Entrevista de José Libério Pimentel
Entrevistada por Luiz Egypto
29/03/2021
Realização: Museu da Pessoa
Entrevista número SINPRO_HV013
Transcrito por Aponte
Revisado por Luiz Egypto
00:00
P/1 - Bom dia, Professor Libério! É um prazer tê-lo conosco. Eu queria que o senhor começasse dizendo...Continuar leitura
Entrevista de José Libério Pimentel
Entrevistada por Luiz Egypto
29/03/2021
Realização: Museu da Pessoa
Entrevista número SINPRO_HV013
Transcrito por Aponte
Revisado por Luiz Egypto
00:00
P/1 - Bom dia, Professor Libério! É um prazer tê-lo conosco. Eu queria que o senhor começasse dizendo o seu nome completo, o local e a data do seu nascimento.
R - Bom dia Luiz! É uma satisfação muito grande conversar com vocês. Eu me chamo José Libério Pimentel e nasci numa cidade próxima a Belo Horizonte, Minas Gerais, Abaeté. E de lá eu me mudei para o Goiás, depois Brasília, Rio de Janeiro, mas eu sou mesmo de Minas Gerais, de Abaeté.
00:49
P/1 - E a data do seu nascimento, por favor?
R - A data do meu nascimento é 06 de agosto de 1948.
01:03
P/1 - Senhor Libério, o nome dos seus pais, por favor?
R - Minha mãe, Maria José da Silva, e meu pai, Aprígio Pimentel da Silva.
01:18
P/1 – E qual era a atividade do seu pai, o que ele fazia?
R - Meu pai, de origem muito humilde, e minha mãe também, nós fomos para o interior do Brasil. Meu pai trabalhava de servente aqui no hospital da cidade que eu moro até hoje, Sobradinho, Distrito Federal, e minha mãe era merendeira de escola.
01:52
P/1 - O senhor conheceu os seus avós?
R – Eu cheguei a conhecer meus avós, meus avós maternos, os paternos eu não conheci.
02:10
P/1 - O senhor sabe o nome deles?
R - Minha avó materna era Francisca, mas eu não sei o sobrenome, e meu avô materno era Antônio, também não sei o sobrenome.
02:36
P/1 - E da outra parte, os outros avós?
R - Não, [Os outros avós] esses a gente não teve nenhum tipo de convivência com ele, parece que eles faleceram cedo, alguma coisa assim.
02:52
P/1 - Como é que era Abaeté, como é que era a sua cidade, a cidade que o senhor nasceu, a cidade da sua infância, como é que era?
R – Uma pequena cidade de interior. Eu fui lá depois né, depois de adulto, depois de professor e tal, e uma cidade pequena, bem pequena.
03:21
P/1 - Foi lá onde o senhor esteve na sua primeira escola?
R - Não, na verdade nós viemos de Abaeté para Goiás e nós fomos morar no interior, Inclusive, é a cidade de Zezé de Camargo e Luciano, chamada Vila Propício. Na verdade eu comecei a estudar em Brasília aos 12 anos de idade, porque lá nós aprendemos a ler, mas era minha irmã, que estudava em colégio de freira, que ensinava a gente. E a gente lia nas latas, essas latas de óleo e tal, a gente lia nelas. Eu fui dentro de escola mesmo aqui em Brasília, aos 12 anos na mesma cidade de Sobradinho.
04:23
P/1 - Eu não lhe perguntei sobre os seus irmãos, o senhor tem irmãos?
R - Eu tenho muitos irmãos, agora diversos já faleceram. Eu tenho 12 irmãos e irmãs
04:44
P/1 - O senhor sabe o que motivou a mudança da família para Sobradinho?
R - Olha, nós primeiro nós viemos da Vila Propício para uma cidade que foi tomada pelo lago, nós fomos para a Vila Amauri, da Vila Amauri é que nós viemos para Sobradinho. Naquela época Sobradinho era só mato, mas como a cidade de Vila Amauri foi sendo tomada pelo lago, nós mudamos com ajuda da prefeitura que colocou à disposição os caminhões e tal. Isso foi em 1959.
05:45
P/1 - E o seu pai fazia o quê em Brasília?
R - Meu pai era servente do Hospital de Sobradinho
06:00
P/1 - E a sua primeira escola formal que o senhor frequentou, já foi aqui em Sobradinho?
R – A primeira foi em Sobradinho. Para não passar muito tempo e tal, eu e meu irmão mais velho dos homens, o Cirilo, nós fomos estudar aqui em uma escolinha do governo em Sobradinho, e começamos no segundo ano, na segunda série do primário, nós não fizemos primeiro.
06:41
P/1 - Algum professor ou alguma professora que tivesse marcado a sua lembrança nesse período?
R - Eu tive uma professora chamada Miriam, a professora Miriam marcou meus estudos.
07:08
P/1 - Porque hein professor? O que ela tinha de tão especial?
R - Ela era muito boa, muito cuidadosa com os alunos, muito delicada e isso nos marcava, e principalmente nós que éramos muito humildes, nossa família era muitíssimo humilde, e isso marcou bastante gente.
07:36
P/1 - Como é que era a casa em que vocês moravam? Você poderia descrever a casa como era?
R - Luiz, nós inicialmente aqui em Sobradinho, nós moramos em baixo de uma árvore, por que o barraco que a gente morava lá na Vila Amauri, quando chegou aqui, ele não deu mais um barraco, então nós ficamos dependendo, inclusive as telhas quebraram todas, e nós ficamos embaixo de uma árvore até que minha mãe foi até o prefeito, o doutor Henrique Tam, e ele arrumou um pouco de madeira e eu lembro até... 29 telhas, essas telhas grandes, e aí arrumou também pessoas para refazer, instalar o barraco e aí é que nós tivemos uma casa para morar. Aí depois a gente foi devagarinho, construindo e chegamos a ter duas casas aqui de Sobradinho, construída com muito esforço, com salariozinho da minha mãe, a gente também ajudava, eu era engraxate, meu irmão era engraxate. Além de engraxar sapatos nós também trabalhamos vendendo laranja, depois meu irmão comprou um tabuleiro de quebra-queixo e nós passamos também a vender quebra-queixo. Então nessa luta nós fomos ajudando minha mãe e ela e meu pai e eles foram construindo, de forma que nós fizemos casinhas modernas, modestas, modernas não, modestas. E aí nós chegamos a ter duas casas aqui em Sobradinho.
09:35
P/1 - Como é que essa criançada se divertia, quais eram as brincadeiras que vocês faziam, que vocês mais gostavam?
R – Olha, nós brincávamos de tudo né, a gente jogava finca, a gente tinha pião, na época a gente não era muito invocado com pipa não, a gente até soltava, mas era só eventualmente, o que a gente fazia mais era bola de gude, finca, pião e andar de bicicleta. É tanto que eu até hoje sou craque, ando de costas na bicicleta, entende, e eu possuí várias bicicletas, eu mesmo consertava minhas bicicletas, tirava uma peça de uma e colocava na outra e tal. Então era normalmente esse tipo de diversão que a gente tinha. Depois teve um cinema que a gente também ia, mas no cinema passava muito o filme com censura de 18 anos e não deixavam a gente entrar e tal. Então era mais andar na rua. E vinha circo também, de vez em quando vinha um circo para nossa cidade, a gente tinha aquela brincadeira de furar lona, primeiro que não tinha dinheiro para pagar, e depois, que era uma farra a gente entrar ali por trás do circo e assistir ao espetáculo sem pagar nenhum centavo.
11:22
P/1 - Enquanto isso os estudos continuavam né, como é que o senhor foi seguindo seus estudos.
R – Olha Luiz, os estudos, nós tínhamos muita vontade de estudar, e na segunda série quando nós entramos, eu digo nós, é eu e meu irmão dois anos mais velho que eu, que inclusive já é falecido. O Cirilo tirou em primeiro lugar até o quinto ano, aliás, ele não fez o 4°, a professora passou ele do 3º para o 5º e ele tirou tudo em primeiro lugar. Eu tirei o primeiro lugar no segundo ano, eu tirei bastante primeiro lugar, a partir do terceiro eu comecei a brincar muito e não fiquei muito mais em primeiro lugar. Aí foi quando meu irmão foi para servir à Aeronáutica e logo em seguida eu fui para Marinha do Brasil.
12:34
P/1 - E como é que foi esse período na marinha?
R – Luiz, foi um período muito bom. Quando eu cheguei na 5° série primária, apareceu aqui em Sobradinho um concurso para aprendiz de marinheiro, e eu enfrentei esse concurso e passei. Aqui em Sobradinho tinha 37 concorrentes, só eu passei. Concurso para ser aprendiz de marinheiro. Uma vez aprovado, aí fiz os exames de saúde, aquela coisa, e uma vez aprovado eu fui para o Espírito Santo, eu fui para Vila Velha, onde é a escola de aprendiz de marinheiro do Espírito Santo. Lá eu passei um ano e seis meses estudando, a gente só saía fim de semana, eu passei um ano e seis meses estudando, praticando muito esporte e tal, isso foi de 1964 a 1966. Em 1966 eu jurei bandeira e sai batido. Aí fui para o Rio de Janeiro e passei 12 anos no Rio de Janeiro servindo a Marinha do Brasil. Eu saí da Marinha como terceiro sargento. Eu fiz concurso para sargento, passei, fui para escola de sargento e na escola de sargento eu consegui servir, aliás, depois da escola de sargento eu consigo servir na Escola de Técnicas de Ensino da Marinha, uma escola com curso de técnica de ensino muito bom, eram 720 horas-aula. Eu fiz um curso de técnica de ensino e fiquei dando aula de comunicação oral, o que eu faço até hoje, depois de alguns avanços no aprendizado, até hoje eu faço live de como falar em público, e eu sigo a linha do
, norte-americano que formou milhões de pessoas nessa linha. Então minha trajetória foi basicamente isso aí, eu passei 13 anos na Marinha do Brasil, fiz o curso superior de Letras em português/inglês no Rio de Janeiro, quando eu terminei o curso eu tentei uma transferência para Brasília. Porque meus pais ainda moravam aqui, e não consegui. Então eu dei baixa na Marinha, em 1977, saí como terceiro sargento, mas desempregado. E aí fiz concurso para Fundação Educacional de Brasília, fiquei até meio chateado, porque eu passei em segundo lugar. Eu costumo estudar muito quando eu vou fazer um concurso, eu passei em segundo e teve uma professora que tirou mais nota do que eu. Comecei como professor da Fundação Educacional, e aí fiz um concurso para mestrado em Linguística na Universidade de Brasília. Luiz, o pessoal indicavam 5 livros, teve gente que não leu nenhum, eu lembro de gente que leu dois, um. Eu li os 5 e mais 35. Então eu passei em primeiríssimo lugar, ganhei bolsa da CAPES e tal, mas não cheguei a defender a tese, estudei bastante, mas não cheguei a defender a tese porque eu caí na besteira de me candidatar a presidente do Sindicato dos Professores daqui de Brasília, isso, depois de uma greve muito forte que nós fizemos em 1979, nós fizemos uma greve durante o regime militar, nessa greve eu fui demitido da fundação, depois readmitido, e aí fui ser presidente do sindicato e não tive mais tempo para defender a minha tese de mestrado.
17:39
P/1 - Professor, eu queria voltar um pouquinho atrás, porque veio de uma associação profissional até o sindicato ser autorizado em 1979, poucos meses depois o sindicato convoca uma greve e o ministério do trabalho intervém no sindicato, como é que foram essas circunstâncias? Eu queria que o senhor descrevesse mais detalhadamente como é que se deram esses fatos?
R – Bom, quem fundou a Associação Profissional dos Professores, foi o professor Olímpio Gonçalves Mendes, recentemente falecido aos 80 anos. E o Olímpio chegou a ficar no sindicato um mês, porque o sindicato foi criado, e o presidente era o Olímpio, e recebeu essa intervenção do governo, entrou lá o interventor e tal, então passou-se um período grande sob intervenção. O sindicato entrou em intervenção em 1979, acredito que 6 meses depois foram abertas as eleições. E foi aí que eu me candidatei, tinha lá uma junta governativa de professores e eu me candidatei a presidente, nós formamos nossa chapa, e no meio do ano de 1980 houve a eleição e eu ganhei essas eleições, e ganhamos muito bem.
19:29
P/1 - O que levou o senhor a candidatar-se?
R - Hein?
19:38
P/1 - O que levou o senhor a se candidatar, a formar a chapa Ação Sindical? Qual foi a motivação de tudo isso?
R - Luíz, depois da greve eu estava dando aula em Sobradinho e recebi um grupo de professores me chamando para coordenar esse trabalho. Por que isso? Porque durante a greve de 1979 eu me destaquei muito, eu fui uma das 39 lideranças que foram demitidas da Fundação Educacional devido à sua atuação na greve. A secretária de Educação era uma pessoa, tipo coronel de saias, muitíssimo autoritária, então ela nos retornou e deixou três pessoas de fora né. Então o pessoal foi atrás de mim, eu estava em sala de aula aqui em Sobradinho, quando eles me chamaram para conversar e disseram que eu seria a pessoa indicada para liderar o processo dos professores daí para frente. Eu aceitei, fiz uma análise achei que seria bom, aceitei e passei 3 anos como presidente do sindicato. Aliás, tem uma coisa curiosa, nós ficamos de 1980 a 1983 lá no sindicato, trabalhando, e aí 1983 veio a eleição, a eleição era de 3 em 3 anos, e o pessoal, a oposição, formaram uma chapa e veio concorrer comigo. Aí nós ganhamos, nossa chapa ganhou de 83% a 17%. Por ironia o ano era 83 e nós ganhamos de 83% a 17% dessa chapa. E aí fiquei até 1986, não quis mais concorrer, e foi quando a oposição ganhou as eleições. Eu não concorri mais, sabe por quê? Pela minha cabeça eu tenho duas coisas que eu defendo para o sindicalismo: é o não partidarismo, a não partidarização da classes sindicais, e o não continuísmo, por que as pessoas falam em não continuísmo , mas estão aí há 20 anos mamando nas tetas do sindicato. Aliás, Luiz, eu vejo hoje, os sindicalistas praticamente todos são ricos. Eu moro em um apartamentuzinho alugado. Isso me dá orgulho né, de não ter roubado, passou o dinheiro demais pelas nossas mãos e nos felizmente investimos.
23:10
P/1 - Professor, essa greve de 1979, a primeira do sindicato, quais eram as suas pautas? Quais eram as pautas desse movimento?
R - Olha Luiz,
principalmente a questão salarial, tinha muita coisa também, condições de trabalho e tudo, mas era o salário. Eu lembro que na assembleia tinha professora mostrando o salário dela e era menor do que o salário de uma doméstica, o salário era muito ruim. Nos seis anos que nós tivemos lá, nós melhoramos substancialmente o salário. Para você ter uma ideia, em 1985 nós fizemos uma outra greve e obtivemos 100% das reivindicações, nós tivemos 46% de avanço salarial, aliás 47,47% de avanço salarial, e isso para todos, e aí melhorou bastante o nosso salário. De lá pra cá nós perdemos demais. Nós chegamos Luiz, a ter aqui em Brasília, admissão para a Fundação Educacional com salário de professor de 18 salários mínimos, 18, hoje eu acredito que não temos mais 9, viemos perdendo, perdendo, perdendo e chegou nesse ponto.
24:57
P/1 - Nesses seus dois mandatos, quais foram as principais mobilizações que houve nesse momento?
R- Nós fizemos muita coisa, nós participamos do movimento nacional de professores, nesse movimento nacional nós conquistamos aposentadoria especial para o professor. Nós no sindicato, nós sempre tivemos uma visão ampla da coisa, não ficamos só reivindicando, nós criamos diversas ações culturais, por exemplo, nós criamos uma ação cultural chamada “Conta Professor”, em que o professor escrevia um conto, ou poesia e isso era editado por nós. O setor cultural de Brasília durante muito tempo participou ativamente dessa questão cultural. Então nós participamos de tudo que foi movimento político, reivindicatório que Brasília teve e que o Brasil teve. Nós sediamos diversas greves, compramos uma sede própria e sediamos diversas greves em nossa sede, coisa assim, de participação mesmo. Em 1984, eu e alguns diretores, estávamos em uma manifestação pelas “Diretas Já” no país, e fomos presos e levados para a Polícia Federal. E lá, eu passei a noite toda sendo interrogado, e aí um delegado disse: mas professor, porque que o professor tem que estar ajudando aluno a fazer greve? Porque hoje a greve nacional dos alunos universitários está lá na sua sede? Aí eu disse para ele: tem tudo a ver, primeiro que é um movimento social importante, e depois que é um movimento educacional, também importante, para a gente crescer em qualidade de educação. Então nós temos todos os motivos do mundo para ceder a sede do sindicato para que esses estudantes façam a sua greve nacional. Aí ele ficou quieto. Então, a nossa visão foi a de ajudar a criar novos sindicatos. Nosso sindicato, como tinha uma sede muito boa, nós recebíamos e convivíamos com diversos outros pequenos sindicatos lá. Nós arrumávamos sala, por exemplo, para o sindicato dos escritores, e outros sindicatos pequenos, como o dos trabalhadores em educação, dos trabalhadores em escola, também funcionava dentro do nosso sindicato. Então a gente tinha uma visão ampla de como deveria se dar a questão da luta sindical, não era só salário. Porque se você trabalha só com o salário você se isola da comunidade, e o professor tem que ter apoio da comunidade para todo movimento que ele faça. É basicamente isso aí.
28:48
P/1 - A compra da sede própria se deu sob sua gestão, é isso?
R – Hoje a atual diretoria vendeu aquela sede e comprou a outra em outro local. Mas a sede própria se deu na nossa gestão, como também a compra de um grande terreno para o clube do professor, se deu também. Eu assinei a escritura dessas duas coisas, tá certo!
29:17
P/1 - Professor, eu queria voltar um pouquinho, porque nós falamos de uma figura que não está mais entre nós, que é o professor Olímpio Gonçalves Mendes, o senhor poderia falar um pouco como é que ele era, quem era o Olímpio, como é que ele agia, como é que poderíamos caracterizar essa figura que não está mais conosco?
R - Luiz, o Olímpio é muito fácil de caracterizar. Goiano, daqui de Formosa, e uma pessoa, um professor muito tolerante, muito bom no seu convívio,
uma pessoa de muita garra, e
que já vinha, quando eu entrei também na Fundação Educacional, o Olímpio já vinha há algum tempo militando em prol dos professores. Ele era muito político, depois que saiu do sindicato ele foi ser vereador em Formosa. Uma pessoa muito paciente, muito tolerante, muito amiga, eu gostava muito do professor Olímpio.
30:37
P/1 - Professor, como é que o senhor avalia a ação do sindicato do SINPRO hoje? Quais são os grandes desafios que se colocam para a luta sindical hoje?
R - Luiz, eu sinceramente, como eu estou afastado, eu tenho poucas observações. A primeira que eu acho que eles deviam seguir é não continuar partidarizando o sindicato, principalmente com o partido PT. É claro que lá tem outros partidos, mas existe uma grande partidarização e isso tem dificultado o avanço nas lutas, porque numa luta sindical você tem que se relacionar bem com todos os governos. Deixa eu lhe dizer uma coisa: no auge da greve de 1985, nós fomos recebidos pelo governador do Distrito Federal, senhor José Aparecido de Oliveira, e lá ele me questionou o seguinte, falou: Libério, você anda dando declarações contra mim na imprensa e nos jornais, por que você faz isso? E eu falei: não governador, eu tenho um papel oficial e esse papel ele é feito através de notas e editais, eu não ando falando mal do senhor. Por quê? Porque o nosso objetivo aqui não é falar mal de nenhum governador, nosso objetivo é alcançar o que nós estamos pedindo, que é a melhoria das condições de trabalho e salário. Ele ficou tão contente com essa minha declaração que ele falou: eu vou na SEPLAN conseguir esse dinheiro para vocês. Você está entendendo? Que dizer... Claro que teve todo o papel do movimento, não vou pegar isso para mim, mas ajudou também eu ter humildade suficiente e mostrar que nós não estávamos contra o governo, nós estávamos lutando por melhores condições de vida e de salário. Então eu acho que o sindicato, hoje, eles devem repensar a prática sindical, repensar o partidarismo dentro do sindicato, eu acho que essa daí seria a primeira observação, porque eu já participei de assembleias nas gestões deles aí, do pessoal xingar o Governador de cachaceiro, xingar o governador de tudo e depois botar uma pastinha embaixo do braço e ir negociar com o Governador. Entende? Então eu sou radicalmente contra isso. E é muito simples né, é muito simples quando você não é arraigado em um partido político, e quando não se quer chegar à presidência da república através de sindicatos. Então, basicamente é isso aí.
34:16
P/1 - Professor, quando o senhor deixa os seus mandatos sindicais, o senhor voltou para a sala de aula? Onde o senhor foi trabalhar?
R – Eu voltei para a sala de aula, eu voltei, depois eu peguei uma licença e tal, mas logo que eu saí do sindicato eu voltei, eu fui lecionar em Ceilândia de onde eu saí.
34:50
P/1 - Continuou lá até se aposentar?
R - Continuei, eu fiquei lá até me aposentar, eu me aposentei em 1990. Fiquei em sala de aula até me aposentar.
35:13
P/1 - A partir da aposentadoria manteve a relação com o sindicato?
R - Não, porque depois que eu saí a minha participação foi muito pequena, e eu sofri muito, muito tipo de perseguição, de queimação, de forma que eu tinha um péssimo relacionamento com eles, então até nas Assembleia eu fui muito pouco, foi um
erro meu, mas eu me afastei.
35:55
P/1 - Professor, vamos pensar em uma situação hipotética na qual o senhor está diante de um rapaz, ou de uma moça, que decidiram ser professor, ou professora, o que o senhor diria para eles?
R – Olha Luiz, eu diria que ele deve ser professor e que ela deve ser professora, que deve
acreditar no futuro desta nossa profissão e lutar para melhorar, fazer o que eu fiz, eu sempre lutei para melhorar a minha condição de professor. Hoje está difícil e tudo, mas eu não faço ninguém desistir de ser professor, eu acho que o Brasil precisa de um bom professor, de bons professores, e é só a pessoa ter um ideal de ensinar e ajudar os outros.
36:58
P/1 – Professor, agora sem lhe pedir nenhum exercício de futurologia, mas como é que o senhor enxerga o futuro da educação no Brasil?
R – Luiz, eu enxergo com um pouco de pessimismo, sabe! Eu enxergo conforme os fatos, e os fatos estão aí, sai governo, entra governo, sai governo e ninguém prioriza a educação. E é uma coisa ideologicamente já programada, o país quando não prioriza a educação, ele nunca vai sair da condição precária que ele se encontra, porque seria através de uma boa educação que nós cresceríamos em todos os outros setores. E eu vejo com bastante pessimismo a questão do avanço da educação. Eu gostaria que fosse diferente, mas a gente sabe né, é só analisar os governos, já teve governo que falou em pátria educadora, mas cadê dinheiro pra fazer pátria educadora? Teve dinheiro para tudo, teve dinheiro para mandar para Cuba, teve dinheiro para mandar para esses países todos, para fazer metrô na Venezuela, teve dinheiro para tudo, e a educação continuou só com o nome de pátria educadora, e esse outro que entrou aí, eu não vejo também compromisso sério com a educação. Então é uma falta de compromisso, uma falta de visão, de que seria através da educação que nós resolveríamos todos os nossos problemas, faz com que a gente seja pessimista com esse futuro.
39:09
P/1 - Compreendo professor. Agora voltando um pouco para o plano pessoal, o senhor é casado, tem filhos?
R - Eu já tenho, inclusive, 11 netos. Eu tenho uma filha que mora na Irlanda há 16, 17 anos, a Lívia. Tenho um filho que hoje está morando nos Estados Unidos há 4 anos né. Então desses meus filhos, e outros que tenho aqui, a gente já está com 11 netos, graças a Deus.
40:01
P/1 - E quantos filhos são no total?
R - Eu tenho 6.
40:11
P/1 - Está casado?
R - Olha, eu só tenho um que é solteiro, não, eu tenho dois solteiros, é o Márcio e o Allan e os outros estão casados. E o Roberto. São três solteiros.
40:32
P/1 - Professor, eu estou satisfeito. Eu queria saber se tem alguma coisa que o senhor gostaria de ter dito e eu não lhe estimulei a dizer?
R - Não Luiz, eu queria, para finalizar, já estamos finalizando né, eu queria agradecer a vocês, reconhecer em vocês um trabalho de altíssimo nível mesmo, é muito importante, que vai ficar gravado aí na história do sindicato professores. A condução de vocês foi muito boa, e eu queria agradecer a todos, principalmente a todos os professores, meus colegas, a
Jaqueline que me chamou para esse bate-papo aqui com vocês, Filha da Maria Holanda que é uma professora muito combativa, muito minha amiga, e deixar aí esse agradecimento.
41:37
P/1 - Como é que o senhor se sentiu participando dessa entrevista?
R - Eu me senti bem, muito bem. Eu acho que você conduz muita tranquilidade, eu me senti muito à vontade para conversar com vocês.
42:01
P/1 - Que bom professor. Agora, para finalizar, quais são os seus sonhos?
R - Olha, meu sonho, meu único sonho é viajar. Eu já passei dois meses na Irlanda, na casa da minha filha, de lá nós fomos para Paris, Londres e tal, e já passei dois meses na casa do meu filho em Orlando, onde também fomos a Miami, essa coisas, e eu quero continuar viajando, dando uma contribuição aí para os meus netos quando eles precisarem e tal, não é porque, com 72 anos se eu não tenho nada até hoje não é agora que eu vou adquirir bens materiais, eu tenho uma visão muito particular com relação a bens materiais, eu não quero mais nada, eu só quero viajar e ajudar, também quero ajudar. Eu tenho um projeto de órfãos que eu pretendo, é porque faltou dinheiro para fazê-lo, mas eu comecei a desenvolvê-lo aqui perto de Brasília, em Anápolis. Porque o órfão sabe Luiz, ele não tem, normalmente não tem aula de informática, então quando eles se formam no ensino médio e vai disputar um emprego ele disputa em uma condição muito terrível né, porque ele não teve estrutura. O órfão, normalmente, sempre ele tem aula do governo, ele estuda na escola do governo, e a escola do governo é totalmente desestruturada para a questão de informática e não deveria, deveria ter toda assistência para informática porque hoje existe o analfabeto digital, e o órfão sai, normalmente, como analfabeto digital. E lá em Anápolis, depois que eu me aposentei eu comecei a trabalhar com vendas, adquiri uma franquia de purificador de água lá de Anápolis e mudei para lá. E lá eu tive condições de pegar um orfanato com 190 crianças de 0 a 19 anos, e dar um curso de informática numa escola de informática lá de Anápolis para eles, para todos eles, meninos e meninas, foi a coisa mais linda que eu consegui fazer na minha vida. Foi uma coisa bonita, depois conversar com eles e tal. E eu pretendo levar isso a frente, estou vendo aqui a questão de grana, porque para tudo tem que ter dinheiro, mas eu acho que ajudando um órfão a gente tá dando uma ajuda as pessoas certas, porque ele precisa desse apoio.
Esse orfanato, Instituto Evangelho, lá de Anápolis, é a coisa mais linda que existe, os meninos se vestem direitinho, comem direitinho, são 190 alunos, jovens, em uma cidade com o poder aquisitivo muito baixo, que é Anápolis, uma cidade de Goiás. Estão lhe falo que o trabalho é muito bom e que nós demos essa ajuda, eu pretendo levar isso adiante.
46:02
P/1 - É um sonho meritório. Eu só tenho a agradecer a disponibilidade do seu tempo, as boas histórias que o senhor nos contou e agradecer muito pela entrevista que o senhor nos concedeu. Muito obrigado viu professor!
R - De nada, tenha um bom dia a todos vocês.Recolher