Entrevista de Marina Vaz da Costa Vianna
Entrevistada por: Luiza Gallo e Bruna Oliveira
São Paulo, 10/09/2021
Projeto Mulheres Empreendedoras Ernst & Young
Realizado por: Museu da Pessoa
Entrevista PSCH_HV1013
Transcrita por Selma Paiva
Revisado por Luiza Gallo
P/1 - Vamos lá! Marina, pra começ...Continuar leitura
Entrevista de Marina Vaz da Costa Vianna
Entrevistada por: Luiza Gallo e Bruna Oliveira
São Paulo, 10/09/2021
Projeto Mulheres Empreendedoras Ernst & Young
Realizado por: Museu da Pessoa
Entrevista PSCH_HV1013
Transcrita por Selma Paiva
Revisado por Luiza Gallo
P/1 - Vamos lá! Marina, pra começar, gostaria que você se apresentasse, dizendo seu nome completo, data e local de nascimento.
R - Tá, eu sou a Marina Vaz da Costa Vianna, tenho 35 anos e nasci no Rio de Janeiro. Tá faltando uma pergunta... uma resposta?
P/1 - A data do seu nascimento.
R - Nasci no dia nove de maio de 1986.
P/1 - E quais os nomes dos seus pais?
R - Paulo Francisco da Costa Vianna e Maria Cecília Pires Vaz.
P/1 - E o que eles faziam ou fazem, no que eles trabalhavam?
R - Meu pai era empreendedor, mas não sabia muito. Ele era intraempreendedor, mas sempre foi guiado pra carreiras que o afastavam um pouco desse lado, mas ele realmente se descobriu empreendedor nos últimos anos da vida. Ele faleceu vai fazer sete anos, acho que fez sete anos esse ano. E a minha mãe era arquiteta, ainda é arquiteta, só que agora a profissão dela está sendo mais cuidar dos meus filhos e me ajudar, porque a gente teve um momento prolongado de pandemia, eu precisei muito dela.
P/1 - E como você descreveria seus pais?
R - Hum, meu Deus, são perguntas pessoais mesmo, deixa eu pensar aqui. Meus pais, meu pai era uma pessoa... quando eu cresci, crescendo, vendo meu pai, era sempre uma pessoa destacada. Se tem algum grupinho ali conversando, tem o buchicho, ele está separado, ele está num canto. Era uma pessoa que te encanta na conversa um a um, mas se sente muito oprimido pra situações sociais, assim: tem aversão à festa, à Carnaval, Natal, tudo isso ele odeia. Minha mãe, por outro lado, não, adora um buchicho e ela sempre foi uma pessoa assim, que não importa se eu tô ali morrendo, a gente acabou de ter uma briga bizarra e eu preciso engolir um cabide e ir pro Natal, porque é muito importante estar ali, ver todo mundo o tempo inteiro. Então crescer com esses dois, eu sempre tive dois lados muito separados e eu tenho esses dois lados dentro de mim. Então eu sempre oscilei muito, em vários momentos da vida, sobre qual caminho seguir ou qual lado está falando mais alto aqui e agora. Então eu sempre cresci vendo o meu pai muito estressado. Na verdade, assim, vendo os dois muito estressados. Eu tinha pra mim, que era: “Eu preciso gostar muito do que eu faço, porque eu não quero ser assim”. Então eu via a minha mãe trabalhando muito em obra, ela era arquiteta, então trabalhava muito em obra, cheio de problema, tinha um monte de prazo atrasado. E o meu pai era jornalista, tinha que fazer plantão, trabalhava de noite e tudo mais. Então eu sempre os via muito cansados e falei: “Cara, preciso gostar muito”. E aí, por isso, eu pinguei muito, acho que de faculdade em faculdade. Profissionalmente falando, era assim: comecei com Publicidade e Propaganda, falei: “Não tô feliz aqui, vamos pra próxima”. Fui fazer Medicina: “Não tô feliz aqui, vamos pra próxima”. Aí caí em Arquitetura, que foi assim: “Eu não quero ser igual a minha mãe”. Quando eu vi, eu estava sendo igualzinha a ela, fazendo Arquitetura. Foi impressionante. E Arquitetura foi a que eu aguentei mais tempo, mas mesmo assim, nunca trabalhei efetivamente com Arquitetura. Eu fazia alguns freelancers assim, de cenografia, de cenário, trabalhei muito fazendo cenário, stand de vendas, mas nunca como... sabe, fazendo projeto executivo de prédio e tudo mais. Foi por aí que eu vi a influência dos dois, profissionalmente, pra onde eu estava indo, mas o meu pai sempre teve esse olhar: “Que processo que a gente está vendo aqui, hoje, que pode ser melhorado”? Então o Sem Parar, quando aconteceu, ele já tinha pensado em fazer um Sem Parar. A gente nasceu numa época pré internet. Então o meu pai foi vendo mil possibilidades, ele era muito voltado pra tecnologia, ele era jornalista de informática. Então ele estava muito antenado com tudo o que estava acontecendo e ele via muitas possibilidades ali. Então, teve várias empresas depois que explodiram, cresceram, nasceram e nenhuma delas ele tinha efetivamente feito. Então eu sei que ele era um empreendedor frustrado, só que, ao mesmo tempo, ele trouxe isso pra mim. Eu sempre tive esse pensamento: “Como isso pode ser melhor? Como a gente pode fazer isso de um jeito mais eficaz, mais criativo? Como a gente pode resolver esse problema?” Então eu sempre tive esse olhar, ele passou isso pra mim. E, no final da vida dele, acho que uns cinco anos antes dele morrer, ele realmente brilhou como sendo... tendo um cargo muito importante, numa startup de segurança da informação, segurança de dados, muito antes da Lgpd. Então eu sei que ele era uma pessoa muito visionária, em termos de tecnologia, mercado, startup, inovação, isso tudo estava dentro dele. E essa forma de pensar entrou dentro de mim, de um jeito que rege, agora eu vejo muitas das minhas decisões. É muito engraçado quando a gente vê, reconhece os nossos pais nas nossas ações, né? Então, tem isso.
P/1 - E você sabe como seus pais se conheceram?
R - Meu pai estava ‘pegando’ a melhor amiga da minha mãe, aí não deu muito certo (risos) e eles continuam sendo melhor amigo e melhor amiga, prima da minha mãe, eram muito próximas. Arranjou, entendeu? Uma amiga em comum arranjou o meu pai com essa amiga da minha mãe, que é a tia Ana. E aí não deu link nenhum, mas deu link, que no dia que eles saíram com a minha mãe e aí teve um: “Posso, né? Me dei muito bem com ela”, saíram os três um dia e, sei lá, agora pronto, acabou. E aí foi uma coisa super tradicional, casamento, tudo. Mentira. Minha mãe engravidou de mim um mês e meio depois e eles foram morar juntos, acho que eu tinha seis meses de feto, dentro da barriga da minha mãe (risos). E ficaram juntos até o meu pai falecer.
P/1 - E você tem irmãos?
R - Tenho uma irmã, que também é a minha antítese, embora a gente tenha os mesmos pensamentos em relação a muita coisa, tipo assim, nós somos duas procrastinadoras masters, a gente é muito movida a preguiça. Então o meu caminho pra resolver preguiça, é inovação. Acho que inovação é movida a preguiça, pode ser meio polêmico falar isso, mas, assim, eu não quero ter que olhar 25 CD’s, tirar um CD e colocar um CD, vou inventar um iPod, porque aí fica mais fácil de a gente poder escutar música, entendeu? É movido a preguiça. A gente não sabe, mas Steve Jobs era um hippie. Ele era basicamente um hippie que queria acordar três horas da tarde. Lindo, mudou o mundo (risos). E a minha irmã é assim: “Não, eu preciso ter uma carreira corporativa bem estável aqui, porque eu não quero ter o trabalho de procurar outra coisa. Então ela escolheu uma empresa, focou nessa empresa e está nessa empresa desde que ela se formou. Então, enquanto eu pulei, sei lá, 250 empresas, até começar realmente abrir a minha.
P/1 - E você conhece a história dos seus avós, você chegou a conhecê-los?
R - Então, essa é uma deficiência minha, porque eu tive muito pouco, assim. Até eu ter dois anos de idade, acho que eu perdi uma avó, eu já nasci sem metade dos avós. A mãe do meu pai estava viva, morreu um ano depois de eu nascer. E meu avô por parte da minha mãe era muito distante. Minha vó já tinha falecido e meu avô por parte de pai já tinha falecido. Então eu nunca os tive muito presentes, mas a gente tem aí algumas coisas interessantes, né? Eu sei que o meu avô por parte de pai era empreendedor e vendedor, era muito comercial. Vendia garrafa térmica, acho que coisas assim, naquela época era de porta em porta. Então viajava muito pra ir vendendo. Sobre a minha avó, ela era dona de casa. Então ficava em casa mesmo. Não sei muita coisa sobre ela. Engraçado, não sei, realmente nunca soube muita coisa, nunca muita coisa me foi falado. Sobre meu avô por parte de mãe, ele foi o primeiro cirurgião pediátrico do Brasil. Então ele foi uma estrelinha no mundo da Medicina. E a minha avó por parte da minha mãe, foi a primeira estudante de Medicina mulher numa universidade. Primeira turma, abriu pra mulher agora, entraram duas mulheres e uma delas era a minha avó. Ela não chegou a se formar, teve ali vários problemas de gênero, nessa época, você ter uma mulher com esse nível de independência. Então não chegou a se formar, teve um filho depois do outro e vivia orbitando em volta da carreira do marido, que era muito bem-sucedido. Então foi muito difícil pra ela. E ali eu tenho, realmente, também, uma coisa muito frustrada, do tipo, um potencial feminino gigantesco que nunca conseguiu sair do papel. E, em cima dela, bisavó, também eu sei. Tinha essa bisavó que - essas histórias que chegam e marcam a gente – ensinava, por exemplo, o aborto caseiro, do tipo: “Olha, não dá pra ter um monte de filho, você não vai conseguir, você não vai ter vida. Não deixem vocês fazerem, em casa você faz isso: pedra quente na barriga”, essas coisas malucas. Mas porque era assim que a gente era presa dentro de casa, né? Gerações, duas, três gerações pra trás, não precisa nem ir muito longe, era todo mundo cheio de dez, quinze irmãos. Então esse era um caminho. Então teve isso assim, você vê que isso passou. E a minha mãe também... meu avô, carreira médica, super bem-sucedida, filhos naturalmente vão atrás da Medicina, eram quatro filhos, dois mais velhos foram pra Medicina, minha mãe era terceira e falou: “Nossa, ela precisa fazer Medicina” e ela foi: “Não, não quero, não”. Então também foi uma mulher que correu contra o que as convenções a mandam correr. Enquanto todo mundo também casou, fez faculdade, tudo direitinho, ela foi lá e engravidou um mês e meio depois de conhecer meu pai e fez do jeito dela. Então da bisavó até a minha mãe, eu vejo muita coisa que eu herdei dessas mulheres, pra trás.
P/1 - E, Marina, na sua família, tem algum costume específico, desde comida, cheiro, que te lembra a sua infância? Pratos ou datas comemorativas, isso é presente?
R - Costumes comemorativos? Não, a gente sempre foi uma família muito avessa a convenções, eu diria. Então a gente fez os obrigatórios mesmo, Natal, Ano Novo, aniversário e ponto. Mesmo assim, não eram grandes coisas. E, assim, cheiros de infância... eu tenho uma coisa... eu nasci na década de oitenta, a década em que se fumava dentro do avião. Então tinha muito cheiro de cigarro dentro de casa. Meu pai fumava muito, minha mãe fumava ocasionalmente, mas fumava assim, do lado de um bebê recém-nascido. E eu morava no Rio, e no Rio você vive com o ar-condicionado ligado e aí o cheiro da minha infância é um cheiro de ar-condicionado com cigarro. E eu tenho uma coisa de quando eu entro num lugar que tem o ar-condicionado ligado e entrou um fumante, me acende um cheiro da infância (risos). Eu odeio cigarro, tenho pavor de cigarro, mas o cheiro, assim, que me traz um calorzinho humano. Então quando eu tive carro pela primeira vez, eu deixava as pessoas fumarem no meu carro, quem era fumante entrava no meu carro pra eu poder fechar o vidro e ligar o ar e ficar com o cheiro do meu pai, olha só que coisa estranha. É horrível, mas é isso. Você vê que o cigarro é ruim. Ele fez isso assim, até hoje, pra mim tem um calorzinho na alma, quando eu sinto esse cheiro (risos).
P/1 - E você sabe a história do seu nascimento?
R - Do meu nascimento, eu sei que ele foi bem “tradiça”. Na época, era cesariana, tinha sido agendado pra oito e meia da noite, nasci oito e 33, foi bem direitinho, não tinha nada muito fugindo. Alguém falou de parto normal, a minha mãe, sendo filha de cirurgião e irmã de cirurgião: “Não. Parto normal não. Vai pra faca, vai pra cesárea, agenda isso logo”. Então com seis meses já tinha sido agendada a minha retirada. Então eu sei disso assim, que foi uma coisa bem tranquila pra minha mãe, ela estava bem segura. Sei que meu vô estava presente na sala. Então é isso que eu sei do meu nascimento, não sei muito mais que isso, não.
P/1 - E a história do seu nome?
R - Hum, a história era assim, minha mãe engravidou e meu pai falou: “Se for menina, é Marina” (risos). Foi isso, basicamente isso. “E aí, se for menino, você pode escolher, Cecília”, mas foi isso, assim: “Se for menina, é Marina”. E aí, inclusive, também, quando nasceu, quando a minha mãe falou que estava grávida, ele falou a mesma coisa: “Se for menina, vai ser Joana”. Então os nossos nomes já estavam definidos e a referência eram bisavós dele, que eu acho que também tinham histórias interessantes de vida, mas eu vou ser bem sincera, eu não me lembro qual que era a referência pro meu nome ser Marina. Mas eu sei que foi assim, não foi um processo de decisão demorado, não.
P/1 - E você lembra da casa onde você passou a sua infância?
R - Lembro, lembro que eu passei a minha infância inteira em Ipanema, no auge, num privilégio absurdo que, pra mim, não era privilégio, era só a minha vida. Eu não tinha essa visão de consciência social, nem nada, só estava ali, morando num prédio em Ipanema, de frente pra praça, dava pra ver o Cristo Redentor, do quarto dava pra ver a praia. Era assim, a minha vida era ali, maravilhoso. Mas sobre o apartamento da minha infância, lembro, lembro do canto que era mais bagunçado, lembro de tudo. Só que é muito engraçado, porque eu tive lá recentemente, nesse apartamento que a gente vendeu, fui pro Rio recentemente e eu passei na portaria, falei com o porteiro, que era o mesmo e aí passou o atual proprietário e aí ele me chamou pra conhecer, eu falei: “Nossa, que pequeno, né? Meu Deus, é muito pequeno”. Então na minha cabeça era uma mansão, quando eu fui ver, na verdade era um apartamentinho normal, não era a mansão que eu tinha dentro da minha cabeça. Mas eu lembro muito bem desse privilégio grande que eu tive. Depois, olhando pra trás e falando: “Caraca, foi aqui e assim que eu cresci”. É muito louco (risos). Boa, vai.
P/1 - E, Marina, as brincadeiras favoritas da infância, quais eram?
R - Show! A gente adorava fazer um show. Então era: “Vamos roubar a camisola da mãe e reencenar aqui a Bela Adormecida. Vamos na papelaria comprar papéis e fazer fantasia de papel e aí vamos fazer um desfile de moda”, tudo a gente precisava fazer um show. Se minha prima vinha pra ficar em casa, a gente ia lá e a fazia entrar na peça, fazer a dança, fazer tudo. Então a gente sempre curtiu... a gente, eu digo a gente, mas eu tô sendo... coitada da minha irmã, ela sempre foi forçada, mesmo, a participar dos shows. Foi uma decisão unilateral minha, mesmo: “Hoje a gente vai brincar, fazer show, hoje vai ser Caribe” e aí eu pegava músicas do Caribe lá, que tinha o CD do Caribe e aí a gente fazia o show do Caribe. Então tinha muito disso (risos).
P/1 - E, nessa época, você pensava, meio fantasiando mesmo, o que você queria fazer quando crescesse, que profissão você gostaria de ter?
R - Ah, quando me perguntavam, eu falava que eu ia ser médica, pela família, mas eu não pensava ativamente nisso, sabe? Eu pensava ativamente no que eu não queria, que era fazer igual a minha mãe ali. Quando eu ia visitar a minha mãe no trabalho, eu via sempre a minha mãe gritando, berrando com alguém, uma coisa: “Socorro, meu Deus, eu odeio tomar essa bronca em casa, imagina no trabalho!” Eu lembro muito disso. Então o caminho que eu não quero ter… e o momento de escolher profissão foi tenso pra caramba. Então, realmente eu não conseguia tomar essa decisão porque, na minha cabeça, o que eu escolhia ali, ditava o que eu ia fazer pro resto da minha vida. Então eu não conseguia tomar essa decisão, rolou um pânico ali no fim do colégio, demorei muito tempo.
P/1 - Antes de chegar no fim do colégio, queria saber, qual é a sua primeira lembrança da escola?
R - Hum, escola não foi um lugar legal pra mim. Eu nunca me enquadrei muito bem, eu sempre tentei me encaixar em algum grupo que parecia ser legal, mas eu, pessoalmente, nunca me encaixei. Acho que até hoje eu tenho o WhatsApp de uma pessoa da escola. Mas eu nunca fiz assim, grandes amigos na escola. Nunca tive. Eu sempre fui uma pessoa meio outsider, sempre estava meio isolada. Acho que tem muito a ver com essa coisa de, as pessoas são diferentes e a escola meio que tenta: “Vamos colocar todo mundo no mesmo patamar. A média de nota é isso. Se você está acima, você está abaixo, não sei o quê”. É uniforme, é aquele lance todo. Então eu nunca me dei bem na escola. Sempre foi uma coisa que eu levei com muita facilidade em termos de nota: “Ah, passei com folga”, nunca tive essa dificuldade pra estudar, pra passar de ano, pra nada, mas o social, pra mim, sempre foi pavoroso. Então eu sempre tinha o lance de tentar imitar as pessoas que pareciam legais. Juntando um pouco com a parte da brincadeira da infância, eram shows, eram coisas que eu fazia: “Então hoje a gente vai brincar de avião” e aí eu transformava a sala da casa num avião e eu era a aeromoça, fazia a coreografia certinho, como se eu tivesse passado a vida dentro de um avião, como se a minha mãe fosse aeromoça. E aí fazia bandejinha, o lanchinho, hora do almoço, fazia tudo isso. Na escola, eu fazia mais ou menos a mesma coisa: eu olhava as pessoas que eram mais populares ou aonde, sei lá, o social orbitava ao redor dela e eu tentava ser ela. E sempre foi frustrado, nunca deu certo, sabe? (risos) Assim, sempre ficava meio patético, que a imagem que eu tinha na minha cabeça, de como eu estava parecendo, estava igualzinho a ela. Mas, na prática, nossa, nada a ver. Então ela usa o sapato tal: “Mãe, pelo amor de Deus, eu preciso desse sapato, você não tem noção, eu não tenho nenhum amigo”. Engraçado, era muito em torno do que a pessoa tinha ou da beleza da pessoa. Nunca era muito em cima de conquistas, personalidades e tudo mais. Então não foi um ambiente legal pra mim, era um ambiente bem opressor. Fiquei muito feliz quando acabou (risos).
P/1 - Mas teve algum professor que tenha te marcado, de alguma forma?
R - Tem o Orlandino do segundo ano do ensino médio, o Orlandino do segundo ano do ensino médio do Santo Agostinho. Ele era um professor que chacoalhava as estruturas. Então enquanto todos os outros professores faziam provas superdifíceis, a prova dele - ele era professor de Física - tinha perguntas assim: “O que é uma partícula? O que é velocidade?”, ele transformou Física em Filosofia. E aí é muito interessante. Então, aquilo chacoalhou as estruturas inteiras sobre a forma de ensinar, sobre a forma de aprender e foi no momento certo, na hora certa, sabe? Se não tivesse passado um Orlandino na minha vida, certamente eu seria outra pessoa, porque era assim: entender energia, né? Como você ensina energia? Quando ele ensinou pra gente sobre o que era energia, sobre várias formas. Não era que a fórmula da energia que o Einstein fez, era assim: “O que é energia e sobre como isso tem impacto na nossa vida?” E depois a gente vai pra alguma fórmula e se vai, muitas vezes não ia. Era assim: “Por que a fórmula da velocidade é distância sobre tempo”? (risos) Era muito louco. Então isso me marcou, porque fui muito atrás, falava: “Preciso entender o fundamento das coisas, eu não preciso saber aquelas fórmulas gigantescas de Química, de Matemática, de Física, Trigonometria e o “escambau”. Eu preciso entender o porquê das coisas. E se esse porquê faz sentido pra mim ou não”. Então ali foi um divisor. Eu tô dando respostas assim, gente, podem ser muito complexos, se vocês acharem que está muito longo... tá, beleza.
P/1 - Fique super tranquila, está maravilhoso.
R - Tá, beleza.
P/1 - E, Marina, me conta uma coisa, você só estudou nesse mesmo colégio?
R - Eu estudei em dois, foi um colégio até a sexta série, na sexta série eu fui pra outro. O colégio foi minguando, foi ficando uma galera meio barra pesada na turma. Tinha duas pessoas na turma e metade estava muito barra pesada, em termos de bullying. E a escola não se posicionou muito bem e aí estava muito ruim, sabe? Bullying no momento da pré-adolescência, quando começa a aparecer peito e ali a minha mãe me tirou e me colocou nessa escola mais tradicional, que era de padre, Escola Santo Agostinho, de nome assim. E lá tinha doze pessoas numa turma e a outra escola eram quarenta, sei lá, cinco turmas de quarenta pessoas cada uma. Então também não foi fácil. Eu falei, escola não foi assim: “Woo! Tô superfeliz aqui na escola”, nunca aconteceu isso. Eu matava aula na escola pra ir pro aeroporto. E aí eu pegava o “frescão” no Rio de Janeiro e ia até o aeroporto internacional do Rio de Janeiro, que era bem perto do colégio. Ficava lá, circulava um pouco pelo aeroporto, pegava aquele clima de viagem, de pessoas viajando, saindo, chegando, ficava ali na área do desembarque, vendo as pessoas chegando, pegava o ônibus e voltava pra casa. E aí foi: “Como assim, Marina, você faltou?”. A gente aprendia também a falsificar a assinatura da mãe, pra poder não ser importunado com essas coisas (risos).
P/1 - E você dava esse “rolê” sozinha?
R - Dava, super errado. Acho que hoje, se eu tivesse uma filha, deixá-la com catorze anos fazer isso pela cidade do Rio de Janeiro, pegar um ônibus e ir até o fundão, nossa, socorro. Ainda bem que a minha mãe não sabia disso, mas fazia esses “rolês” sozinha.
P/1 - E o encerramento do colégio? Quais foram... você já falou que foi um período difícil, de decisão. Quais eram as angústias, os desafios?
R - Tá. O fim do colégio veio num momento bem turbulento de família, em termos financeiros. O meu pai estava trabalhando muito mais em São Paulo, na época. A minha mãe tinha sido terceirizada, o departamento onde ela trabalhava, na empresa em que ela trabalhava, tinha sido terceirizado. Então a renda dela diminuiu e o meu pai estava muito em São Paulo. Então a gente acabou vindo pra São Paulo, foi aí que a gente se mudou, no meio do último ano escolar. Então o que já era ruim, difícil, ficou três vezes mais, porque agora eu tenho que fazer amigos aqui, gente que está terminando colégio, que ficou junto uma vida inteira e aí entrou a carioca metida, que só dorme aqui e tira dez, entendeu? Foi meio isso que aconteceu (risos). E aí... só que São Paulo tinha uma coisa que era muito diferente do Rio. São Paulo, basicamente você tem uma grande universidade pública na cidade, que é a USP e as outras estão no interior. E esse momento foi muito difícil pra mim, eu dei muito trabalho pra minha mãe, eu fugia de casa e voltava pro Rio. E, assim, basicamente não passei. Então chegou assim: realmente o nível da concorrência em São Paulo era muito mais alto e no Rio, todas as minhas amigas passaram em tudo. Todas aquelas pessoas que eu conhecia, estava todo mundo numa universidade, fazendo alguma coisa e eu estava ali. Não passei, fui pro cursinho: “Cursinho pra quê, Marina?” “Não sei, vamos escolher uma coisa aqui” e aí eu fui fazer: “Ah, você é muito comunicativa, tem que fazer Comunicação”, aí eu: “Tá bom, vamos lá: Relações Públicas na USP, Publicidade e Propaganda na Casper, não sei o que lá, não sei o que lá”. Aí eu passei na USP, em segunda chamada, nesse ano. Não fui fazer, porque eu já tinha mudado de ideia porque, quando você passa na USP de segunda chamada, eu já tinha começado Publicidade em outra faculdade. E eu já tinha achado pior do que colégio, porque colégio não tinha trote e faculdade tem. Tem o tal do trote, onde você é pintada, jogam papel higiênico molhado na tua cara e mandam você pra rua pedir dinheiro, pros outros mais velhos beberem. Então falei assim: “Gente, é muito opressor todo esse sistema educacional”, se a gente parar pra pensar, né? Muito ruim, também eu entrei e vi as aulas e falei assim: “Cara, quero ir embora” - não sei se pode falar merda aqui, pode? – (risos) “Cara, que merda, quero ir embora, é particular isso aqui, a minha mãe está pagando, não faz sentido isso aqui. Vamos sair, vamos voltar pro cursinho”, que eu conheci gente ótima no cursinho, é muito interessante como o cursinho não tem prova, não tem essa competitividade, tem o final do ano, onde todo mundo vai pra um lado, as minhas amigas mais duradouras, eu conheci no cursinho. Então na época onde você não tem... Então eu cheguei em São Paulo, no cursinho, eu conheci gente muito legal, eu tive um namorado que eu conheci no cursinho, amiga que é madrinha do meu filho que eu conheci no cursinho. Então, o cursinho, pra mim, foi onde eu me achei, fechou o colégio, me achei no cursinho, só queria ficar no cursinho. Meu sonho agora era ser professora de cursinho, vou ficar aqui muito bem, não preciso fazer faculdade. “Que faculdade que eu preciso fazer pra ser professora de cursinho o mais rápido possível”? Então, foi meio que isso. “Ai, olha, se você escolher Medicina, você fica anos aqui no cursinho, porque ninguém passa”, foi bem isso. Aí no ano seguinte eu falei: “Tá bom, vou fazer Medicina”, meio que isso. Não foi planejado pra ficar muito tempo no cursinho, mas foi... ah, a galera que mais rala aqui, a galera que quer passar em Medicina. Então vamos colar nessa galera e vamos fazer Medicina. “Medicina paga bem, né? Eu tenho aí histórico de família, já saio na frente, vai ser assim, puts, já saí rica dessa faculdade”. Então eu já entrei na escolha de faculdade, eu não sei nem se já era pra falar. Beleza? E aí escolhi fazer Medicina, só que aí eu achei que eu não ia passar e passei numa particular, ali já em outubro, que foi na Unisa. Aí eu parei de estudar completamente. Eu falei: “Eu já passei, já tô bem”, aí não passei mais em nenhuma outra e essa daí foi a única e ela era muito cara, se era cara antes, agora deve estar dez mil reais por mês, não sei quanto. E acabou que eu falei: “Ah, vamos fazer mais um ano de cursinho aí, né”? (risos) Só que aí falou: “Não, Marina, você não vai fazer mais um ano de cursinho, não temos dinheiro pra ficar bancando você em cursinho”. E aí, nessa época, o meu namorado, que eu tinha conhecido no cursinho, já tinha passado na USP, em Letras, e aí eu ia com ele e ficava estudando na biblioteca, comecei a estudar por conta. Então agora assim: “Eu tenho que passar, eu tenho que escolher. E eu tenho que fazer uma pública, porque a minha mãe já gastou muito dinheiro com cursinho, com faculdade privada, com um monte de coisa. Então eu preciso passar e precisa ser numa pública, qual que vou fazer?”. E aí, como eu já estava frequentando a USP, a FAU, que era a faculdade de Arquitetura, era uma que me parecia a mais inovadora de todas, porque era uma faculdade cujo o projeto do prédio é fascinante, era uma faculdade sem parede. Ou seja, era tudo muito integrado assim, é uma faculdade que, de dentro, todo mundo consegue ver todo mundo, é muito interessante a comunidade e era muito diverso, assim. Você entra na faculdade de Economia, de Administração, todo mundo tem o mesmo perfil. Você entra na faculdade de Letras, também, todo mundo tem o mesmo perfil. Agora, você entra na Arquitetura, tem tudo que é perfil. E aí, como eu estava muito mais interessada no social do que nas possibilidades, a essa altura, eu estudei pra FAU e passei e aí eu fui fazer Arquitetura. Então foi assim, foi aos trancos e barrancos, porque eu precisava tomar uma decisão, mas o momento assim que eu me vi: “Preciso passar, ninguém vai me bancar mais agora. Minha mãe já encheu a cota dela de me bancar. Já tenho amigos se formando e eu tô aqui parada. Eu tenho que passar”. E eu me organizei de um jeito que era melhor que cursinho. E, realmente, eu estudei as provas, eu estudava, sentava sozinha na biblioteca, tinha regra, tinha método. Basicamente assim: enquanto os cursinhos focavam em simulados pra primeira fase durante ano, fazia uns dois, três simulados a cada bimestre, sei lá, era basicamente um por mês. Eu fazia um simulado por semana e uma redação por dia, que eram os meus [pontos] fracos, sabe? Mas foi tipo treinar pras olimpíadas assim, em termos de cursinho. Então o cursinho era uma coisa genérica pra fazer você passar e quando eu preciso passar real: “Tá, vamos lá, onde é que eu tô bem? Vamos fazer um simulado, onde eu tô bem, onde que eu tô mal? Eu tô mal em redação”. Então, o meu pai era jornalista: “Pai, me ajuda aí, lê essa redação, vê se está boa a introdução, o desenvolvimento e conclusão”. E aí eu fazia uma redação por semana... não, fazia uma redação por dia e eu comecei a escrever muito bem, por causa disso. Então eu consegui fazer textos muito interessantes no final e eu falei: “Gostei disso também, dessa parte de traduzir o que eu tô pensando em textos”. E aí fazia um simulado por semana, pra me treinar pra prova. Então, assim, a prova tem cinco horas de duração, cinco horas sentado ali, eu não posso deixar pra fazer isso só uma vez no fim do ano, preciso treinar a concentração pra prova. Então, sabe: “Como é que ninguém faz isso, uma coisa assim?” – eu fiquei pensando – “Como ninguém faz isso?”. Tanto que daí, depois, eu ensinei, ajudei um monte de gente a passar também. Então a vizinha, não sei o que, a filha, a minha prima, começou a todo mundo precisar: “Ah, eu quero passar na USP”, eu falei: “Vem aqui que eu já ‘crackeei’ o negócio, eu já sei como você faz pra entrar. Esquece cursinho, é caro demais, você não precisa pagar” e passaram. Aí eu coloquei duas pessoas pra dentro, até onde eu me lembro. Então, às vezes, pode ser que essas duas pessoas tenham propagado a palavra pra outras também.
P/1 - E como foi o momento da faculdade, quais foram as mudanças, momentos marcantes dessa época?
R - Hum, vamos lá: momentos marcantes da faculdade, foi assim, principalmente pública, é um problema, porque significa que a recuperação não é paga (risos). Então você meio que larga a mão, sabe? E a FAU era integral, de manhã até o fim do dia, cinco anos integral. Então ninguém se formava em cinco anos, porque todo mundo queria trabalhar e não dá pra você trabalhar sendo a faculdade integral, de manhã e de tarde. Então todo mundo se formava em sete, oito, nove anos. Tinha gente lá que era famosa por estar quinze anos na FAU e não se formava, porque sempre ficou com matéria pendente lá, que segurou outras três, quatro pra frente, isso era muito comum. Isso é muito legal, porque você tem tanta liberdade, que você acaba “cagando” com a sua liberdade. Mas o momento, a coisa mais legal em termos de faculdade, foi pela primeira vez estar convivendo com ambiente diverso. E a USP, realmente... a Arquitetura era um ambiente diverso. Tinha amigos de todas as cores, de todas as preferências, ainda tinha o lance assim, quando você vai fazer a matrícula na FAU, tinha um arco-íris na porta da matrícula escrito: “Seu filho vai virar gay” e dito e feito. Metade assim: você entra, tem metade homem, tem metade mulher, ali dos homens você vê que tem 10% gay, os outros não eram. Até o final da faculdade todo mundo vira, os poucos héteros que ficaram são tidos como, sei lá, deuses no Olimpo, entendeu? Você fala: “Nossa, que lindo, maravilhoso”, mentira, porque é a única opção que a gente tem aqui. Então foi o que sobrou. Mas era muito libertino. Isso era muito legal, você conhece, realmente... e pessoas de vários passados. Então, em termos de Rio de Janeiro, na bolha que eu cresci, que era a bolha da Zona Sul, todo mundo vive numa mesma bolha, ali no mesmo bairro, na mesma criação e fazia faculdades ali em volta, tudo muito igual. E quando eu entro na USP, aqui em São Paulo, tem gente de Brasília, tem gente de Sorocaba, tem gente de Catanduva, tem gente de Jacutinga, tem gente de Mato Grosso, tem gente da Bahia, e isso é muito legal. Você sabe que essas pessoas têm também o nível de inteligência pra terem entrado ali ou de dedicação, porque estudaram pra ter entrado ali. Então você começa com uma barra já, interessante, de pessoas, de qualificação, o que é muito interessante. Você tem essa coisa: “Eu passei, woo”. Então, isso é legal, sabe? Você está ali, convivendo com outras pessoas que passaram também e a gente passeia por aí, falando: “A gente é foda, porque a gente é da USP”, tem um pouco disso. E ao mesmo tempo assim: “A gente não paga recuperação e a gente se forma em quinze anos”. Então, era assim, meio oscilando. Então era muito legal isso, e o que eu guardo com muito carinho, da faculdade, são as pessoas. Muito mesmo, ainda mais pública. Então é assim: “Olha, o projeto político-pedagógico está muito ruim, vamos se mobilizar e vamos fazer uma coisa, um projeto pra melhorar”. E aí a gente vai, cartaz e: “Vamos fazer mobilização, chama o professor tal, chama o coordenador tal. Ah, ele não veio falar? Mobilização. A gente vai parar essa faculdade” (risos). Então tem muito disso e tem o lance da consciência social também. Eu acho que, fazendo uma faculdade pública, pelo menos em todas as aulas você tem isso, assim: “Olha, a sua cadeira aqui custa três mil reais por mês, a sociedade está pagando a sua educação e você tem o dever de devolver isso”. A faculdade realmente tem uma formação humana, principalmente voltada pra cidade, pra parte de Urbanismo, muito mais forte do que pra parte de Arquitetura. Então você entender desenho da cidade, entender desigualdade, entender formas de transporte que podem melhorar o fluxo da cidade, entender que essas escolhas nunca são tomadas e elas estão ali e tem mil projetos maravilhosos e não acontecem. Então você entra em contato com conhecimento, que até então eu não tinha, porque eu cresci numa bolha muito privilegiada. Então a minha bolha privilegiada cresceu em Ipanema, de frente pra praça, com o Cristo Redentor e a praia no fundo, não tenho a menor noção de que eu tenho a capacidade de fazer uma diferença ali e entender. Na hora que você tem esse despertar da desigualdade, que, assim, pode até ser um pouco marxista na época, que você fica encantada quando você vê, entra em contato com alguma coisa do Marx, mas você realmente fica indignada que você está vivendo num mundo assim. E você fica indignada que você não sabia disso até então e você passa por isso. Eu tô todo dia ali, vem uma pessoa e me pede dinheiro no semáforo e eu fico: “Ai, meu Deus”, né? Então foi transformador em mil sentidos.
P/1 - E divertimento, como você viveu a juventude? Como foi esse aspecto da sua vida?
R - Como que eu me divirto, né? Eu me divertia trepando e bebendo, acho que era basicamente isso (risos). Trepando e bebendo com os amigos, acho que essas eram as minhas atividades principais, assim, o mundo girava em torno disso: “O que é que eu preciso fazer aqui, pra ganhar um dinheirinho, pra conseguir viajar com os meus amigos pra Guarda do Embaú no fim do ano”. Então não tinha muitas ambições, sabe? E também não era um ambiente que projetava muitas ambições. A gente era gandaia o tempo inteiro. E, assim, as festas e aí iam ficando cada vez mais arrojadas, os temas, e aí tinha flash mob, na época surgiu o flash mob, a gente fez uns três flashes mobs, sabe? A gente fazia happy hour toda sexta-feira, toda sexta-feira o happy hour tinha pena, tinha telão, tinha produção, tinha patrocínio, porque era na USP, a gente conseguia. E aí vendia cerveja e ganhava um dinheiro a mais e aí dava pra fazer eventos, e enfim. A coisa foi ficando profissional nesse sentido da produção, de festas e viagens. Tudo era uma coisa, assim, cada vez mais arrojada.
P/1 - E expectativas de carreiras assim, teve estágio? Você entrou no mercado?
R - É, vamos lá, aí começa a parte ruim, né? Então cursinho é maravilhoso, ir pra faculdade, “pô”, não queria. Então: “Entrei agora, a FAU é maravilhosa, ninguém tem ambição nenhuma aqui. Está todo mundo feliz de estar aqui, todo mundo se forma em sete, oito anos. E aí o tempo foi indo e aí: “Meu, eu preciso ganhar algum dinheiro, né? Preciso fazer alguma coisa. Então que ambição que eu vou ter”? e aí, sei lá. Nada cantava muito comigo, em termos de dinheiro, então eu falei: “Ah, então acho que eu vou começar uma outra faculdade aqui, de Cinema”, porque eu sou muito do audiovisual, adoro fazer edição, aprendi a editar um monte de vídeo lá. Então sempre tive facilidade com softwares e usabilidade e também, na era da internet, tudo tem um tutorial no YouTube. E aí aprendi a fazer um monte de coisa, eu falei: “Ah, acho que eu vou fazer um curso de Cinema”. Aí comecei a fazer duas faculdades ao mesmo tempo, fazia uma faculdade noturna de Cinema e durante o dia fazia Arquitetura. E aí acabei indo um pouco mais pro lado de Cinema e pensei: “Ah, acho que eu consigo casar as duas coisas com cenário”. E aí eu me candidatei pra um estágio, estágios de cenário por aí, entendeu? E aí acabou que eu passei, na verdade, no estágio de produção, numa emissora de televisão e aí trabalhei pra uma emissora de televisão fazendo cenários, acho que foi o meu primeiro grande trabalho remunerado, aí eu ganhava quinhentos reais por mês, trabalhava doze horas por dia, era isso que eu fazia. E aí, também, você tranca a faculdade, pra poder trabalhar, é muito engraçado: “Ai a faculdade assinou o estágio, está tudo certo? Beleza, agora tranca e foca ali, porque você precisa estagiar”. E aí o estágio foi ficando superinteressante, ali dentro eu consegui migrar pra área da cenografia e fazer alguns projetos, aí eu falei: “Ah, eu acho que eu consigo ser mais útil aqui”. E mandava super bem, só que era realmente uma emissora que era estranho, o computador ainda era de tubo, na época que... sabe, era muito ruim, tudo meio que acaba tendo que ser feito na mão. E os programas eram todos os mesmos. Então o que eu tinha que fazer, às vezes, era: “Ah, precisa de um cabide ali, pra colocar atrás da Luciana Gimenez”, sabe? Você vai lá e desenha um cabide pra colocar atrás da Luciana Gimenez. Então eu realmente tinha muito tempo ocioso nesse trabalho. E aí uma amiga minha também estava fazendo a faculdade, também estava fazendo cenografia pra Band, cenografia pro Carnaval da Band, aí eu falei: “Consegue me colocar pra dentro, aí?” E aí ela conseguiu e aí eu saí da Rede TV! e fui pra fazer montagem de Carnaval da Band. Isso foi sensacional, fiquei um mês em Salvador, montando aquele cenário do Carnaval da Band, aí tinha folga, nossa, me senti adulta, estava ganhando mil reais por mês e estava achando uma fortuna, essa coisa de ser privilegiada: você ganha mil reais por mês só pra gastar, porque você não tem que pagar conta nenhuma, é impressionante. E aí estava ali achando aquilo o máximo e pronto, já achei o que eu vou ficar aqui fazendo isso a minha vida inteira e, realmente, aí sai de lá e fui pra Record, aí fiquei pingando de emissora em emissora, trabalhando com cenografia e às vezes fazendo uns freelancers também, montando stand dessas feiras que têm, no Palácio das Convenções, tem feira e aí tem um monte de stands de marcas, fazia isso também. E era bom, porque era muito rápido. Então, assim: “Olha, eu tenho um briefing aqui de um negócio x, y, z”. Então eu tinha que fazer, desenhar esse projeto e montá-lo num prazo de uma semana. Isso é bom pra mim, eu não me entedio. Então: “Vamos lá!” “Estou fazendo um projeto” “Qual é o briefing?” “Ah, stand três por dois, nessa empresa, eles querem fazer um tema alegre”. “Ah, está bom, está aqui” “Ó, aprovou” “Beleza, show, vou detalhar aqui o projeto. E aí depois acompanho a construção, no galpão”. E tinha muito contato com a galera do galpão, eu nunca fui igual a minha mãe nesses galpões, nunca, sempre ao contrário: eu era a que sentava pra beber com a galera e comia marmita no chão, com todo mundo, sabe? É outro esquema. E você realmente entra em contato com a galera, um deles a esposa fez acarajé pra mim, eu fui na casa dele comer acarajé. Você cria um outro vínculo com eles e, realmente, eles trabalham por menos do que eu, isso era muito louco. Você trabalha ali... assim: eu ganho um “milão” só pra gastar; eles ganham ali, sei lá, quinhentos a seiscentos, comparado ao que eu estava fazendo, eu ganhava ali novecentos, oitocentos, basicamente porque o trabalho deles era bater martelo e prego. Então é substituível, né? Sai um, entra outro. E não tinha uma estabilidade nenhuma, porque eu não sei se vai ter esse freelancer no mês que vem e eles realmente criam uma rede de camaradagem muito grande. Então se um é puxado pra um job, ele tenta puxar todo mundo depois e vai indo. E aí eles começaram a me puxar também. Então eu acabei caindo no mundo dos freelas também, muito por eles, assim: “Ó, tem uma aqui que está precisando de arquiteta, porque o arquiteto é ruim, você pode?” Eu falei: “Posso! Vamos aí”. Então tem isso, assim: “Ah, a gente gosta de trabalhar com você, porque você deixa a gente trabalhar, enfim”. Foi onde eu aprendi um pouco de liderança, do liderar, por exemplo, do liderar: “Me ensina fazer isso aí, deixa eu ver se eu consigo entender como que é”. Aí aprendi a fazer, bater martelo... bater prego em martelo de bandido, assim: martelo normalmente você bate assim, bate e vai afundando. Bandido é assim: quando você quer juntar uma coisa com outra, aí você tem que bater assim. E aí, quando eu chego nos lugares, falam: “Essa aí faz de bandido, ó, que funciona”. Então, tiro e queda, porque eles sabem que eu sei do que eu tô falando, porque eu me misturo ali, entendeu? Então tem muito assim, de como eu aprendi a liderar porque, normalmente, o chefe vai no final do dia pra ver o resultado, eu tô ali pra garantir a execução. E aí foi isso, assim, o tipo de líder que eu queria ser e eu gostei. Eu gostava dessa galera, gostava dessa vibe da montagem, muito mais do que da fase do projeto. O projeto era assim, meio: “Está feito, pronto, está aí”.
P/1 - E quando você se formou na faculdade, você continuou com esse trabalho?
R - Continuei e fiquei trabalhando na Record. Vamos lá: eu continuei até engravidar, basicamente isso. Eu engravidei com 29 anos. Então eu estava CLT na época que eu engravidei, crachazinho, ginástica laboral, passava a pessoa, VR, VA, tudo, seguro de vida, seguro de saúde e aí eu engravidei. Então eu engravidei com uma coisa muito legal ali, que era licença-maternidade. Então eu tive ali um tempo gigante e aí dali eu não consegui mais. Dali me bateu o vazio: “Eu tenho zero ambição na vida e eu coloquei uma pessoa nesse mundo. Eu não consigo deixar essa pessoa em casa, que eu coloquei no mundo, pra ir trabalhar nesse emprego, pra essa empresa, cujos valores não têm nada a ver com os meus e ficar oito dias... oito horas por dia, pelo menos, fora de casa”, porque eu demorava uma hora pra ir e uma hora pra voltar, ficava dez horas por dia longe dele. Ou seja: “Faz sentido eu abrir mão da criação do meu filho, pra um trabalho que eu não gosto? E que tipo de pessoa que eu tô criando, se eu tô fazendo isso? Que valores eu tô ensinando?” Então ali foi onde bateu a chavinha do... na verdade, ainda não tinha nome, mas a chavinha: “Preciso criar alguma coisa pra mim. Não sei o que, não sei por onde, mas vamos lá”. E aí eu pedi as contas, sei lá, no dia seguinte de eu voltar da licença-maternidade, antes de mandarem embora, porque costumam mandar embora mãe, quando volta. Antes de me mandarem embora, eu já pedi as contas e aí fiquei entrando no mundo dos freelas, fazia os freelas de vez em quando ali, pra poder fazer e me matriculei numa faculdade de Tecnologia. Então, porque eu estava muito focada no que eu posso fazer, eu tenho muitas ideias. Foi o boom do Airbnb, do Uber, do iFood, aí você fica vendo: “Pô, tem tanto aplicativo interessante pra se fazer, tem tanta coisa legal pra se fazer. Vou estudar programação e vou entrar nesse mundo da tecnologia”. E essa foi a grande virada de chave minha. Quando eu comecei a estudar e comecei a frequentar esses eventos, eu participei do último processo seletivo, na minha vida, pra entrar em uma grande empresa. E aí, quando eu participei... eu tive uma clareza tão grande, pela primeira vez na minha vida: “Ainda bem que eu não passei, porque isso não é o que eu quero fazer da minha vida”. E comecei a entrar no mundo das startups e assim, dito e feito, foi muito rápido. Quando eu digo muito rápido, é de um dia pro outro. Eu participei de um Startup Weekend e o Startup Weekend é um evento onde você monta uma startup num fim de semana. Você vai sem conhecer ninguém e aí todo mundo se junta pra uma ideia que você tenha afinidade, pra fazer aquela startup acontecer. E a gente fez uma startup que era de reserva de motel, e se chamava Fooking, era o booking.com pra foder, (risos) era isso. E não tinha na época. Então, era muito... e, assim, foi muito interessante ver acontecer aquilo e realmente deu muito certo, a gente teve várias ideias sobre, indo muito na linha do empreender rápido, do testar barato e errar rápido. Foi muito louco isso, porque eu achei que eu precisava gastar cem mil reais pra fazer um aplicativo e eu consegui testar a ideia com um folheto, distribuindo esse folheto na Rua Augusta, no sábado à noite, sabe? Então, foi: “Nossa! As possibilidades são infinitas! Que dor do mercado, agora, eu consigo fazer? Que dor do mercado eu quero preencher”? Então essa ideia do motel até foi ali, foi uns três, quatro meses pra frente, só que a equipe era muito ruim e todo mundo estava com as ideias erradas ali. Eram sete pessoas, sete sócios, imagina, e eu era a única de mulher, nada a ver. E, nesses eventos, era impressionante, mulher era 20%, se muito. Mãe, então: zero, não tinha nenhuma. E eu estava amamentando, nessa época. Então eu tirava leite no banheiro, era muito ruim todo esse esquema, você se sente um alienígena de estar aqui montando uma startup, com um monte de jovem programador, enquanto eu fico aqui tirando leite no banheiro, mas foi bem interessante, assim. Então, eu saí, a gente conseguiu o primeiro lugar nesse do motel, levou o motel até adiante e quando eu desisti do motel, eu fui pra outra Startup Weekend, pra conhecer outras pessoas. Então nesse eu montei uma startup que ficou realmente famosa. Isso é ruim, muito ruim isso acontecer muito rápido, porque eu não tinha nada, né? Então, qual era a minha proposta, quando eu fui nessa Startup Weekend? Eu queria fazer um dispositivo para que pessoas que perderam a fala pudessem voltar a se comunicar, usando a própria voz, porque normalmente você usa uma voz sintetizada, que não tem nada a ver, que não carrega a personalidade da pessoa. Eu queria que ela ainda pudesse ter a sua personalidade exprimida pela sua própria voz. E aí tinha um monte de gente da área da saúde ali, que conhecia uma pessoa que tinha perdido a voz há quinze anos, por conta de um AVC, tinha perdido mais um monte de coisa também, mas a voz também e ela usava dispositivos pra se comunicar. E a gente pegou um VHS dela dando aula, ou seja, tinha um áudio riquíssimo dela ali, esse VHS. Então isso tudo num fim de semana, tá, gente? Então, tudo em um fim de semana. “Pega esse VHS, vamos... alguém tem um VHS, pra gente poder ver isso, pra gente poder pegar essa voz, recortar essa voz e conseguir construir alguma coisa sintetizada?” Não foi bem uma coisa sintetizada, mas foi uma prancha de comunicação, que tinha palavrão, sabe? Essas pessoas não têm o direito de falar palavrão. Então era uma prancha que tinha ali coisas que ela tinha falado, que você via que eram frases dela e que ela podia usar dali pra frente. Então, pela primeira vez, em quinze anos, ela falou um “puta que pariu” e isso foi bem emocionante. Então isso se desenvolveu ao longo de um fim de semana e aí, na segunda-feira de manhã eu saí no UOL, nos principais portais de notícia, falando: “Ah, a startup promete devolver a voz, pra quem perdeu a fala. Desenvolve aplicativo”. Não tinha site, não tinha nada e eu estava sendo chamada ali, no dia seguinte o meu telefone não parava de tocar: “Vem cá, você pode mostrar pra gente o protótipo, não sei o quê”, eu falei: “Gente, não sei se vocês entenderam, não é o protótipo, é uma prancha, é um PPT, não tem nada”. E aí eu comecei a desenvolver essa ideia. Em paralelo a desenvolver essa ideia, eu conheci também a Dani, que estava montando ali um coletivo de mulheres empreendedoras, de mães empreendedoras e eu falei: “Cara, eu tô sozinha no mundo das startups, não têm outra mãe aqui comigo. Não existe mãe no mundo das startups. E essas mães que estão aqui fazendo cupcake pra colocar o dinheiro na mesa e têm diploma de Harvard, precisam só um pouco de metodologia pra conseguir emplacar”, sabe? E trazer aquilo que eu peguei do mundo de startups, lá do motel, dessa empresa que se chama Soul Vox e colocar, dar isso ao alcance pra essas mulheres, porque elas não estão nesse meio, isso nunca vai chegar nelas. Então, ao mesmo tempo, eu fundei, junto com a Dani, uma rede de mães empreendedoras. Então foi essa rede de mães empreendedoras ali, veio em paralelo com a Soul Vox, que essas duas coisas começaram a caminhar paralelas. Essa época... lembra lá que eu falei, que a Record eu trabalhava dez horas por dia e não dava, trabalhava quinze. Eu não via o Guilherme, sabe? Mas, ao mesmo tempo, eu sentia que eu estava realizando coisas e que ele ia entender, em algum momento, sabe? Não tinha fim de semana, não tinha noite, a gente morava em Alphaville, tudo era em São Paulo, tudo tinha um puta trânsito pra ir, um puta trânsito pra voltar, às vezes eu dormia na casa de uma amiga. E a minha mãe segurando as pontas lá, porque eu engravidei do Guilherme sem planejamento. Então eu não estava junto com o pai, não tinha nada, era mãe solo ali mesmo, com a minha mãe criando o meu filho, enquanto eu estava fazendo isso tudo. E aí era muito isso, assim: “Nossa, lembra da Record, de quando eu trabalhava dez horas por dia, com uma coisa que eu odiava”? E, nesse ponto, ficou claro que eu odiava, que eu fazia só porque era rápido e eu podia me livrar daquilo logo, sabe? Faz um projeto que resolve lá, rápido, e eu posso sair daqui logo. E agora eu tô passando quinze horas por dia, acordada, trabalhando e eu não tô vendo meu filho, mas eu tô com a sensação de que eu tô realizando uma coisa muito legal. Então foi onde eu entendi que, puts, propósito é fundamental para se empreender. Se você não tem, é meio assim, você esquece. E eu tinha, tinha pros dois, tenho propósito pra quinze mil empresas, esse é o problema. Depois a gente descobre que tem outros problemas, propósito também cega. Mas, nessa época, eu estava muito empolgada com esses dois projetos. E aí eu fui, passei na aceleração da Farm com o projeto da Soul Vox, ao mesmo tempo que a gente estava montando um programa de aceleração aqui no B2Mamy, tudo junto. Aí eu pegava o conteúdo daqui e aplicava aqui e a gente reproduzia isso e, ao mesmo tempo, eu estava sendo acelerada pela Soul Vox. Enquanto eu estava sendo acelerada pela Soul Vox, junto com outras empresas que estavam muito mais pra frente e eu, basicamente, só tinha um PPT, foi a hora que me deu o gancho assim, tipo: “Espera aí, eu não tenho Cnpj, eu não tô gerando renda nenhuma, eu tô sendo chamada pra ir na Fátima Bernardes, tô sendo chamada pra ir... a Record quer vir em casa, filmar, eu tive uma página na Folha sobre uma campanha de doação de voz que eu fiz”. Não foi pouca coisa. E eu me sentia realmente uma fraude e eu estava dando palestra de empreendedorismo na área da saúde e eu não tinha o Cnpj, sabe? Não tinha nada, eu não tinha nenhum dinheiro entrando e eu fazendo freela de madrugada pra conseguir pagar a mensalidade da escolinha do Guilherme. Então, foi realmente a sensação de fraude, era gigantesca. E aí, durante o programa de aceleração e eu estava trabalhando com voz, eu pensei assim: “Tá, eu realmente preciso pivotar esse negócio pra alguma coisa que gere renda e que gere renda rápido, porque eu não consigo ficar aqui, mais, muito tempo. Eu preciso ganhar dinheiro”. Então eu mudei esse mindset, nesse momento. E como eu estava trabalhando com voz e o B2Mamy estava sendo hospedado em um call center: “Vamos olhar pra call center”. Então eu tinha proximidade, tinha o que olhar e tinha o que testar e aí foi daí que nasceu a Scooto. Não nos moldes do que é hoje, porque era muito orientado à tecnologia. Então eu preciso desenvolver uma ferramenta que resolve as dores de call center. E aí quando eu fui olhar realmente pra dentro do call center, eu entendi. E olha que eu fiz uns 25 pitches, desenvolvendo uma ferramenta de monitoria e controle de qualidade em call center. Fui pro Vale do Silício falar isso, porque o programa de aceleração tinha uma viagem pro Vale do Silício, você vai, faz isso e você vê: “Espera aí. O problema, a dor...” - e, assim, acho que todo produto tem que resolver uma dor – “... aqui é o atendente, é a mão de obra, essa relação de trabalho. Não é uma ferramenta, ferramenta tem ‘trocentas’ aqui, eu tô todo dia olhando ferramenta pra ver se eu consigo desenvolver alguma coisa. Tem ferramenta pra tudo que é tipo, tem um “mar vermelho” aí de possibilidades. Mas o atendente, um call center que tenha foco nas pessoas, não existe. São jornadas de oito horas por dia, num cubículo, com horário cronometrado pra fazer xixi, com horário cronometrado pra você comer, presencial”. Então, assim, era tudo muito... impossível sair uma relação de qualidade ali, pra você fazer atendimento de qualidade com essa condição de trabalho, com horas de controles gigantescos em cima de você. E a minha tese era: “Se a gente der melhores condições de trabalho, a gente consegue melhores pessoas, e aí a gente consegue entregar um resultado melhor”.
P/1 - Eu só queria te perguntar, aproveitando a deixa, como surgiu a ideia de montar a Soul Vox e a B2Mamy? Você já vinha com essa intenção ou foi pensando em conjunto? Como foi esse momento?
R - A Soul Vox, quando eu pensei e idealizei a Soul Vox, eu fui pro Startup Weekend com essa ideia na cabeça. Então o Startup Weekend, você vai, apresenta uma ideia que você tem na cabeça e as pessoas votam nessa ideia e aí as ideias mais votadas são desenvolvidas. Então eu fui com essa ideia na cabeça, porque o meu pai tinha perdido a voz pra um câncer de língua. E eu fiz isso, eu falei: “Pai, grava aqui essas frases e essas palavras que você fala tanto”. Por exemplo, acachapante é uma palavra que ninguém fala acachapante, é uma coisa, assim, é muito louco, ele falou: “Nossa, foi acachapante”. E aí eu: “Grava aqui, acachapante, grava essas palavras”. Então eu tinha um acervo que eu tinha feito pro meu pai usar no WhatsApp pra se comunicar comigo, porque eu não ia ouvir mais a voz dele, do jeito que eu conheci. Então tinha uma coisa muito emocionante dentro de mim, pra fazer a Soul Vox acontecer. Quando a gente conseguiu fazer algo semelhante, quando a Amália, que tinha tido um AVC de quinze anos e a filha dela, que tem catorze, não lembrava de ouvir a voz e nunca teve a voz da mãe, foi muito emocionante. Então era um projeto que, sim, mobilizava muitas pessoas, eu me sentia incrível fazendo isso. E eu achava que era uma dor extremamente válida, porque afinal está todo mundo falando que é lindo. Mas quando eu fui ver, é um falso positivo, é um caso de... a gente tem saudade da voz, a gente tem, mas a comunicação passa muito longe disso. Então a comunicação passa pela agilidade, por exemplo, Ana Amália usava prancha de comunicação pra falar com quem ela não conhecia. No dia a dia, ela se comunicava com o olho. E ela desenvolveu uma metodologia pra se comunicar, piscando. Então ela piscava, que era o que ela conseguia mexer e ela piscava com o olho, sinalizava as letras que ela queria falar e as pessoas iam já entendendo que ela tinha... e eu estudei o método dela, pra ir lá e falar com ela, conseguir me comunicar e entender as piscadas de olho, sabe? Porque era o mais rápido pra ela. E aí eu fiquei sem falar durante uma semana, pra testar coisas. É incrível, eu só ter tido essa ideia um ano depois: “Vou ficar sem falar e vou ver o que eu uso pra me comunicar”. E o que era melhor pra mim, era papel e caneta. Eu tive que discutir com uma pessoa no estacionamento, falei: “É gestos, papel e caneta”. Nunca na minha vida que eu ia pegar um aplicativo, digitar pra pessoa ouvir, sabe? É muito distante da realidade isso, que basicamente, assim, você fala, aí eu: “Espera um minuto”. Solto, aí você ouve. Então isso não acontece, foi onde eu entendi que a Soul Vox não fazia o menor sentido, depois de já ter saído e ter rodado o mundo e ter ‘mentorado’ em empresas. É uma coisa muito louca, velho, por causa disso. E foi onde eu enterrei o projeto, foi no meio do meu processo de aceleração. Então...e dei uma entrevista, inclusive na CNN... era, sei lá, BBC. Dei uma entrevista de quarenta minutos para a BBC, num programa que teve uma audiência de dezesseis milhões de pessoas, derrubou o site, uma coisa assim, muito louca, porque eu não acredito que depois disso tudo, eu ainda tenha validado errado. Eu não validei uma coisa tão básica, que é: “Isso é uma dor de mercado? Isso é realmente uma dor que as pessoas têm ou é só uma saudade?”, né? E era uma saudade e que não adianta, eu não vou conseguir trazer de volta. Perdeu, perdeu a voz e desenvolveu outras formas de se comunicar, o universo das pessoas que perderam a fala é muito diverso. E o B2Mamy nasceu porque eu estava muito sozinha ali e conheci uma pessoa que também queria fazer alguma coisa. Ela queria fazer um marketplace pra mães empreendedoras venderem os seus negócios. E aí as mães que se encontram na dor, porque tem muito isso, a gente se encontra na dor de: “Puts, e agora? Olha o mercado de trabalho (risos). Olha o meu filho crescendo, olha o sacrifício que eu tenho que fazer”. Então, nessa dor gigante, ela tinha isso e eu tinha essa experiência do mundo de tecnologia, eu falei: “Cara, marketplace, você está sonhando muito alto. Tem que partir de uma dor, qual é a dor aqui? Elas querem empreender, precisa da informação”. Então, na hora que a gente começou a dar informação, a coisa começou a decolar. E aí a gente trouxe métodos ágeis, metodologia de startup pra lançar rápido, metodologia de MVP, que é um Mínimo Produto Viável. Então, assim: “Qual é o jeito mais barato que você consegue lançar essa sua ideia? Não é abrindo uma loja, é colocando uma roupa na sacola e batendo de porta em porta, vendo se você consegue comprar. E aí você pode inovar no método de vender. E você precisa ter o dinheiro rápido, você precisa vender mais rápido”. Então, a gente mudou o mindset de muitas mães e eu estava muito envolvida com elas ali também. Mas era assim... e essas duas coisas aconteciam em paralelo. Então era muito legal ver esse shift mental que aconteceu comigo, na época do motel, que eu vi: “Espera aí, está validada a ideia com o folheto?” E ver ali nas mães que estavam: “Eu quero vender cupcake, eu tenho diploma de Harvard, mas eu pedi demissão porque eu [quero] ficar mais perto da minha filha, depois que eu virei mãe e agora eu fiz uns cupcakes”. E, assim, é muito louco, porque são cupcakes maravilhosos, lindos. Você olha a foto, tem um baita de um Instagram, um negócio maravilhoso, mas, cara, está vendendo cupcake, né? Você tem diploma, você é pós-graduada em Harvard, tinha o cargo alto, executivo, numa empresa multinacional. Então, você vê - é muito angustiante - essa capacidade gigantesca sendo soterrada, porque elas viraram mães. E aí, quando nasceu a Scooto, eu consegui juntar as duas coisas, inconscientemente, né? É muito louco, não estava no projeto, no início.
P/1 - Conta um pouquinho desse processo, assim, quais foram os maiores desafios e aprendizados com essa junção?
R - Tá. Maiores desafios eu entendia assim: como eu rodei muito nesse início, tentando empreender, o meu rostinho já ficou carimbado ali, em eventos de tecnologia e eu fiz muito contato e conheci muitas pessoas, quando eu falei que eu estava tentando validar o modelo de call center, focado na flexibilidade e na jornada de trabalho e local remoto e tudo mais, naturalmente eu já tinha contatos com mães e elas eram as primeiras a topar. E, assim, vamos lá, sobre validar rápido. Esquece isso, já chego lá, vamos primeiro sobre validar rápido, essa é a minha ideia. Então eu consigo entregar uma satisfação muito boa, um tempo de resposta muito bom, consigo entregar uma qualidade de atendimento extremamente empática, se eu contratar remoto e flexível. Beleza. Na hora que eu defini essa tese que eu ia testar, esse MVP, eu olhei ao meu redor e eu vi que as empresas, por mais cagadas que tivessem, todas as startups tinham uma vaguinha ali, de customer service, que agora é assim, você coloca o nome em inglês, parece que sumiu toda ótica ruim ali que tem do subemprego, que é o atendente. Mas é muito louco. Então, tem dinheiro, assim, a empresa, por mais falida que esteja ali, na validação da ideia, na tração que não anda, ela tem uma vaga de customer service. Então, realmente tem esse gap ali, tem esse furo, tem essa necessidade. Você quer colocar alguém interno ou você topa testar comigo na ideia que eu tô querendo ter, de entregar um atendimento extremamente empático? Era basicamente assim: quero ser uma agência de marketing que atua ali, no atendimento. Eu inverto o seu funil: a pessoa que entra sai tão encantada, que ela vai indicar pra um monte de gente e você vai bombar em cima das pessoas que você já tem, na sua base. E assim eu comecei a vender a Scooto. Em uma semana, eu tinha dois clientes e já tinha uma renda recorrente, mensal, de sete mil reais. Em um ano e meio, eu não tinha nada com a Soul Vox. Em uma semana, eu tinha sete mil reais de renda recorrente por mês, com a Scooto. Então foi: “Pim! Não acredito que eu tô ganhando dinheiro, finalmente, finalmente”. Então, óbvio que, no início, era eu sozinha, e na época eu tinha conhecido um Tinder maravilhoso, que era o Diego. E esse Tinder maravilhoso, que eu estava ali também, trabalhando e fazendo vários pitches acordada e trabalhando muito essa ideia, foi muito seduzido quando eu virei e falei: “Eu quero inverter esse lance do atendente ser o subemprego e quero entregar um atendimento de qualidade aqui, contratando pessoas sob jornadas flexíveis e horário flexível e remoto”. Quando ele entendeu isso, ele embarcou, nesse momento. E aí eu entro muito no lance da sorte, pra coisa dar certo. Então consegui ali, consegui pessoas que acreditassem em mim a ponto de pagar por mês, pra fazer. Isso foi muito construído em cima da reputação que eu tinha antes. Beleza, mas agora eu tenho que entregar. Então, agora, como é que eu faço pra entregar? Nunca trabalhei com isso. Então, foi muito no instinto, veio tudo lá de trás, cenografia, preciso montar rápido, preciso aprender rápido, veio tudo lá de trás, eu aprendo muito rápido as coisas. Edição de vídeo eu aprendi muito rápido, edição de vídeo, cinema, que loucura! Então tudo veio junto. Então, aprendo muito rápido essas ferramentas e aprendo muito rápido sobre o que a empresa está querendo vender, pra eu conseguir entregar. Mas isso estava no meu braço e depois, no momento, no braço do Diego. Então a gente tinha, sei lá, sete aparelhos em cima da mesa, sete aparelhos de telefone celular, assim, em cima da mesa, fazendo atendimento com vários canais possíveis e sambando ali, a gente pegou empresas que tinham atendimento no Ano Novo, no Natal e tudo mais e era assim, mas muito emocionante, porque realmente estava acontecendo. E a gente tinha dois clientes, né? Nos dois clientes, a gente conseguia absorver e eu conseguia ganhar algum dinheiro. Entrou três clientes, a gente já precisou contratar a nossa primeira pessoa e é aí que eu falo sobre o lance da sorte. O Diego foi uma primeira grande sorte, de ter uma pessoa ali que é muito parecida comigo em termos de pegar rápido as coisas e de querer topar. E ele tinha um emprego full time também. Então não era fácil pra ele, ele fazia escondido na gaveta e ninguém sabia que ele estava fazendo isso na época que ele saía e ia, tinha um almoço de uma hora, ele tirava uma hora e meia, era tudo meio junto. E aí quando a gente começou a contratar pessoas, a primeira pessoa não deu muito certo, a segunda pessoa não deu muito certo e aí, deu mais ou menos certo. Depois de um tempo, o Diego foi demitido. Não foi demitido, mas era PJ e o projeto tinha acabado. Então eu o tinha full time e eu engravidei. Na verdade, a ordem dos fatos não foi bem essa. Eu engravidei bem no início ali, de quando ele embarcou, ele ainda estava trabalhando na agência, vamos lá: Diego estava trabalhando PJ, enquanto estava trabalhando junto comigo ali na Scooto, eu estava full time na Scooto, já conseguindo bancar alguma coisa e aí, nesse meio tempo, pá, grávida de novo, legal. “Ai, meu Deus, ferrou, caramba”, mas muito parecido com a minha mãe lá atrás, lembra que minha mãe engravidou depois de um mês e meio? Guilherme não veio planejado, Téo veio mais ou menos planejado, porque a gente estava super se amando, mas aí a gente não fez nada pra evitar, falei: “Se acontecer, aconteceu”. E aconteceu, assim, no primeiro mês, meio... caramba, não deu nem pra testar direito. Então eu tinha conhecido o Diego há cinco meses, já diga-se de passagem, é intenso, quando é pra ser, é pra ser e foi e estamos aí até hoje. E aí foi nesse momento aí da gravidez também que a gente começou a crescer um pouco, veio mais alguns clientes e veio sempre de umas indicações. E aí o Téo nasceu, estava fazendo atendimento na maternidade, que agora dessa vez não tem licença-maternidade, só tinha o Diego pra me cobrir. E a gente não tinha ninguém, era só eu e ele na empresa, fazendo os atendimentos. E assim que a gente saiu, depois de um tempo, aí sim ele perdeu o emprego na agência. Quando ele perdeu o emprego na agência, a gente o teve full time, a gente olhou pra cartela de clientes, ficou uma coisa assim: “Espera aí, se a gente perder um cliente agora está muito perigoso pra gente, a gente tem dois filhos agora, ferrou. Não dá mais e agora eu saí da casa da minha mãe, não tô mais naquele lance. Então, aquele privilégio todo foi embora. Não tem mais minha mãe aqui lavando roupa, segurando os filhos o tempo inteiro. Precisamos aqui...” É muita sorte, sabe? É muita sorte, do que tem que acontecer, acontecer na hora certa. Diego estava fumando um cigarro num casamento que a gente foi, com uma pessoa que ele conhecia já de longa data e essa pessoa que ele conhecia de longa data era CEO da InfoMoney. E a InfoMoney estava com uma dificuldade grande de atendimento na área de cursos, da parte educacional dos cursos que a InfoMoney tinha, lá na área de finanças. E aí eles tiveram um evento que teve um pico gigantesco, eles já tinham contrato com um call center grande na época, mas eles estavam precisando atender um momento de pico ali, gigante. E aí o call center grande não conseguia atender esse momento de pico e a gente falou: “Vamos, vamos”. A gente já estava atolado, só nós dois, mas a gente não tinha mais ninguém na empresa: “E aí, como a gente faz”? Essas horas, assim, que eu vejo que, realmente, eu sou empreendedora, porque eu dou jeito, eu dou um jeito. Divulguei no grupo do B2Mamy e era aquilo, pra virar duas vagas. Então assim: eu vou fazer um processo seletivo, vou chamar um monte de gente aqui pra testar e acabar zerando essa caixa daqui. Chamo um monte de gente pra testar e depois a gente contrata duas pessoas. Então onde que eu divulgo: grupo de mães. E foi isso, assim: divulgo a vaga no grupo de mães, com a oportunidade de um trabalho remoto e flexível de horário. Choveu! Choveu. E a gente vai fazer um teste remunerado, de uma semana. “Puts grila! Eu ainda vou ganhar, durante um processo seletivo?” Foi assim. Foi onde eu realmente vi como falta dignidade no processo seletivo hoje, no mercado de trabalho. Então a gente inovou nisso também. Então, assim, a gente paga as pessoas pra testá-las durante esse processo que tem ali, eles tinham contratado quatro posições, por exemplo, pra atacar aquele momento, a gente colocou dezoito pessoas ali, pra fazer. Então eu mais do que tripliquei a quantidade de pessoas. A gente treinou, da noite pro dia, dezoito pessoas. E dessas dezoito pessoas, duas que estavam ali, hoje são C-levels na Scooto. Então entraram ali depois, a gente conheceu pessoas muito incríveis ali e voltando pro lance da sorte: tem muita sorte no início do empreendedorismo, tinha muita coisa que se isso não acontecesse, eu não tinha renda pra aguentar mais um mês e eu ia precisar enviar currículo e ia precisar fazer alguma pessoa. E aí uma pessoa me indicou pra entrar na Falconi, mas indicou porque conhecia a Marina, não indicou porque conhecia a Scooto. Então durante muito tempo eu sobrevivi à base de um networking que acreditava em mim e não na Scooto. E aí isso me levou até certo ponto, mas chega em um ponto que o networking esgota e eu tô aqui, agora, em casa, com dois filhos, desenvolvendo uma empresa remota e não tô mais dando a cara em um milhões de eventos. O que acontece? Num casamento que a gente tinha que estar, caiu a InfoMoney no nosso colo. Então caiu a XP, né? Caiu uma empresa gigante no nosso colo e a gente conseguiu duas cadeiras fixas ali, tirando a cadeira do... a gente desbancou gigantescamente a cadeira do call center, porque a qualidade do atendimento era, assim, outro nível. O português, a empatia, a atenção, o cuidado, era uma coisa... a velocidade, o SLA era uma coisa assim, absurda a satisfação. E o do call center era lá embaixo, não tinha comparação. Então a gente chegou, entregou, o negócio cresceu, duas cadeiras viraram, rápido, quatro cadeiras. Depois, quatro cadeiras, viraram rápido seis cadeiras. Nisso a gente começou a trazer, conseguiu crescer na indicação de empresa pra empresa. Então a gente entrou na Alura, entrou numa empresa grande ali, também, de educação, pra fazer vendas e aí a gente descobriu um braço novo, eu achei que a gente ia fazer só suporte e a gente... “Vocês fazem vendas?”, porque a pessoa me conhecia, eu falei: “Claro, estamos dentro. Você sabe que é pau pra toda obra, manda aí, que a gente faz”. Daí a gente fez vendas nesse cliente e a gente teve resultados tão bons, que indicaram pra outro cliente e a gente conseguiu um resultado muito bom. E todos esses, inclusive, estão com a gente até hoje. São clientes que estão com a gente, a empresa tem quatro anos, tá? Então não é muito tempo. Mas elas começaram aqui no segundo ano e estão com a gente há três anos. Então são contratos muito longos e só cresceram, isso é muito emocionante. Nesse meio tempo, a gente tinha aí uma empresa de quinze “scooteiras” e realmente foi muita sorte, porque era uma dor gigantesca que eu via nas minhas companheiras startups: eram pessoas, as pessoas que você contrata, né? E aí, ao mesmo tempo, o Diego fala muito isso, pra mim: “Marina, não foi sorte, é por causa das condições de trabalho. As condições de trabalho de uma startup normalmente são insalubres. Você trabalha pelo propósito, por equity, num vento, equity de vento”. Então as pessoas trabalham horas absurdas, porque é startup, meu! Startup é um ritmo, surreal, você trabalha pra caramba. Não, cara, precisa dar boas condições de trabalho, é só isso. E o mercado não percebeu isso, e nisso, quando eu olhei, realmente a gente só tinha mãe, não foi uma coisa assim, planejada. Eu só tenho mãe, eu só acredito em mãe, entendeu? Eu só acredito nelas. Eu não acredito, se eu colocar um homem aqui, que vai dar certo, eu só acredito nelas. E aí que eu realmente entendi que eu tinha criado uma empresa que tinha o propósito de colocar mulheres no mercado e provar uma coisa muito importante pro mercado, que é: “Olha o que vocês estão jogando fora. Que erro, sabe? Olha a entrega, é um absurdo”. Então a gente tinha ali, no início, neurocientista, arquiteta, psicóloga, jornalista, atriz, todo mundo fazendo atendimento ao cliente, fazendo venda. Entregando um baita de um resultado, sendo que nunca fez isso na vida, trazendo relatórios estratégicos pras empresas, sobre produto, pra redesenhar produto. Então: “Olha, a gente está atendendo muito ticket disso, que tal fazer um produto que atenda essa necessidade?” E aí eles fazem o produto e o produto vende. Então tem uma coisa muito louca aí, que aconteceu nesse início, que a gente cruzou com pessoas muito legais, que também estão com a gente até hoje. Nessa primeira leva, a gente perdeu acho que uma pessoa, que saiu pra montar uma empresa própria também. Então realmente estava com a gente num momento de transição. E realmente era algo que era pra ser um plano B, enquanto elas estavam sendo mães e virou plano A e estão com a gente até hoje, porque viu o quão importante é trazer essa autoestima pras mulheres, porque você coloca dinheiro dentro de casa. É diferente. Você conseguir ser mãe e colocar dinheiro dentro de casa, enquanto você acompanha o crescimento do seu filho, enquanto você está numa empresa onde você não se sente culpada de virar e falar: “Eu vou levá-lo na natação, eu aviso quando eu voltar, tá bom? Quando eu voltar, eu olho”. Isso não tem preço, assim. Então a cultura da empresa é fundamental pro crescimento de uma empresa. A gente tem uma sorte ali, no início, a sorte do cigarro certo na hora certa (risos), lembra do pai fumante? Aí, ó os complexos. Foi o cigarro certo, na hora certa. Tem uma sorte de umas indicações, de uma pessoa que acredita em mim estar numa empresa e ter uma vaga que precisa de algo parecido comigo. Então ela consegue lutar pra contratar gente dentro. Então, teve muito isso ali nesse início, muito dependendo do que acontece, mas depois o crescimento, eu só consegui crescer, porque eu tinha essas mulheres comigo. Então não era... e não é mais eu, sabe? Eu até fico assim, meio receosa de ser colocada num palco de empreendedora, porque eu não fiz nada sozinha. Acho que eu fiz sozinha ali, duas semanas, depois o Diego entrou, depois as outras foram entrando e a gente só cresceu, porque essas pessoas entraram. Então eu tenho muito... eu queria muito dar palco pra elas e trazê-las junto comigo, porque essa empresa só cresceu, porque elas mandaram muito bem nessas operações. Pegaram realmente como se fosse o segundo filho, porque é preciso colocar outras mulheres também no mercado de trabalho, porque estão lá em casa apanhando do marido e não têm dinheiro pra sair, né? Então, tem muitas realidades aí, tem a mulher preta que fala mandarim, que tem dois diplomas de Relações Internacionais, de Gestão de Empresas, mas não consegue um cargo que não é recepcionista, é um absurdo. Então a gente foi... aí, o propósito da mulher começou a crescer muito mais e a gente foi vendo também uma coisa assim: olha o que acontece quando você tem um ambiente de trabalho, que é 100% feminino, você as vê livres. Você as vê falando sobre coisas ou se impondo. Você vê que, no início, é uma coisa meio.... desculpa, é como se quase fosse uma vírgula, pra mulher, no ambiente de trabalho: “Desculpa, mas eu acho que pode ser que seja isso. Desculpa, mas eu vou fazer aquilo ali. Desculpa, é que eu ouvi um negócio. Desculpa, desculpa, desculpa”. E você vê que, depois de um tempo, num ambiente de trabalho 100% feminino, a autoestima vai mudando, porque elas não precisam falar desculpa, porque elas estão num ambiente seguro, nesse sentido. Então você vai devolvendo uma coisa pra elas, que elas tinham perdido e que elas não iam encontrar no mercado de trabalho, porque não tem uma empresa feminina, 100% feminina no mercado de trabalho. Então, é realmente muito necessário. E eu não tinha me ligado disso na teoria, eu tinha me ligado disso na prática. A teoria veio depois, entendeu? Ela veio depois, pra virar e falar: “Olha, realmente somos uma empresa com esse propósito”. Mas ela veio meio na raça mesmo, meio no sangue.
P/1 - E como foi a escolha do nome?
R - A escolha do nome veio de escutar. A gente ia ser uma empresa que escuta, só que quando eu ia fazer “escuta”, tinha um cu no meio, aí eu não queria que o nome da minha empresa tivesse cu no meio, eu achei que ia pegar mal. E aí eu falei: “Pô, Google, Facebook, empresas gigantes tem dois
“os” no nome, vamos trocar o “u” por dois “os” e fazer um nome meio “startupeiro”, entendeu? E aí as pessoas entendem, mas vêm de escutar. Então a gente traz muito assim: “Fala que eu te Scooto”. Tem muitas coisas assim que a gente usa esses trocadilhos em cima do escutar, com a escrita do Scooto com dois “os”, mas assim, porque falou: “Empresas com dois “os” no nome dá super certo” e tem funcionado assim. Hoje, a gente... realmente, esse ano a gente começou o ano, com acho que quinze, quinze a vinte “scooteiras”, em janeiro desse ano, a gente está com 96. Então a gente cresceu muito esse ano, eu tô muito ansiosa de chegar em cem, porque era uma meta pessoal minha, que eu tinha de chegar a cem “scooteiras” e aí isso está muito próximo de acontecer. Então... e a gente está conseguindo crescer, óbvio, mil dores de crescimento, governança, muitas coisas a gente fazia do jeito que a gente entendia e agora a gente precisa ter processos mais claros porque, afinal, tem 96 pessoas ali. E agora tem CFO, C-levels e tem o chefe de pessoas, tem a chefe de marketing e tem Comercial. Assim, agora realmente é uma empresa. Lembra da pessoa que se sentiu uma fraude, hoje eu olho pra isso, eu fico: “Meu Deus, olha só o que eu fiz!” E todo mundo com propósito igual e carregando a empresa, eu mexi. Então, assim, aí do nada aconteceu isso. Não foi do nada, porque realmente as pessoas que vão entrando, sacam o propósito e vão entrando, é contagiante. E quem não se enxerga na cultura, sai muito rápido. Os processos seletivos que a gente fez, remunerados, continuam, acontecem com frequência. Então a gente conhece muitas pessoas assim. E as pessoas também, que não se interessam, saem muito rápido. Então tem o turnover caps, se é pra dar errado essa relação, que ela dê errado em dois, três dias e não depois de um ano, com você sacrificando um monte de coisa, daqui a três meses. Não, vamos resolver isso aqui em uma semana. Então as pessoas são fantásticas, a cultura que acontece aqui dentro e eu falo aqui dentro, sendo que essas pessoas poderiam ser madrinhas do meu terceiro filho e eu nunca as abracei. Olha que loucura! Porque estão cada uma em um lugar no Brasil. Essa cultura é fenomenal.
P/1 - Tem alguma história marcante, de alguma mulher que você conheça e queira compartilhar?
R - Tem mil histórias marcantes, porque história é um requisito pra entrar. Então não entra quem não tiver uma história marcante ali, que a gente não percebe que essa oportunidade vai fazer uma diferença gigante na vida dela. Então, realmente: “Você quer se candidatar? Tem no formulário: escreva aí a sua história, tome quantas linhas que precisar” e até hoje a gente lê tudo. Assim, tem de tudo. A primeira de todas, que é a Usha, que está com a gente até hoje, curiosamente não foi pra esse formulário, foi pra um cliente nosso, que ela era atendente interna e eu a roubei, ela era muito boa, muito atenciosa a detalhes e ela ganhava três e meio e eu falei: “Eu consigo te pagar mil. É só que eu consigo te pagar”, ela falou: “Cara, eu tô dentro, eu não aguento mais isso”. E a história de vida dela é o seguinte: ela nem era mãe, mas o marido dela... assim, a Usha, o marido da Usha sofreu um acidente e vive num estado semivegetativo, ela não sabe nem se ele está ali mais, mas ela cuida e vive em função dele 24 horas por dia, sete dias por semana. Então, ela não tinha mais alguma coisa dela, sabe? Então a Scooto deu pra ela não só uma comunidade muito tempo depois, porque no início era só ela. Então, era assim: o Téo tinha dois meses, era a primeira vez que eu ia sair de casa e deixar o Téo sozinho, porque eu falei: “Eu vou lá, porque eu preciso contratar essa mulher, ela é perfeita pra gente”. E a gente foi, ela está com a gente até hoje. E é uma que também faz assim: “Cuidado pra não perder a essência, cuidado pra não perder a essência”, porque ela estava lá no início e ela sabe qual é a essência. Então, é muito louco isso. E ela tem essa história, de estar com o marido em estado vegetativo, em casa e ela nunca ia conseguir um trabalho em outro lugar, que atendesse as condições de vida que ela tem, que dê a flexibilidade que ela precisa. Isso não ia acontecer, ela nunca ia conseguir gerar renda. Então, é muito importante, muito empoderador, as mulheres que estão nesse momento delicado, conseguirem gerar renda. Essa é uma história, que é a primeira, mas tem mãe de três na periferia, solo, que saiu de casa porque apanhava, na frente dos filhos. Então, tem moradora do Complexo da Maré, onde helicóptero anda atirando pra baixo e também é mãe solo. Então, tem muita coisa aí, muita, muita, muita história, muito louca. Então, não sei nem por onde começar, sinceramente. Você falou de história, eu falei da uma, que é a primeira. Mas, assim, tem um milhão.
P/1 - E, Marina, pra você, como foi, o que significou se tornar mãe? O que a maternidade representou na sua vida, nesse primeiro momento como mãe solo e depois, tendo um parceiro?
R - Espera aí, vamos beber água, que essa é complexa. Ai, ai. Ter feito um ser humano foi uma coisa que me ensinou a amar, me ensinou de fato o que é amar. Acho que antes eu não sabia o que era. Antes era: “Ah, eu amo a minha mãe, amo o meu pai. Se morrer, vai ser foda, vou ficar muito triste”. Mas é muito diferente essa sensação de você ter o seu coração fora de você e o propósito que vem com isso. Vai muito além do: “Nossa, eu quero estar perto, eu quero acompanhar o crescimento, eu quero educar”. Pra mim, vai assim: “Eu preciso transformar o mundo, que essa pessoa chegou agora num mundo melhor e o que eu posso fazer, né?” Porque olha esse mundo: está muito cagado, eu tô sozinha aqui agora. Nenhuma das minhas amigas teve filho, eu sou a primeira e ainda assim, nessas condições, sozinha. Então, foi muito... mudou, mudou a minha vida. Certamente, eu olho pra Marina de antes, eu falo: “Nossa, acho que eu não sei nem se eu seria amiga dela”. Aquela Marina de antes de ser mãe, é uma pessoa que eu me identifico zero. Acho que ela não acrescenta nada pra ninguém. Ela só queria aquilo o que eu falei: beber e trepar. É isso que ela quer: beber, trepar e viajar, é essa a vida dela e hoje a vida tem um propósito de transformar o mundo num lugar melhor, pra que meus filhos possam herdar algo que seja um pouco melhor. Vamos pegar o que está ao meu alcance. Então ser mãe sozinha e também, assim, teve uma outra coisa, que é: eu nunca fui muito disciplinada na minha vida. Ter essa coisa do horário pra dormir, da rotina que a criança precisa e tal, eu nunca fui, eu falei: “Eu vou ser uma péssima mãe, nesse sentido. Eu sei que vou ser, eu já sei, não vou tentar me mudar. Sei que meu filho vai dormir uma hora da manhã e ponto e é isso, entendeu? Eu não vou conseguir colocá-lo pra dormir às nove e depois acordar às seis da manhã. Eu não sou essa pessoa, não vai dar certo”. Então, que eu lidere por exemplo e, nesse início, a minha mãe me ajuda, então, com essas coisas do horário, mas ele ia dormir uma hora e meia da manhã, acordava onze e meia e aí está ótimo. Essa é uma frase que eu adoro, relacionado a maternidade: “Ué, mas ele está aí, está ótimo” (risos). Isso cala a boca de toda mãe “opineira”, aquela que opina alguma coisa em relação aos seus filhos. E depois, quando eu tive filho com o Diego, com um pai ali presente e que, inclusive, assumiu a paternidade do Guilherme também, foi uma relação entre os dois que floresceu, muito legal, muito lindo de se ver. Foi mais difícil, porque agora eu tenho que compartilhar as decisões e dividir, eu tenho que respeitar o jeito como ele troca a fralda, diferente do meu. Ele quer rotina certinha, eu não sou dessas, eu não consigo, mas agora tem dois filhos. Então, é o aprendizado de ceder, foi muito difícil no início, porque eu sou uma pessoa que atropelo muita coisa e, se eu tô sozinha, eu faço do meu jeito e é isso e ter que dividir essas decisões. Então na hora que nasceu o Téo, a vida ficou um pouco mais complicada, no sentido de: “Meu Deus, agora eu tenho dois corações fora de mim e agora eu tenho um marido. Agora eu tô dividindo casa, empresa com uma pessoa, além dos dois filhos”. Então, esse momento foi muito conturbado, porque tudo se misturou muito. Então... mas, assim, tinha uma coisa sobre empreendedorismo, sobre você empreender em família, você empreender com o seu marido, falei: “Ah, isso não vai dar certo, isso não vai dar certo” e é meio tabu, inclusive, em termos de financiamento, de investimento. Tanto que, assim, a gente foi num programa, num reality show lá do João Kepler e meio que não importava o que a gente fazia ali, o que a startup fazia. O que importava era que os fundadores eram marido e mulher. Então, vamos abordar isso no programa. Vamos abordar as fraquezas disso e vamos abordar as fraquezas que a Marina é quem teve a ideia e é ela que manda no negócio e o marido, enfim, foi muito feio, nesse sentido, a forma como o programa decidiu abordar a realidade do casal. Porque se você está acreditando com aquela pessoa: casa, carro, empresa, filhos, casamento, não tem como eu acreditar mais nessa pessoa. Não tem como essa parceria ter um amor maior e você comparar isso com outras empresas: “Os sócios não podem ter...”, cara, foi o que fez dar certo aqui, né? Foi o que fez dar certo. O problema é que casamento ficou no fim da fila, assim. Então, foi filhos, empresa, dinheiro, filhos e tem que estar tudo certo e acabaram as horas do dia e a gente meio que demorou pra se reencontrar, um tempo depois. Então foi muita terapia de casal agora, que a gente consegue pagar (risos). É muita terapia de casal, pra ajudar. Então, ali vieram aprendizados talvez mais dolorosos, com o nascimento do Téo porque, antes, com o Guilherme eu era sozinha e eu fui e eu fiz. E ali eu tive que negociar muita coisa. Então foi uma coisa: “Agora eu tenho que negociar, porque agora eu tenho que dividir. Pô, que saco, meu Deus do céu, não consigo tomar uma decisão e tudo é interpretado de um jeito que foge do meu controle”. Mas é o amor também que a gente se acredita, ele acredita em mim num nível que, lá atrás só ele acreditava, a ponto de dedicar o que dedicou. Então, hoje ele realmente foi a primeira pessoa que viu na Scooto alguma coisa, a ponto de querer entregar sua vida ali, pra aquele propósito, profissionalmente falando. Mas não é fácil, não é fácil, porque fica muita coisa pra trás. Eu não consigo chegar em casa e falar, né: “E aí, como foi seu dia? Ai, no meu, você não sabe...”, porque está tudo junto e tudo em casa. A gente não tem nem um espaço onde a gente sai de casa e aí veio a pandemia. Então, puts, ficou tudo muito misturado. Mas eu acredito muito nessa parceria e acho que não devia ser tabu porque, se você acredita a ponto de estar amorosamente e profissionalmente com a mesma pessoa, olha o nível de confiança! Não tem essa comparação com sócios que não são casais, por exemplo, sabe assim? A confiança ali é gigantesca. Vai fazer filho, então, porra! Não tem confiança maior, não tem, não tem, não tem, não tem como ter uma parceria nesse nível. Então não deveria ser tabu.
P/1 - Marina, queria saber do seu dia a dia, como é?
R - Meu dia a dia é caótico. É caótico, não é um dia a dia fácil, desde a hora que eu acordo, até a hora que os filhos dormem, é adrenalina total, mas eu brinco que: “Se não for pra ser na adrenalina, eu nem faço”. Tipo assim, eu decido “desfraldar” um filho no dia que o outro fica doente e eu tenho que trabalhar e tenho 25 reuniões, é isso aí, é assim que tem que ser, porque senão eu não consigo, porque eu já me acostumei com esse ritmo de vida. Então, basicamente, eu vou te dar um resumo: eu acordo antes dos meus filhos, como, às vezes eu tomo banho, às vezes não, às vezes pulo isso daí, porque está muito frio. E aí, dá trinta minutos, os filhos acordam e aí eu tô trazendo aqui, muito, inclusive, uma rotina que foi pandêmica, durante muito tempo. Acordo e aí eu dou um café da manhã pra eles, ali, que já tem alguma coisa pronta, tomo um waffle, tomo uma banana, como fruta, como algum negócio ali, tomo um suco. E aí: “Vamos aqui um pouquinho de tela, que a mamãe precisa aqui olhar os e-mails e ver o que está acontecendo”. Meio isso (risos). “Olha aqui esse iPad, que lindo, que foi uma mágica, pega um pouco disso e aí a mamãe vai olhar isso aqui”. E aí a gente foi ficando um pouco mais criativo com o tempo, porque eles ficaram... é muito impressionante como o comportamento das crianças muda, se ficam muito tempo em frente a uma tela. Mas aí a gente foi inventando umas brincadeiras que eles foram realmente se encontrando. Então, pega uma caneta de giz, e aí eles começaram a escrever nos livros da casa e iam desenhar, recortar, colar, coisas que eles conseguem, ali, ficar fazendo muito tempo. Massinha, nossa, massinha eu consigo muita coisa. Jardinagem. A gente se mudou no meio da pandemia também, pra uma casa um pouco maior, a gente morava numa casinha pequena. A gente se mudou pra uma casa um pouco maior, onde eles têm uma grama maior, pra poder fazer alguma coisa, que a gente não tinha perspectiva de sair de casa tão cedo. E a gente tem a minha mãe, lembra lá da minha mãe que me ajudou muito com o Guilherme no início? Minha mãe também está super presente na rotina. Então ela ajuda muito a gente. Então, minha mãe vem dar o almoço pra eles, ela é a única que consegue fazer o Téo dormir em cinco minutos. Então, ela tem um pozinho ali, que ela joga no olho dele, que ele dorme em cinco minutos, eu nunca consegui fazer isso na minha vida. O “bichinho” fez três anos ontem e até hoje eu não consigo fazê-lo dormir em menos de quarenta minutos, é inviável. Então a rotina é muito colaborativa. Então, a minha mãe chega, dá o almoço e aí o Diego fala assim: “Olha, eu tenho uma reunião, você consegue ficar mais focada neles hoje?” “Beleza” “Agora eu tenho uma reunião, agora você fica um pouco mais focado?” “Beleza” “Mãe, agora a gente tem os dois uma reunião, você consegue ficar um pouco mais focada?” É muito colaborativo, nesse sentido. Então, precisa ser, é um trocando com o outro, por isso que é realmente muita adrenalina, porque volta e meia: “Ih, a gente não pensou no almoço hoje. Vai, vai o miojo com nuggets que resolve e aí amanhã a gente tenta fazer melhor” (risos). Então, tem dias e dias. Não é uma rotina fácil, é uma rotina bem cansativa. Agora, finalmente, ah, voltaram pra escola. Então, a gente tem alguns horários no dia a mais e eles estão muito felizes de ir pra escola. Então a rotina fica um pouco melhor. Aí, nossa, o que a gente consegue produzir, eu fico até sem saber o que fazer, quando meus filhos estão na escola, porque eu fico: “Tá, já vi todos os e-mails, já limpei o meu WhatsApp, já fiz uma reunião. E aí, o que a gente faz agora? Não sei, acho que vou tomar um banho (risos), vou fazer alguma coisa”. Tem tanto tempo livre ali, é impressionante. E quando eu realmente preciso fazer alguma coisa, que eu preciso focar, eu faço de noite. É engraçado. De noite é o horário que eu mais produzo, disparado assim, eu consigo fazer quinze empresas de noite, tenho mil ideias ali, de noite, sobre o que eu preciso fazer, sobre coisas que... sabe? A Scooto é uma renúncia de outras trezentas empresas que eu queria fazer também, todas com propósitos lindos e maravilhosos, mas é que a Scooto eu realmente tive muita sorte, que eu não tive antes. Então foi muita sorte ali, muita sorte mesmo, eu acho que falta as pessoas falarem isso, no mundo do sucesso “empreendedorístico”, o quanto sorte é fundamental pra você montar um negócio. Mais do que metodologia, mais do que você estudar pra caramba, mais do que ficar ali vendo mil estudos de casos de sucesso, sobre: “Ai, o Steve Jobs, ai não sei o que, fulano de tal, o criador do Google, do WeWork”. Você precisa de muita sorte, cara, e tomara que você tenha, porque tem coisas que fogem ao nosso controle, ali. Então, está vendo? Você pergunta uma coisa e eu puff, já me perdi. Estava falando sobre rotina e agora tô falando sobre sorte no empreendedorismo, como papel fundamental para o sucesso (risos). É isso, tá, Luiza?
P/1 - Queria saber como a pandemia impactou a sua vida, pensando nos aspectos pessoais e profissionais?
R - Hum, a pandemia veio pra acelerar um monte de mudança que ia acontecer, provavelmente, em quinze a vinte anos. Então, basicamente, o trabalho remoto, agora é visto como uma opção extremamente viável, descobriram que as empresas continuam funcionando e os resultados continuam sendo entregues, se as pessoas trabalham de casa, inclusive, a um custo bem menor. Então, está começando a ser uma realidade mais difundida. Então, pra citar um exemplo pré-pandemia, quando a gente fazia call de venda, ou call de qualificação, algumas coisas que precisava ter a câmera ligada pro cliente da Scooto, a gente tinha que fazer um fundo que simulasse a Vila Olímpia. Preciso fingir que eu tô no escritório, preciso fingir que eu tô num ambiente de trabalho e aí, às vezes o cachorro tossia... latia e você meio que tinha que tossir em cima da fala, sabe? (tosse) Não, não é nada não, aí o cachorro latindo. Então tinha muito preconceito quando a gente estava trabalhando de casa e isso não ser uma coisa profissional, no ambiente de trabalho. E aí, depois, quando veio a pandemia, nossa, como o trabalho remoto ajudou a humanizar relações de trabalho, porque a gente começou a ver o fundo da casa das pessoas, você vê uma decoração, você vê a sala, você vê um vasinho, você vê uma planta. Isso ajudou as pessoas a criarem conexões muito mais humanas no ambiente profissional. E sobre conexões humanas, é isso que a gente entrega na Scooto. É relacionamento, relacionamento empático com pessoas. Então, pra gente, acelerou um crescimento que talvez viesse de uma forma bem mais lenta e talvez a gente demorasse muito mais tempo pra crescer, quando a pandemia veio pra acelerar. Foi basicamente o que eles falam no mercado de transformação digital, foi o que a pandemia fez: ela precisou transformar as pessoas, pra entenderem que muitos trabalhos estão sendo feitos de um jeito e podem ser feitos de um jeito muito melhor. E, se você não correr atrás disso, você não vai ter velocidade pra se adaptar aos novos tempos. Se você não tem velocidade pra se adaptar aos novos tempos, você morre. Então, não morre fisicamente, mas a empresa morre. Então, as empresas que a gente viu morrendo, eram empresas que estavam muito distantes. E olha que eu não tô nem falando do restaurante aqui do lado, da farmácia, eu tô falando de empresas grandes, cujo sistema operacional não estava habilitado pras pessoas trabalharem de casa e aí ela não conseguiu. Ou ela entrega um produto que ela precisou ajustar, ela não teve tempo hábil. Então, ferrou. E aí, as empresas que prosperaram, eram empresas que já estavam visando um futuro, só que esse futuro realmente foi antecipado. Então, eu acho que é isso, assim: em termos profissionais, a pandemia acelerou muita coisa. E fez as pessoas reverem muitas escolhas também, principalmente sobre modelos de negócio. Agora, ó, não é mais só um varejo, ‘vou abrir uma lojinha aqui’, que é o que o pequeno empreendedor pensa muito. Ele viu que tem outras possibilidades e que é muito importante você estar no meio digital, você ter uma lojinha, você ter um e-commerce, você ter um controle de estoque unificado, enfim. Então, profissionalmente, é isso. Pessoalmente, foi muito desgastante, eu saio com o cabelo que eu não reconheço, o meu cabelo não era assim no início da pandemia. Eu saio com um corpo que, nossa, coitada de mim. Foi meio abandonado, porque a gente ficou enclausurado muito tempo, com filhos e com tudo junto, com empresa. A empresa crescendo, sem freio. Então a gente vai crescendo sem freio nenhum: “Ah, quer quinze pessoas pra manhã? Beleza, a gente consegue quinze pessoas pra amanhã” e vamos indo, entendeu? Preciso entregar um relatório? Beleza, eu vou inventar um relatório aqui. Então, trabalha de madrugada. Então, isso veio a um custo pessoal - vou soltar uma rotina aqui, que eu vou beber uma água aqui, parou aqui - muito grande. Eu, Marina, pessoalmente, fiquei meio abandonada. Então a empresa deslanchou, os filhos estão saindo vivos. Assim, minha mãe não pegou covid durante a pandemia, a gente realmente ficou em casa. Não perdi ninguém e a gente realmente não recebeu ninguém, levamos o negócio a sério. E durante muito tempo pedindo mercado em casa, sempre vem coisa da marca errada ou você pede uma banana e você não sabe qual o peso da banana e aí, vem uma banana só, ao invés de ser um cacho de banana. Você vai abrindo um monte de coisa, é muito estressante isso, realmente. Não sobrou espaço pra Marina, no fim do dia. E aí, agora eu tô retomando um pouco disso, a gente faz terapia de casal, mas eu tô começando a fazer terapia individual, comprei um tênis, eu não tinha mais tênis, pra você ter uma noção do sedentarismo da pessoa, não tem um tênis, não tem um par de tênis. Então, comprei um tênis, tô andando, tô começando a fazer coisas pra Marina, pra ventilar o cérebro, porque eu não estava mais ventilando. E aí vem uma série de transtornos que a gente vê bombando aí: de ansiedade, de burnout, de um monte de coisa. Então, isso realmente estava acontecendo, e estava acontecendo assim, acho que até há um mês atrás isso estava muito feio. Gente, eu tô desesperada, chega sexta-feira à noite, eu já tô chorando, porque segunda-feira está logo ali. Porque não é feriado segunda-feira, né? Eu preciso descansar, eu preciso ter mais tempo. Então, foi um pouco disso assim, veio um custo pessoal grande, de olhar no espelho e falar: “Eita, perdi o colágeno, né? Olha só o que aconteceu, olha o cabelo, como está branco”, não sei se dá pra ver aqui, mas nossa Senhora, eu tô extremamente grisalha. O cabelo que eu vejo aqui, olha isso aqui, não era assim, gente, ele tinha vida, juro que ele tinha. Então, ficou assim, foi isso que a pandemia fez comigo (risos).
P/1 - Marina, ouvindo a sua história, é possível perceber que você se propôs a empreender, valorizando duas características bem importantes pra comunicação e convívio social, que é a fala e a escuta, né? Você consegue identificar como surgiu esse interesse por trabalhar com essas áreas, pensando na comunicação e na linguagem, que é isso: a fala, o corpo fala também, não precisa ser só a voz. E se a fala, a escuta, a comunicação, sempre foram presentes e valorizadas, ao longo da sua vida?
R - Então, vamos voltar lá pra Marina da escola, que ficava copiando a pessoa que era centro das atenções, pra tentar se enturmar, né? Comunicação é uma obsessão minha, como eu faço pra me destacar aqui, nesse ambiente. Eu estudo comédia, eu tento conquistar as pessoas pelo sorriso. Então eu fico vendo: se você não está sorrindo, eu fico desnorteada. Se eu não consigo ver que a pessoa está interagindo, que eu trouxe um sorriso pro rosto dela, né? Na hora que você congelou aqui, por exemplo, eu fiquei: “Meu Deus, perdi minha audiência, eu não sei mais se eu tô agradando ou não”. Ó, está rindo. Muito louco isso, né? Então, a comunicação é uma obsessão minha. E aí, voltando lá pra Soul Vox, pro meu pai, o meu pai perdeu a voz pra um câncer de língua e eu gravei a voz dele, pra ele continuar se expressando, pra continuar tendo a voz dele ou as principais expressões que ele usava, que eu nunca mais ia ouvir. A Soul Vox, também olhando pra voz, olhando pra comunicação, olhando pro quanto se perde quando você não tem a fala. Eu não tenho qualificação nenhuma na área, muito louco. Hoje a gente tem a comunicação não violenta, tem o estudo de semiótica, tem tanta coisa sobre comunicação, isso eu nunca tinha estudado. Eu só tinha por princípio fundamental a empatia, o se colocar no lugar do outro e ver o que o outro quer, o que o outro precisa, pra além do que ele está falando, entender a linguagem corporal. E aí, quando veio pra Scooto, foi muito assim: tem muita coisa que está por trás do que o cliente está falando, tem muita coisa que está por trás do que o lead está falando. “Vamos tentar se colocar no lugar dele, vamos acolher no momento em que a pessoa não está feliz”. Assim, ninguém liga pra um call center falando: “Eba, vou ligar pro call center aqui porque, uhul, preciso remarcar a minha passagem!” Isso simplesmente não acontece, ninguém fica feliz de ter que ligar pra um call center de madrugada pra cancelar um cartão de crédito. Então, nesse momento, você escutar um: “Nossa, o que houve? Está tudo bem, está tudo certo?” É um acolhimento, que muda a forma com que empresas se relacionam com pessoas. Então, muda a forma como as mulheres se portam na sociedade, a gente tem um impacto ali das mulheres, na família. Então, elas se comunicam de um jeito diferente, quando elas têm dinheiro entrando, quando elas estão num ambiente seguro de trabalho. Elas vão se comunicando, isso influencia os filhos, isso influencia a comunidade ao redor. E as empresas entram nas pessoas de um jeito diferente. Então, a comunicação de empresas com pessoas, quando acontece num nível individual, num chat, num WhatsApp, numa ligação, a pessoa lembra da forma como ela foi tratada de um jeito muito maior do que o que a empresa gastou pra fazer o logotipo, o branding, a propaganda na Prova do Líder do BBB, por exemplo. Então, não adianta você gastar milhões ali, pra fazer a Prova do Líder do BBB, na festa, uma edição gigantesca e aí, na hora que a pessoa deu um problema na entrega e ela liga pra falar: “Olha, cadê o meu pacote?” e ela não receber nenhum tipo de acolhimento, aqueles milhões vão pro lixo, porque não só aquela pessoa não foi bem tratada, como ela vai falar pras outras pessoas que ela não foi bem tratada. A gente é muito rápido pra falar mal das pessoas, quando alguma coisa não deixa a gente satisfeita. Então é muito louco que estava lá atrás, estava em tudo. Estava no mimetismo que acontecia na infância; estava no meu pai, quando eu percebi que eu ia perder a comunicação por fala com ele; estava na Soul Vox e está na Scooto. Mas eu não tenho nenhuma formação na área, foi muito por instinto, porque eu sei a dor do que acontece, pelo menos na escola, de você não conseguir se comunicar e você estar sempre excluída, porque você não se encaixa em nenhum lugar. Isso vai muito de você não conseguir falar, se posicionar, se comunicar. Então, isso é uma dor de uma menina privilegiada, que teve uma boa formação, que estudou nas melhores escolas. Então, imagina pra camada da sociedade que não tem essa oportunidade, que não tem nem um português decente, como essas pessoas vão se posicionar? É muito absurdo, né? Tem um gap gigantesco aí e a comunicação é capaz de mudar isso. Então, quando a gente tem... a gente dá oportunidade pra mulheres, inclusive, que você vê que tem uma vontade ali e a coloca num contexto que a fomenta pra crescer e falar... a gente tem uma “scooteira”, por exemplo, que há um ano e meio estava vendendo bala no sinal, hoje ela está tirando quatro mil reais por mês. E está sendo elogiada e o cliente está até duvidando da performance dela, do tanto que essa mulher vende. Então, do tanto que ela é persuasiva, do tanto que ela realmente consegue enxergar a dor do outro, fazer uma conexão e vender e ela faz isso em cinco minutos, enquanto a equipe interna faz em vinte. É muito louco como isso tudo está ligado. Então você vê que ali só faltava uns ajustes finos e aí, a pessoa que, nossa! Ela começou acho que ganhando mil e quinhentos reais e ela falou assim: “Nossa, nunca ganhei isso”. E hoje está ganhando quatro mil e tem uma filhinha. Então, tem... e está sendo seduzida pelo nosso cliente pra sair da Scooto. Aí, tem muito disso: vão oferecer cem mil reais pra ela, por mês, ela não sai, porque é uma cultura que, se você está numa empresa onde, é aquela cultura do vender, vender, toca o sino, comissão e tudo mais, isso te destrói emocionalmente e, em consequência, a família sofre. Se você está bem, a família ganha. Então, é muito louco. Está tudo ligado, está tudo conectado.
P/1 - Marina, eu tenho três últimas perguntas só, faltando dois minutos pra seis, tudo bem?
R - Pode passar um pouquinho, porque eu não tenho nenhuma criança aqui.
P/1 - Tá.
R - Se tivesse aqui na garagem, eu ia falar: “Vai ter que acelerar”, mas agora não tem nenhuma, acho que foram lá pra casa. Então, está tudo certo.
P/1 - Tá. Eu queria saber quais são os seus sonhos, hoje?
R - Hum, hummmm! Cara, eu tenho sonho de ser um pouco mais livre, no dia a dia. Então hoje eu tô realmente muito amarrada, pessoalmente falando. Eu quero um sonho, assim, não é uma ambição muito grande, não, eu sonho assim, vamos colocar um sonho alcançável aqui, a curto prazo. Pra mim, eu quero ter uma hora livre no dia. Então tem um pouco disso. Não tenho conseguido isso, com facilidade. Então, realmente vem um sacrifício grande para o crescimento da empresa. Mas agora a empresa, eu tô sendo mais bem amparada, agora eu tenho C-levels, agora a gente tem uma equipe interna. E aí, agora, pela primeira vez eu tô conseguindo visualizar isso. Profissionalmente, eu quero que a Scooto chegue a ser a maior do mercado, eu quero que ela mude a forma como as empresas se relacionam com pessoas, é isso que eu quero. E, nisso, em termos de propósito da empresa. Em termos de propósito social, eu quero mudar a sociedade, basicamente, assim. Eu quero mudar a forma de como as mulheres são vistas na sociedade, mulheres de todas as cores, de todas as etnias, de todas as camadas sociais. Então isso está acontecendo e acontece no efeito cascata, aquele efeito ripple. Você ataca a pedrinha na água e vai gerando ondas e ondas e ondas. Então, a gente está no início, está no início, isso vai gerar um efeito que a gente ainda vai medir... a filha da Ketlin, por exemplo, a que estava vendendo bala no sinal, vai ter uma mãe completamente diferente, por causa da gente. E ela é menina e ela vai ter uma perspectiva de vida muito maior, por causa da Scooto. E a gente tem muitas histórias assim. Então eu não consigo medir o impacto social. Então... mas eu sei que essas mulheres são vistas de outra forma. Não são as que estão em casa e não conseguem comprar um pão porque... sem pedir dinheiro pro marido ou sem ter que pedir, porque não consegue trabalho na sociedade. E nisso a gente muda a forma de como as mulheres são vistas no mercado de trabalho. Então, eu tenho sonhos bem ambiciosos, eu falei ali, eu começo: “Eu quero ter uma hora livre no dia, mas eu quero mudar a sociedade inteira também”, entendeu, Luiza? É isso o que eu quero (risos).
P/1 - E queria saber se você quer acrescentar alguma história que eu não tenha instigado ou deixar alguma mensagem?
R - Cara, não sei, acho que é muito complexo, porque eu acho que eu já falei demais, falei: “Empreender é sorte”, falei isso (risos) e ‘foco no dinheiro’, mas eu não quero fazer muito conselho aqui. Acho que não é o caminho, aqui é falar mais de mim, então. Mas precisa ganhar dinheiro, esse é o problema, voltando lá pro propósito: a gente vai montar uma empresa com um propósito lindo, esse propósito só existe porque, em uma semana, eu fechei dois clientes. Então eu fechei dois clientes com pagamento recorrente, ou seja, no mês que vem eu já tinha uma renda previsível ali. Então precisa ganhar dinheiro, precisa ganhar dinheiro rápido. Não dá pra perder muito tempo ali na ideação. E olha que eu perdi muito tempo ali na ideação, até de fato acontecer e hoje eu realmente me sinto... não me sinto uma fraude, como eu me senti em diversos momentos da minha vida. Não me sinto uma fraude. Paro e olho pra trás e vejo 96 mulheres, junto comigo, nesse caminho. Isso é muito emocionante de ver. Cara, eu cheguei a 96, tinha vinte no início do ano. Tinha projetado crescimento de cinquenta, terminar o ano com cinquenta, sessenta.
P/1 - O que você achou de ter participado, de ter dividido um pouco da sua história com a gente?
R - Eu me senti muito importante aqui, me senti assim: “Nossa, estou falando coisas que eu demoro cinco sessões pra falar tudo isso pra uma terapeuta, consegui falar tudo aqui de uma vez”, e é muito louco que eu vou vendo que está tudo ligado, né?
P/1 - Marina, muito obrigada, muito obrigada mesmo! Foi um astral passar essa tarde com você, muito gostoso.Recolher