Projeto Pueri Domus
Depoimento de Mariluce Alves Barreira Lourenço
Entrevistada por Mauricio Rivero e Iwi Onodera
São Paulo, 17 de Agosto de 2006
Realização: Museu da Pessoa
Código: Pueri_HV008
Transcrito por Denise Yonamine
Revisado por Joice Yumi Matsunaga
P/1 – Mariluce, boa noite.
R ...Continuar leitura
Projeto Pueri Domus
Depoimento de Mariluce Alves Barreira Lourenço
Entrevistada por Mauricio Rivero e Iwi Onodera
São Paulo, 17 de Agosto de 2006
Realização: Museu da Pessoa
Código: Pueri_HV008
Transcrito por Denise Yonamine
Revisado por Joice Yumi Matsunaga
P/1 – Mariluce, boa noite.
R – Boa noite.
P/1 – Primeiramente, eu gostaria de saber de você, Mariluce, seu nome completo, local e data de nascimento.
R – Mariluce Alves Barreira Lourenço, nasci em São Paulo, 10 de maio de 1949.
P/1 – Qual foi a sua atividade na Pueri Domus?
R – Dentro da área de Educação fui professora, orientadora educacional e diretora.
P/1 – Nome dos pais?
R – Lauro Alves Barreira e Maria Antonieta de Castilho Barreira.
P/1 – Me fala um pouco da sua família, qual a origem dela?
R – Bom, minha família, meu pai nasceu em Manaus, meu avô demarcava terra para o governo na época, então ele teve doze filhos e cada um num estado do Brasil, então meu pai nasceu em Manaus, outro nasceu no Pará. Minha mãe é de São Paulo, família bem antiga de São Paulo e meu pai era fazendeiro, então eu, a minha origem, educacional inclusive, foi colégio interno, porque nós morávamos na fazenda, e na cidade em que morávamos naquela época não tinha a escola, por exemplo, do Fundamental de hoje, né, então eu fui para colégio interno assim como as minhas irmãs também, tá?
P/1 – Quantos irmãos você tinha?
R – Eu tenho duas irmãs mais velhas, eu sou temporona na minha casa, quinze anos de diferença.
P/1 – E fala um pouco da sua casa e da infância?
R – Como eu disse a você, morávamos em fazenda, então eu tive uma vida, uma infância muito ligada a zona rural mesmo, né, então eu fui uma pessoa que curti muito campo, até hoje curto, porque tem uma ligação aí acho que de vida, né, gostava muito de andar a cavalo, sempre muito envolvida com animais, depois fui para colégio interno cedo, né, fui com dez anos, fiquei cinco anos estudando em Minas Gerais, em Poços de Caldas num colégio dominicano, em Poços de Caldas de São Domingos, onde fiquei até quando eu estava na oitava série. Nós nos mudamos para São Paulo com o falecimento do meu pai e aí eu vim para cá, a partir da oitava série estudei aqui no _________________ ali na Nove de Julho, onde eu fiz o magistério.
P/1 – E, me conta um fato marcante da sua infância que ficou gravado.
R – Bom ou ruim? Tanto faz? (Risos). Eu acho que uma marca muito forte foi o falecimento do meu pai, porque eu era muito criança e muito ligada a ele, né, acho, por ser uma temporona foi acho que meio uma marca na minha vida bastante séria e a partir daí eu assumi uma responsabilidade pessoal bastante grande de dar conta, na época, dos estudos, da minha vida, ser uma pessoa mais independente, que não era muito ainda na época isso que se pensava, né, a mulher ainda tinha uma educação mais voltada para casa, para família e eu já nesse fato, isso mexeu um pouco comigo no sentido de correr atrás, né, e ter uma ocupação que realmente gerasse a possibilidade de eu ser independente, isso sempre passou na minha cabeça, acho que foi muito marcante essa questão.
P/1 – Me conta um pouco da sua escola, como é que eram as brincadeiras, como que era o relacionamento com os alunos, com os professores?
R – Bom, primeiro lugar, era uma escola religiosa, né, onde a gente tinha, todos os dias você levantava, você tinha duas opções: você ia para missa ou você ia para sala de estudos. Então eram só essas duas opções. O café da manhã vinha depois da missa ou do primeiro estudo da manhã, nós tínhamos o estudo a manhã toda. Então, depois do café da manhã, tínhamos um recreio, depois nós tínhamos estudo até às onze e meia, aí tínhamos o almoço e as aulas eram à tarde, né? Naquela época se usava ainda, o não tradicional uniforme de saia azul marinho pregueada, tinha aquela blusa de fustão tipo marinheiro que foi bem uma época dos uniformes das escolas, né, vendo outro dia uma exposição que teve em São Paulo sobre os uniformes das escolas, a origem, passei bem por eles aí nessa época. E as brincadeiras nossas eram, né, mais tradicionalmente os jogos mesmo, tinha vôlei, basquete, as questões que rolam até hoje e era muito mais uma coisa de sentar, bater papo, jogar xadrez. Não existia, a televisão surgiu nesse período em que eu estava interna. As freiras fizeram então, convidaram os pais a contribuírem para compra de uma televisão, né, então nós tínhamos uma televisão, foi na época do Roberto Carlos, eu me lembro bem disso. Então era um frisson domingo à tarde porque ia ter, nós íamos ver televisão e ia ter o Roberto Carlos na televisão, então isso foi assim, era um máximo a gente poder assistir, né? Tínhamos teatro na escola, as irmãs eram bastante inovadoras, eu diria assim, na época. Então nós tínhamos uma vez por semana, nós nadávamos no Country Club lá de Poços de Caldas no mesmo dia em que o colégio Marista que eram os rapazes, também iam, então isso era o máximo. Imagina? Você encontrar os rapazes do outro colégio interno, né, então eu gostei muito do colégio interno, porque eu era a temporona na minha casa, então foi nesse momento que eu, na realidade, encontrei os pares da minha idade, né? Então eu fiz amigos, então gostei muito, embora eu tenha sofrido muito com a morte do meu pai que foi muito próximo eu, curti muito essa época, porque a minha escolaridade, acho que é importante ressaltar, eu entrei na escola com dez anos eu nunca fui à escola antes, eu fui alfabetizada pela minha mãe e estudei com uma professora particular até a terceira série e entrei na escola já interna, né? Então, hoje, quando a gente vê os pais estão preocupados com os detalhes que o filho vai sofrer, eu lembro um pouco da minha história, eu entrei aos dez anos num colégio interno, onde minha mãe me deixou, meu pai na época que era vivo e voltou seis meses depois, né, então eu acho que a gente tem uma outra envergadura aí de vida porque também passamos por outras questões que hoje não se passa mais.
P/1 – E quais eram as matérias que você mais gostava na escola?
R – Eu sempre gostei muito de Geografia, História, Ciências, tive uma certa dificuldade em Matemática, depois essa dificuldade foi resolvida a partir de uma sétima série passei a gostar, né, acho que por aí.
P/1 – E biblioteca, tinha?
R – Tinha biblioteca e uma biblioteca muito boa e eu sofria muito para ir à biblioteca, não tinha o hábito do estudo acho que até pelo fato de morar em fazenda, sempre achava muito mais interessante atividade toda da qual eu participava do que ler. Era um esforço da minha mãe, eu me lembro, né? Mamãe sempre leu muito, tinha uma formação muito grande, falava Francês fluentemente, porque na época era normal isso também, mas ela não conseguia muito que eu lesse não. Então na escola passou a ser um grande sofrimento, porque eu me lembro que foi marcante, a professora mandava fazer pesquisa, mas eu não sabia o que era pesquisa e eu ia para biblioteca e aí me davam um livro, e você ficava com aquele livro aberto e não tinha noção por onde começava, o que que fazia e eu, a minha reação era passar mal do estômago, aí eu não chorava, mas eu passava mal do estômago literalmente, eu ia para enfermaria, né, tinha enjôo. Então a biblioteca no início da minha vida está ligada com essa cena assim. Bem, hoje eu lido com criança, quando eu vejo uma criança aflita eu sou a primeira a falar: “Pode parar”, né, isso não é para acontecer. Hoje eu sou uma leitora eu diria, uma boa leitora, gosto bastante de ler, mas vou dizer uma coisa para você, eu descobri a leitura eu acho que eu já tinha trinta anos por aí, já trabalhava há bastante tempo, porque também tive filhos e aí tudo vai, né, tudo vai dificultando, mas depois que eu aprendi a ler, a curtir um bom livro, eu leio bastante.
P/1 – E qual foi o fato mais marcante da escola?
R – Dessa escola que eu estou falando?
P/1 – Isso.
R – Ai meu Deus, tem tanta coisa, tem tanta, tanta recordação, acho que, acho que o fato mais marcante tenha sido quando eu voltei lá depois de muitos anos, né, que eu quis revisitar esse lugar e aí eu acho que tem aquela questão de você fazer uma ideia de um lugar que depois ele não é quando você volta quinze anos depois, né, então me emocionei muito com a minha visita a esse espaço lá e evidentemente tem aquela questão assim, as pessoas não existem mais, né, as pessoas já morreram, então você é assim, acho que foi uma emoção assim, choro ao mesmo tempo tristeza, ao mesmo tempo eu estava com o meu marido, eu queria que ele conhecesse aquele espaço. Foi bastante emocionante e a outra emoção está sempre ligada à vida também, ainda a morte do meu pai foi, eu estava no colégio interno quando ele, né, quando ele faleceu e eu passei, foram me buscar, enfim isso foi uma questão que me marcou muito também.
P/1 – Você tinha saudades dos seus pais?
R – Tinha, muito, tinha muito, muita saudade, porque o que eu disse para você, eu entrei num dia e fiquei seis meses lá, né, não tinha essa de ficar e não existia essa coisa de você ligar, de ficar falando ao telefone, matando saudade, hoje você sai com aluno, o menino leva celular, fala dez vezes com o pai, né, “ó, não gostei do almoço”, quer dizer não existia nada disso, então você tinha que “guenta”, né, ser forte mesmo.
P/1 – Mas vocês trocavam cartas?
R – Não, cartas de vez em quando, de vez em quando sim, não vou dizer que não, se escrevia sim, eu me lembro de escrever um pouco e depois rolou uma coisa assim, como minhas irmãs eram mais velhas, quando eu voltava para fazenda para passar um feriado, por exemplo, já estavam nascendo as sobrinhas, não? Então eu tenho sobrinhas de diferença de idade para mim de dez anos por aí, então rolava um pouco de ciúmes também, porque a minha mãe se ocupava um pouco com as netas que eram pequenininhas, então teve tudo esse lance, aí, né?
P/1 – Fala um pouco da sua juventude, quando você saiu da escola, grupo de amigos?
R – Saí da escola, terminei aqui o Magistério em São Paulo, na época em que eu terminei o Magistério, esse grupo de amigos – na realidade, de três anos, né, porque eu tinha vindo transferida de outra escola – se afastou, nos afastamos um pouco porque, imediatamente, fui fazer esse curso de especialização que, na época, era um curso do método de estudo Montessori. Porque as escolas que nasciam naquela época trabalhavam com o método de Montessori. Para que você conseguisse, até certo ponto, uma vaga, uma oportunidade você deveria ter esse curso, né? Um curso que era feito no Ipiranga. E aí eu fiz um novo grupo de amigos, que na realidade perduram muito, porque foi um grupo, por exemplo, que veio para cá, né? Nós fizemos esse curso lá e depois algumas pessoas desse curso vieram trabalhar na escola, porque a Maria Lucia, que era sócia da Beth na época, era a nossa professora. Então ela trouxe aquele grupo de estagiárias que acabaram depois assumindo classes aqui e trabalharam muitos anos, tem gente que eu sei que ainda está aqui até hoje, entendeu, então foi aí que eu diria que foi um grupo de amigos mais duradouros, já ligado à profissão mesmo.
P/1 – Me fala um pouco então assim, falando em relação ao Pueri Domus, como foi seu início aqui, quando entrou?
R – É, eu entrei em 1969 como estagiária desse curso que eu me referi e em 1970 eu peguei classe. Se não me engano, em 1970 eu comecei a dar aula para terceira série, era muito jovem e a escola sempre teve uma característica de acreditar muito nas pessoas, porque, quando você inicia, acho que qualquer atividade profissional, você sempre tem dúvidas, né, você tem inseguranças. E eu me lembro que era, lidar com gente, nós sabemos que não é fácil, e o professor aprende dando aula, não adianta dizer que ele vem formado e pronto, porque ele não vem, né? Não vinha e continua não vindo. Ele vai aprender no dia a dia. Então esse início, foi um início sempre de muita expectativa, né? Na época, a gente tinha uma coordenadora pedagógica que hoje ainda está aí por São Paulo dando muita assessoria, que apoiou esse grupo bastante, que é a Cleide Terzi, e trabalhamos juntas muitos anos. Aí foi, aí, né, você vai se acostumando com o lidar com a criança, lidar com o jovem, que eu acho que é o mais difícil.
P/1 – Você começou na Avenida Brasil?
R – Comecei na Avenida Brasil.
P/1 – Você consegue descrever assim como era o espaço físico?
R – Bom, espaço físico era, eu não sei agora se esse ano, parece que houve alguma diferença onde era o Fleury, onde era o laboratório Fleury, a casa da esquina, porque tinha, né, uma casa da esquina, foi ali que eu dei aula, né? Quando nós viemos aqui para Verbo Divino eu já não dava aula em sala, mas foi lá que eu dei aula nos anos de dar aula mesmo, aconteceram nesse espaço, era um espaço interessante porque era uma casa, não sei se eu estou correta, mas era um pouco ______________, né, então tinha uma escadaria toda, toda cheia de ferragens e mármore, que na realidade, depois o laboratório manteve. Então, quando você entrava e depois você ia fazer exame de sangue, quando você ia ao Fleury, você subia por essa escada, né? Então foi nesse espaço que a gente, né, que eu comecei profissionalmente a trabalhar.
P/1 – Como era o perfil dos alunos?
R – No início da escola, a escola tinha o nome de escola experimental, né, era razão social e se entendeu naquele momento, os especialistas em São Paulo, que a escola era mais ou menos uma escola que iria lidar com crianças especiais, então naquele momento nós tínhamos muitas indicações de crianças com dificuldades emocionais ou de aprendizagem e então, essa caracterização, ela foi bastante marcante no início do Pueri. Então você tinha uma classe com crianças, lógico, totalmente normais em questão de aprendizagem e você tinha nesse grupo crianças com, não vou dizer distúrbio, mas dificuldade mesmo, inclusive comportamental, né, então foi um início difícil, foi um início difícil para quem dava aula, para quem orientava, até o momento que a escola também teve que fazer uma opção: ou se especializava nesse ramo ou ela seguia um outro caminho, então...
P/1 – E os professores?
R – Os professores vinham sempre de uma escola especializada em Montessori, porque a escola trabalhou com o método Montessori durante um bom tempo, então era um pessoal que saía do Magistério, que tinha uma especialização mesmo no método Montessori, né? Nós normalmente, a escola nos mandava fazer estágio em escolas do Rio, que no Rio também tinham algumas escolas que aplicavam essa metodologia, então todo mundo ia fazer um estágio, fazer uma observação de aula. Era esse profissional, todo mundo jovem, muito jovem, né, eram meninas vamos dizer assim.
P/1 – Descreva como era a sala de aula?
R – Sala de aula, hã, me recordo de duas, uma era no térreo, uma sala pequena de chão de madeira, as janelas meio naquele estilo que eu acho __________ que tinha uma, parecia uma, um ____________ mas não era, um pouquinho para fora assim e com algum enfeite, algum desenho, se não me engano, de gesso nas paredes, alguma coisa tinha, tinha uns dois murais de cortiça e mesinhas, lousa, né?
P/1 – Você sente saudades da Avenida Brasil, daquele período?
R – Eu acho que era um período muito interessante porque todo mundo era mais ou menos da mesma faixa etária, né, e foi um momento de muito crescimento, de muita vontade de aprender aquele grupo todo, então foi uma época acho que todo mundo tem saudade um pouco sim, assim como a gente tem também do início aqui na Verbo Divino, né, que esse grupo veio todo para cá e ficou muito tempo na escola, então foi um período muito bom.
P/1 – Bom, então veio, chegando a Verbo Divino como é que foi essa adaptação?
R – É, para você ter uma noção daquela época, a marginal estava acontecendo, não sei quando é que ela foi inaugurada, tá, mas estava por aí e mulher não dirigia na marginal, porque não, não dirigia na marginal, nós perdemos na época um número considerável de aluno, porque as mães não vinham para cá, depois muitas famílias se mudaram, porque os filhos, né, tinham aquela paixão pela escola, então muitos acabaram vindo para o lado de Santo Amaro. Mas então começou até a adaptação da clientela, o espaço já era um espaço imenso, né, então a gente chegou aqui era tudo de chão batido, não tinha nada do que tem hoje, eu tenho até vontade de recordar um pouco, mas era tudo de terra, né, desde a entrada até lá em cima, não tinha o prédio do Colegial lógico. E eu depois me lembro vagamente dessas mudanças, né? Depois passamos pelo período do pedrisco onde tinha pedrinha em toda essa área externa, então essas crianças brincavam com essas pedrinhas, jogavam pedrinha um no outro, foi um outro momento. E depois já veio a construção de quadras, aí foi, aí começou, constrói o prédio onde hoje deve ser o Fundamental, não sei, né, o prédio ali lateral e o prédio lá do fundo do Colegial. Então foi uma adaptação grande ao próprio espaço. E quando nós chegamos aqui tinha à noite, no andar do prédio principal, a obra continuava da adaptação porque aqui era um (seminal?), né? Então em cima tinha os banheiros, tinham dormitórios que se transformaram em sala de aula, então os pedreiros dormiam de dia e de noite eles começavam a trabalhar, quando os alunos estavam indo embora, a obra começava e isso hoje eu não tenho noção de quanto tempo durou, né, mas com certeza deve ter durado no mínimo um ano. Então era uma vida dupla, escola de dia, funcionava escola, de noite era uma obra a todo vapor, então foi uma coisa bastante arrojada.
P/1 – Os alunos sentiram dificuldade com a adaptação?
R – Não, curtiram muito o espaço, desde o início curtiram muito nesse sentido.
P/1 – Os professores também?
R – Mesma coisa, as mesmas coisas...
P/1 – Aí você continuou dando aula?
R – Não, eu quando cheguei aqui em seguida, eu já comecei a trabalhar como auxiliar de coordenação de primeira à quarta série, onde eu fiquei alguns anos, depois eu trabalhei uns oito anos, uma coisa assim, no colegial como orientadora do colegial...
P/1 – Sempre na Verbo Divino?
R – Até essa época sim, depois eu vim para direção geral junto com a Beth e aí eu acabei passando um tempo em cada unidade acabei sendo deslocada para Jacurici, antiga Jacurici na época, que hoje não tem esse endereço mais, e passei uns quatro anos em Aldeia da Serra, na direção da escola de Aldeia.
P/1 – Como era o seu relacionamento com a Beth?
R – Era muito próximo, né, a gente fez faculdade juntas e ela sempre foi uma pessoa muito arrojada, muito próxima, não era só das pessoas que trabalhavam diretamente com ela, sempre foi próxima de todo mundo. Então era um relacionamento de muito respeito, mas de muita troca, né, que eu acho que hoje, a chefia vamos dizer assim, mantenedores e empresários, não sei como é que se passa isso, mas eu acho que a Beth era muito arrojada nesse sentido, tinha muita troca e você podia discordar, podia dialogar e era bastante interessante, acredito que isso tenha ajudado muito no próprio crescimento da escola, né? Porque lógico que as pessoas que trabalham, elas têm coisas a dizer, né, isso não significa que o empresário tenha que fazer as coisas que ela ouve, mais ouve e sempre agrega alguma coisa, acaba ajudando em decisões, acredito que foi uma das boas coisas que ela fez, a nossa relação era muito próxima.
P/1 – E me fala um pouco da Jacurici desse período?
R – Eu fiquei na Jacurici pouco tempo, não me recordo se foi um ou dois anos, hã, que fui deslocada para lá, fiquei na direção da escola num período que a escola tinha crescido bastante por ser uma escola vertical, vamos dizer assim, não tinha o espaço que tem na Verbo até hoje, então nós tínhamos uma outra realidade de aluno, porque eu também aprendi em escola que o espaço também compunha esse aluno, faz parte, não adianta você comparar a sua clientela de um espaço igual a esse com uma clientela da época da Jacurici, era uma postura diferente, era um aluno diferente, né? Então, nesse período, a escola cresceu muito lá, um colegial bastante grande e foi a época em que eu trabalhei lá. Uma clientela bastante exigente aqui, eu acho que na época era uma clientela mais, vamos dizer assim, nós tínhamos muitos filhos de artistas que estudavam tanto aqui quanto lá, talvez mais aqui, a clientela da Jacurici era mais tradicional, né, vamos dizer assim, se eu posso, se esse termo é correto, não sei.
P/2 – Em que ano que foi isso?
R – Sou péssima de datas...
P/2 – Você não se recorda?
R – Eu tenho isso no meu currículo, tá, mas eu não lembro certinho não, porque na década de oitenta eu estive aqui na Verbo, eu estava aqui no Colegial, então eu acredito que tenha sido depois disso um pouco, na década de oitenta, alguns anos e na época que a escola era muito grande, né, foi por aí, não foi depois não.
P/1 – Você continuou como diretora?
R – Até o final, eu fiquei muitos anos na direção da Verbo, vice-direção da Verbo, depois fui para Jacurici e fui para Aldeia da Serra. Depois de Aldeia, eu voltei para São Paulo, aí fiquei só mais um ano.
P/1 – E Aldeia da Serra?
R – É, Aldeia acho que é um sonho, né, a Fernanda trabalhou lá, né, como dona da escola e diretora, sabe bem que Aldeia é um local bastante especial, você tem também uma clientela diferenciada que é o pessoal de Alphaville, hoje não sei se continua assim, mas, na época em que eu trabalhei lá assim, era uma clientela muito exigente que também vive em comunidade o tempo todo, né, então esse, os pais de uma escola, por exemplo, de lá se encontram tanto no supermercado quanto no cabeleireiro, quanto no clube. Então, na realidade, é uma comunidade que vive junta mesmo, então lidar com essa situação em escola, você precisa de uma certa habilidade, né? Porque escola é um local que você junta diferenças de cultura, as diferenças, de educação da própria família e é um local de conflito natural. Não que seja conflituoso, mas é natural, você junta uma série de pessoas. Então esses pais, nesse momento da escola era um, era delicado você lidar com eles, né? Porque qualquer coisa que acontecesse era de grande envergadura, quando na realidade era um acontecimento muitas vezes natural dentro de uma escola. Então era, diria para você, um local delicado de se trabalhar embora delicioso, né? Acho que foi um grupo especial que trabalhou lá também, professores que se deslocavam de São Paulo na época que ficavam na estrada, no comecinho era todo mundo de São Paulo, depois muitos professores, alguns mudaram para lá, começou-se a contratar gente da região, que também começou a ter lá um segmento de professores que moravam lá, né, depois foram abrindo outras escolas, isso também foi mudando.
P/1 – Bom Verbo Divino, Avenida Brasil, Jacurici, Aldeia da Serra e as feiras de ciências, Feitec, como é que eram essas atividades entre essas unidades?
R – Na realidade, sempre tudo isso era integrado, né? A gente tinha esses eventos acontecendo em cada data, em locais separados, datas diferentes, mas todos com o mesmo objetivo, com o mesmo tema se fosse um evento que tivesse, né? Um tema, esse tema era único e você, com isso, mantinha um pouco a unidade da escola em relação aos próprios eventos, né, tanto em feira de ciências quanto as feiras de livro, né, festas. Embora as festas juninas, as maiores foram realizadas num período que eram festas imensas de vinte mil pessoas. Nunca mais acho que ninguém faz isso, aqui a gente fez, né, então aí os alunos vinham para cá, eram momentos interessantes, né?
P/1 – E houve algum tipo de dificuldade com relação aos pais, algum problema que tenha ocorrido, porque na década de oitenta teve problema das mensalidades, né?
R – É, a gente viveu um período difícil porque você já abria o ano, já abria o ano negociando salário com professor, né, então quando você dizia boas vindas para o corpo docente, você já, o professor já esperava uma palavra sobre salário. Foi um momento difícil a relação com o sindicato, o que sempre a Beth tirou muito de letra, porque era uma pessoa muito comunicativa, então ela tinha um bom contato com o sindicato dos professores. Mas era um momento difícil, de um lado você tinha o professor e do outro lado você tinha o pai, né, então aquele momento que você, todo mês um carnê diferente para casa porque o preço da escola todo mês mudava, né? Então era, foi um período que quem trabalhou naquele período numa direção de escola aprendeu muito, mas teve que ser muito habilidoso, né, porque com certeza era uma coisa diária, então você não podia, você não tinha uma estabilidade de tranquilidade nessa questão, passou a ser de repente mais importante do que a própria pedagogia, né, que a própria aula, isso era assim uma preocupação constante dos administradores na época, era você conseguir manter tudo em ordem, né, adequar todas essas questões.
P/1 – Fala um pouco dos seus colegas aqui na Pueri Domus?
R – Olha, são pessoas que trabalharam comigo muitos anos também, né, a gente de vez em quando até tem um grupo de professores de Colegial que já faz um ano e pouco que a gente não se vê, mas quando a gente se reúne, as pessoas da velha guarda, e são amizades que duram até hoje, embora hoje nós não tenhamos nada em comum profissionalmente, cada um está num segmento, numa escola diferente, pessoas que não estão mais em São Paulo, mas são pessoas que se comunicam, né, se sabe notícia sempre, é muito forte, foi muito tempo, né, muito tempo.
P/1 – Você continua visitando as outras unidades?
R – Não...
P/1 – De Itaim?
R – Não, nem conheço a atual, o Itaim eu não conheço, por acaso eu conheço a escola porque, quando eu me casei, eu morei em frente a esse prédio durante quatro anos, exatamente em frente, então eu conheço de fora, mas nunca fui lá depois disso, tenho amigas que trabalham lá hoje que eu vejo com mais frequência, né, um pessoal que entrou depois na escola, mas que a gente fez uma boa amizade, viaja de vez em quando junto, mas nunca fui. Nunca fui por uma questão mesmo de tempo, né, de praticidade. Também estou sempre envolvida com escola, com período integral, então fica difícil. Mas, Aldeia, eu tenho muita saudade, porque é um lugar muito especial, foram anos muito bons, de muita coisa nova, muito desafio, foi muito bom. E eu acho que eu sinto isso, eu passei tanto tempo no Pueri porque ele me permitiu, ele me desafiou o tempo todo, né, eu tive a oportunidade de ter muitos desafios na minha vida profissional e hoje eu tenho um pouco de certeza disso, né? Hoje, né? Primeiro, não é o momento mais de ficar tentando em lugar nenhum, mas eu acho que não teria acontecido esse período tão longo se eu tivesse ficado fazendo só uma coisa, com certeza eu acho que hoje eu me conheço mais para dizer que talvez eu não tivesse ficado, mas eu fiz muitas coisas, tive muitas atividades, por isso acabei, sempre tive uma coisa nova, né?
P/1 – O perfil dos professores dentro dessas unidades eram perfis semelhantes ou tinha diferenças?
R – É, eu acredito que eram semelhantes sim. Não vejo essa grande diferença, eu que trabalhei nas três. Sempre foi um professor muito vocacionado pela escola, sabe? Teve uma época em que existia o professor mais questionador do que outras, até pela própria situação política salarial da época, mas eu diria para você que eu não faço uma grande distinção não. Eu trabalhei nas três. Eu acho que não tem assim uma característica tão diferente, não.
P/1 – Me fala um pouco da Festa do Olho?
R – Festa do Olho, é, foi instituída uma festa para que se homenageassem as pessoas e a gente dizia que era, essa é a nossa vida, porque na realidade, no começo, eram poucas pessoas, mas teve um momento que você tinha vinte e cinco, trinta pessoas homenageadas, né, e começou dessa maneira. A Beth falava da pessoa, “entrou na escola não sei quando”, contava fatos pitorescos daquela pessoa. Então acabou sendo a história da vida, porque ela relatava um pouquinho dessa vivência, dessa história, e era muito interessante, as pessoas se arrumavam muito para ir à festa, né? Quem era homenageado levava esposa, às vezes filhos, então era uma coisa assim que o pessoal: “Que roupa vai pôr no dia da festa?”. Era um evento muito interessante, evento dos funcionários, e era um momento que o pessoal, os funcionários mais simples, né, porteiros, faxineiros, todos participavam e eles esperavam isso com muita, muita, muita ansiedade. Era um dia muito importante, né? Que eu acredito que até continue sendo, porque eu sei que a Festa do Olho continua, né?
P/1 – Como é que foi a sua primeira experiência na Festa do Olho?
R – A primeira experiência na Festa do Olho foi muito engraçado, porque ninguém, foi uma surpresa, então ninguém sabia que existia essa festa e muito menos que existia essa, esse olho, essa joia que as pessoas iam ganhar. E foi num dia de fechamento de nota de colegiado, né, conselho de classe. E isso só tem sentido para quem trabalha no ramo, sabe o quanto significa esse bendito dia que você fecha nota, que você vê o aluno que está reprovado, que você tem questões para levar para o conselho de classe, então é um dia assim, né, que você sente que tiraram o seu sangue de canudinho. E tinha um convite que nós tínhamos que estar tal hora na capela aqui da Verbo. E que raio de coisa que vai ter à tarde num dia como esse? Todo mundo cansado e tal. E estavam todas as pessoas de uniforme sentadas no chão quando veio a homenagem, né, para as pessoas que faziam dez anos naquele ano. E foi bem interessante, porque aí ficou todo mundo: “Mas como?”. Estávamos achando ruim de estarem nos chamando, né, para esse horário e todo mundo querendo descansar porque no dia seguinte tinha o resultado, soltar resultado para pai, tal e foi o primeiro. Eu, se não me engano, eu me lembro que eu estava com bota de chuva também, tá, porque chovia e quando chovia aqui como era, né, não tinha toda essa estrutura que tem hoje, você andava na água literalmente, então a gente usava, eu usava umas galochas, eu trabalhava lá no Colegial lá no fundo, então eu me lembro que eu estava com bota de chuvas, sentada lá no chão esperando o que iria acontecer, e era uma festa, foi bem legal.
P/1 – E as outras Festas do Olho, você já ficou mais segura, já ficou mais experiente?
R – É, nessa eu fui homenageada, nas outras eu assistia, né, ajudava a montagem, participava da organização, mas eu era, não deixava de ser uma assistente. Teve um ano, que eu não vou me lembrar que ano foi, que a Beth teve um imprevisto e não veio, hã, eu acho que ela estava nos Estados Unidos e eu que tive que fazer, então aí foi uma investida grande, porque eu tinha que fazer a festa sozinha, fazer a história da vida de cada um sozinha, e eram muitas pessoas.
Ela sempre, a gente aprendia muito com ela, né, porque ela era uma pessoa muito arrojada, então ela fazia um, como é que se diz, um apanhado do ano, os grandes acontecimentos mundiais para depois iniciar a festa e eu fiz lá o apanhado de tudo o que tinha acontecido para poder e foi muito legal, acho que dei conta do recado bem, mas foi uma experiência assim, uma responsabilidade grande.
P/1 – E as viagens, você participava?
R – Ah, fantásticas, fantásticas até hoje. Hoje, lógico que com a idade que eu tenho, eu não faria mais, né, acabei de voltar de uma viagem ontem, mas com criança. Mas a viagem que nós fazíamos na época, primeiro gente, não existia as empresas especializadas em viagem educacional que tem hoje, então hoje você contrata uma empresa, ele traz um monitor, ele te traz o roteiro, ele te ajuda, ele te ajuda a tomar conta de aluno. Na época não existia isso, então a gente ia montar viagem, né, sozinha, ia, montava, fazia preço e depois acompanhava os alunos, né? E acho que a mais louca que a gente fez, quando eu digo louca, porque é louca mesmo, né, eram cento e trinta alunos pra Manaus, então foi, de colegial, né, aí fazíamos os voos da madrugada, porque era mais barato, então nós tínhamos montado a viagem e foi o maior sucesso. Depois fomos para Belém e a Beth muito brava, porque ela queria que a gente fosse para Santarém, para Belém e fossemos ver os índios no meio do mato, levar os alunos, aí quando nós chegamos, eu e uma outra professora, nós fomos montar a viagem, fomos a Manaus numa agência de viagem falar que a gente queria levar os alunos para verem índios, um olhou para o outro e falou: “Bom, a senhora não vai achar ninguém que faz isso, isso não existe, pensa o quê? A senhora está brincando, não é assim, vai ver índio, nós não temos estrutura para fazer isso e não é tão fácil assim”. E, na época, a gente ligou para ela dizendo: “Olha, não vai rolar a história dos índios”. Ela ficou brava: “Como não vai rolar?”. Ela tinha umas coisas assim: “Não vai rolar provavelmente porque ela não foi lá e não montou, né, vocês não montaram direito”. Mas o cara disse: “Não vamos fazer isso, descer o rio com aquela barca com rede, não, um monte de menino de São Paulo desce rio com barca de rede, vocês estão ficando loucas. Não nós não fazemos”. As companhias acharam que era uma alopração total, mas nós montamos dentro do possível, né, sem esses detalhes, uma viagem que foi fantástica, né, mas hoje eu diria, hoje até eu passei do tempo.
[interrupção]
P/1 – Vocês foram para Manaus, que outra viagem você me indicaria?
R – Ah, nós fizemos Foz do Iguaçu, fizemos Manaus, nossa gente, foram muitos lugares, primeira viagem que eu fui, maior, foi para o Rio, né, a escola não tinha ainda os alunos grandes, era até Fundamental Um, referente hoje até a Quarta Série, nós fomos para o Rio, ficamos hospedados no Mineirão e era mais ou menos fim de ano, tinha a chegada do Papai Noel e resolvemos que íamos levar as crianças para ver o Papai Noel chegar. Foi uma experiência inédita, porque foi uma loucura, né, aquele monte de criança sob a nossa responsabilidade, aquele helicóptero atrasado que chegou com pessoas avançando, bom, foi assim, eu diria, beirando o caos, e nós lá no meio. Então isso também foi uma coisa, foi a primeira viagem que eu fui acompanhando crianças assim, né, sem ser viagens perto, foi para o Rio. Mas nós fizemos muitos roteiros, né, fizemos Fortaleza também, um ano saiu Fortaleza, Salvador foi uma viagem muito bonita, a parte cultural muito boa...
P/1 – O objetivo das viagens?
R – Ela sempre tinha um lado cultural e um lado de diversão também e acho que alguma coisa que a gente aprendeu a fazer, as escolas aprenderam de uma maneira geral, não adianta você sair, mesmo com criança, sair e só levar a criança para fazer parte cultural, museu, sabe? Preencher apostila. Você tem que fazer a coisa dupla, você tem que ter o lado cultural, o lado de estudo, você tem que ter o lado de lazer, porque o grupo não aguenta, né? Então eu acho que a gente aprendeu a fazer isso um pouco na raça. Eu acho que, eu fiz uma viagem para Porto Seguro também, na época em que não tinha nem aeroporto em Porto Seguro, a gente ia de ônibus de Ilhéus para lá. Foram viagens muito grandes, sabe? Com muito aluno e com muito adulto, né, então você tinha que gerenciar a questão dos alunos e dos adultos também, né, porque com quinze, vinte professores você acabava tendo que gerenciar questões entre os adultos também, porque os adultos são muito difíceis, né? Gente, o jovem, cá entre nós, é facílimo, o duro é você lidar com adulto, as suas manias, com as suas idiossincrasias, com as exigências. Então você tinha que controlar o adulto para que ele achasse as coisas boas, porque aí o aluno acha. Agora, se o adulto começa a achar tudo ruim, o grupo dele vai tudo achar ruim. Então foram viagens difíceis, né, que, hoje, eu acho que seria, teria um outro conceito, mas na época eram feitas assim. A gente administrava na raça mesmo. Mas foi muito bom, aprendi muito. Agora, eu fui com crianças de terceira série para Porto Feliz ontem, né, e eu fico, estou chegando numa escola nova, entrei agora em agosto e eu imaginei a expectativa da escola com uma pessoa nova, uma coordenadora nova que vai viajar com os alunos, falei: “Gente, eles não têm noção de tudo que eu já vivi”, né? Nada vai ser novo. Então a gente aprendeu, aprendeu bastante.
P/2 – E essas viagens, qual era a ligação com o experimento?
R – Então, teve um período em que o experimento fazia toda a parte aérea, parte terrestre, nas reservas, toda essa parte, mas a parte – porque não existia isso que eu estou dizendo –, numa parte assim de monitoria, de gente ligada à Educação eram só nós, não tinha quem te ajudasse muito nisso, você contratava o serviço para fazer a parte de reserva. Aquilo que a gente fazia, inclusive, antes sozinho, porque eu fui para Manaus, junto com uma outra profissional montar a viagem para Manaus, fui lá bater no restaurante: “Quanto custa, quanto você vai fazer quando os alunos vierem, quanto custa o almoço?”. Vai lá, bate na companhia de ônibus: “Quanto que sai?”. Então, isso, o experimento fazia o período em que ele atuou como agente do Pueri nesse sentido, então facilitou já uma parte com certeza, né?
P/1 – E as atividades sociais, trabalho com comunidades carentes, como que era isso?
R – Olha, a gente tinha algumas iniciativas que aconteciam, mas não era uma coisa como as escolas têm hoje, a preocupação mais assim como um projeto, né, projeto de trabalho em asilo, projeto de trabalho em creches com alguns segmentos que cada escola tem um que faz um trabalho mais constante, a gente tinha eventos que se fazia, então você tinha grupo de teatro que se preparava e depois ia fazer uma apresentação em final de ano num asilo que era indicado, então você trabalhava mais com alguns eventos ligados a essa questão, mas não era uma coisa assim que hoje as escolas têm mais como uma função mesmo, mais social nesse sentido.
P/1 – Você citaria algum?
R – Eu acho que a gente teve, foi na época que já estava saindo daqui, um projeto, tinha um núcleo de projetos do Ensino Médio, o Colegial na época, que fez alguns trabalhos aqui na Ondina Lobo, que foi um projeto que eu sei que durou e que foi significativo para escola, mas era normalmente os mais velhos que faziam.
P/2 – Fala um pouquinho para gente desse núcleo de projetos?
R – Esse núcleo de projetos era interessante porque o menino tinha aula de manhã e à tarde ele podia se inscrever em alguns projetos, né, e nesses projetos a ideia era você trabalhar, não ter nada da metodologia do período da manhã, você trabalhar autonomia desse jovem, ele participar da construção do conhecimento dele mesmo, ele resolver os problemas que surgiam dentro do projeto que eles estavam se propondo a fazer. Eles direcionarem o projeto. Quer dizer, se criou um projeto que se tinha uma direção, de repente o grupo resolve que aquilo muda um pouco o foco. Então era era muito rico isso. Eu, especialmente, tive filho que participou do projeto de teatro, porque já era ligado um pouco em teatro, né? Então foi um período muito rico da escola, porque tinham várias iniciativas, né, você tinha uma parte de Astronomia, tinha uma parte de peça de trabalho com setores carentes, você tinha uma área ligada à Física, então você tinha muita Biologia. E os alunos tinham que se inscrever, eles tinham que optar, era optativo. Você punha um leque de projetos e eles tinham que se encaixar em alguma coisa e se trabalhava a responsabilidade de uma maneira diferente também, né? A ideia sempre foi essa e durou, os anos em que duraram foram muito interessantes. O aluno que teve a oportunidade de participar aproveitou, cresceu que era uma coisa arrojada também, né, porque hoje você fala muito em projeto, as escolas trabalham com projetos, têm hoje uma quantidade de literatura sobre o assunto que na época já tinha também, mas está mais inserido no cotidiano da aula, o professor trabalha com metodologia de projeto dentro de uma matéria e, naquele momento, era todo o período da tarde, era só projeto, foi um período legal, eu não me lembro quanto tempo durou, tá, talvez uns três anos, quatro, não sei.
P/1 – E o Projeto Valor?
R – Era o Projeto Valor que tinha envolvimento com Celso Antunes, que também trabalhava com os alunos que, por exemplo, essa questão que eu citei do teatro era dentro do Projeto Valor, que na realidade era um projeto que tinha o nome de Projeto Valor e essas atividades aconteciam direcionadas por esse caminho que o Celso fazia muito bem na época, trabalhava, que ele sempre gostou muito de batizar, né, os eventos. Então era o Projeto Valor, era o nome, mas era ligado a todo esse trabalho mesmo de creche, então era um grupo de alunos que você levava e fazia uns trabalhos educacionais, uns trabalhos culturais nesses segmentos.
P/2 – Você chegou a participar daquelas festas que o Roberto Carlos cantava?
R – Cheguei...
P/2 – Como é que era?
R – É, na realidade, a primeira foi quando a escola fez quinze anos, né, depois foi no Juventus, no Esporte Clube Juventus, que era o maior clube na época de São Paulo. E naquele ano se convidou os alunos, as meninas que faziam quinze anos naquele ano para dançar valsa no final do show, no meio do show – não me lembro mais – ou no início. Então para mim foi o ano mais significativo, porque também, as pessoas, o Roberto Carlos estava mais no auge ainda, né, porque a última festa que ele fez, embora esteja lotado, os jovens nem, Roberto Carlos, porque a escola convidou, eu já nem estava aqui fui convidada, fui no último show dele, mas sempre lotava, né, todo mundo fala, fala, mas sempre lotou, se vendia tudo que se propunha e foi bastante interessante. Não tenha dúvida, a escolha dele como artista que juntava aquelas gerações todas, né, mas era uma organização detalhada, você imagina você assumir a organização, não a organização do show porque ele vem pronto, mas a organização do bastidor todo, a venda de tudo isso, né, era um departamento, vamos dizer assim, né?
P/1 – E a integração entre os alunos, teve as olimpíadas?
R – Muito grande, o Pueri sempre se preocupou muito com isso e como tinha unidades diferentes, se juntava aqui na Verbo onde se fazia todas as olimpíadas, inclusive a de Araraquara, que é do interior, e era uma semana de muita festa. Os meninos conheciam, se conheciam todos entre si, né? E tem até uma história interessante. A minha filha, na época, estava no colegial e foi mal de Química, nunca foi muito boa aluna e eu dizia: “Minha filha, mas como, só você foi mal nessa prova, que absurdo, o resto da classe foi razoavelmente bem e tal”. Aí, eu continuei a pressionar, ela falou: “Ah, eu não quero que você diga nada, mas a maioria da classe colou, tá, e ninguém passou cola para mim porque eu acho que tem medo que eu conte para você”. Eu falei: “Como colou, colou da onde?”. Aí a história era a seguinte: tinha tido as olimpíadas, todo mundo se conhecia e, na época, o coordenador de Química resolveu aplicar a prova que era aplicada em São Paulo na escola de Araraquara para meio que dar uma testada nos alunos, só que a data era antes. Eles passaram tudo por telefone, então integração eu diria para você, que a integração era total, tá, até a prova vinha via interior, então eles se conheciam. Até hoje, os meus filhos que estudaram aqui o tempo todo, eles lembram de alunos de Araraquara, né, ou da Jacurici, o meu menor que está, que é advogado hoje, ele fala: “Mãe, você não sabe quem eu encontrei, um aluno de Aldeia da Serra”. “Ricardo, como você lembra?” “Ai, eu fazia olimpíada na época.” Então integrava mesmo, tá, integrava legal. Tinha as torcidas também, né, unidade, então a Aldeia se sentia preterida porque os daqui diziam que eles eram do interior e que eles eram caipiras, ihh, tinha tudo isso para você administrar, mas é bem coisa de aluno que acontecia e era muito legal, era muito grande, era um evento grande.
P/1 – Os professores torciam também?
R – Ah torciam, torciam com todas as letras...
P/1 – Para sua unidade?
R – Para sua unidade com certeza...
P/1 – Troféu, medalha?
R – Tinha, tinha tudo isso, tinha sempre um esportista que abria, né, o evento e trazia esportista de renome, tinha toda uma solenidade, era muito legal.
P/1 – Você lembra algum esportista que veio?
R – Eu lembro da Paula do basquete, ah, teve mais gente, antes da Paula teve mais gente, teve jogador de futebol, agora não me lembro.
P/1 – Durava uma semana?
R – A abertura era feita à noite com essa coisa mais de abertura de evento, hasteamento de bandeira e o atleta que vinha, corria com a tocha, tinha toda essa, e aí os jogos começavam no dia seguinte, era a semana toda, era uma semana todinha e juntava todos os esportes, né, natação, os esportes de campo, teve uma época que se alugava um campo ali, que era o antigo clube do (MÊS?), se não me engano ali na entrada da Cidade Jardim, acho que tem outro nome agora e saiu no jornal há pouco tempo, inclusive porque teve algum problema ali que desapropriaram que era da prefeitura e aí tinha um campo de futebol que eles alugavam, teve um ano...
P/1 – Parque do Povo?
R – Parque do Povo. Isso. Então eles alugaram esse espaço, né, a escola alugou e os jogos de campo eram lá, porque o Pueri não tinha, não tem futebol de campo aqui, então os jogos de campo eram lá, então tinha um grupo que ia para lá para tocar esse jogos lá, levavam os alunos daqui para lá, era bastante trabalho.
P/1 – E poderia dizer alguma coisa sobre as mudanças pedagógicas nesse período que você esteve na Pueri Domus?
R – A escola sempre foi bastante arrojada, né, então sempre tinha coisas novas na área de Educação que a escola, muitas vezes, adotava, mas eu diria assim, ela foi seguindo o ritmo da época também, então nós tínhamos o material apostilado, depois algum momento, alguns segmentos, passou-se a ter livro, foram sempre no se..., o material, toda a parte de projetos que a escola adotou, esse trabalho, na época, sempre seguiu essas novidades, porque na área de Educação não tem uma grande novidade, as coisas são muito antigas, né, quando elas surgem para que você comece a trabalhar, ela já tem muitos anos de teoria atrás de tudo isso. Então escola sempre procurou muito estar pautada por essas questões, sempre levou o professor a estudar muito, pelo menos na época em que eu..., eu sei que hoje também tem um núcleo de planejamento que levam os professores, estudam, né, fazem um trabalho pedagógico paralelo que mantém na competição aí, vamos dizer assim, um bom professor, né?
P/1 – Você ficou na Pueri Domus até que ano?
R – 1997.
P/1 – Aí depois?
R – Depois eu fui para o Augusto (Laranja?) e fiquei até agosto, agora desse ano fiquei nove anos lá.
P/1 – E qual foi o impacto lá depois de tanto tempo na Pueri Domus?
R – Olha gente, eu acho que eu me descobri meio corajosa, né, porque trinta anos num lugar é bastante complicado você se recolocar no mercado, é difícil você receber a nova casa com os seus parâmetros antigos, né? Então você tem que zerar e zerar não é fácil, você acaba comparando e, dentro da comparação, você precisa cuidar porque senão você fica infeliz nas coisas, que você acha que fez uma troca que não era boa. Mas eu aprendi que não é por aí, cada instituição tem o seu momento e no momento que isso clareou para mim, eu toquei muito bem, me dei muito bem, gostei muito de trabalhar no Augusto, nesses nove anos acho que fiz o meu trabalho, mas é uma coisa que você tem que tirar da veia, porque trinta anos você tem que se despir, né, vamos dizer assim, de uma série de questões e recomeçar. E tem mais tem que entrar na história do outro, não adianta você trazer a sua história, você tem que entrar na do outro, né, é a mesma coisa que está acontecendo comigo agora e me motivou um pouco essa mudança, achei que estava no momento de estar, estou com cinquenta e sete anos, não vou ficar mais trinta anos em lugar nenhum, e acho que precisava ter mais uma experiência, eu achei que estava no meu momento e estou começando do zero numa outra instituição e estou entrando dentro da história dela também. É lógico que eu tenho a minha, mas eu tenho que entrar na dela para que eu dê conta e acredito no meu trabalho, então são coisas que você aprende, né?
P/1 – Você saiu do Augusto (Laranja?) e foi para onde?
R – Eu estou no Magno agora.
P/1 – No Magno?
R – É.
P/1 – E quais são as inovações que você acha que você contribuiu para ser implantas no Augusto (Laranja?)?
R – Eu acho que eu nem digo para você que foram grandes inovações, não acho que seja por aí. Eu acho que mais como uma maneira de tocar o trabalho, de entender o aluno, de lidar com o professor, que eu acho que o professor em si é um profissional difícil de lidar, né? Ele é muito cioso do trabalho dele como intelectual. Lógico que é mais difícil de você trabalhar. Por outro lado, se você tiver uma boa relação, você consegue muita coisa assim como o adolescente também, então eu entendo assim que Augusto foi mais por aí, né, eu acho que a maneira de eu trabalhar, que eu vinha imbuída com um trabalho que eu já fazia antes, me ajudou muito nesse sentido de mudar um pouco essa maneira de entender esse jovem que naquele momento a instituição entendia de outra maneira. Não acho que a minha maneira era melhor ou pior, mas talvez um pouco mais ágil para aquele momento da escola, então eu acredito que isso eu tenha contribuído sim.
P/1 – E, hoje, qual a diferença entre a educação de hoje e a educação da sua infância, a escola em que você estudava?
R – Nossa Senhora!
P/1 – Qual a diferença?
R – Total, total, hoje você trabalha com, trabalho até com objetivos de mudar atitude, né, que a gente chama, ____ atitudinais são objetivos que você trabalha nas matérias e, na minha época, se isso existia, não era tão claro assim, né? Então você trabalhava com conteúdo enquanto conteúdo, pelo menos eu me lembro exatamente disso, eu sempre digo que eu aprendi, né, de uma maneira mais grosseira, eu aprendi a cuidar da natureza trabalhando e eu sou de origem, morei em fazenda. Então vivi na natureza. Mas eu não me lembro da escola em que eu estudei ter essa preocupação que se tem hoje com preservação e tal, então você achava tudo meio natural, né, e depois trabalhando é que você vai se tocando. Poxa, e, hoje, a escola tem essa preocupação desde pequeno, né, da preservação da natureza, do reciclar do lixo, então essa questão toda de atitude, de formação, eu acho que a escola antiga, a que eu fiz era muito mais o lado religioso, né? Então esse lado, na minha opinião, deixava muito a desejar com certeza. E lógico que era um outro momento no mundo, né? Eu na época aí, que a gente teve toda aquela questão política, né, de AI-5 tudo isso foi um período que eu estava no colégio interno e a gente não sabia de nada lá porque ninguém contava nada para aluno desse tipo de coisa que acontecia, então você ficava sabendo depois e sem entender o contexto todo dessa história, porque o jovem não participava hoje como se participa dos acontecimentos da sua nação, da sua cidade, não sabia do que rolava e depois ia aprender no livro o que estava escrito, né, mas assim, você discutir isso em sala, não tinha nada disso, então é outra época mesmo.
P/1 – Qual a relação hoje dos pais com a escola?
R – Olha, eu acho que a relação dos pais não, não vamos generalizar, porque eu acho que seria completamente imbecil, mas evidentemente tem muita gente que acredita no projeto pedagógico da escola, entende a escola enquanto parceira para criação dos filhos, porque a escola precisa da família e a família precisa da escola, quer dizer, é uma mão dupla o trabalho com jovem, né? Agora, eu me entristeço assim porque eu acho que tem muita família hoje que a escola é um prestador de serviço como outro qualquer, né? Pelo menos na minha geração a gente não acredita nisso, não acreditava nisso, nós nos achávamos uns prestadores de serviço diferenciados, né, onde você pressupunha parceria, se pressupõe resolver questões que não estão bem resolvidas ou questões, ou erros que você possa resolver ou não. Hoje você tem muito pai, hoje mesmo eu atendi uma mãe: “Ah, o meu filho está muito desestimulado, eu tenho até pensado que talvez seja melhor mudar de escola”. Então, hoje assim, você não passa, a família não quer muito que o aluno passe pela dificuldade, né, então “vamos para outra, vamos para outra”. Então você pega casos de alunos que passaram por quatro, cinco escolas e não são alunos com problemas de disciplina como tradicionalmente você sabe que um aluno com grande problema de disciplina, acaba passando por algumas escolas, não porque numa não gostou de uma coisa. Então isso eu acho que é muito ruim para formação da criança hoje, né, muito ruim. Eu acho que não é por aí, hoje você viaja com aluno, eles levam celular, então eu fico pensando, né, eu sou antiga de achar que não deve levar, ao mesmo tempo a gente tem que abrir isso para um momento diferente de vida. Um celular, hoje é um instrumento que, é um aparelho que cai entre nós, é banal, só que existe uma questão complicada. Então o aluno leva um celular numa viagem, ele fica ligando para o amigo que também levou o celular, não presta atenção no trabalho que você está fazendo com ele, ele liga para mãe de madrugada para se queixar que ele está com frio, né, então eu, essas questões eu tenho um pouco de dificuldade de entender o porquê tem necessidade de ser assim, eu entendo que nós precisamos estar com a cabeça aberta porque é um outro momento, mas essa questão de formação, né, do aluno ter que gerenciar suas questões é muito diferente.
P/1 – E a relação da escola com a comunidade, como você vê?
R – Eu acho que a escola brasileira ainda não aprendeu a ter essa relação com a comunidade como deve, né, eu entendo que a escola de uma maneira geral, ela precisa ter, ser uma relação mais aberta e ela reluta e é difícil até porque eu entendo que a formação do brasileiro também é difícil, é uma questão cultural. Você pega uma escola europeia, você tem, aqui mesmo a gente tem escolas estrangeiras que têm uma outra relação com os pais, é tudo na comunidade, né? Eles participam comunitariamente de uma série de questões, não é a relação nossa das escolas, desse segmento não tem, não tem essa relação dessa maneira, por dificuldades também da própria família, né, a família tem, é muito, muito, muito egocêntrica, né, olha um pouco com o umbigo, então as coisas ficam mais difíceis de você ter uma parceria assim, eu entendo assim.
P/1 – Como você avalia as recentes iniciativas governamentais na área da Educação?
R – Por exemplo, o Fundamental de nove anos, é isso que você está querendo saber, por exemplo?
P/1 – __
R – É uma mudança, né, que é uma mudança mais política do que para escola particular, não tem tanta alteração assim, você continua tendo o seu aluno sendo alfabetizado com seis anos, ele vai ter o mesmo tempo terminar o Fundamental com a mesma idade que ele termina hoje, só vai mudar um pouco de nome, porque ele vai passar a ser alfabetizado na primeira série, vamos dizer assim, acho que socialmente é um ganho porque você tem um ano mais de escolaridade para população, acho que politicamente de uma lado e socialmente de outro. No social, eu acho que a gente ganhou enquanto país, né, então é uma alteração bastante atual que deixou todo mundo meio perdido, mas que está aí valendo.
P/1 – E a formação de professores, como você vê isso hoje?
R – Eu vejo que todas as escolas ainda não perceberam que a importância toda está aí, porque isso gera custo da maneira que se entende hoje, né, e a escola só se mantém, na minha opinião, no mercado com um bom trabalho quando se preocupa com a capacitação do professor. Não adianta você..., é um profissional diferente, é um profissional que precisa muito disso, como todo profissional precisa, né? Mas, as escolas ainda, entendo eu que não dão a importância devida a esse fato. Então a escola que tem uma programação, um projeto de capacitação profissional, ela com certeza vai se sobressair se já não está se sobressaindo, porque você, imediatamente, você recebe isso em troca, né, você tem esse troco quando você tem um trabalho desse.
P/1 – E a questão das tecnologias na sala de aula, como você vê isso, como uma evolução?
R – Eu vejo que isso é um ganho imenso, não tenha dúvida, hoje você tem condição de fazer, voar com esse aluno dentro de uma sala de aula, né, então toda a escola que consegue ter, vamos dizer assim, um padrão maior em relação à tecnologia, é um ganho imenso, não vou nem falar de Internet, disso aí, lógico que é arroz com feijão, embora eu ache que exista uma questão da dificuldade da escola também trabalhar com essa tecnologia com o aluno, né, porque você, hoje, tem que montar com o aluno uma postura frente à Internet, porque aquilo que a gente queria que eles pesquisassem em livro, eles vão para Internet e eles, também, no recorta e cola, passa ser a grande pesquisa deles. Então aquela questão do pesquisar, formatar o seu texto próprio, escrever sobre aquilo que você leu, a dificuldade continua a mesma com tecnologia ou sem, mas com certeza é um passo imenso.
P/1 – E em que nível a escola deve formar?
R – Para vida, né, com certeza com a parte humana bem grande para melhorar um pouco esse país que a gente vive, porque se não for assim, se você for só trabalhar com os indivíduos que pensam no seu umbigo é uma lástima, então eu entendo que a formação completa do indivíduo passa pela questão humanitária, humana, social e não só a parte profissional. Com certeza está embutido aí. Mas, essa parte da vida em comunidade, eu entendo que a escola tem que trabalhar muito isso, né? O brasileiro, principalmente, não sabe viver em comunidade nenhuma, basta uma reunião de condomínio para você saber como é que é, então eu acho que, isso,
a Educação tem que abraçar como uma causa, né, ela tem que lutar muito, evidentemente com a questão pedagógica toda a parte, né, de conteúdos necessários nem se fala, que é a própria Educação, né, tem que fazer isso mesmo.
P/1 – E como é que você avalia esse tempo que você esteve na Pueri Domus na sua vida?
R – Olha, você falou tudo, é uma vida, né? Porque trinta anos, tem gente que não vive trinta anos, você concorda comigo? Então eu acho que eu tive duas vidas: a vida do Pueri Domus e a outra vida eu considero um pouco isso, eu acho que demorou um pouco para eu entender isso, né, mais foi assim que eu sobrevivi também, que eu acho que as pessoas que ficam muito tempo num lugar, existe uma dificuldade na sua saída que é muito séria, que é uma questão social também. Você perde o seu grupo de referência, que eu acredito que todo mundo sinta isso em qualquer segmento, e quando você fica trinta anos, você quebra para valer isso. Acabou, por mais que você continue se dando com algumas pessoas você telefona, você quebrou isso, isso é quebrado e não existe como não entender assim, por isso eu entendo que as pessoas têm que partir rapidamente para outra, porque não adianta ficar em casa se lamentando: “Olha como foi bom, o que eu aprendi”. Não, esquece isso e vai a luta, se não for assim, eu acho que pira quem fica muito tempo.
P/1 – Qual o aprendizado que você teve aqui na Pueri Domus?
R – Eu aprendi a trabalhar aqui eu era uma menina de dezenove anos, vinte anos e saí daqui uma profissional com trinta anos de experiência, então o que eu posso dizer para você é que eu aprendi a trabalhar aqui e que norteia o meu trabalho hoje e muito as coisas que eu aprendi aqui, adaptadas às realidades que eu estou inserida hoje, mas eu diria para você assim, no fundo, no fundo eu aplico aquilo que eu aprendo no Pueri, porque foi a escola da vida para mim, né?
P/1 – E o que você achou do Pueri comemorar os quarenta anos ___________o projeto memória?
R – Eu acho legal, acho muito legal, porque eu acho que a gente vive num país que não tem memória, eu acho, né, e as escolas, de uma maneira geral, eu agora que já estou passando pela terceira escola da minha vida, eu percebo da grande dificuldade, inclusive do próprio Pueri da gente ter a história aqui dentro, né, você guardar, ter uma galeria de uniformes, de você ter a história mesmo escrita, então eu achei muito interessante isso porque vem suprir um pouco uma dificuldade que a própria instituição deve ter, porque eu acredito que todas tenham um pouco, né, o Augusto (Laranja?) está fazendo quarenta anos também, então a luta para você achar todo esse material que tem coisas guardadas. Lógico que tem, aqui também tem, mas aquela questão assim, essa preocupação que deveria talvez nascer lá atrás, você já fazer um projeto, “olha nós vamos guardar”, né, o que vai ser guardado de memória, né? Eu acho que a Beth tinha um pouco dessa preocupação, ela tem uns lances assim interessantes, não sei se alguém já contou para vocês, né, na Jacurici, que agora não tem mais o prédio, quando foi lançado o, foi inaugurado o prédio da Jacurici, ela colocou uma pedra fundamental num local lá do prédio que era na entrada com uma caixa, aquelas coisas simbólicas que se faz com todos os jornais do dia, tinha toda uma simbologia histórica, né, então ela sempre teve essa preocupação, mas mesmo tendo, eu, que estava aqui dentro, percebia que também, a gente no dia a dia você, não arquivava tudo devidamente sabe? Essa preocupação de história mesmo e imagino que todas tenham um pouco, então a questão do projeto é muito interessante.
P/1 – O que você achou de ter participado dessa entrevista?
R – Olha legal, a Fernanda me ligou, disse a ela que eu teria muito gosto de ir sem problema nenhum, lógico, que como eu disse para você, fez parte da minha vida, né, então sem problema, um momento prazeroso.
P/1 – Tem alguma coisa que você queria abordar e não foi falado?
R – Não, acho que não foi bem o geralzão, né, eu acho que uma coisa que é interessante, eu, hoje na minha vida profissional, encontrar os meus ex-alunos, né, hoje eu estou numa outra instituição, aconteceu isso há vinte dias, estava atendendo uma mãe no fim da tarde e a minha sala atualmente dá de frente para entrada da escola, aí veio um rapaz, abriu a janela assim de correr e ficou me olhando, na hora eu pensei: “Meu Deus, que coisa”. O rapaz abre a janela, eu estou atendendo uma pessoa aqui dentro e fica naquilo, aí a mãe fez tchau para ele, vi que eles se conheciam, eu achei mais tranquilo, eu olhei para ele e falei: “Sérgio?”. Ele disse assim: “Estava só olhando pra ver se você ia lembrar de mim”. Então já estou encontrando lá uns seis alunos que são pais, então é muito legal, isso é muito gostoso.
P/1 – Você se sente recompensada?
R – Ah, isso é muito legal, então um liga para o outro, uma já me ligou. “Já soube que você tá aí”, né, então eu acho assim, são alunos que foram meus aqui no Colegial, né, então acho que isso é bem legal, lidar com gente é muito bom, né, para quem gosta, lógico. Eu acho que não conseguiria fazer outra coisa, eu preciso lidar com gente mesmo, sou feliz no que eu faço, graças a Deus.
P/1 – Em nome do Pueri Domus e do Museu da Pessoa agradecemos a sua entrevista.
R – Perfeito, obrigada vocês.Recolher