IDENTIFICAÇÃO O meu nome é Carlos Alberto da Silva Santos, nasci em oito de fevereiro de 1961, em Cabo Frio, no Rio de Janeiro. INGRESSO NA PETROBRAS O meu ingresso se deu em fevereiro de 1985 – estou prestes a fazer 20 anos de Companhia. Nesse período, eu estava desempregado, trabalhava em ob...Continuar leitura
IDENTIFICAÇÃO O meu nome é Carlos Alberto da Silva Santos, nasci em oito de fevereiro de 1961, em Cabo Frio, no Rio de Janeiro. INGRESSO NA PETROBRAS O meu ingresso se deu em fevereiro de 1985 – estou prestes a fazer 20 anos de Companhia. Nesse período, eu estava desempregado, trabalhava em obras da própria Companhia, por meio de outras construtoras que trabalhavam para a Petrobras. Mas a obra foi reduzindo e houve a necessidade de cortar pessoal. Eu fui cortado nessa época, em junho. Quando foi em agosto, surgiu um concurso. Eu prestei o concurso para a mesma função que exerço até hoje. Passei e fui fazer um curso de formação, em 1984. Em fevereiro de 1985, eu fui efetivado como técnico de inspeção de equipamentos. COTIDIANO DE TRABALHO A minha atividade se resume a verificar a situação dos equipamentos de processo. Tem também a parte de pintura, de caldeiraria, que a gente também participa, fazendo uma certa verificação da qualidade dos trabalhos. Presto assessoria também ao Geplat [Gerente de Plataforma], em diversos assuntos dessa área técnica. Trabalho mais focado mesmo para esta área da inspeção dos equipamentos de processo da embarcação e também dos guindastes e dos tanques que armazenam o petróleo. A função é basicamente isso. TRAJETÓRIA PROFISSIONAL Eu sempre trabalhei embarcado, fora o período de aproximadamente três anos que fiquei fora para acompanhar o projeto desse navio aqui. Foi um período bom e deu para aprender muito, os mais variados assuntos. Foi uma experiência boa, porque eu estava num período, vamos dizer, meio estagnado. Quando você começa a ficar muito tempo embarcado e tal, ser convidado para um projeto novo, ainda mais do outro lado do mundo, te eleva um pouco. Eu tive a oportunidade de ficar em Cingapura durante mais de um ano, não me lembro bem quanto tempo, e pude conviver com essa cultura totalmente diferente. Tive a oportunidade conhecer outros lugares. Foi bom por causa disso, principalmente, e por renovar as energias e os conhecimentos. A adaptação foi a melhor possível. Depois dessa experiência, eu posso morar em qualquer outro lugar do mundo, porque eu tinha muita resistência em sair do meu nicho, de sair desse trâmite de trabalho entre Rio de Janeiro e a minha cidade de Cabo Frio. E, de repente, eu sou jogado para ir para o outro lado do mundo. Houve um impacto inicial, pelas várias diferenças, mas depois a gente vai se adaptando. O que facilitou foi a convivência com muitos outros brasileiros e o fato de ter levado família também. Num primeiro momento, não era para levar família. Eu fui sozinho, mas a família não agüentou e eu também não. Então, a minha esposa teve que abandonar o trabalho, onde ela trabalhava há 17 anos. Ela pediu demissão para me acompanhar e fomos para lá com uma criança de um ano e pouco. Foram várias idas e vindas, num período de um ano e meio. TRABALHO EMBARCADO / RISCOS Eu trabalhava na PCH-1, plataforma de Cherne 1, e já tinha trabalhado durante um bom tempo na plataforma de Cherne 2. Em Cherne, eu exercia a mesma função, mas era um pouco mais fácil, porque não tinha o balanço de um navio, né? Se bem que eu me adaptei a esse balanço. Mas tem o lado de risco, porque você tinha mais equipamentos de processo efetivamente e trabalhava com as mais variadas pressões. Aqui na P-38, a gente só armazena, quer dizer, tem um ou outro equipamento. Em Cherne, eu corria um pouco mais de risco, mas era tranqüilo. Eu me adaptei bem a esse trabalho aqui e lá também. AFASTAMENTO DA FAMÍLIA Se dissesse que trabalhar embarcado é fácil, eu estaria mentindo, principalmente, quando se tem uma criança de três meses, né? O afastamento da família é sempre difícil e eu sou muito ligado à minha família. Eu me adapto bem ao trabalho, mas não é fácil. Tem os seus momentos de angústia, quando você pensa na família. Mas eu gosto de trabalhar embarcado, eu faço o que eu gosto, efetivamente. Para a família também é muito difícil. Agora, eu estou passando por um período em que a minha filha de oito anos está sentindo muita falta, ela ficou muito grudada comigo, e eu estou tendo que ligar todo dia para casa, às vezes duas vezes, para conversar com ela, para poder amenizar esse afastamento. CONVIVÊNCIA A BORDO Eu acho que, aqui nessa unidade, a gente tem uma boa convivência devido ao número de pessoas ser mais reduzido que em outras plataformas. Então, eu diria que a relação é boa com todo mundo, acho que todo mundo se dá bem por isso. É uma unidade nova, tem um certo conforto, talvez bem melhor do que as antigas. Isso também ajuda a amenizar um pouco esse tormento que a gente passa. Sobre essa parte de se acostumar ao trabalho embarcado, não tem muito mais o que relatar. HISTÓRIAS / CAUSOS / LEMBRANÇAS Nesses 20 anos, eu já passei por várias situações, tanto alegres, quanto tristes. As tristes foram as mais variadas: saber de acidentes na região e saber que você também está efetivamente exposto a isso. Por exemplo, quando eu trabalhei em Cherne 1, lembro de um período próximo ao Natal, quando aconteceu um acidente com um trabalhador. O piso da plataforma correu e ele caiu no mar e desapareceu. Eu fiquei lembrando tudo, porque você convivia com aquela pessoa e de repente... Isso é um fato que me marcou, tanto que ficou na memória. Fatos mais marcantes são esses, né, sempre que acontece um acidente, alguma coisa, você fica preocupado, pensando que poderia estar lá. REFORMA DA P-38 Outro fato marcante, talvez, tenha sido participar do projeto da P-38 e ver a sua obra concluída. Eu peguei esse projeto no papel; era só um papel e um navio velho, vamos dizer assim, e participei de tudo. O pessoal costuma dizer que eu conheço mais a unidade do que qualquer outra coisa, porque sou o mais antigo, mais antigo até mesmo que o Geplat. Então, isso é uma coisa boa, um fato marcante. Eu costumo dizer que é meu filho também. Você se sente um pouquinho dono dessa obra, se sente responsável por ela. Tanto que eu tenho uma certa resistência a ter que sair daqui um dia, por tudo, pelo pessoal e, também, por ter participado, ter visto isso aqui crescer. É como um filho, você não assiste o parto, mas ele nasce, cresce e você começa a aprender também com ele. Enfim, é uma relação para o resto da vida, aqui não tanto pelo resto da vida, mas por um bom tempo, né? Esses foram os dois fatos que marcam esses extremos: da tristeza e da alegria. P-38 – PROJETO DE REFORMULAÇÂO Acompanhar o projeto da P-38 foi um desafio, principalmente, pela língua e o pelos costumes do local para onde fui. Eu não tinha o domínio do inglês e tive que aprender alguma coisa, mas até hoje sou péssimo. Isso foi um desafio, mas acho que passei bem, convivendo com o modo de trabalho do pessoal lá do outro lado do mundo. A grande conquista do projeto foi saber que você teve a capacidade de modificar muita coisa, de melhorar muita coisa durante o projeto, e ver que aquilo que você botou no papel foi aceito, foi realizado e de alguma forma beneficiou, ajudou. Participar de algum tipo de projeto dessa forma, na minha função, marca muito. Pensar que um dia eu vi isso aqui muito diferente. Eu tenho uma foto do navio totalmente depenado. “Olha, aquela tubulação ali fui eu quem deu a idéia de fazer ou aquele item ali eu pedi para fazer, porque achei que ia melhorar, com a experiência que eu já tinha.” Isso é marcante. SINDICATO Sou sindicalizado desde que entrei na Companhia, mas nunca ocupei nenhum cargo. Um fato marcante – eu não digo que participei, mas que estava junto – foi que, até então, se acreditava que as plataformas não parariam nunca. Um dia, houve um movimento e pararam as plataformas de produção, parcialmente. Então, se é que se pode dizer, foi uma conquista do Sindicato, mas que acabou beneficiando a todos os empregados. De uma forma ou de outra, acaba sempre beneficiando todo mundo, e se quebrou esse paradigma. Eu não me lembro quando foi, sinceramente não me lembro. Mas talvez tenha sido o fato marcante dessa parte sindical, com altos e baixos do nosso Sindicato, erros e acertos, exageros algumas vezes também. Mas acho que essa foi uma grande vitória. RELAÇÃO SINDICATO - PETROBRAS Eu acho que a relação não mudou muito, talvez agora tenha melhorado, nos últimos tempos. Eu acho que tem sido um pouco mais transparente. O Sindicato está um pouco mais realista nas suas solicitações. Acho que o Sindicato pode tentar algumas coisas indiretas, não deve só visar à parte financeira. Tem outras coisas que pesam também pra gente, que poderiam ser ajustadas com a Companhia. Uma coisa que me perturba e, com certeza, perturba outros colegas é a situação dos nossos pais. Hoje em dia está muito difícil pagar um plano de saúde, porque eles estão muito caros, principalmente, quando se chega a uma idade avançada. Eu gostaria que a Companhia – da mesma forma que me dá ou participa da assistência médica, já que a gente também paga por essa assistência – pudesse estender para os nossos pais essa assistência, nem que você tivesse que pagar um pouco mais. Seria uma coisa muito boa. A exemplo dessa ajuda à parte escolar, eu acho que seria um bom caminho, não visando só a parte financeira, visando também a essa parte social, vamos dizer assim – se é que se enquadra aí. Isso me traria um grande alívio. É um caminho a seguir, mesmo que tenha que se pagar um pouco mais. Hoje, se um idoso precisa ficar internado por muito tempo, imagina quanto vai ser? E, com certeza, vai mexer com todo mundo da família, inclusive com quem está aqui embarcado ou trabalhando em qualquer outro lugar. Então, acho que é um caminho a se trilhar. E o Sindicato poderia ir por aí. COTIDIANO EMBARCADO Nas plataformas antigas, nas fixas, você tinha de conviver com três pessoas diferentes dentro do mesmo camarote, raramente você ficava sozinho. Ali era preciso um exercício danado de psicologia, porque você tinha que se moldar a três pessoas diferentes e as pessoas também tinham que se moldar ao seu jeito de ser. Era difícil. Mas foi um período interessante, porque você convivia com pessoas que tinham hábitos diferentes: tem o que range os dentes à noite, o cara que ronca pra caramba, um outro que fala de noite, aquele que bate em parede ou soca a sua cama, coisas desse tipo. São coisas engraçadas. Aqui na P-38 não é assim, os empregados da Petrobras normalmente ficam em um camarote individual. No meu caso, isso facilita um pouco, porque eu estou fazendo faculdade, gosto de estudar de noite e tal. Mas serve também como um fator de separação do pessoal. Nas antigas plataformas, você não tinha essa divisão, dificilmente você tinha televisão em camarote. As pessoas se reuniam numa sala para assistir televisão e você acabava não vendo, porque era bagunça o tempo todo. Eu acho que isso, de repente, agregava mais as pessoas. Isso é uma coisa interessante para falar. Mas isso é uma característica desse navio, dessa unidade, nas outras, normalmente, você divide com alguém. A concepção é sempre essa, duas, três pessoas para um camarote. É difícil, porque, às vezes, você não tá bem ou a pessoa também não tá bem, e um tem que se moldar ao outro, tem que tolerar o outro. Eu costumo dizer que quando você briga com uma pessoa na rua ou no trabalho, você vai para casa e esquece. Aqui não. Se você brigar com uma pessoa, talvez você tenha que dormir com ela. Então é difícil, é um grande laboratório. O pessoal costuma dizer que todo mundo que trabalha embarcado não bate muito bem da cabeça, porque você tem que conviver com todo esse contexto de diferenças de idéias, de pensamentos, de atitude. Você pega aquele cara que desliga a televisão às nove horas da noite, mas você quer assistir um pouquinho mais e não pode. Tem aquele cara que ronca, que você tem que ir dormir antes ou vai dormir muito depois com muito sono. Enfim, tem tudo isso. São as coisas interessantes do trabalho embarcado. MEMÓRIA PETROBRAS Eu acho excelente, já deveria ter sido feito há muito tempo. Nesses 20 anos, eu já vi pessoas que participaram da evolução da Empresa saírem sem que tivessem tido essa oportunidade, ou até mesmo a gente perder esses companheiros de alguma forma e não ter essa memória de pessoas que tem muito para falar, né? E seria interessante que desse a oportunidade de contar alguns fatos, ter tempo de lembrar, porque quando você é pego de surpresa, você não consegue lembrar de fatos pitorescos que tenham acontecido.Recolher