Projeto White Martins
Depoimento de Valter Rossi
Entrevistado por Monique Lordelo e Débora Querido
São Paulo 07/10/11
Realização Museu da Pessoa
Entrevista WM_HV030
Transcrito por Ana Carolina Ruiz
Revisado por Carolina Maria Fossa
P/1 – Bem vindo a nossa entrevista, Valter. Para come...Continuar leitura
Projeto White Martins
Depoimento de Valter Rossi
Entrevistado por Monique Lordelo e Débora Querido
São Paulo 07/10/11
Realização Museu da Pessoa
Entrevista WM_HV030
Transcrito por Ana Carolina Ruiz
Revisado por Carolina Maria Fossa
P/1 – Bem vindo a nossa entrevista, Valter. Para começar, por favor, o seu nome completo, data e o local de nascimento.
R – Antes de mais nada, agradeço o convite. Meu nome é Valter Rossi, nascido em 13 de setembro de 1960.
P/1 – Onde?
R – Em Osasco, município do estado de São Paulo.
P/1 – E o nome dos seus pais?
R – José Rossi, infelizmente falecido, e Dora Ferrari Rossi, graças a Deus, viva.
P/1 – E o nome dos seus avós?
R – Os paternos, Batista Rossi e Aurora Zanelli Rossi. Maternos, Alba Ferrari e Luiz Ferrari.
P/1 – Conta um pouquinho dessa família, dos Rossis, dos Ferraris.
R – (Risos) Muita gente. Muitos tios, primos, primas. Por parte da minha mãe eles eram em 13 irmãos, sendo dez mulheres e três homens. Uma média de três filhos cada um, então tem um número muito grande de primos envolvidos. E por parte do meu pai, com ele eram cinco, quatro homens e minha tia. Cada um com três filhos também. Então, têm primos espalhados pelo Brasil afora.
P/1 – E o pessoal é todo de São Paulo? Qual é a origem dessa família?
R – Descendentes de italianos das duas partes, mas a maioria mora aqui no Estado de São Paulo. Ou no interior ou aqui na capital, na região da Grande São Paulo.
P/1 – Onde foi a sua primeira infância?
R – Hoje, estou com 51 anos, morei 49 anos em Osasco. Quase minha vida toda foi lá. Recentemente, eu mudei para o município de Santo André, mas por 49 anos morei em Osasco. Minha infância foi baseada ali, meus amigos... Tudo, toda a minha vida foi naquela região de São Paulo.
P/1 – Como eram as festas na sua casa? Com tanto parente assim, devia ter...
R – Na casa dos meus pais, não, porque era uma casa humilde e pequena. Mas pelo menos dois ou três tios moravam em lugares separados, com uma área bem maior. Então ali era a concentração das festas de final de ano, Natal, Ano Novo ou quando havia algum almoço para reunir o pessoal. Para juntar 50 pessoas não custava nada, bastavam dois ou três telefonemas, estava todo mundo lá. Minha infância toda foi assim, de almoço em almoço, de final de ano em final de ano, trocas de presente, aquela brincadeira toda. Sempre foi isso. Foi muito divertido.
P/1 – E como é que eram as brincadeiras com os primos nessa época _________ [trecho incompreendido – problema no áudio]? Como era a tua casa, esse ambiente de infância?
R – Infância... Eu tenho um irmão, sou o filho do meio. Meu irmão mais velho tem dois anos e meio a mais do que eu e o mais novo a diferença é de nove anos. Então o gap de diferença de idade era muito grande. Ficava muito mais junto do meu irmão mais velho, só que ele também tinha a turma dele. Eu ficava um pouco excluído, ficava no vácuo. Eu tinha os meus colegas que moravam na rua, saímos muito, jogávamos bola juntos, pipa, aquela coisa toda, cinema. E tinha pelo menos dois primos com quem me dava muito também. Eram primos-irmãos na verdade. Dormíamos muito um na casa do outro, aquela coisa toda. Saíamos muito também, sempre estávamos juntos. Crescemos assim. Até o ponto depois que o pessoal se casa, naturalmente, acaba se separando um pouco. Foi uma pena, mas até um pouco antes do casamento saímos muito juntos, sempre estávamos juntos. Todos. Foi muito bom.
P/1 – Osasco devia ser um pouco diferente do que é hoje, quando você era criança. Você se lembra de algum marco que você fale: “Meu Deus, não acredito que é Osasco”?
R – Lógico. Eu acompanhei a transformação da cidade. Nasci praticamente em um ano que o município foi emancipado. Até então era um bairro, transformou-se em município. Vimos essa mudança. Quando começaram a asfaltar as ruas, porque era tudo rua de terra. Muito pó, muito barro quando chovia. Veio asfalto, água encanada. Em casa ainda tinha poço com bomba. Houve toda essa transformação. Linha de ônibus passando na rua da casa da minha mãe, do meu pai. Ônibus passava um de manhã, outro à tarde, depois começou a ter uma frequência um pouco maior, a cada hora. Hoje, não. Há várias linhas de ônibus. Hoje, Osasco se tornou uma cidade dormitório e voltada ao comércio, mas Osasco foi uma cidade muito importante no contexto da industrialização, tinha a Cobrasma, que fazia vagões de trem, a Eternit que produzia telhas e caixas d’água pelo Brasil afora, a __________ ligada a motores elétricos. Existiam muitas empresas. E como várias empresas, receberam incentivos fiscais de outras partes do país, de outras cidades do interior e foram saindo do município. Hoje o município é forte no comércio, mas na indústria está bem fraco. Existem pequenas empresas, micro empresas. Foi outra transformação __________ [trecho incompreendido – problema no áudio] percebeu muito. Porque eu sou oriundo ainda da época do SENAI [Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial], do Jovem Aprendiz, e muitas empresas angariavam esses jovens para se tornarem seus funcionários. Recebiam um salário simbólico, mas depois de formados iam para empresa. E essas empresas que eu citei eram muito concorridas. Porque possuíam planos de carreira muito bom, em termos de salário e de futuro, para nós que éramos jovens ainda, vislumbramos isso.
P/1 – Seus pais ou seus avós trabalharam nessas empresas?
R – Um tio, sim, trabalhava. Meu pai era voltado ao comércio, ele trabalhava em um depósito de materiais de construção. Minha mãe era do lar, minha avó também. Tanto que morava todo mundo junto. Havia três casas no mesmo terreno, então, morávamos todos juntos. Esse pessoal sempre me dava apoio, principalmente esse tio, porque ele trabalhava na empresa em que eu comecei a fazer o SENAI. Era como o meu tutor, o meu responsável dentro dessa empresa. Eu trabalhei em duas empresas na vida: a Brazaço Mapri, uma indústria que fabricava parafusos, na região da Leopoldina, Lapa [zona oeste de São Paulo]. Comecei lá com 14 para 15 anos, fiquei nessa empresa até os 21. Nesse período, foram dois anos de SENAI, um ano de exército e mais três anos trabalhando lá. Quando eu saí de lá, ingressei na White Martins. Estou prestes a completar 30 anos na White.
P/1 – Eu vou querer saber mais disso tudo, com certeza.
R – Eu vou me atropelando. Vou falando e me atropelando na própria história, né...
P/1 – E você falou que o seu pai era do comércio. Como era?
R – Ele era funcionário de um depósito de materiais de construção. Por muito tempo foi caminhoneiro, transportava areia, adubo na região de Cubatão, litoral de São Paulo. Depois, ele veio a trabalhar com materiais de construção. O dono do depósito abriu uma filial em outro bairro de Osasco e ele trabalhava lá. Como falei, não tinha muito ônibus, eu tinha que levar almoço para ele, andava uns quatro quilômetros, precisava atravessar uma ponte de tambor no rio. Não tinha ponte de concreto na época. Foi outra transformação. O bairro que eu morava era como uma ilha, possuía uma entrada e uma saída do bairro. De carro. O restante desse transporte era feito por pontes sustentadas por tambores.
P/1 – Que bairro que era?
R – Rochdale, em Osasco. É um bairro que sai muito na televisão quando tem enchente (risos). Enche de água. O final da rua, onde a minha mãe mora, passa muito na televisão.
P/1 – Quando você era pequeno aconteciam enchentes? Já havia problemas?
R – Não. Porque esse braço do leito do rio era bem mais amplo, mais aberto. Em volta não era tão impermeabilizado por asfalto, por cimento. Tinha muita terra, que absorvia muito mais rapidamente o volume de chuva. O que não acontece hoje. Cai aquela bruta chuva, desce com velocidade até um córrego minúsculo. Não comporta.
P/1 – Daí você entrou na escola, como foi o período em que começou a estudar? Era no mesmo bairro?
R – Sim. O primário foi feito próximo à minha casa. Por incrível que pareça, toda vez que eu passo lá, vejo que a escola continua, é uma das referências da região, uma escola muito boa. É incrível. Todas as vezes não consigo passar em frente ao prédio da escola indiferente. Tenho muitas lembranças. Muitas.
P/1 – Conta algumas... (risos)
R – Ah, de vários amigos que fiz na infância e, vez ou outra, acabamos nos encontrando no bairro ainda. Dos times de futebol em que jogava na quadra do colégio. Outro dia até passei em frente ao colégio, em um domingo, acho que dez horas da noite, o portão estava aberto e o pessoal jogando bola na quadra. Eu tive um repente de parar e entrar. Deu muita vontade, mas estava um pouco tarde, resolvi ir embora. Mas é um lugar que marca. Fez parte da minha vida aquela escola. Fiz o primário e parte do ginásio lá. Hoje mudou um pouco a nomenclatura escolar. Não concluí o ginásio, acabei migrando para o SENAI, cujo curso era equivalente ao ginásio. Assim que eu me formei no SENAI, fui ao exército, depois comecei o técnico e me formei em uma escola de Osasco também. Tudo em Osasco.
P/1 – Como se chama a escola?
R – Júlia Lopes de Almeida. Escola Estadual Júlia Lopes de Almeida.
P/1 – Você se lembra de algum professor que te marcou, de algum colega?
R – Sim. Impossível não me lembrar da professora Ivete, foi a minha primeira professora. Ela se parecia muito com a minha mãe, ela era muito calma ________ [trecho incompreendido – problema no áudio], como a minha mãe é também. Muito pequeno, com sete anos, ficar sem a mãe por perto, um mundo novo e encontro uma pessoa que fisicamente se parece com a sua mãe, tem o mesmo jeito. Aquilo facilitou muito a minha vida. Por isso, tenho a imagem dela até hoje, a imagem de como eu a via. Era uma estrela. Muito boa. Professora Ivete.
P/1 – E ela dava todas as disciplinas?
R – Dava. Na época, a professora ficava um período integral com a gente lá e dava todas as disciplinas, Matemática, Português, Ciências, História do Brasil, aquela coisa toda.
P/1 – Você lembra se você tinha mais afinidade já com alguma disciplina?
R – Geografia, eu gostava muito. Gosto até hoje. Matemática, como todo mundo, sofri muito. De Ciências, gostava também. Incrível, depois, perto do ginásio, eu me adaptei muito ao Francês. Hoje não me lembro quase nada. Eu era bom pra caramba.
P/1 – De idiomas, você só tinha aula de Francês?
R – Francês e Inglês. Na época, a grade incluía o francês também. Eu ia muito bem. Muito bem mesmo. Hoje eu não lembro quase nada daquilo, mas... Talvez por ser garoto, cabeça vazia ainda, pronto para receber muitas informações, aquilo acabou vindo ao encontro como uma coisa que eu gostei, deu certo.
P/1 – E você ia a pé para escola?
R – Sim. Não dava mais do que 500 metros da minha casa até lá.
P/1 – Estudava só meio período?
R – Meio período.
P/1 – E o que fazia depois?
R – Sempre tinha lição de casa, né? Os professores adoravam dar lição de casa. Certa vez, nas férias de julho, 30 de junho, último dia de aula, maravilha. O dia estava quente, eu já descendo da escola para ir a minha casa, percebi que eu não estava legal __________ [trecho incompreendido – problema no áudio] meio se mexendo. Cheguei em casa com muita febre. Passei as férias inteiras com caxumba dos dois lados, com o rosto inchado. Minhas férias inteiras foram de cama. Foi um período de férias marcante da minha infância.
P/1 – A única coisa boa de caxumba era que a gente podia tirar alguns dias da escola e você foi pegar bem nas férias.
R – Exatamente. A caxumba começou junto com as férias. Não teve jeito.
P/1 – E nessa época, do que você brincava? Como eram as brincadeira no bairro?
R – Olha, eu era muito adepto de jogar bola. Adorava. Não gostava muito de pipa, pião, bolinha, coisas que a maioria do pessoal da nossa idade gostava. Eu era meio fora da curva já. Meu negócio era jogar bola, enquanto tivesse luz de dia.
Luz artificial na rua era outra coisa que não tínhamos. Então, enquanto dava para enxergar o vulto da bola, nós estávamos correndo atrás dela.
P/1 – Nas lições de casa quem te ajudava?
R – A mãe. Até porque meu pai saía muito cedo, voltava muito tarde. Minha mãe sempre acompanhava.
P/1 – Seus irmãos também estudaram nessa escola?
R – O mais velho sim, o José Carlos. O Marcelo, que é o mais novo, não. Ele já estudou em outra escola, na metade do caminho entre a casa da minha mãe e essa escola.
P/1 – E como é que foi entrar no SENAI? Você falou que fez um pedaço do ginásio lá.
R – No SENAI foi diferente. Era período integral. Foram dois anos seguidos. Podia ser a parte prática de manhã ou à tarde, dependendo de como eram distribuídas as turmas. Fiz dois períodos de parte prática à tarde e dois períodos de prática pela manhã. Foi bom que ali tive a iniciação profissional, pude mexer com máquina. Mas eu também já entrei um pouco escolado. Um desses tios que moravam com a gente, todo santo sábado, estava mexendo com os carros dele. Eu acordava sábado, adorava ficar com ele na garagem da oficina, lambuzado de graxa. Mexendo em freio de carro, motor. Quando eu comecei no SENAI, já tinha certa noção. Eu já sabia o que queria, aquilo que queria ser na vida profissional. Eu fiquei um pouco a frente da garotada que começou junto comigo.
P/1 – Mas como foi? Você fez o curso técnico do quê?
R – Na época era denominado Mecânica Geral, compreendia tanto a parte de bancada, que é uma mesa que tem várias ferramentas ou a parte de usinagem, que é a tornearia, fresagem, mandrilha, essa coisa toda. Nesse período eram divididas essas funções.
P/1 – Era comum os seus colegas também fazerem SENAI...
R – Sim. Muito comum.
P/1 – E era só o técnico de Mecânico ou tinha curso para as mulheres também?
R – Na época, quase não havia curso para mulheres. Mas havia o pessoal que fazia Elétrica, Modelação, que era um pessoal que trabalhava muito com moldes de madeira. Era um dos cursos mais concorridos, porque se pagava muito bem ao profissional que trabalhava com moldes em madeira, principalmente para fundição. Esse curso de aprendizagem equivalia ao ginásio e o próximo passo no SENAI seria o curso de Metalurgia, que valia como se fosse o ginásio. E quem fizesse Metalurgia no SENAI, já saía assim com uma bagagem muito boa para prestar pra uma universidade, saía muito bem embasado. Era bastante puxado, as matérias eram difíceis, mas quem fazia, certamente, iria se dar bem.
P/1 – Então, alguns amigos da escola foram com você para o técnico.
R – Foram.
P/1 – E era difícil passar?
R – Não. Para quem se preparasse um pouquinho, não. Não era tão difícil.
P/1 – Tinha prova?
R – Tinha. Como toda escola que oferece alguma coisa é aberto um concurso. Então, era preciso se preparar um pouco.
P/1 – Como era a prova?
R – Perguntas básicas de Português, História, Matemática. Não era tão difícil, um pouco, mas quem se preparasse, conseguiria. Só que é aquele negócio: para cada empresa também tinha um número limitado de cinco, dez, 15 pessoas. Os melhores classificados ficavam. Questão de um décimo em uma nota era um fator determinante para que você não entrasse. Havia alguns alunos que estudavam, mas não tinha empresa. A maioria, sim. Eram estudantes, mas estavam ligados a alguma empresa. O SENAI tentava, durante esse tempo, encaixar aquele aluno que estava sem empresa ainda.
P/1 – E daí você saiu do técnico e foi para onde?
R – Saí do SENAI, fui para a empresa, fiquei um período. Logo, como todo garoto na faixa dos 18 anos, tive de me alistar. Alistei-me, fui convocado, fiquei no exército. No ano de 1979, eu fiquei no exército.
P/1 – Como é que foi?
R – Foi um ano fantástico. A princípio, eu não queria ir, até porque, na época, o meu pai estava com muitos problemas de saúde. Eu já trabalhava na empresa. A maior renda de casa era a minha, que era pouco, mas era ___________ [trecho incompreendido – problema de áudio]. Era um momento em que seria muito difícil deixar de receber o salário da empresa para ir ao exército. Não teve jeito. Eu fui convocado, fiquei de janeiro a dezembro do ano de 1979. Foi um marco na minha vida o exército. Impressionante! Na bateria, eu pertencia ao grupo de artilharia antiaérea. Na minha bateria éramos em 86 homens. Todos, praticamente, com a mesma idade, entre 18 e 19 anos. Aí você vê aquele bando de gente da tua idade, com corpo diferente, com a cabeça diferente. O que mais me chamou a atenção é a forma de pensar diferente. Com a mesma idade, todo mundo vivendo o mesmo padrão de vida, mas a forma de agir e reagir às situações é muito diferente. E foi um ano fantástico. É uma das coisas que me faz sonhar. Eu lembro pouco das coisas que sonho. Dificilmente lembro. Falando um pouquinho dos sonhos, lembro do meu pai, quando sonho com ele, do meu filho e do exército. São as três coisas que eu lembro com uma nitidez quando abro os olhos. Incrível! O resto, não. Eu demoro quase o dia inteiro para dar um estalo: “Eu sonhei com isso. Agora lembrei”. Mas não consigo de imediato. O exército é uma coisa marcante. Quando eu sonho, sonho com o pessoal, como se estivesse vendo tudo daquele mesmo jeito. O pessoal todo _________ [trecho incompreendido – problema de áudio] lá. Então, foi muito marcante nesse aspecto. Foi muito engraçado, curti muito, vivi muito aquilo. Muita gente sofreu naquele ano. Eu tinha uma satisfação incrível de ir todo dia e participar de tudo aquilo. Achava muito legal. Gostei muito.
P/1 – Mas você falou que havia pensamentos diferentes. Por que você comentou sobre isso?
R – Por causa de atitudes de cada um, da forma de... Quando tínhamos liberdade, não havia um superior por perto, podíamos conversar de várias coisas, percebia essas diferenças, do que cada um gostava. Se fosse falar de música, um gostava de sertanejo, outro de rock, outro de pop, aquela coisa toda. Até de comportamento. Lá se conhecia todo mundo. Pessoal que usava droga, os evangélicos. Como hoje também, acho que não mudou muito. Naquela época, eu não tinha me atentado para toda essa mudança e, de repente, convivendo com todo mundo, todo santo dia naquela situação, comecei a prestar mais atenção a essas coisas. Talvez, para muita gente eu era diferente. Eles viam em mim alguma coisa diferente, como eu via coisas diferentes neles também.
P/1 – E era fechado? Você ficava o tempo inteiro, não conseguia estudar, nem trabalhar? Não dava para conciliar?
R – Era difícil. Até tinha dois colegas, três na época, que todos os domingos estavam de serviço no exército. Era um acerto que eles fizeram com os nossos superiores na época, para não pegarem serviço durante a semana. Esse serviço é um período de 24 horas. Na época também era uma coisa curiosa. De 86 pessoas homens da bateria, só três estavam na universidade. Esses três, todo domingo, estavam lá, pegavam serviço aos domingos para não perderem a aula durante a semana.
P/2 – Valter, você teve amizade com alguma das pessoas que serviram contigo?
R – Não. Como reservista, nos cinco primeiros anos após servir o exército é obrigatório ir ao exército, carimbar a reservista, aquela coisa toda. Nos três primeiros anos, conseguimos ainda reunir grande parte. Entre dez e 15 de dezembro, marcamos um dia. Também não havia a facilidade de hoje, como internet, nem telefone. Era meio difícil. “Ano que vem, dia 12, todo mundo aqui nove horas da manhã e tal”. No primeiro ano quase todo mundo foi, no segundo 70%, o terceiro 30%, e daí para frente, esporadicamente nos víamos.
Eu não tive esse elo com ninguém.
P/2 – Você nunca pensou em seguir a carreira militar?
R – Não. Até por conta da situação em casa, a saúde do meu pai se agravou. Com a ida ao exército, não houve quebra de contrato com a outra empresa, saía do exército e voltava. Eu vislumbrava a crescer nessa empresa ____________ [trecho incompreendido – problema de áudio].
P/1 – Você recebia alguma coisa pelo exército?
R – Sim. Mas era coisa simbólica. Sei lá, cem reais, alguma coisa assim. Uma coisa bem pequena.
P/1 – Você saiu do exército e voltou para essa empresa. Que empresa era essa?
R – Brazaço Mapri. Hoje tem outro nome, acho que era ligada a Belgo-Mineira [antiga Companhia Siderúrgica Belgo-Mineira, atual ArcelorMittal Aços Longos] que já mudou de nome também. Ou já nem estão mais nessas regiões, mudaram para o interior de São Paulo, não sei...
P/1 – E o que você fazia lá?
R – Eu comecei como aprendiz do SENAI. Saí de lá eu saí como mecânico de manutenção. Eu saí em agosto de 1981. Em outubro de 81, ingressei na White Martins.
P/1 – E quais eram as suas funções nessa empresa?
R – Consertar máquinas que quebravam. Era uma infinidade de máquinas: máquinas operatrizes, prensas. Muitas máquinas. A função era essa. Como tudo que está rodando, uma hora quebra. E quebrava bastante, então, tinha atividades da hora que entrava até a hora que saía. Muitas vezes, a hora-extra era liberada e fazíamos de duas a três horas extras por dia. Sábado e domingo. Havia atividade continuamente. Sem parar.
P/1 – E como foi a sua entrada na White?
R – Eu saí da outra empresa sem querer sair, porque gostava muito de lá também. Saí em um corte, era um momento de desaquecimento do mercado, greves gerais, essa coisas todas. Era a época do Lula, ele bancava aquelas greves no ABC de São Paulo [região da Grande São Paulo, que compreende os municípios de Santo André, São Bernardo e São Caetano]. E como o trabalho dessa empresa era voltado à indústria automobilística, deu uma quebrada nas vendas, aquela crise.
Três meses depois, consegui entrar na White Martins. A White já estava em uma ascensão boa naquela época. Abriu uma vaga perto de casa, em Osasco, em um bairro vizinho ao que eu morava. Fui para lá, fiz um teste, entrei. Estou até hoje.
P/1 – Você falou do contexto de recessão no momento que você saiu da empresa. Conta um pouco melhor como era a industrialização no Brasil, essas greves.
R – No final dos anos 1970, as indústrias voltadas à metalurgia e ligadas às empresas automobilísticas eram muito fortes, tinham muitas atividades, muitos empregados. Começou o movimento sindical muito forte no ABC, que logo se espalhou para toda a região da Grande São Paulo. Ouvia-se falar muito do Lula, desse movimento. E o pessoal foi se engajando, os próprios profissionais metalúrgicos foram se engajando até para entender direito os direitos trabalhistas de cada um. Até porque estávamos vivendo ainda em uma ditadura militar, em que tudo que você pensasse contra o governo, você era comunista, era contra o governo. Se você pensasse alguma coisa diferente, você era uma pessoa não grata na sociedade. Nessa empresa que eu trabalhei e em toda a região, aconteceram várias paralisações. Greves, chamadas greves brancas. Nós entrávamos de manhã, mas ninguém ligava uma máquina, ninguém fazia nada. Ficava a jornada de trabalho toda jogando conversa fora lá dentro, sem fazer nada. Terminava a jornada, havia os ônibus da empresa, cada um pegava o seu ônibus e ia embora. O turno que entrava das três às 11, depois das 11 à meia-noite, fazia a mesma coisa. Às vezes, ficava semanas a fio nessa balada. Depois de um acordo, sabe Deus como era feito esse acordo sindical com os patrões, descontavam os nossos dias ou, senão, tínhamos de repor os dias. Então, percebemos que o trabalhador, de certa forma, foi bastante lesado pelos empresários e bastante enganado pelo sindicato também. Eles ajudaram a maquiar a coisa. Tanto é que hoje o movimento sindical no país caiu muito. Acabou caindo em descrédito. Em função, talvez, de uma ação não muito boa no passado. Mas foi importante. O movimento sindical foi importante. Acho que serviu para alertar o mundo do chão de fábrica que tinha uma população gigantesca. Nem todos tinham condições de estudar, era mais atividade braçal mesmo, não paravam para pensar nos direitos. Sabiam que tinham muitos deveres, mas desconheciam os direitos. Isso foi um ponto bom de todo esse movimento sindical.
P/1 – Na sua empresa havia os fura-greves também?
R – Havia os fura-greves, que não aceitavam de jeito nenhum, como havia, também, o pessoal ligado ao grupo dos sindicalizados. Existiam os caras que eram mais radicais, ligados ao Partido Comunista que era o grande inimigo do sistema militarista do Brasil. E eram colegas de setor que andavam com jornalzinho debaixo da capa, distribuindo-o dentro da empresa. Foi um momento muito legal. E como te falei, você jovem, tudo isso desabando na sua cabeça, precisava assimilar tudo isso. Achava tudo uma novidade. “Pô, quem tá certo nisso aí? É o empresário? É o sindicato? Os dois estão errados?”. Eu parei um pouco para pensar tudo isso: “Pô, a gente vai fazer essa greve, vai levar na cabeça. Eles vão descontar os dias, quando acabar a greve vai ter corte, eles vão mandar gente embora. E o sindicato não vai conseguir emprego pra esse pessoal depois, né?”. E o pessoal do sindicato sempre dando um jeito de ficar bem na foto, de até, talvez, levar uma grana, alguma coisa por fora... Isso nunca vamos saber. Ninguém nunca vai confessar.
P/1 – Mas o sindicato ia até a empresa fazer reuniões?
R – Sim. Fazia reuniões, fazia comícios com aqueles caminhões de som na porta da empresa. Chegavam lá de madrugada. Nós entrávamos por volta das seis horas da manhã. O meu turno, minha jornada de trabalho era das seis às 15. Por volta de cinco horas da manhã, o pessoal já estava lá. O caminhão ligado, o pessoal chegando, fazia aquele apanhado ali na porta, já fechava a rua, muita gente. Ficava: “Companheiros, vamos entrar, mas não vamos fazer nada. Não vamos ligar as máquinas!” E assim era feito. Aí acabava a greve, uma semana depois, você via um monte de gente indo embora. Pais de família, muitos perdendo emprego. Até no final dos anos 70, era até fácil arrumar emprego. Todas as empresas em volta com aquelas placas pedindo funcionários. Existiam várias, mas muitas placas e para várias atividades. Várias. Se você entrasse, combinava salário, o cara fala: “Você vai ficar em experiência três meses, após três meses a gente vai pagar tanto pra você”. Chegasse nesse quarto mês e não viesse o salário: “Tudo bem, cara. Tô indo embora”. Entraria em uma empresa ali em frente para ganhar uns 200, 300 reais, na moeda de hoje. Se aquela empresa não estava boa, saía dali e ia para outra. Era muito fácil conseguir emprego. Depois a coisa foi minando, minando, as placas foram esvaziando, tudo foi ficando muito mais difícil. Até chegar nos dias de hoje. Hoje, qualquer emprego que você está concorrendo, precisa ter um curso superior, senão você nem concorre. Mudou muito.
P/1 – E daí você saiu da empresa porque teve um corte.
R – Sim. Teve um corte, já havia uma crise muito forte no início dos anos 80. 1980, 1981, as greves também já estavam diminuindo, mas a crise mundial, a crise no Brasil, dívida do Brasil com o FMI... Chegaram: “Vai ter que ter um corte X”. Para mim, foi um choque na hora que o encarregado do setor me chamou, falando que o supervisor queria conversar com um grupo, que estava nos demitindo. Ele não queria fazer isso, mas em função... Eram ordens também. E saí.
P/1 – E você morava ainda com a sua família toda em casa?
R – Sim. Por incrível que pareça, eu tinha acabado de entrar na White, estava no primeiro mês, encontrei esse mesmo supervisor em um restaurante. Ele falou: “Quer voltar?”. Eu perdi a confiança nele. Poxa, um período em que eu precisava tanto e fui demitido. Trabalhava de segunda a domingo direto. Ganhava muito pouco, então, contava muito com as horas extras, que me ajudaram muito. Então eu ficava todo dia até mais tarde. Para mim, foi um baque. Com um mês de White, ele me chamou para voltar, falei: “Vou pensar um pouco”. Mas já havia perdido a confiança nele. Não demorou muito, ele saiu da empresa, abriu uma empresa própria. No ano seguinte, estava com um ano na White, encontramo-nos casualmente, e ele falou: “Quer ir trabalhar comigo na minha empresa?” O salário era bem melhor que o da White. Mas ainda continuava não confiando nele. Acho que fiz a escolha certa. Acabei ficando na White.
P/1 – E como foi a tua entrada? Você fez entrevista? Como você ficou sabendo que estavam precisando?
R – Nesse depósito em que o meu pai trabalhava, o dono da empresa conhecia alguém da White e ele falou assim: “Parece que estão pegando, admitindo mecânico lá, tal”. Aí meu pai falou: “Pô! Meu filho tá procurando emprego. Tá desempregado.” “Lá em Osasco, no Jardim Piratininga. Pede pra ele ir lá”. Eu fui, procurei uma pessoa, preenchi a ficha, depois, fiz uma entrevista, fiz um teste prático e entrei na empresa.
P/1 – Você se lembra de quem te entrevistou?
R – Lembro... Um técnico de nome Valdir. Só que eu não trabalhei com ele. Quando entrei, trabalhei em outro setor, mas a entrevista foi com o Valdir. Depois, entrei em outro setor e rodei. Acho que naquela área, fiz um pouco de tudo, trabalhei em todos os setores. Esse setor em que estou na White, hoje, é um setor de manutenção, o CCM, Central de Confiabilidade e Manutenção. Quando entrei, tinha outro nome. Havia vários departamentos nesse setor. Acho que eu trabalhei em todos e fiz um pouco de tudo em cada um deles.
P/1 – Na primeira semana de trabalho, você lembra como foi o primeiro dia, se foi bem recebido?
R – Lembro. Fui muito bem recebido. Fase de adaptação, você tem que saber onde está pisando. A forma, o ritmo de trabalhar eram outros, as máquinas eram outras, pessoas diferentes também. Existia um estilo White de ser. Era bem diferente da outra empresa. Eu tentei me adaptar rápido. Precisava esquecer a outra, o que eu fazia lá e acertar aqui.
P/1 – Você tinha essa noção da existência da White Martins, esse universo do gás? Você conhecia antes de entrar na White?
R – Para ser sincero, não. Usava muito o oxigênio acetileno na outra empresa em que trabalhava, porque era necessário, mas eu não fazia essa associação de que era a White Martins que nos fornecia isso. Ou pelo fato de eu não estar muito interessado, ou por estar mais focado no que eu estava fazendo e não no mundo externo, de quem fornecia a matéria prima, o gás, na época. Não consegui associar a tanques em hospitais, indústrias. Hoje, você vê, é difícil passar em frente a um hospital que não tenha um tanque da White Martins. Mas, enquanto você não está precisando, não está voltado para isso, você não pensa nessas coisas. Sendo sincero, não sabia nem da existência da White Martins. Apesar de que muito próxima a minha casa havia uma unidade muito grande da White, que hoje é a de gases especiais, em Osasco. É muito perto, tem muitos cilindros lá. Fazem muitas coisas interessantes na área química.
P/1 – E você entrou para trabalhar com o quê exatamente?
R – Como até hoje, com equipamentos voltados à produção de gases dentro da White Martins. Em momento nenhum eu trabalhei na produção do gás, na produção do líquido na White Martins. Eu sempre trabalhei com os equipamentos que produzem esses gases. Nunca estive voltado à produção, à operação e, sim, sempre com a manutenção.
Mas também não dá pra desvincular uma coisa da outra. É preciso que a máquina estivesse funcionando para produzir. Se quebrasse, teríamos que consertar no menor tempo possível, fazer um ótimo trabalho para que continuasse produzindo.
P/1 – E como que foi a sua trajetória? Conta um pouquinho.
R – Acho que eu fiz um pouco de tudo dentro do setor de Manutenção da White. Passei por quatro, cinco, seis gerentes, talvez, nesses 30 anos. Não foram muitos. Mas acho que se fiquei até hoje é porque que eu fiz um bom trabalho com todos, né? Em tudo aquilo que foi determinado para que eu fizesse. Eu sempre pensei o seguinte: se estão pedindo para fazer é porque eles acreditam que é para fazer bem feito, uma vez só. Eu sempre tive isso, sou muito detalhista em fazer bem feito para fazer uma vez só. E fui fazendo.
P/2 – Mas a princípio você era responsável pela manutenção na planta de Osasco.
R – Não.
P/2 – Era geral?
R – Geral. Nós nunca pertencemos a nenhuma planta. A Central de Serviço nunca pertenceu à planta alguma. Até hoje, falando a verdade, nós somos um grande anexo, todo mundo que trabalha para a White Martins seria o nosso patrão. Mesmo hoje, estando dentro da Usina de Capuava [na cidade de Santo André, Grande São Paulo], nós não pertencemos à Usina de Capuava, somos um anexo, residimos dentro do condomínio Capuava. Tanto é que a Capuava tem o próprio grupo de manutenção. Nós somos um anexo que atendemos toda a América do Sul.
P/1 – Você está há 30 anos na empresa, pode dizer como se deu o desenvolvimento desses equipamentos? Você consegue dizer alguns marcos?
R – Sim. Há marcos importantíssimos. No final dos anos 70, eu entrei na White em 1981, e tinha a produção, as grandes plantas da White eram _______ [trecho incompreensível – problema no áudio] plantas de alta pressão, máquinas de expansão. Uma operação extremamente perigosa. Perigosa, mas para os padrões da White sempre seguras, não há relatos de acidentes catastróficos. E no final dos anos 70, início dos anos 80, começava a era de turbocompressores, de turbomáquinas na White, que para o grupo todo era uma grande novidade. Até hoje essa evolução vem acontecendo, de máquinas cada vez mais encorpadas, que produzem muito, o volume de produção é muito grande e com bastante rendimento. Deu para acompanhar bem toda essa movimentação.
P/1 – E como era o treinamento? Eu sei que não foi de uma hora pra outra, foi mudando ao longo do tempo. Antes trabalhava de um jeito, daí muda a máquina, passa a trabalhar de outro...
R – Exato. O treinamento, no meu caso específico, e de outros colegas da empresa, não tivemos uma escolinha. A nossa escola foi o dia-a-dia. Às vezes, trabalhando com pessoas mais experientes, saindo, viajando com eles, a cada dia, cada máquina que se via, cada máquina que se abria era novidade, era mais um conhecimento adquirido. Então, não tive escolinha. Foi a necessidade de campo que fez com que eu me desenvolvesse. Como tem colegas, que até hoje prestam serviços, excepcionais em termos profissionais, na execução do trabalho. Buscava me espelhar nesse pessoal, pensava o seguinte: “Pô, se ele é capaz de fazer, eu tenho que ser capaz também. Se ele faz, eu vou dar um jeito de fazer também”. De um jeito ou do outro, eu vou, talvez de formas diferentes tal, mas o resultado no final acabava sendo igual.
P/1 – E você, no seu começo na empresa, começou a viajar, já foi escalado para trabalhar em algum outro lugar?
R – No início, não. Acho que até os nove primeiros anos, viajei muito pouco, ficava mais na base. Comecei a viajar de forma absurda, viagens seguidas, a partir do ano de 1993, 1994. Uma sequência, até hoje, interminável de viagens. Várias e várias.
P/1 – Você lembra a primeira que fez? Uma grande viagem que você falou: “Olha, que bacana, que desafio!”?
R – Acho que a primeira em que eu fiquei mais tempo fora, chamou bastante a atenção foi quando tive de trabalhar em uma fábrica de Iguatama, em Minas Gerais, fábrica de carbureto. Na época, era uma fábrica pioneira no Brasil, não existia fábrica de carbureto no ano de 1983. O Brasil ainda atravessava uma crise industrial muito brava. E eles começaram a construir aquela fábrica e pararam. Eu fui trabalhar na manutenção de conservação de equipamento para que um dia, quando voltasse o projeto, as máquinas não estivessem deterioradas, com infiltrações de umidade, esse tipo de coisa. Eu fiquei um mês em Iguatama. Não havia uma cidade perto que tinha hotel, eu fiquei um mês morando dentro do alojamento da obra nessa cidade. Um mês seguido, deu 30 dias certinhos. Acho que foi a primeira marcante. A primeira em que fiquei mais tempo fora.
P/2 – Depois ela retomou na década de 90, não?
R – É.
P/1 – E você teve de voltar lá?
R – Não. Nunca mais voltei. Incrível!
P/1 – Foi bem conservada?
R – Foi, foi... Não reclamaram. Foi bem conservado, sim.
P/1 – E como foi na sua família? Você já era casado?
R – Não.
P/1 – Como foi deixar a sua casa por um mês?
R – O pessoal estranhou, porque estão acostumados com você saindo e voltando todo dia, de repente, fica um período fora trabalhando assim, estranham um pouco, como eu estranhei também. Nas primeiras viagens, quer queira, quer não, impossível a pessoa não ficar deslumbrada de sair, de conhecer outras pessoas, outra natureza de trabalho, máquinas diferentes, tudo diferente. Incrível! Muda bastante. Meu pai, minha mãe, meus irmãos estranharam um pouco também. Depois, minha mãe foi acostumando.
P/2 – E depois você ficou oito meses, teve uma experiência mais longa no Chile?
R – É. Mas foi agora mais recente. Isso foi agora no ano de 2008 para 2009, de 2009 para 2010. Eu devo ter ficado quase um ano e meio no Chile, entre idas e vindas.
P/1 – Foi o tempo mais longo que você já ficou em alguma viagem?
R – Eu acho que sim.
P/1 – Conta um pouco, então, dessa experiência, os desafios do Chile, na questão da América do Sul.
R – Na América do Sul... Vou falar um pouquinho da América do Sul, daqui a pouco eu chego ao Chile. A primeira viagem para o exterior que eu fiz foi no ano de 1996 para a Colômbia. Não falava nada de castelhano, espanhol, nada, nada. Pintou um trabalho lá, eu fui. Foi difícil para mim, porque eu não falava a língua dos caras, a máquina era uma novidade, não havia trabalhado com aquele tipo de equipamento. Para ajudar, ela estava bastante quebrada, precisava recuperar. Foi um marco dessa saída. Não tinha para quem perguntar como devia ser feito o trabalho, então, acho que me ajudou muito, porque consegui desenvolver as minhas técnicas, o meu jeito de trabalhar e isso me ajudou bastante. Depois, foram várias viagens. Para Venezuela, Colômbia, Peru, Chile, Argentina, intercalando com vários trabalhos no Norte e Nordeste do Brasil, no Sul, em Minas. Aí foi.
No Brasil, nesse período, eu fiquei bastante tempo fora também quando trabalhei na planta de Barcarena, no Pará. Por que eu fui trabalhar nesse projeto também? Porque já tinha trabalhado com essa planta, que estava na Colômbia e foi transferida para Barcarena no Pará. __________ [trecho incompreensível – problema no áudio] já tinha trabalhado lá, o pessoal achou que eu conhecia tudo, então fui trabalhando na montagem. Ela foi transferida, eu fiquei cinco meses entre idas e vindas também. É outro mundo o Norte do país. O nosso país é diferente, a gente, os costumes também. É impressionante. Nosso país tem uma diversidade fantástica. Mas foi um período bom também.
Essa do Chile, que comentava com vocês um pouco antes, além do trabalho ser prazeroso, é um país fantástico, eu gosto muito, muito mesmo. Eu acho o povo bem politizado, culto e dentro do possível eu sempre estou lendo alguma coisa na internet sobre o Chile. É aquela coisa de muita afinidade. Nesse período de um ano e meio, de final de 2008 até 2010, trabalhei em dois projetos. Já havia trabalhado em 2000, em outra planta em que fiquei uns três meses. Depois, voltei e trabalhei em mais dois projetos. Nesse último projeto, estava indo tudo muito bem, tudo muito maravilhoso, até que veio um forte terremoto. Eu sou um dos sobreviventes do terremoto. Santiago balançou muito, estávamos hospedados em Santiago. O epicentro foi em Concepción, que é ao sul do Chile, a 400 quilômetros. Não é muito perto. É daqui no Rio de Janeiro. Mas tudo balançou muito. Foi uma experiência que eu não desejaria repetir, porque é assustador, é muito forte. Historicamente, eu acho que foi um dos cinco maiores terremotos registrados no mundo. A coisa foi brava. Todo o nosso grupo que estava lá... Esse terremoto se deu por volta das três e 35 da madrugada, numa noite de sexta para sábado de fevereiro. Estava muito próximo de partir a planta nova. Nós estávamos trabalhando em um projeto, uma planta nova, uma PL 2. Talvez, em mais uns 15 dias, estaríamos com a planta produzindo. Esse terremoto não só abalou o Chile todo, como a nossa planta também, destruiu muita coisa. Derrubou transformadores e demorou mais, pelo menos, 40 dias para colocar tudo em ordem. De 15 foi para 40, 45. E essa foi uma das passagens mais traumáticas para nós. Nos primeiros quatro dias, não chegavam voos, nada chegava lá. O aeroporto destruiu, ficou bem ruim a situação. Muitos viadutos, passarelas caíram. A Praxair do Chile parada, como tudo parou. Faltava energia elétrica, comunicação, aquela coisa toda. O nosso diretor falou: “Se alguém não estiver confiante de ficar...”. Porque a terra não parava de tremer, balançava o tempo todo, eram 200 epicentros por dia. Alguns eram perceptíveis, outros não, mas... Só que tinha um lance também, de ver tudo que havíamos feito bastante danificado. Começou a faltar produto para o mercado, começou a faltar oxigênio para os hospitais e acabamos encampando a ideia de que tínhamos de fazer aquela fábrica funcionar de novo de um jeito ou de outro. Foi o pessoal da FEC [Fábrica de Equipamentos Criogênicos], do Rio [de Janeiro], o pessoal do Maurício, do Giovane, do Jorge Franco que estavam lá. Eles tiveram um trabalho heroico, todo mundo trabalhou... A planta nova não parou, porque nem estava funcionando ainda, mas possuíamos uma planta chamada T100, que estava em pleno funcionamento e parou com o terremoto, danificou também. Nosso foco foi lá e trabalhamos dez dias, dia e noite, 24, 30 horas, 40 horas seguidas, todos, para fazer acontecer, fazê-la voltar a operar. Por tudo o que aconteceu, conseguimos em um período curto, fazer essa unidade voltar a funcionar e voltar a produzir.
P/1 – E aí vocês voltaram a entregar oxigênio aos hospitais?
R – Na medida em que você volta a produzir... É o tal negócio, a partir do momento que você bota um equipamento para funcionar, rodar, o pessoal dos negócios, de distribuição sabe para quem, as prioridades, aquela coisa toda. Não é uma área que nos pertence. Intimamente estamos ligados, mas não nos pertence, então você não fica tão envolvido nesse tipo de coisa. Mas sabe que no teu íntimo, o teu papel foi cumprido, aquilo que tinha de ser feito, fizemos. Da melhor maneira possível, fizemos. Dentro dos recursos que contávamos, fizemos.
Foi acho que a passagem mais... Nesses 30 anos de White, acho que foi a passagem mais difícil. Até pelo fato do terremoto, que só via na televisão, em documentário. Quando eu estava no meio do terremoto, falei: “Pô, acho que é terremoto mesmo, para estar tremendo desse jeito só pode ser terremoto”. Não temos isso aqui, não sabemos como é. Na verdade, estávamos um pouco mal acostumados. A terra no Chile treme todo dia, todo santo dia treme. Tem um site que acompanhamos, treme três, quatro, cinco vezes por dia em algum ponto do Chile. Um com intensidade maior, outro menor, mas treme. Percebíamos mais de madrugada, porque a cama dava uma balançada... Estávamos em um apart-hotel bacana, inclusive, mas a cama balançava. Era coisa rápida e parava. Várias vezes isso aconteceu, no período em que estive lá. Só que aquele dia começou e demorou a parar. Demorou, destruiu muita coisa. O pior foi o epicentro, porque além do terremoto, teve o tsunami também. Foi catastrófica a coisa. Mas, graças a Deus, passou. Passou.
P/1 – Você contou do caso de um país que sempre treme um pouquinho. __________ [trecho incompreensível – problema no áudio] existiam objetivos diferentes, então, em cada planta, em cada país. Como são esses desafios para vocês atuarem? São equipamentos diferentes? Como é a manutenção em diferentes locais?
R – Como falei, dentro do que o mercado mundial apresenta em tecnologia de turbocompressores, tem um pessoal da Engenharia, da Matriz, do CENA [Centro Empresarial Nova América, na cidade do Rio de Janeiro], que determina as máquinas que vão para cada planta. Há vários fatores, depende se a unidade vai ser colocada em um lugar muito alto, em um lugar ao nível do mar, faz toda essa diferença. Capacidade de cada máquina. Envolvem muitos fatores atmosféricos até para a produção, como montar uma unidade em La Oroya [Peru], que está no meio da Cordilheira Peruana a 3800 metros. É um lugar terrível de ir. Eu já fui umas cinco, seis vezes pra lá. Recentemente montaram uma planta. Eu acho que essa planta ainda está parada, porque a mineradora está tendo problemas com o governo peruano, não está operando. Mas para quem foi trabalhar é complicado, você tem de trabalhar com máscara, é um dos lugares mais poluídos do mundo, há muito metal pesado no ar. Um lugar terrível de trabalhar, não é fácil, não. E tem o inimigo da altitude. Deixa mal pra caramba! Há pessoas que não sentem absolutamente nada, mas tem outros que, só pelo fato de saber que está indo para lá, já começa a passar mal. É um inimigo a ser respeitado mesmo. Porque você sai de Lima a nível zero do mar, sobe a 4000 e __________ [trecho incompreensível – áudio com problema], 3800 metros. Dor de cabeça, falta de ar, nariz que resseca, sangra. Há todas essas adversidades que o grupo da White precisa absorver e executar. Coisa que o pessoal não fala muito, mas existem adversidades que vamos enfrentando no dia-a-dia.
P/1 – E como vocês fazem? Mascam muita folha de coca, bebem chá de coca, como vocês fazem para trabalhar?
R – Eu não sou muito adepto a chá, esse tipo de coisa. Eu me limito a tomar alguma coisa contra enjoo, tipo Dramin, e comprimidos para dor de cabeça, sabe? Nem no meu dia-a-dia, nem aqui em São Paulo, em lugar nenhum eu não gosto muito de chá, essas coisas, não. O pessoal tanto na Bolívia, quanto no Peru, na Colômbia, adora esse tipo de chá que é vendido à vontade em qualquer lugar lá, supermercado, tal.
P/1 – Valter, o seu setor tem alguma relação com o IMPAC [Centro de Monitoramento Remoto]? Eles fazem monitoramento e, às vezes, quando não conseguem resolver daqui, vocês são mandados para ir a campo?
R – Há uma ligação direta com o Impac. Não especificamente nós, o meu setor. O Brasil está dividido em algumas áreas, área São Paulo, Sul, Minas, Rio, Norte e nordeste. O IMPAC, além de acompanhar a produção de algumas plantas remotas, tem várias VPSAs [?], que também são remotas e essas VPSAs estão instaladas dentro dos nossos clientes. Vários clientes espalhados___________ [trecho incompreensível – áudio com problema] e as plantas são, como eu disse, remotas, operadas pelo pessoal do IMPAC. De repente, essa planta por algum motivo mecânico ou elétrico ou de instrumentação, para. O operador que está no IMPAC tenta ver o motivo da parada. Se for conveniente ou não, dependendo da análise técnica, ele tenta repartir essa planta. Se ele não conseguir, vai acessar alguém de uma dessas regionais de onde ele estiver: “Olha, estou tentando partir a planta, não vai. Então, tenho que mandar um técnico para lá”. Normalmente, é o owner que toma conta da planta. E vai lá, tenta avaliar o que é, se é elétrico, instrumentação, e chamar alguém para avaliar também. Se ele conseguir resolver, beleza. Se não, ele vai acionar alguém da parte Mecânica, Elétrica, Instrumentação, depende a natureza do trabalho. Tem histórias aí que o pessoal conseguia arrebentar a planta inteira, de ter que refazer no campo tudo. _________ [trecho incompreensível – áudio com problema] uma coisa mal avaliada destrói a planta. Hoje, conseguem monitorar mais, os cuidados são outros, porque o estrago é grande, o prejuízo é bem grande. Mal avaliada a coisa, tentar partir outra vez, estraga... E é assim que trabalhamos. A Central de Serviço à qual pertenço, não tem acesso direto ao IMPAC, não. Por exemplo, eu vou trabalhar, amanhã, sábado e domingo em uma unidade da Gerdau, em Pindamonhangaba [interior de São Paulo]. Temos uma VPSA lá dentro. Então essa unidade vai parar domingo pela manhã, para eu poder inspecionar o equipamento _____________ [trecho incompreensível – áudio com problema]. Todo o domingo essa planta para. Está determinado que esse domingo tenho de ir, fazer uma inspeção. Aí o IMPAC vai parar a planta, sabendo que estaremos lá dentro do site fazendo uma manutenção.
P/1 - A Gerdau é um caso de planta on site?
R – Sim...
P/1 – Queria que você falasse um pouco sobre como é a manutenção das plantas on sites. Você está falando da paralisação, mas o que mais de específico ela teria?
R – ___________ [trecho incompreensível – áudio com problema] produzir o oxigênio para essas unidades. Ela compreende em um trem de máquinas que vai captar esse ar que respiramos, vai sugar esse ar, comprimir, passar por vasos pré-purificadores. Há um compressor desse produto. Os vasos pré-purificadores vão extrair o oxigênio e outro tipo de compressor vai comprimir o oxigênio, que vai mandar para o nosso cliente, vai usar esse oxigênio para o alto forno dele. Não é o mesmo oxigênio que se usa no hospital. Ele tem uma riqueza de pureza um pouco mais baixa do que a pureza que se usa no oxigênio em hospital, que dá 99,99, quase 100% de pureza. Esse aqui é um pouquinho mais impuro, de 90 a 96% de pureza.
P/1 – Mas em termos de manutenção, há diferenças também nas plantas on site?
R – Não há um padrão de máquinas ___________ [trecho incompreensível – áudio com problema] e cada máquina tem sua característica, são ferramentas especiais, dispositivos especiais. A White Martins, a Praxair aproveitaram muitas máquinas de outros lugares do mundo e as adaptaram para essas plantas. Então, abriu-se um leque muito grande de equipamentos e nem sempre temos tempo de treinamento para esse tipo de máquina. Quebrou, tem que ir lá. Aí muda ____________ [trecho incompreensível – áudio com problema]. Um problema sério, porque você não pode estar com o equipamento contaminado por derivados de petróleo, ele pode ter uma ignição e há a possibilidade de explodir a planta. Você pode explodir ou __________ ou pode pegar fogo no equipamento. É preciso estar muito centrado quando você está mexendo em um sistema de gás da máquina. Você está muito exposto ao perigo, porque bem próximo há todos os sistemas de óleo e os dois não podem se conversar. Tem câmara separadora. É um tanto quanto perigoso, mas seguro. Eu volto a insistir nesse ponto, é bastante seguro, não há relatos nos últimos 30, 40 anos, de nenhum acidente sério dessa natureza. É só saber o que está fazendo, a integridade está garantida. Mas, respondendo a sua pergunta, em função desse aproveitamento de máquinas, o leque de máquinas é muito grande e são máquinas de fabricantes e nacionalidades diferentes. Tem máquina alemã, americana, italiana, franco-suíça... E quando precisa falar com esse povo é complicado (risos). Não tem vida muito fácil, não.
P/1 – Quais são os seus grandes desafios, hoje, na sua área?
R – Pôxa, são infinitos. Com 30 anos de White, posso dizer que são infinitos. Eu tenho uma vontade de conhecer as coisas, máquinas. Sinto um prazer incrível naquilo que eu faço, tenho uma satisfação enorme de trabalhar com máquinas. Eu me divirto. Posso afirmar, eu me divirto com isso. É incrível! Não sei de onde vem essa satisfação. Objetivo... Eu poderia falar assim: “O objetivo é conhecer mais”. Mas não. _______________________ [trecho incompreensível – áudio com problema] até quando, não sei. Mas o que vier, eu estarei disposto a ver, a conhecer... Não sei se é o tipo da resposta que você esperava, mas é isso. Não teho outra resposta.
P/1 – Como é seu dia-a-dia hoje? Você é casado? Tem filhos? Está estudando? Como é?
R – Eu estou no meu segundo casamento. Nesse segundo casamento há dois anos. Fiquei no primeiro casamento quase 27 anos casado. Da primeira união eu tenho o Danilo, meu filho, está com 22 anos, é uma das minhas paixões da minha vida. Ano que vem ele termina o curso de Engenharia, forma-se Engenheiro Químico, graças a Deus. E tenho a Letícia que completou um ano e dois meses, um toquinho de gente também que _____________ [trecho incompreensível – áudio com problema] é uma filha. Até então, eu não tinha esse contato, além de sobrinhas, mas o contato de ser pai de uma menina é diferente. Para mim, está fácil comparar uma coisa com outra, do Danilo quando era pequeno, a Letícia hoje, mas... Comportamentos diferentes. Estou na segunda união. Tenho dois filhos, o Danilo e a Letícia.
P/1 – E você estuda?
R – Eu tenho o curso superior incompleto. Eu estava fazendo Engenharia da Automação e Controle, hoje, acho até que mudou a nomenclatura, tá ligado a Mecatrônica. Fiz por três anos, mas em função de viagens intermináveis, não consegui conciliar os estudos com as viagens. Ficava 20, 30 dias fora, quando chegava, assistia uma semana de aula. Depois, desaparecia outra vez, foi complicado. É difícil, não dá para... Precisa ter um acerto muito bom com o gerente, alguma coisa, para que eu consiga tempo. E dentro da unidade que estou, na Central, nosso grupo é pequeno e, dependendo da natureza do trabalho, são poucas pessoas direcionadas a grandes trabalhos. Eu sou uma dessas pessoas que se o trabalho é muito grande, de bastante responsabilidade, acabo, naturalmente, sendo direcionado para isso. Aí sem chance, precisa cuidar da empresa.
P/1 – E o que você faz nas suas horas de lazer?
R – O que é lazer? (risos) Eu viajo bastante, às vezes, gosto de ficar em casa. Quando quero ficar em casa, o pessoal quer sair também, mas dentro do possível... Estou tendo a experiência de pai fresco, novamente, voltado à garotinha também. Com o Danilo, eu ____________ [trecho incompreensível – áudio com problema] sair bastante com ele final de semana, encontrá-lo, até para não perder o elo, o contato de pai e filho. E ______________ [trecho incompreensível – áudio com problema] bastante, esse ainda está dando para levar, porque eu vou na segunda, volto na sexta, aí só tenho o sábado e o domingo para ficar em casa. Mudei recentemente, comprei outro apartamento, estou montando, tenho um monte de coisas para fazer. Se bobear, trabalho mais em casa do que na empresa, porque há muita coisa para fazer em casa. Nos últimos quatro meses, estou muito voltado ao novo apartamento. E com as viagens, ficar dois dias, disponibilidade para lazer é complicado. Precisa fazer de tudo, a verdade é essa. Tem de cuidar da casa, dar um jeito de descansar um pouco a cabeça, descansar um pouco ______________ [trecho incompreensível – áudio com problema], ir a um parque dar uma caminhada, alguma coisa assim. Mas está sendo difícil. Os últimos quatro meses, confesso que estão difíceis. O lazer não é a ordem do dia, não. Não é mesmo.
P/1 – Valter, você quase completando 30 anos de empresa, que aprendizado você tirou, trabalhando dentro da White? É bastante tempo, não?
R – Sim. A White Martins é uma empresa que você pode confiar. De olhos fechados. Por mais que mude presidente, que mude diretor, o seu gerente, o seu chefe direto, mas a White tem uma linha de conduta na qual você pode confiar. Nesses 30 anos, teve um atraso de salário, acho que foi o vale ainda. Foi na mudança do governo do Collor, quando ele confiscou a grana de todo mundo e a White Martins atrasou acho que um ou dois dias o nosso vale. Era dia 15 _________________ [trecho incompreensível – áudio com problema] nunca, nunca. Religiosamente, em dia, está lá o seu vale, seu __________ [trecho incompreensível – áudio com problema], às vezes, até antes. Se o dia 30, cair em um domingo, você pode ver na sexta-feira, que seu salário está lá. É uma empresa que te dá essa confiabilidade. O compromisso dela... Da mesma forma que ela tem o compromisso com os clientes, tem com os seus funcionários também. Isso é essencial. Dá essa tranqüilidade: “Fica tranquilo, que teu salário estará lá sempre”.
P/1 – E vai ter festa?
R – Dos 30 anos?
P/1 – Dos 30 anos.
R – É uma coisa gerencial. Há um programa dentro da companhia, dá prêmio em dinheiro, completando 30 anos. Nesse pacote, você tem direito a um almoço, a uma confraternização, e fica por conta de cada gerente e do funcionário que estiver concluindo, como será feito isso. Se vai ser feito dentro da unidade, se vai ser feito em um restaurante. Ainda não fui procurado (risos). Ou não fui procurado, ou não me acharam. Mas não conversamos sobre isso ainda. Não necessariamente é feito no dia em que se completa. É um pouco depois. Antes, acho que não, mas um pouco depois, algum dia depois. Acho que vai acontecer alguma coisa, sim.
P/1 – O que você acha desse projeto de contar a história da industrialização do Brasil, da White Martins, por meio de um projeto de memória? Das pessoas virem para dar seu depoimento?
R – Vou confessar uma coisa, fiquei surpreso e lisonjeado por ter sido indicado. É um grupo pequeno na White Martins que está participando dos depoimentos, não é grande o grupo, vocês devem ter esse número, não sei quantas pessoas são. Mas a White, deve estar com seis mil funcionários espalhados pela América do Sul. De repente, não sei se é um grupo de 100 pessoas, ou mais, ou menos. E ser escolhido para dar um depoimento é fantástico! Porque eu gosto de assistir muito na televisão e, hoje, estou vivendo isso. É engraçado, né? Pessoas fazendo depoimentos sobre pessoas ou de empresas. Ter o que falar. É legal, é muito bom. Ainda mais talvez daqui mais alguns anos todos os equipamentos que estão sendo usados hoje, serão sucata, vai ter uma geração _____________ [trecho incompreensível – áudio com problema]. Pôxa, o que vocês estão fazendo, esse programa que a White está elaborando, será muito legal assistir tudo, poder ver um relato dos outros colegas. Esse pessoal tem muita história para contar, há muita coisa boa da White Martins para contar. Vai ser muito bom. E causa um impacto grande. Vários perguntaram: “Como vai ser?”. Falei: “Não sei também, gente. Estão me convidando lá pra dar um depoimento, falar alguma coisa tal, mas a essência mesmo eu não sei como vai ser isso”. O pessoal está bastante curioso para ver tudo isso editado, elaborado. Porque temos umas revistas antigas de quando a White começou, até quando a Praxair, há cinco anos, completou cem anos. Hoje a White Martins está prestes a completar o primeiro século. É muito legal, isso está mexendo com o pessoal, seguramente, está mexendo bastante. Todos da Central ficaram bastante curiosos também de querer saber como vai ser. Falei: “Deixa tentar ver como está indo, depois a gente conversa. Também não sei não”.
P/1 – E o que você achou de ter participado?
R – Ah, interessante. Como eu falei, assisti muitos depoimentos de outras áreas, de outras empresas, de repente você se vê dentro de um projeto como esse, é muito gratificante. Muito gratificante! Até por saber alguns nomes que vocês citaram que virão, ou que estiveram do CENA, deram depoimento. Pessoas importantes dentro da companhia. Todo mundo é importante, cada um no seu segmento, mas tem uma importância _______________ [trecho incompreensível – áudio com problema], acredito que todo mundo falou muito bem. Só podemos falar bem dessa empresa, eu não tenho nada para falar contra, não. É bom. Estou satisfeito por dar essa contribuição, mesmo que pequena, estou bastante satisfeito.
P/1 – Nós também! Muito obrigada.
R – Eu que agradeço, de coração. Agradeço mesmo.
FINAL DA ENTREVISTARecolher