava na base dos quinze ou dezesseis anos. Todo ano era um filho. Todo ano tinha que ter um filho, não tinha jeito, não. Não tinha televisão nesse tempo. (risos) Não tinha televisão, chegava cansada, batia um banhinho, embora dormir. Não tinha jeito.
P/1 – E como dá jeito pra criar os catorze filhos?
R – Era assim, trabalhava, trabalhava. Agora mesmo estou aqui, mas ainda estou muito pesada. _______
P/1 – Saudade?
R – Saudade muita da minha filha. Fez dois meses agora que foi embora. Minha caçula. Ficou doente. Eu estou aqui porque eu estou ______, porque senão não tinha, não. Eu entrei nessa batalha, você não pode sair, tem de enfrentar. Queira que não queira o olho desce um pouquinho de água, eu limpo, mas sempre me lembrando dela. Quando eu olho aquele pequenininho que ficou pra eu tomar conta. Não é mole, não. É sofrimento, mas tudo o que Deus faz é bem feito, não é? Ela tinha 35 anos.
P/1 – Como ela chamava?
R – Lucianeide. __________
P/1 – E os seus outros filhos, moram com você?
R – Ah, comigo só quem mora é uma. Tem duas aí em Pomares. As outras moram em Camaçari. Tenho três filhos também, moram tudo em Camaçari.
P/1 – E eles trabalham com o quê?
R – Eles são empregados. As mulheres não, tem seus maridos, vivem em casa. Mas assim mesmo elas trabalham. Só ___ que mora aí junto comigo, na casa dela, mas está desempregada.
P/1 – Eu vi que a senhora ficou muito alegre de poder participar da Ação Griô e poder ensinar muita coisa para as pessoas. O que você ensina?
R – Eu ensino, o dia que é pra brincar ___, vamos embora brincar. Eles não sabem, então eu começo. O baile na casa das minhas cunhadas, ___, a gente se trata como irmã. Só tenho eu e ela, que ela não tem irmã e eu não tenho irmã. Ela ___ que eu ____. Morei um tempo em Camaçari e lá eu tinha ___, eu tinha tudo. Mas quando eu vim me embora pro Pomares, eu deixei: “Não vou cuidar mais disso, não.” _____________. Consegui armar na casa dela a lapinha. Todo ano entra um abará. Em janeiro, a gente vai ____. Mas ela não sabe quase nada, que tudo sou eu que indico pra fazer. Como é que canta, como é que são os versos, como é pra queimar, no dia que vai queimar. Como é que vai, como é a roupa que vão botar as pastoras . Sou eu que sou a mestre de fazer aquilo tudo.
P/1 – O que é a lapinha?
R – A lapinha é o lugar que a gente arma a lapinha, com folha de São Gonçalo, pitanga, faz aquela cozinha assim, no canto de uma casa. Quem quer armar no chão, arma no chão, bota aquele bocado de pedra. Quem não quer põe numa mesa, ali bota boneca, bota tudo quanto é de enfeite. Pedra. Tudo quanto é de enfeite aquela lapinha ali. Como se fosse uma lapinha. Pega o __ das meninas e bota ali dentro. Faz aquele jardim todo de folhas e muitas flores. Toda noite a gente vai ___. Toda noite. Até chegar o dia de queimar. O dia de reis.
P/1 – Queima a lapinha?
R – É, queima as folhas. A gente bota aquelas folhas que a gente bota naquele cantinho. Nos oito dias que a gente vai trabalhar de novo a gente tira aquelas folhas e encosta num canto. Toda mão assim, toda mão assim. Até o dia de queimar. Quando vai queimar tem um bocado de folha. A gente pega aquelas folhas na hora de queimar, bota do lado de fora. Faz aquela roda assim, tudo é rodeadinho de folhas. Cantando e ____, o pandeiro, de viola, e tudo ali cantando e ali bota fogo. Naquelas folhas ali.
P/1 – E é pra homenagear alguma coisa?
R – O senhor dos meninos. O dia das queimadas o senhor dos meninos. É a festa dele aí.
P/1 – Que dia é este?
R – A gente queima por janeiro. A gente começa a bailar pro natal. Véspera de natal a gente começa. Natal, véspera de janeiro a gente queima. É muito bonito.
P/1 – E todo mundo lá na comunidade participa?
R – Todo mundo, e é muita gente mesmo. Iara foi pra lá uma vez ______________, já queimou as folhas duas vezes, a Iara. Lá em Terramirim. Já veio pra queimar duas vezes. _______. Ela tinha no salão dela. Ave Maria, tanta gente de fora. Mas eu sempre to ali de frente.
P/1 – E durante o resto do ano não fica a lapinha lá?
R – Não, não. Fica lá o santinho lá no lugar, no cantinho dele. Todo ano nós temos aquela obrigação de fazer.
P/1 – E as pastorinhas?
R – As pastoras, é de seis de um lado, seis de outro. Começando a bailar e a cantar, a gente vai.
P/1 – Como é a música?
R – A primeira música? “Meu senhor Deus menino, Deus lhe dê boa noite. Precisa de festa por entre as ___ do ano, com despedida de festa, entre a ____ um ano. Serena eu bem te disse, a noite tão singular, hoje é na letra divina, hoje é noite de natal. Hoje é na letra divina, hoje é noite de natal”. O verso, e pronto e então a gente continua mais: “Entremos por essa sala, pra louvar a Deus menino, Entremos por essa sala, pra louvar a Deus menino. Ainda que nasceu flor, é sina de ouro fino. Ainda que nasceu flor, é sina de ouro fino. Nas horas de Deus, amém, Pai e Filho e espírito e Santo. Nas horas de Deus amém, Pai e Filho e espírito e Santo. É a primeira jornada, que nessa vitória eu canto. É a primeira jornada, que nessa vitória eu canto. Entremos por essa sala, pra louvar a Deus menino. Entremos por essa sala, pra louvar a Deus menino. Ainda que nasceu flor, é sina de ouro fino. Ainda que nasceu flor, é sina de ouro fino. Foi na horta de Jesus, ache tudo bem plantado. Foi na horta de Jesus, ache tudo bem plantado. O pouco com Deus é muito e o muito sem Deus é nada. O pouco com Deus é muito e o muito sem Deus é nada. Entremos por essa sala, pra louvar a Deus menino. Entremos por essa sala, pra louvar a Deus menino. Ainda que nasceu flor, é sina de ouro fino. Ainda que nasceu. Flor, é sina de ouro fino. Meu senhor, meu Deus menino, tão ____. Me guarde um lugar no céu, onde minha ____”.
P/1 – Lindo. Quem te ensinou essas canções?
R – Eu aprendi com a minha sogra. Ela amarrava a lapinha. Ela tinha lapinha. Eu era pastora dela. Comecei a bailar atrás das outras pastoras, depois fui aprendendo por conta de passar pra frente. Na frente são duas pastoras. Uma de um lado e outra do outro. São doze no total. Mais se tiver mais põe, mas são doze no total. Aprendi com ela. Antes dela morrer, ela já estava velha, entregou pra mim. Então minha filha, você que vai _____. E até hoje eu tenho ele.
P/1 – E como são a roupa das pastoras?
R – A roupa das duas da frente é toda de alvo; agora as outras podem ser a blusa branca, a saía azul. Mas todo ano as duas pastoras da frente a obrigação é as duas de alvo.
P/1 – E o cabelo?
R – O cabelo, se quiser usar chapéu usa chapéu, se não quiser usa um lacinho de fita. Uma florzinha.
P/1 – E a sua sogra que cuidava da lapinha?
R – E assim aprendi. ________, e me disse: “Dona Tatá, o que a senhora me ______.” E eu digo: “_______ só se vocês me abrirem a cabeça, que aqui dentro tem muita. Não é ___, não. Já estou perdendo. Eu não sei ler, está tudo aqui na minha memória. Quanto mais puxar por ela mais sai.” E as músicas todas, por exemplo, eu sei elas todas, do princípio até o fim. Até no dia de (queimar?) eu sei.
P/1 – E tem alguém que está aprendendo com você?
R – Está aprendendo já, a Iara mesmo está aprendendo. Iara já copiou metade de tudo.
P/1 – Anotou tudo?
R – Ah, copia tudo. Toda semana ela vai pra lá pra fazer reunião lá em casa, lá na casa de ___, toda semana.
P/1 – Logo que você casou com seu marido você já virou pastora.
R – Já era pastora. Antes de eu casar com ele, já era pastora.
P/1 – E quem eram as outras?
R –As outras já morreram. A metade toda, que eram muito velhas, já morreram.
P/1 – Amigas suas?
R – É, já morreram. Mas muito bom a lapinha, viu? É muito bonito. Tem aqueles pandeiros, viola, ali tocando certinho.
P/1 – E é só mulher mesmo, ou homem também participa?
R – Tem homem, tem os ____, dois, três homens. Tem o violeiro pra tocar, pra acompanhar as moças. Eu bato pandeiro na frente, eu e a outra pastora. As duas pastoras da frente. É obrigação tocar pandeiro.
P/1 – O que você mais gosta da lapinha?
R – Eu gosto de tudo. Agradecer a Deus menino já é comigo. Eu vou em qualquer lugar. Se fosse outra coisa eu não estava praqui. Mas pra agradecer a Deus menino eu ando virado o mundo todo. E é um santo padroeiro que eu adoro, dentro do meu coração.
P/1 – E agora tem uma associação que cuida disso?
R – De lá?
P/1 – Que é o ponto de cultura?
R – É, Iara.
P/1 – Como surgiu o convite pra senhora ir trabalhar com a Iara no ponto de cultura?
R – Ela que foi lá. Ela saiu fazendo pesquisa e procurando o pessoal mais velho. Tem um compadre meu, que é o mais velho que existe, o compadre Manoel, que existe no local lá no Pomares. Ele é o mais velho que existe. Ele sabe de tudo, como começou, como não começou, ___. Ele sabe de tudo, tudo que perguntar a ele, ele sabe. Ela saiu procurando, fazendo pesquisa, foi na casa perguntar, lá, ___ Seu Manoel. Seu Manoel chegou no colégio, ela procurou Seu Manoel. Então Seu Manoel foi; aí ela foi lá pra casa de ___. Chegou lá na casa de ___. Ela ficou na casa de compadre Manoel, o compadre Manoel conversou com ela. “Por aqui não tem alguma pessoa que ___ lapinha, não?” Ele disse: “Tem” “Quem é?” “É minha irmã ali”. Assim ela ensinou a casa de Pina, que fica na frente da casa dela, ela foi na casa de Pina. Pina disse assim: “Ah, pra benção Deus menino, ele ali, mas eu não sei de nada. Quem sabe aqui tudo é Tatá – que ela me chama de Tatá – é Tatá que sabe”. “Onde fica a casa dela?”. “É lá em cima”. Mandou o menino levar na casa dela. Daí a pouco chegou aquela mulher: “Ô de casa!”. Eu disse: “Quem é, meu Deus?”. “Licença de entrar”. “Pode entrar, filha”. “A senhora que é dona Otacília?”. “Sou eu mesmo”. “Vim aqui que dona Pina e Seu Manoel me mandaram que viesse aqui”. Não sei o quê, “Que eu estou fazendo uns perfis aqui de cultura, como é que eu faço? A senhora entende de quê?” Eu digo: “Não entendo de nada. Entendo de roça, carvão, piaçava”. “Não, mas eu quero outra coisa. Negócio de um santo que tem aqui, a lapinha.” Eu digo: “Ah, bom, então nós conversamos”. Logo ela levou o gravador; eu comecei a cantar; ela gravou duas músicas. “Depois eu venho cá, de novo”. Eu digo: “Está certo”. Ela foi; aí começou a gravar um bocado de músicas. Eu cantando e ela gravando. Eu e (Sueli?). Depois eu adoeci, fiquei ruim, ruim, ruim. Teve uma vez mesmo que ______, eu nem vi, que eu estava doente. Depois: “Eu vou continuar.” “Não, dona Otacília, a senhora não pode parar, não.” Vamos embora, vamos embora. Eu sei que Deus me ajudou, deu tudo certo e está dando e vamos em frente. Vamos pra frente. Quer que cante mais uma música?
P/1 – Com certeza.
R – Ah, bom. “E olhe que, viagem bela é a viagem de Belém, vamos ver a flor mimosa, o cheiro que o lírio tem. De correr vem o cansar, de cansar vem o___. Me encontrei com Deus menino agora descansarei. E olhe que viagem bela é a viagem de Belém, vamos ver a flor mimosa, o cheiro que o lírio tem. Deus menino já foi santo, hoje em dia é marinheiro. Quero viajar com ele para o Rio de Janeiro. E olhe que viagem bela é a viagem de Belém, vamos ver a flor mimosa, o cheiro que o lírio tem. Eu menino ao te romper o solado dos sapatos, visitando as paridas para não morrer de parto, visitando as paridas para não morrer de parto. E olhe que, viagem bela é a viagem de Belém, vamos ver a flor mimosa, o cheiro que o lírio tem. O meu senhor, meu Deus menino, minha flor de girassol, já sua sombra me cobre, quer chova, que faça sol”.
P/1 – Essas músicas são só da região de vocês? Tem em outros lugares a lapinha?
R – Tem a pitanga, Pitanga de Pomares.
P/1 – Só?
R – Por aqui por enquanto é. Pitanga de Pomares. Lá essa Bernadete. Tem o Deus menino e tem o São Gonçalo.
P/1 – Você sabe como começou a lapinha?
R – Desde lá? Não, porque eu morei no arraial.
P/1 – Não, no de vocês mesmo.
R – O meu eu já contei. É de minha sogra.
P/1 – Mas antes dela já tinha outras pessoas.
R – Mas essas outras pessoas eu não conheci. Não foi no meu tempo. Não alcancei ela. Mas agora quem era em principio, acho que é a mãe dela. Sei que foi ela que ___, deve ter sido da mãe dela. Eu não sei.
P/1 – Dona Sartíria, eu não perguntei de onde vem o teu apelido, de Sartiria.
R – Vem dos meus pais, chamar Sartíria, Sartíria. Vem dos meus pais.
P/1 – Por algum motivo.
R – Não, mesmo, porque chamava Otacília, chamava Sartíria.
P/1 – A senhora está indo lá no ponto de cultura pra passar essa experiência. Pra quem a senhora está ensinando essas coisas?
R – Pra Iara e as meninas de lá do Pomares. Que Iara lá tem ___. A gente trabalhou, até as meninas que __________. Ela sozinha.
P/1 – E pra senhora qual a importância de passar esse conhecimento que a senhora tem pra outras pessoas mais jovens, que a senhora conhece?
R – Porque eu sei que daqui há alguns dias eu não vou ficar mais aqui, eu tenho que me mudar, não é? Eu não quero que isso morra. Meu prazer é ver isso crescer. Porque é uma devoção muito bonita. Eu queria que elas aprendessem pra elas colocarem pra frente. Pra ter uma que diz assim: “Não pode morrer isso, vamos continuar.” ______________. Graças a Deus. Olha que ____. Os meus meninos ali.
P/1 – Como a senhora faz? A senhora dá uma aula, a senhora senta em roda? Como a senhora faz pra ensinar as pessoas?
R – A gente vai, chega na casa de ___, tem uns bancos a gente senta. Eu começo a cantar, ___, boto todo mundo pra dançar. Bora dançar, ___ da gente dançar, bora dançar. Bate palma, tudo certinho. Até a gente ter tudo certo, pra não errar nada.
P/1 – E você que escolhe quem são as 12 pastoras?
R – É, ___ escolher. Escolhe tudo.
P/1 – Mas a Iara não mora lá?
R – Não, ela mora em Terramirim. Agora toda semana ela vai pra lá. Toda semana, todo sábado ela vai. Ou não vai todo sábado, vai de 15 em 15. Agora nós vamos dentro do colégio, os alunos do colégio já estão aprendendo.
P/1 – E eles gostam?
R – Gostam. Lá mesmo tem uma professora aqui do ____. _____.
P/1 – Que acompanha o trabalho?
R – ______.
P/1 – Como foi essa chegada da senhora na escola?
R – Ah, a chegada. A primeira música que canta é essa: “Entremos por essa sala, pra louvar a Deus menino. Entremos por essa sala, pra louvar a Deus menino. Ainda que nasceu flor, é sina de Ouro Fino. Meu senhor, meu Deus menino, a Vós venho visitar, meu Deus menino, a Vós venho visitar. Doença venho trazer, saúde eu quero levar. Doença venho trazer, saúde eu quero levar. Entremos por essa sala pra louvar a Deus menino. Ainda que nasceu flor, é sina de Ouro Fino. De correr vivo cansada, de cansada eu me assentei. Encontrei com Deus menino, agora descansarei. Entremos por essa sala, pra louvar a Deus menino. Entremos por essa sala, pra louvar a Deus menino. Ainda que nasceu flor, é sina de Ouro Fino. Meu senhor, meu Deus menino, meu cordão de ouro grosso. Meu senhor, meu Deus menino, meu cordão de ouro grosso. Quem me dera uma volta pra eu botar no meu pescoço.
P/1 – A senhora chega na escola. Como a criançada recebe?
R – Sobe todo mundo. Faz a roda. A pajem tira as cadeiras, a gente vai brincar. Os meninos vão todos. Agora tem as músicas tudo, pra cada um dizer a sua música. Eu canto e paro pra cada um dizer a sua música. _____
P/1 – Até eles aprenderem.
R – Até eles aprenderem.
P/1 – Dança de roda também? Como a senhora dançava quando era criança?
R – É.
P/1 – E o que eles acham? O que eles falam pra senhora?
R – Eles estão achando muito bom, não é? Todo mundo animado porque eles não sabiam, não tinham visto ainda. E agora com a Iara, que levou lá pro colégio. Eles estão ____. Brincam em duas salas.
P/1 – E algum dos seus filhos te ajudam?
R – Só uma menina, a Sueli.
P/1 – Ela é uma das pastoras?
R – É.
P/1 – A senhora hoje é uma mestra griô. Como a senhora vê a importância desse trabalho que a senhora está fazendo?
R – Minha filha, pra mim é uma alegria que Deus mandou pra mim. Eu não esperava que eu ia ser. Chegar na altura que estou. É como diz a música: “Por eu ser tão pequenina, me deixaram pelo fim; por eu não saber falar, meu Jesus fala por mim.” Como diz o verso. Eu não sei falar, mas ele fala por mim.
P/1 – E a importância dessa memória que a senhora tem na cabeça? O que a senhora acha disso?
R – Deus deu. Ninguém tira. Foi Deus que me deu. No tempo que eu era menina, moderna, se eu fosse numa reza, eu corria pra ___, rezando lá, louca pra chegar em casa ____. Sem saber ler. Sem saber nada. Eu sabia tudo. Não tinha bendito que eu não soubesse. Não tinha o bendito de um santo que eu não soubesse. Hoje em dia, eu não sei mais. Foi morrendo o pessoal, fui ficando mais triste. Deixei de ir mais em festa, porque não tinha um samba que eu não fosse. Em terra de samba, eu fazia sucesso.
P/1 – Muita festa?
R – ___. Eu sambava de Pomares pra Parafuso, com ___. Eu varava três dias com três noites sem parar. Gritando mais os homens assim.
P/1 – Como eram as festas?
R – Sambar, bater palma, bater pandeiro, cantar. Tudo é festa. Eu cantava muito, sambava muito. Quando entrava na roda de samba ninguém me segurava, não.
P/1 – A noite inteira?
R – A noite inteira.
P/1 – E como a senhora se arrumava?
R – Naquele tempo era qualquer roupa que tivesse. Naquele tempo não tinha aquele negócio de muito luxo. Um vestidinho está lavadinho? Vamos embora! (risos). Só não podia ir sujo, rasgado. Mas está lavado? Vamos embora!
P/1 – O seu marido não ficava bravo de você ir sambar?
R – Ele ia. Gostava de tomar uma pingazinha. ________. Quem vai sambar sou eu, se quiser que morra, morra. (risos)
P/1 – E dona Sartíria, tinham comidas? Quais eram as comidas?
R – Feijoada, muito feijão, muito bola. Tinha um bocado de coisas, muita comida. Caruru mesmo é que não, que era muito caruru, era Galina, era tudo, feijoada. Aquela coisa toda.
P/1 – E era todo final de semana ou quando tinha um evento religioso?
R – Era de ano em ano, quando tinha aqueles santos. No Santo Antonio mesmo. Tinha uma criatura, ____. 13 noites sem parar. Mas a minha tia, que Deus já levou, ela rezava 13 noites. Era 13 noites que a gente sambava. Cada uma noite era de um dono. Por exemplo: hoje era minha, amanhã era sua, amanhã era sua. Você queria fazer mais bonito que os outros. Que uns levavam um bolo, levavam qualquer coisa. A gente tinha de mudar. Não era pra levar tudo, não. Cada qual largava a casa. Levava bebida, quem quisesse beber.
P/1 – E quando era o seu dia era na sua casa?
R – Não, o dia na casa dela. A minha noite era no dia três. Era eu e um padrinho meu. A gente trabalhava o ano todo já pensando nessa festa que ia fazer, que era para fazer mais bonito que os outros. Vai muito fogos. Muito fogos, muito foguetão. Muito bonito.
P/1 – E como arrumava o local?
R – Muito lindo, muito lindo mesmo.
P/1 – E a sua era a mais bonita de todas?
R – Eu ___ o enfeite dos outros. Eu tirava tudo. Quero o meu. (risos) _______. Era eu e compadre Zequinha. Muitos fogos, vamos embora!
P/1 – Essa era a festa de 13 dias de?
R – Santo Antônio.
P/1 – Tinham outras.
R – Tem a Nossa Senhora da Conceição, mas a ___ na casa dela. Na casa de um senhor que já morreu. Domingo de boi.
P/1 – E essa era boa?
R – Era boa também. Duas noites a gente sambar. Era um quase um ricaço, aí que era festa mesmo.
P/1 – Comida à vontade?
R – Comida à vontade. Muita comida, muita bebida, muita coisa. Era tempo bom.
P/1 – E hoje em dia ainda tem essas festas.
R – Tem, mas eu não vou em mais nenhuma, não. A bagunça está demais; tem muita violência. Nem lá mesmo eu não saio mais. Tem lá a festa, mas de dentro da minha casa eu não saio. A gente vai lá pra se divertir, acaba recebendo a bala, é isso, é aquilo. Que nada, eu já estou velha, com 84 anos. Fico quietinha.
P/1 – Tem muita violência?
R – No Pomares tem muita violência. Antes não era assim, não, mas agora! Em todo lugar existe a violência.
P/1 – O que a senhora acha que tinha que voltar pra ficar bom?
R – Não sei, não. Se acabasse a violência, diminuísse mais. Muita paz, muito amor. Que é o desejo. Porque sem paz, sem amor não tem nada. Se terminasse a metade dessas drogas, que isso não termina nunca.
P/1 – Pra gente terminar a entrevista. O que significa pra senhora participar da Ação Griô e estar aqui dando este depoimento?
R – Importância muita alegria, muita felicidade, muito contente mesmo de conhecer as pessoas que eu não conhecia, como eu to conhecendo vocês. Estou muito alegre. É muita felicidade. Graças a Deus.
P/1 – Você conheceu outros mestres?
R – Ainda não.
P/1 – Então, Dona Sartíria, muito obrigada por contar a sua história, lindas as canções.
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