“Caso dos meninos emasculados: governo garante pensão às famílias. Deputado anuncia a assinatura de um Pré-Acordo de Composição Mista, na Comissão Interamericana de Direitos Humanos da OEA, pelo qual o Estado do Maranhão se compromete, dentre outros benefícios, a conceder pensão especial...Continuar leitura
“Caso dos meninos emasculados: governo garante pensão às famílias. Deputado anuncia a assinatura de um Pré-Acordo de Composição Mista, na Comissão Interamericana de Direitos Humanos da OEA, pelo qual o Estado do Maranhão se compromete, dentre outros benefícios, a conceder pensão especial mensal de cunho indenizatório, no valor de R$500, a famílias de meninos emasculados pelo período de 15 anos.” (al.ma.gov.br, em 26/10/2005)
A maioria das pessoas que tomou conhecimento da notícia acima talvez não tenha noção dos caminhos que levaram à construção do acordo citado.
Tudo começa em 1991. O Centro de Defesa dos Direitos de Crianças e Adolescentes Pe. Marcos Passerini (CDMP) acaba de ser criado quando acontece o primeiro dos casos que ficaram conhecidos como “caso dos meninos emasculados”. Ranier Silva Cruz fora violentamente assassinado e seus órgãos genitais tinham sido extirpados. A partir de então, outros casos aconteceram, vitimando 29 crianças e adolescentes do sexo masculino, todas nas mesmas circunstâncias.
A negligência do Estado para com os casos incomoda o CDMP. Para os investigadores, os casos não tinham nenhuma ligação entre si, apesar de apresentarem as mesmas características. Inquéritos foram perdidos. As autoridades competentes não tinham nada a dizer. As famílias ficavam sem respostas.
Para o Centro, sempre existiu uma conexão entre os casos e o Estado precisava assumir a responsabilidade na resolução dos mesmos. Inicia-se o acompanhamento às famílias. Foi um longo percurso: visitas às delegacias junto com os familiares das vítimas, audiências com secretários de segurança, com delegados, reuniões com as famílias, passeatas e tantas outras ações de mobilização e defesa de direitos. Esse processo gera o Projeto Cidadanear, que por sua vez resulta na criação do Fórum Intermunicipal pelas Crianças e Adolescentes da Grande São Luís.
Ante a postura do governo do Maranhão, o CDMP representou contra o Estado brasileiro na Comissão Interamericana de Direitos Humanos da OEA. Foram três anos de acompanhamento processual. Audiências, apresentação de informes semestrais, juntada de documentos, atualização dos relatórios, negociações com representantes dos governos federal e estadual, tendo a primeira tentativa de acordo amistoso fracassado. Finalmente, após um ano, em nova audiência em Washington, EUA, o governo do Maranhão reconhece que falhou na investigação dos casos e, com a mediação da Comissão Interamericana dos Direitos Humanos, celebra o acordo nos termos citados acima. Foram 14 anos de luta até se chegar a essa conquista.
Esse é apenas um dos processos emblemáticos desenvolvidos pelo CDMP ao longo da sua história. Outras ações foram feitas. Em 1997, coordena a Campanha contra o Abuso e a Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes, que resulta no Projeto Rompendo o Silêncio, que gera a elaboração e implementação do Sistema de Atendimento a Casos de Violência contra Crianças e Adolescentes em São Luís.
O combate ao trabalho infantil tem sido outra das suas bandeiras. Desenvolve campanhas educativas contra o trabalho infantil doméstico e o Projeto Cata-Ventos de Liberdade em Timon, Santa Inês, Imperatriz e São Luís, visando à retirada de crianças e adolescentes do mundo do trabalho para inseri-los na escola.
Desde sua criação, o CDMP atua na implantação e capacitação dos Conselhos de Direitos e Tutelares. Desenvolve ainda o Projeto Semente de Girassol, capacitando agentes sociais para o enfrentamento à violência doméstica. E, em parceria com o Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente, desenvolve o Observatório Criança, que monitora os dados sociais e orçamentários sobre a infância e adolescência no Maranhão.
Esse quadro mostra parte daquilo que vem sem feito pelo CDMP para ajudar a construir uma nova cultura social que respeite e valorize crianças e adolescentes como sujeitos de direitos, na busca pela efetivação do Estatuto da Criança e do Adolescente.
Os resultados já alcançados ao longo dos anos expressam que o CDMP está cumprindo a sua missão. Muitas mudanças já ocorreram, principalmente na cultura das instituições e das pessoas que lidam com os direitos de crianças e adolescentes em nosso Estado. E essas mudanças podem ser creditadas, em parte, ao papel assumido pelo CDMP e por outras organizações que lideram a luta em defesa da infância e adolescência no Maranhão.
Estamos caminhando rumo a uma nova relação da sociedade maranhense com suas crianças e seus adolescentes. Por mais que muitas crianças ainda sejam vitimadas, é preciso reconhecer os frutos de uma história de luta pela garantia dos direitos, onde o papel do CDMP tem sido fundamental no Maranhão e no Brasil.
Rogenir Almeida Santos Costa, sócia fundadora e ex-coordenadora do CDMP (1995 a 1999)Recolher