Projeto: Indígenas Pela Terra e Pela Vida
Entrevista de Wenatoa Wenake Parakanã
Entrevistada por Tiago Nhandewa
Entrevista concedida via Zoom (Curitiba/Altamira), 30/03/2023
Entrevista n.º: ARMIND_HV032
Realizada por Museu da Pessoa
Transcrita por Mônica Alves
P/1 – Primeiramente, boa tarde, parente Wenatoa! É um prazer falar contigo, uma honra poder ter alguém representando o povo Parakanã! Gostaria de perguntar para você, que você falasse o seu nome em português e também o seu nome indígena.
R – Olá, boa tarde para todo mundo! O meu nome é Wenatoa Parakanã, da aldeia Apyterewa. Eu não tenho nome em português, só Wenatoa mesmo, em português eu não tenho.
P/1 – Eu gostaria que você também falasse sua idade, onde você nasceu?
R – Tá. Eu tenho 32 anos, eu nasci na aldeia Apyterewa, na TI Apyterewa.
P/1 – Parente, falando em nascimento, geralmente nós temos uma história referente ao dia em que nós nascemos, né? Como sendo um dia muito especial, que às vezes os nossos pais nos contam como foi o dia do nosso nascimento, como foi aquele dia, o que aconteceu. E você, ouviu alguma história do dia do seu nascimento? Tua mãe, teu pai, tua avó contaram como foi esse dia do seu nascimento?
R – Bom, os meus pais nunca me contaram, na verdade. Eu nasci em uma aldeia velha, onde a gente está morando, não é essa aldeia o lugar onde eu nasci, mas, eu nasci na aldeia velha, que é a aldeia chamada Apyterewa. E hoje onde a gente mora é Apyterewa também.
P/1 – Tá certo. Eu falei sobre a sua mãe, eu gostaria que você pudesse contar um pouco sobre ela. Qual o nome dela, a história do lado da família da sua mãe? Se você pudesse falar um pouco sobre ela.
R – O nome da minha mãe é Kotapara Parakanã, o nome do meu pai é Tevirela. Hoje os meus pais moram muito longe, em uma aldeia nova, que é chamada de Tekatawa e tem o acesso muito difícil de chegar até lá. Está muito difícil para eles hoje em dia, porque é só...
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Entrevista de Wenatoa Wenake Parakanã
Entrevistada por Tiago Nhandewa
Entrevista concedida via Zoom (Curitiba/Altamira), 30/03/2023
Entrevista n.º: ARMIND_HV032
Realizada por Museu da Pessoa
Transcrita por Mônica Alves
P/1 – Primeiramente, boa tarde, parente Wenatoa! É um prazer falar contigo, uma honra poder ter alguém representando o povo Parakanã! Gostaria de perguntar para você, que você falasse o seu nome em português e também o seu nome indígena.
R – Olá, boa tarde para todo mundo! O meu nome é Wenatoa Parakanã, da aldeia Apyterewa. Eu não tenho nome em português, só Wenatoa mesmo, em português eu não tenho.
P/1 – Eu gostaria que você também falasse sua idade, onde você nasceu?
R – Tá. Eu tenho 32 anos, eu nasci na aldeia Apyterewa, na TI Apyterewa.
P/1 – Parente, falando em nascimento, geralmente nós temos uma história referente ao dia em que nós nascemos, né? Como sendo um dia muito especial, que às vezes os nossos pais nos contam como foi o dia do nosso nascimento, como foi aquele dia, o que aconteceu. E você, ouviu alguma história do dia do seu nascimento? Tua mãe, teu pai, tua avó contaram como foi esse dia do seu nascimento?
R – Bom, os meus pais nunca me contaram, na verdade. Eu nasci em uma aldeia velha, onde a gente está morando, não é essa aldeia o lugar onde eu nasci, mas, eu nasci na aldeia velha, que é a aldeia chamada Apyterewa. E hoje onde a gente mora é Apyterewa também.
P/1 – Tá certo. Eu falei sobre a sua mãe, eu gostaria que você pudesse contar um pouco sobre ela. Qual o nome dela, a história do lado da família da sua mãe? Se você pudesse falar um pouco sobre ela.
R – O nome da minha mãe é Kotapara Parakanã, o nome do meu pai é Tevirela. Hoje os meus pais moram muito longe, em uma aldeia nova, que é chamada de Tekatawa e tem o acesso muito difícil de chegar até lá. Está muito difícil para eles hoje em dia, porque é só com o pé na estrada que eles vão para a cidade para fazer compras, mas o acesso é muito difícil. Até para o atendimento da vacina e o atendimento de educação estão sendo muito difícil para eles
P/1 – Você tem irmãos, irmãs? Quem são eles? Se você pudesse também falar sobre teus irmãos, quem são eles?
R – Sim, eu tenho. Nós somos 10, sete meninas e três meninos. A minha irmã mais velha, que se chama Mocoya, a segunda sou eu, me chamo Wenatoa, a terceira é a _________, o meu irmão é _________, depois vem o _________, depois vem a Turiana, depois vem o Virera, Cotanara e Cotanera, nós somos em 10, faleceu duas.
P/1 – Muito bem! A respeito ainda da sua família, da sua criação, onde você passou o seu período de infância, de criança, você lembra das histórias que as pessoas, os sábios, os mais velhos te contavam? Tem alguma história assim, que você mais lembra, que marcou a sua vida ou que sempre você está lembrando dela? Alguma história que te contaram?
R – Bom, a história que eu sempre lembro que o meu avô _________, o meu avô falecido contava, uma história que sempre está comigo na minha mente, é uma história de como os Parakanãs surgiram, né. De que os Parakanãs na verdade surgiram de um pássaro, um pássaro que se transformou em forma de mulher e casou com um rapaz que morava sozinho. E até então, lá, muito tempo atrás, uma mulher sempre cantava em forma de pássaro, depois ela resolveu fazer as coisas, fazer farinha, fazer comida para ele, enquanto ele caçava. Então ele tentou descobrir de alguma maneira, então ele fez um plano, “Olha, eu vou caçar hoje, e eu vou fingir que eu vou bem longe caçar, mas eu vou voltar para ver quem está fazendo todo esse alimento, essa farinha que está sempre pronta”. E ele fez esse plano dele, né. Foi caçar e se escondeu. Aí depois a mulher surgiu, aparece fazendo todas as coisas, a comida pronta. Como ele nunca viu uma mulher, ele sempre viveu sozinho, então ele resolveu pegar a mulher. Tinha duas na verdade, uma morena e uma branca. E ele pegou uma morena, e é por isso que o povo Parakanã é assim, de pele morena. É essa história que eu sempre lembro.
P/1 – Muito bem. É tão linda essa história! Além dessa história que você sempre recorda, que você ouviu do seu avô, teve algum aprendizado que você recebeu durante a sua infância, ou quando você já era uma moça? Ainda é moça, né? Ou quando você ainda era uma adolescente, como os não índios falam? Alguma função assim, que você… alguma formação do povo Parakanã que você recebeu enquanto mulher para levar para a vida adulta? Um aprendizado de como, enquanto mulher, você recebeu algum aprendizado assim nesse sentido?
R – Sim, com certeza. Todas as mulheres jovens, desde crianças são ensinadas a serem guerreiras, serem independentes. Quando uma mulher se torna uma moça, tem que ser uma mulher forte, firme e sempre tentar estar do lado do seu companheiro na luta, em qualquer coisa que precise, você tem que estar do lado dele. Ser uma boa esposa, boa mãe também. E ser o exemplo também das outras mulheres, dos seus filhos, das suas filhas e netos. Foi esse ensinamento que eu recebi da minha mãe, da minha avó e dos meus tios também, porque eles davam conselhos também, né. É isso.
P/1 – Muito bem. Eu fiz perguntas sobre a formação na cultura Parakanã, dentro da tradição Parakanã, mas gostaria de saber também sobre a escola, né? Como foi a sua vida escolar? Se você estudou na aldeia? Se você também estudou fora da aldeia? Se você continua estudando? Como que foi e está sendo sua vida no mundo da escola? Se você pudesse contar um pouco sobre a Wenatoa na escola?
R – Sim. Eu não sabia ler, nem escrever, mas eu ouvia os não indígenas conversando, mas falar eu não sabia. Através dos missionários de Gênio e taki, eu aprendi a ler e escrever. Levou um tempão para eu aprender. Eu aprendi a falar em português e escrever foi na sala de aula. Mas depois que eu me envolvi um pouquinho mais, eu fui para o Mato Grosso, eu e o meu esposo, passamos três anos estudando lá. A gente se formou, conseguimos e a gente voltou para a aldeia. Quando a gente voltou para a aldeia, o meu esposo trabalhou também na saúde e eu na área da educação. Depois eu dei aulas para as crianças durante cinco anos. Depois eu parei de trabalhar, mas agora eu vou estar trabalhando novamente na saúde, na sala de leitura com as crianças, na língua indígena. Então foi assim que eu aprendi. Foi na escola que eu aprendi a ler, escrever, depois eu passei um tempo no Mato Grosso estudando e na volta eu ainda continuei estudando.
P/1 – Você disse que, ainda sobre a escola, você começou estudando, né? Com uma missão, né? Com os missionários, aí depois você fala que foi para o Mato Grosso. Como os missionários, foi na missão, ou foi na aldeia que eles te ensinaram a ler e a escrever? E ainda sobre o Mato Grosso, você foi estudar em uma faculdade, ou em uma outra aldeia? Se você pudesse falar um pouquinho sobre isso.
R – Os missionários começaram a dar aula dentro da aldeia. Como eles trabalhavam dentro da aldeia fazendo a tradução, então eles davam aulas para gente né, para as crianças, para os jovens e para os mais velhos. Até então, como eu traduzia a bíblia desde criança, eu fui, assim, aprendendo com eles. Aí eles ajudaram a gente ir para o Mato Grosso, para fazer essa tradução. E lá no Mato Grosso, a gente estudou o ensino bíblico em português também, mas as nossas matérias a gente não teve em faculdade, o que a gente teve foi estudo bíblico. Aí então a gente ficou lá estudando né, e ajudando os missionários também e eles também ajudando a gente, assim, financeiramente, pagando onde a gente estudava. E foi assim.
P/1 – A parente falou que trabalhou durante cinco anos, enquanto professora na escola, ensinando as crianças, como foi ser professora? Você foi aluna, depois você volta para poder ensinar as crianças da comunidade, como que foi essa experiência de ser professora? E agora você também quer voltar. Se você pudesse contar um pouco dessa sua história enquanto professora, como foram esses cinco anos?
R – No início, quando a gente foi para o Mato Grosso, o pessoal do Semesi me convidou para eu dar aula, se eu poderia, né? Então eu gostei muito de dar aula para as crianças, para o terceiro e quarto ano, mas na língua. Eu gostei muito, eu aprendi bastante com os alunos, praticando mais a minha escrita, a leitura, enquanto eu estava fazendo o meu projeto, preparando as aulas para as crianças, o que eu ia fazer, o que eu ia dar. Então foi uma experiência muito boa para mim, eu gostei bastante. É muito bom que a gente ensine as nossas crianças a falarem só na língua, não português, para depois que eles crescerem um pouquinho mais, que eles possam aprender a língua portuguesa. Mas agora, como eu parei durante um ano só, agora eu estou voltando para dar aula de novo, na sala de leitura, para as crianças.
P/1 – Muito bem. Parente, ainda falando sobre crianças, me fez pensar aqui em quando você era criança, além das histórias que você ouvia, tinha brincadeiras? Como que foi durante esse tempo que você era criança? Como era, ali, junto com outras crianças na aldeia, ou com os irmãos? Como foi o seu tempo de criança? E também, depois, se você pudesse falar da mocidade, quando você cresceu, pudesse falar mais um pouquinho sobre isso.
R – Ah, sim, claro! A minha juventude foi mais com os meus pais na aldeia Xingu, na época era onde eles moravam, né. Aí a gente ficava lá na aldeia Xingu, e lá na minha infância, morei muito pouco com os meus pais. Na nossa cultura, basicamente, quando nasce uma menina, ela já era prometida, então no meu caso, quando eu nasci, eu já fui prometida. E quando eu completei 13 anos de idade, eu já fui morar com os pais do meu esposo, né. Então eu não fiquei muito tempo com os meus pais. O tempo em que eu ficava com os meus amigos, com os meus irmãos, era pouco tempo. Então eu saí muito cedo para morar com a família do meu esposo, porque eu já nasci prometida e quando eu cresci, eu já fui morar com os dele.
P/1 – Falando sobre esposo, você foi aos 13 anos morar com a família dele, prometida, e hoje desde de então você tem sua família, tem seu esposo, tem filhos, né? Se você pudesse falar um pouco quem é seu esposo, a origem dele, falar sobre os seus filhos, quem são eles?
R – Sim. O meu esposo, o nome dele é _________, mais conhecido como Waltinho Parakanã e nós temos um filho, que o meu primeiro filho, que é o _________, a segunda filha é a Wenara e a terceira é a Wenaker, nós temos três filhos.
P/1 – Muito bem. Sobre o trabalho você disse que voltou para ser professora, que também é um trabalho e na saúde também, você disse que atua, se eu não tiver enganado, como que foi esse trabalho na saúde ou outro trabalho que você fez na comunidade, também?
R – (não teve respostas)
P/1 – Vamos lá. Parente Wenatoa, agora nós vamos falar um pouco sobre território, você disse que saiu aos 13 anos e foi morar com o seu esposo e aí também teve essas mudanças de território. Se você pudesse falar como que… e tem conflito também, problemas com fazendeiros, madeireiros, mas começando aí por essa mudança, né? Se você, quando casou, foi morar em outro território? Como foi morar em outro lugar? Se você pudesse contar um pouco sobre isso.
R – Então, quando eu saí do lado dos meus pais, para morar com o meu esposo, foi bastante difícil! Foi difícil demais me afastar dos meus pais desde criança. E lá junto com meus tios e minhas tias, que moravam lá onde eu estava morando, lá onde eu moro agora, na aldeia Apyterewa era bastante gente e depois que a Norte Energia chegou, então o povo Parakanã se dividiu e a maioria saiu da aldeia para fazer outras aldeias. Então a Norte Energia trouxe um impacto muito grande entre os Parakanãs, né. Então foi mudando, não era mais o costume como era antes, o povo Parakanã se dividiu, e eram tão unidos e fortes e quando chegou esse Norte Energia, que fez esse Belo Monte, então esse impacto que eles trouxeram dividiu, várias famílias saíram para fazer outras aldeias para ganhar as coisas do Norte Energia. Então esse impacto trouxe a fraqueza para nós, o povo Parakanã. E também essa Norte Energia de Belo Monte, que eles construíram, e eles prometeram tantas coisas que eles não fizeram, não cumpriram as promessas deles. E uma coisa que eles foram falar para a gente lá na aldeia Apyterewa na nossa TI, dizendo que antes deles fazerem a Belo Monte, eles iam tirar todos os fazendeiros, garimpeiros de dentro da nossa TI, uma coisa que eles não fizeram, só fizeram a promessa e eles não fizeram. E para muitas aldeias novas, eles prometeram tantas coisas também, muitas coisas que não estão acontecendo. O que a gente está cobrando muitas vezes deles, até hoje a gente está lutando, é que aconteça essa difusão, umas das condições que eles prometeram, mas que infelizmente só falaram e não cumpriram.
P/1 – Quanto tempo já está esse problema, tanto com a questão aí da hidrelétrica, da Eletronorte, né? E outra coisa também que eu gostaria de te perguntar a respeito do atendimento por parte do governo, né. Como que tem sido o tratamento… nós tivemos, agora nós entramos em um outro governo, né? Mas como foi no governo anterior esse tratamento com vocês, com relação a esse problema territorial que vocês estão?
R – Bom, esses quatro anos, nesses quatro anos o governo que passou agora não fez nada para a gente, para o Povo Parakanã. Só tem entrado mais fazendeiros, garimpeiros e até a gente recebeu em mensagens, ameaças dos fazendeiros, ameaçados as nossas lideranças, o principal, né. E eles fizeram de tudo, de tudo para que as lideranças fizessem acordos com eles, para dar um pedaço da nossa terra para eles. Então os fazendeiros intimidaram as nossas lideranças, fizeram de tudo, como eu disse, levaram eles para Brasília, para falar com as autoridades para ver se nós fazíamos a divisão da TI Apyterewa para os fazendeiros, invasores, né. Então no governo do Bolsonaro a gente não conseguiu nada, a gente não recebeu uma coisa que alegrava o povo, na verdade o Bolsonaro nunca ligou para a gente. Nesses quatro anos a gente não viu ação dentro da nossa TI Apyterewa, a gente só viu destruição, invasão e os garimpeiros sujando o nosso rio, que a gente não pode nem tomar água, nem fazer a nossa comida. Então nesses quatro anos a gente não viu uma coisa boa, a gente só viu a destruição, a poluição de água. Então nesse governo, a gente está esperando que o governo de hoje, que é o nosso presidente Lula, que é a favor dos indígenas, que está ajudando, a nossa esperança é que ele tire todos os fazendeiros e os garimpeiros da TI Apyterewa.
P/1 – Assim como a gente tem acompanhado o caso dos Yanomamis, que eles estão tendo problemas com a questão alimentar, esses impactos que o garimpo tem causado lá para os territórios, tanto a questão da saúde também. Aí no território de vocês, vocês estão enfrentando algum problema com relação por parte desse impacto do garimpo, na saúde das crianças, contaminação da água, alguma coisa assim?
R – Sim. Falando em contaminação, o nosso rio hoje não está mais como era antes. O rio Bonjardim que era bem claro, está bem sujo e o rio Xingu está bem sujo também, a cor mudou e o rio Bonjardim também, está tipo um leite, branco, branco. Então recentemente a gente recebeu a notícia da minha sobrinha, de que o cabelo dela estava caindo, não sei se era o rio que estava fazendo isso. O nosso medo é que… o medo que a gente tem é que seja o mercúrio, mas não sabemos, mas o medo é muito grande, porque sobre saúde, a nossa saúde não é uma coisa boa também, outra luta que a gente está com as outras lideranças, com os conselhos distrital e local. Então a nossa saúde é precária. E uma das coisas que a gente está lutando para conseguir para melhorar a nossa saúde e atendimento, é que tenha um prédio próprio, que é chamado de Casai, onde os pacientes que ficam no hospital, após o hospital, saíam para ficar na Casai para se recuperar. Então a gente está ficando em uma casa alugada. Uma das condicionantes que a Norte Energia prometeu, foi construir o Casai para os indígenas e não está acontecendo. E para o início desse mês, a gente recebeu a notícia dizendo que os indígenas poderiam sair da Casai, porque a casa onde os pacientes estão se recuperando é alugada e parece que falaram para eles que o aluguel aumentou. Então eles falaram para a gente sair da Casai, mas não sabemos para onde vão os indígenas, saindo de lá, para onde que vai? Se não tem nenhum lugar para serem atendidos. E o hospital também é uma das coisas que a gente está lutando, para ter o hospital próprio para os indígenas, que seja só para os indígenas serem atendidos, para fazer cesárea, entre outras coisas também.
P/1 – Muito bem. Você falou da cesárea, falou do atendimento no Casai e que vocês estão lutando para que tenha essa Casai, e como é o atendimento lá na comunidade por parte da Sesai? Vocês têm pessoas que trabalham na área da saúde? Você disse que o seu esposo trabalhava, como está o atendimento lá? Tem a equipe da Sesai que atua lá no atendimento médico, odontológico? Enfim, como está sendo esse atendimento? Vocês têm estrutura lá na comunidade?
R – Sim. Todo mês está indo uma equipe para atender os que estão na aldeia. Então, essa é uma outra coisa que a gente se preocupa, porque a maioria dos Parakanãs se dividiram para fazerem outras aldeias novas, fizeram aldeias em uns acessos muito difíceis. Então as equipes estão indo nas aldeias que ficam na beira do rio, que é mais fácil de atender. Mas e o resto que fica lá dentro? Como _________, ficam muito lá dentro do nosso TI, então a equipe que vai, não vai até lá. Os nossos parentes faltam tomar vacinas, fazer consultas e outras coisas também. E só vai até na aldeia Paredão e na Apyterewa e no rio Bonjardim, onde fica Tatu, Itapema.
P/1 – Parente Wenatoa, você estava dizendo a respeito do atendimento na saúde, a questão do transporte, da equipe para fazer esse atendimento de campo nas comunidades e as dificuldades que aquelas aldeias novas, que estão mais distantes e não tem esse atendimento, como tem as que estão mais próximas dos rios. E ainda falando nas questões das comunidades, eu pensei aqui na questão do atendimento da escola também, né? Na sua época você estudou com os missionários e agora como está sendo esse atendimento escolar para as crianças e para os jovens? As comunidades têm escola? Tem professores? Como está sendo a educação escolar indígena?
R – Sim, claro. Na minha época, quando eu estudava, não tinha escola estruturada como tem agora. E agora a escola atende os adolescentes, as crianças e o jardim também, o que não aconteceu na minha época. Então na aldeia onde eu moro é o Polo que vai acontecer o ensino médio, graças a Deus, porque é outra luta que a gente teve e a gente conseguiu. E tem quatro aldeias que a gente conseguiu a escola estruturada, tem a Paranopiona, tem a Apyterewa, tem Xingu e a Raio de Sol, essas quatro que estão atendendo as aldeias novas, onde os alunos vêm para estudar.
P/1 – Esses impactos que estão tendo por parte dos fazendeiros, a Norte Eletro, impacta diretamente nas florestas, nos rios, e hoje, como que está isso com relação às florestas, as caças, os peixes? E se você pudesse também falar qual a importância das florestas e dos rios para o povo Parakanã e para sua comunidade? Qual é a importância do meio ambiente para vocês?
R – Esse impacto trouxe uma coisa que a gente não é acostumado, que é o desmatamento, a poluição da água. E o que nós indígenas, povos Parakanãs, a gente não gosta de coisas derrubadas com a floresta, para nós, a nossa floresta, a nossa terra é muito importante, porque é da nossa floresta que a gente tira os nossos recursos, o nosso alimento, a gente traz algumas sementes para fazer os nossos artesanatos, e se não tiver isso, a nossa terra para nós, se não tiver a terra, como nós vamos conseguir as nossas coisas? Como que a gente vai sobreviver? E o rio também é muito importante para nós, para a gente tomar um banho, lavar a roupa, para fazer comida, pescar e se a água estiver poluída, de onde que a gente vai tirar peixe? Vamos ter que comprar, né? Como acontece na cidade, uma coisa que não é da nossa cultura, comprar, né? É uma coisa da cidade. Então tudo isso para nós, o povo Parakanã, é muito importante que a gente cuide, proteja, lute, porque é nosso, o que é nosso a gente tem que cuidar, proteger e lutar. Uma coisa que a gente não quer que aconteça é destruir e perder. Também garantir o futuro das nossas crianças e dos nossos netos. Antigamente só existiam duas aldeias, que é Apyterewa e o Xingu, mas agora, hoje, tem 20 aldeias, isso significa que o povo Parakanã está crescendo e muito! O total do povo Parakanã é de 940, o total está em quase 1.000. Então isso significa que está crescendo muito rápido.
P/1 – Muito bem. Eu vejo que você tem essa preocupação com essa luta, essa atuação também, dá para ver na sua fala, e hoje as mulheres, as guerreiras indígenas, elas estão assim, ocupando espaços importantes na luta pelos direitos dos povos indígenas. Eu gostaria que você pudesse falar, tem a Joenia, tem a Sônia Guajajara, enfim, essas que você deve conhecer, né? E gostaria que você falasse como é a atuação sua enquanto mulher Parakanã, ou as outras mulheres Parakanãs, como que vocês têm ocupado esses espaços de luta? Como tem sido essa posição de vocês, das mulheres Parakanãs?
R – Sim. Eu sou a primeira mulher do povo Parakanã a ser presidente da associação, representando o meu povo juridicamente. É uma coisa nova para mim, é difícil também, mas a gente vai aprendendo. Eu comecei a participar assim, nas reuniões junto com o meu esposo, uma coisa que eu nunca gostava e nem participava também, e foi assim que eu fui aprendendo também, né? Mas aí, eu também ajudando as outras mulheres a traduzir o português para a língua, quando acontecia a reunião, eu tinha muita vergonha na verdade, de participar, mas aí com o conselho do meu esposo, ele sempre me aconselhou a ser uma guerreira, sempre ele falava: “Você tem que ser uma mulher que, um dia talvez, você vai estar falando em público”. Então para mim é uma coisa nova ser representante do povo Parakanã. Não é uma coisa fácil, sempre vai vir uma dificuldade, uma luta. Mas quando eu fui participar da posse da parenta né, em Brasília, então isso me aconselhou muito, porque as mulheres estão ocupando os espaços importantes, uma coisa muito importante para todas as mulheres, né. Que as mulheres que nunca participaram da reunião, possam estar também se animando e participando mais. E para aqueles que pensam que as mulheres não podem, as mulheres podem sim estar na frente, as mulheres também são fortes, são guerreiras e tem voz também. Então é uma coisa muito importante para mim e para todas as mulheres Parakanãs. E eu fico feliz de estar aqui falando com vocês, é uma coisa muito importante para mim.
P/1 – Muito bem. Parabéns a todas as guerreiras por isso! Parabéns a você! Parente, agora falando sobre o tema da Covid 19, nós estamos ainda vivendo com esse vírus em todo o mundo, como que foi para vocês o impacto de chegar essa pandemia aí nas comunidades? Como que vocês enfrentaram isso? Vocês tiveram alguma perda? Pessoas faleceram? Tiveram ajuda? Gostaria que você pudesse contar como que foi esse enfrentamento, como que chegou essa pandemia aí para vocês?
R – Bom, para nós foi muito difícil, muito, muito difícil mesmo de estar na aldeia. A gente praticamente ficou meses na aldeia sem sair para a cidade, com medo de pegar Covid 19. E só a pessoa que ficava doente, que ficava na Casai, mas o resto, que ficava na aldeia não saía. Então para sair para fazer compras das coisas que a gente precisava, a gente não podia sair com medo de pegar e trazer para o nosso povo também. E a Funai ajudou bastante a gente também, de levar cesta básica, coisas que a gente estava precisando e outras coisas também. o TNC também, o órgão que trabalha para a gente, um parceiro nosso, o Cime também. Então a gente perdeu um parente, um tio, falecido Mocoa, ele estava na cidade e quando ele voltou, ele já estava com o Covid, já cansado. Então ele foi removido para a cidade, infelizmente ele veio a óbito. Então a gente perdeu um parente nosso por causa desse Covid 19, então não foi uma coisa fácil pra gente, foi muito difícil, também. Mas mesmo assim, uma coisa interessante também no início da pandemia, o povo parakanã teve uma festa uma atrás da outra, mesmo com a Covid 19 que estava matando muita gente, então a gente estava concentrado lá na aldeia fazendo festa, pedindo para Deus proteger todos os povos indígenas só com cânticos de Deus. Então uma coisa muito interessante que aconteceu com o povo Parakanã.
P/1 – Eu fiquei aqui pensando a respeito do que você disse dessas festas que ocorreram, que vocês tiveram esse fortalecimento, que pediram para Deus, vocês fizeram algum uso de plantas para se prevenirem contra a Covid 19? De remédios da floresta, plantas medicinais para poderem se prevenir contra a Covid? E uma outra coisa também, sobre a vacinação, né? Como que foi a vacinação de início, vocês receberam as vacinas? Receberam até agora? Estão sendo vacinados com todos os ciclos da vacina? Como que foi isso? Se vocês fizeram uso dos remédios tradicionais do mato? E também a vacinação, né? Se vocês receberam? Foi bem aceita a vacina? Como que foi isso?
R – Bom, foi difícil para a gente tomar remédio, mas a gente ficou com medo também, né. “Será que vai funcionar, ou será que esse remédio vai matar a gente?”. Aquele medo, né. Mas no início a gente ficou preocupado, ficou com medo, com medo de tomar a vacina. Mas a gente tomou sim os remédios medicinais, que eu nem lembro o nome, eu até esqueci o nome. E a outra é a quina, que é mais amarga, que a gente estava tomando todos os dias. Então até a vacina chegar na aldeia foi muito difícil, muita gente não tomou por causa do medo, e muita gente também tomou porque confiaram que essa vacina ia proteger, mas mesmo assim, a maioria não teve essa coragem de tomar essa vacina.
P/1 – Muito bem. Depois de você me falar da sua trajetória desde quando você era criança, desde quando você nasceu, a luta aí pelo território e esses problemas que tem com o garimpo, com os fazendeiros, enfim, e também essa luta pela vida, contra o vírus do Covid 19 e você está aí hoje falando desse lado, falando com a gente aqui, eu gostaria de saber de você, quais são as coisas hoje, assim, que você acha mais importante para a sua vida, para o seu povo e os seus sonhos, né? Quais são os seus sonhos? O que você quer deixar assim de legado, de história, de experiência para os mais jovens?
R – Bom, essa é uma pergunta muito importante e muito legal também! Nos meus conhecimentos, o que eu quero deixar para o meu povo, para as novas gerações, é que eles não percam a nossa cultura e a nossa língua materna, que jamais podem trocar pela língua portuguesa. Porque a maioria dos nossos parentes que foram contatados há muito tempo, já perderam a língua, a música, a comida. Então eu quero deixar para eles a língua materna e a nossa cultura firme, dizer que não podem perder, para depois querer resgatar de volta, podem até resgatar, mas não vai ficar 100% como está.
P/1 – Bom, eu fiz várias perguntas para você, talvez você veio hoje aqui querendo contar alguma coisa que eu não tenha perguntado, então eu deixo esse espaço, caso você queira acrescentar alguma coisa que você ache importante falar, deixar nesse registro, que eu não perguntei, então você pode falar também.
R – Eu quero dizer também, perguntar para vocês, que nunca nós mulheres recebemos esse convite né, convite de fazer entrevista e conhecer novos parentes, então nós queremos participar mais nas reuniões, nos encontros das mulheres, para que a gente possa fortalecer mais a nossa força e conhecer politicamente, né. É uma coisa que é nova para mim e é muito importante estar aqui, de verdade! Eu agradeço a todos vocês! Eu agradeço a menina, como é o nome?
P/1 – Edilza.
R – Edilza, que ela falou comigo também. E eu te agradeço também, que tu falou comigo. Quando eu recebi a mensagem, eu falei: "Uau, será que eu vou estar lá? Vou chegar amanhã para participar!”. Então eu agradeço muito!
P/1 – Eu ia fazer justamente essa pergunta agora para finalizar, né. A gente ouve muitas histórias né, de pessoas contando suas histórias e o projeto é isso, é valorizar as pessoas né, por isso que se chama Museu da Pessoa, é um museu que valoriza as histórias de vida das pessoas, o que elas contam sobre suas trajetórias de vida. E eu já perguntei para outros entrevistados, como que foi contar a sua história, e eles, “Olha, eu nunca parei para pensar, eu nunca tinha falado sobre a minha história”. Então para você, parente, como que foi contar a sua história hoje? Eu sei que você já falou um pouco, mas como que foi contar a sua história?
R – É muito importante contar a história né, deixar registrado também né, para que os outros conheçam também, como eu conheço a história de muitas mulheres indígenas de fora, história muito linda que é registrada, que a maioria conhece, então contando minha história é uma coisa muito importante. Nem todas as mulheres têm suas histórias também registradas, então para mim é muito importante que muitas mulheres possam conhecer a minha história, a minha luta, a minha dificuldade. A luta nunca para, sempre continua. Então contando a minha história, eu quero deixar registrado que um dia eu lutei e ajudei o meu povo. Então contando a minha história aqui, é muito importante para mim.
P/1 – Muito bem. Eu acho que é isso. Eu quero agradecer por você ter vindo aqui ter saído lá da comunidade, viajado para Altamira. E também a todos que nos ajudaram, ajudaram você, o Paulo. Espero te conhecer pessoalmente, espero que você cada vez mais tenha essa representatividade, que possa estar também junto com as outras guerreiras e quem sabe né, atuando também nesses espaços importantes, né. Com certeza você já atua nesses espaços. Quem sabe a gente se encontre em Brasília, no acampamento Terra Livre, talvez né, a gente se vê por aí qualquer dia. E agradecer! É uma oportunidade para eu também conhecer mais um parente, uma parenta né, Parakanã, eu sou Guarani. Então agradecer a você por disponibilizar o seu tempo, de estar aqui junto com a gente! Então deixo esse espaço para você fazer suas palavras finais.
R – Obrigada a todas as organizações que me ajudaram a vir até aqui, porque eu moro muito longe, para vir até aqui tem que ter uma logística, é muito demorado também para chegar até Altamira para fazer essa entrevista. Então muito obrigada por essa oportunidade de estar aqui compartilhando e aprendendo com vocês! Então a gente se vê por aí, na Tele, em outras reuniões, quem sabe. E muito obrigada, agradeço muito!
P/1 – (inaudível)
R – _________ quer dizer obrigada. Muito obrigada!
P/1 – Obrigada! Em Guarani a gente fala, Ayvetê. Ayvetê!
R – Quase igual.
P/1 – Da mesma família né, linguística.
R – Tupi.
P/1 – É Tupi.
[Fim da Entrevista]
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