Um século de desenvolvimento industrial no Brasil - 100 anos da White Martins
Depoimento de Cristina Fernandes Garambone Pessoa
Entrevistada por Isla Nakano e Monique Lordelo
Rio de Janeiro, 28 de setembro de 2011
Realização Museu da Pessoa
Entrevista WM_HV005
Transcrito por Ana Carolina Ruiz
Revisado por Teresa de Carvalho Magalhães
P/1 – Cristina, primeiro gostaria de agradecer por você estar aqui contando a sua história e para a gente deixar registrado eu queria que você falasse o seu nome completo, o local e a sua data de nascimento.
R – O meu nome completo é Cristina Fernandes Garambone Pessoa, nome de casada. Nome de solteira Cristina da Silva Fernandes. Eu nasci no Rio de Janeiro no dia sete de novembro de 1969.
P/1 – E o nome dos seus pais?
R – Minha mãe é Maria Arnaldina da Silva Fernandes e o meu pai Raul Rodrigues Fernandes.
P/1 – E os seus avós?
R – Os meus avós paternos Armando Fernandes Marques e Ida Rodrigues de Figueiredo. E os meus avós maternos Amadeu da Costa Rodrigues e Albina da Silva Maia.
P/1 – Conta um pouquinho da sua família para a gente.
R – A minha família é uma família portuguesa, enfim, só falei nome de português aí. O meu pai veio para o Brasil com 13 anos e a minha mãe com cinco. Então eu acho que eu sou assim, como eu falei, uma família tipicamente portuguesa. Como veio uma imigração muito forte de portugueses no fim da década de 1940 e no início da década de 1950 e as minhas famílias, tanto de pai como de mãe, são dessa época.
P/1 – Como é que foi esse processo de imigração deles, eles vieram por algum motivo específico?
R – Buscando uma vida melhor. O meu pai veio, foi até assim digamos uma história meio triste. Como é que era tipicamente um português que emigrava para o Brasil? Vinha primeiro o homem, depois vinha a mulher com os filhos ou então vinham os filhos, cada um vinha de uma vez. O meu pai foi assim, veio primeiro o meu avô que ficou aqui anos no Brasil, veio a minha avó com a irmã mais velha dela. Nisso estava num ponto na Segunda Guerra que o Atlântico fechou. Eram oito filhos, mas vivos estavam seis naquela época, então veio a minha tia mais velha e o meu pai e cada um dos irmãos ficou cada um com uma família. Só depois do fim da guerra que vieram os outros irmãos. Na verdade, o meu tio mais novo nasceu no Brasil, tanto que quando o meu pai conheceu o meu tio mais novo ele já tinha três, quatro anos. Então você imagina, meu pai veio com 13 ele com oito anos, como ele era o homem mais velho, ele se sentia numa responsabilidade com os irmãos. Foi assim. Já a família da minha mãe foi a mesma coisa. Veio o meu avô materno, só que ele já veio no início, minha mãe é de 1950, ele veio no início da década de 1950, também assim, a vida estava miserável em Portugal. Então eles migraram, veio o meu avô, depois veio a minha avó com os dois irmãos e com os dois filhos, e assim, bem típico, meu tio mais novo nasceu no Brasil. Da parte do irmão mais novo da minha mãe.
P/1 – E você sabe por que eles escolheram, entre tantos destinos no Brasil, o Rio de Janeiro?
R – O Rio de Janeiro? Primeira coisa é que tem uma colônia portuguesa forte no Rio de Janeiro. Dizem que é até daí que vem o sotaque. Nosso sotaque do “s” é o sotaque de Portugal. Se você for, enfim, até fui a Portugal este ano, eles falam: “Ó que tu estais a fazer?”. Então esse shi, shi, shi, esse “s” chiado é de Portugal. Tanto que tem muito mais português no Rio do que em São Paulo. Já dizem que o sotaque de São Paulo é por conta da imigração italiana. Até onde eu entendo, eles já tinham conhecidos aqui. O meu avô materno tinha irmãos aqui, metade ficou em Portugal, metade veio para cá. E o meu avô paterno também já conhecia gente. Mas o avô, olha estou contando história, o pai da minha avó materna, já tinha morado uns anos no Brasil e depois foi morar na Argentina, depois que ele voltou para Portugal. Eu entendo isso, que tinha um fluxo migratório e eles tinham conhecidos no Rio de Janeiro, e também eles viram a paisagem e falaram: “Vamos ficar por aqui. Aqui é bonito”.
P/1 – Você já chegou a conversar com o seu pai quais foram as primeiras dificuldades dele, o que é que ele passou no começo?
R – Conversei. Porque é assim, eu adoro... Eu tenho até uma tia minha, a irmã do meu pai, que diz que desde criança eu adorava conversar, acho que era minha veia jornalística querer apurar a história, saber como é que era. E aí o que o meu pai fala é o seguinte: primeira coisa, ele veio com 13 anos. Ele disse que perdeu o sotaque em menos de seis meses. E por quê? Porque ele era muito ridicularizado por ser português. E é engraçado porque eu conheço portugueses velhinhos que vieram para o Brasil com 13 anos e eles têm sotaque. O meu pai não tem sotaque nenhum. Ele falou isso, que ele perdeu o sotaque porque ele queria se adaptar. Ele acha que o português era muito assim, ridicularizado. E outra coisa interessante do meu pai é que o meu pai, isso é história hein, meu pai é um português flamenguista. É algo inacreditável. E aí ele conta que ele é português flamenguista, até fala, ele trabalha desde os oito anos de idade, agora que ele se aposentou. Porque ele chegou ao Brasil, foi trabalhar com um alfaiate e ele era flamenguista. E o meu avô, pai dele, já era Vasco, imagina. Vocês são de São Paulo, mas os portugueses aqui são vascaínos. E só que aí esse patrão dele falou: “Raul, eu vou te levar para ver o que é que é um time de futebol”. Então ele levou para um jogo do Flamengo e o Flamengo ganhou. Aí o meu pai virou flamenguista. E depois ele fez o irmão dele também, meu pai e o meu tio são portugueses flamenguistas. E só para você ter uma noção, o meu pai já apareceu na TV como português flamenguista, de tão inacreditável que é. Então o que eu acho é o seguinte, não sei, meu pai diz porque realmente ele era muito assim, sei lá, o grupo onde que ele caiu, onde ele trabalhava, as pessoas, sabe, não gostavam de portugueses. Então eu acho que ele até perdeu o sotaque, virou flamengo. E até hoje, por exemplo, ele diz que na copa do mundo, confessa para mim que ele torce por Portugal, mas ele fala para todo mundo que torce pelo Brasil.
P/1 – Qual é a história dos seus pais, como é que eles se conheceram?
R – Com os meus pais foi o seguinte. Eles foram morar no subúrbio mesmo do Rio de Janeiro. O meu pai é 16 anos mais velho do que a minha mãe. O irmão do meu pai tinha assim um armazém, uma venda que a minha mãe trabalhava desde os 15 anos. O meu pai ficou de olho na minha mãe e aí começaram a namorar, tanto que a minha mãe casou com 19 anos, ela faz aniversário em janeiro, casou em janeiro e eu nasci em novembro. Então foi particularmente rápido. Mas foi isso. O que o português vinha fazer aqui no Brasil? Vinha trabalhar com comércio, padaria, armazém, açougue, então essa foi a história.
P/1 – E os dois trabalham no comércio?
R – Já trabalharam. O meu pai, todo tipo de comércio já teve. Tudo. Padaria, armazém, pequeno comércio bem de português, aviário. Como os meus tios também. (choro) A minha mãe também é assim, aí minha mãe depois virou dona de casa, mas sei lá, eu sou da família tipicamente portuguesa.
P/1 – E agora conta um pouquinho. Você tem irmãos?
R – Tenho uma irmã, Cláudia. Eu vou fazer 42 e ela tem 40.
P/1 – O que é que ela faz?
R – Ela fez Administração de Empresas, depois fez Direito, hoje ela trabalha na Justiça, ela é funcionária pública aqui do Rio, do tribunal do Rio.
P/1 – E a infância de vocês?
R – Não. Foi ótima. (choro). Quando a gente era muito pequena, eu não tenho tantas lembranças. Tenho algumas lembranças, como eu falei, minha família era mesmo do subúrbio. A gente morava todo mundo perto dos primos. Então foi uma infância, digamos assim, porque depois eu me mudei para a Ilha do Governador, que também é na Zona Norte, mas digamos, já é um bairro melhor da Zona Norte, que aí sim eu tenho bastantes lembranças, porque você já está maiorzinha. Qual é a minha recordação também, mesmo na Ilha, mas mais nova? Eu brincava com os meus primos, com as minhas primas. Eu era aquele tipo de menina, eu fico vendo assim, eu tenho duas filhas, que era completamente menina, mas eu adorava assim, por exemplo, os meus primos gostavam de pipa. Eu não sabia soltar pipa, mas: “Ah, deixa eu ver como é que é?”. Eu gostava de pular corda, gostava de amarelinha, pique. Lembro de brincar assim na rua. Ao mesmo tempo meus pais também eram bem protetores. Mas eu tinha essa liberdade de sei lá, ir na padaria, micra, sei lá, quatro anos, acho que eu jogava lá o dinheiro para comprar pão e comprava pão. Eu brinquei de muita coisa. Gostava de brincar na rua.
P/1 – Você falou que gostava de pular corda, brincar na rua, tinha alguma brincadeira que era a sua preferida da infância?
R – Eu gostava bastante de pular corda. A minha filha mais nova, que vai fazer cinco anos, engraçado que ela ainda vai fazer cinco e ela pula corda a beça. Estou num momento que eu to lá, que eu pulo corda com ela, que eu fico rodando corda e ela pula direitinho. Eu até falei: “Poxa, Rafa...”, é Rafaela, “Como a mamãe pulou corda”. Pulei muita corda. Sabe, e tem algumas músicas que são as mesmas.
P/1 – Tem alguma que você lembra?
R – Tem uma que é até famosa que até... Mas eu vou cantar, eu lembro de várias. Pelo menos de duas eu lembro. Aquela que até você repara que tem um cunho racista. “Qual é a cor do seu namorado? Preto, branco, loiro ou moreno? Preto...”. Aí você fica, né? A outra como é que é? “Um homem bateu em minha porta e eu abri. Senhoras e senhores...”. Aí tinha que fazer uma rodadinha, coloca a mão no chão. Eu fazia isso tudo. Elástico, eu gostava, sabe o que é elástico, tinha isso em São Paulo? Gostava de pique, só não gostava de pique-tá. Porque eu não era ágil o suficiente com os meninos. Mas gostava de pique, de pique-árvore.
P/1 – Como é que era o pique-árvore?
R – Tinha um monte de árvores, para não ser pego tinha que encostar em uma árvore. Tinha pique tudo. Pique-esconde, pique-tá, pique-alto. Já brincaram disso, pique-alto? Tem que subir em um lugar alto.
P/2 – Pique-tá?
R – Pique-tá é o seguinte, solta todo mundo, então está comigo, então passa você correndo, vai pra cá e fica que nem uma loucura total. Esse eu não gostava porque tinha uns meninos muito hábeis, tipo corriam mais do que eu, ficava aquela loucura. Mas eu brincava muito com esses meus primos, mas isso quando eu era pequena, porque quando eu fui para a Ilha que já era assim, eu nem sei precisar a época, mais grandinha, sei lá, talvez dez anos, não sei, ou menos até. Aí eu já não morava tão perto dos meus primos, mas também tinha amigos. Porque a Ilha também é outro lugar que tem muito português. Muito português. Sabe, tipo muito amigo filho de português, era assim uma colônia. Porque português adora se juntar.
P/1 – E essa convivência assim, essa colônia portuguesa, conta um pouquinho como eram as suas festas de família, a questão dos costumes, tradições.
R – Conto. A gente até hoje também se reúne. Aquela coisa de almoço de domingo. O que os meus pais não eram, mas é mais o pessoal da Tijuca que tem aqueles clubes. Como é que eu vou te falar? Fala o clube da cidade, entendeu, de Portugal. Isso eles não tinham, não. Mas, por exemplo, o que a gente fazia? Bacalhau sempre. Ir à missa. Ir à missa é um evento, entendeu? A primeira comunhão é uma coisa assim, um momento importantérrimo. Que mais? Coisas assim muito... Visitar a avó todo o domingo. Quer ver outra coisa que eu lembro de quando eu era micra? “Pede benção para o teu avô. Pede benção para o teu tio”. “Benção avô, benção tio, não sei que lá, sei que lá”.
P/1 – E o Natal, aniversário?
R – Todo mundo junto no Natal. Como eu falei, fazia bacalhau. Realmente é muito família. Tinha aquela coisa de estar sempre junto, muito católicos, muito católicos. Minha família é muito católica. Tipo, eu tenho três primos padres. Tenho primos padres, não sei quantas tias beatas, não sei o quê. Dois são padres em Portugal e um padre aqui no Brasil. É primo de segundo grau, mas muito junto esses primos. Muito catolicismo, muita igreja, muito Virgem Maria. Poxa, Fátima é um evento. Tanto que o aniversário da White Martins, dia 24 de maio, é dia de Nossa Senhora. Quando eu cheguei na White e gravar que o aniversário é dia 24 de maio foi muito fácil. Porque era isso essa coisa da Virgem, porque da Virgem de Fátima é 13 de outubro, mas a Nossa Senhora é 24 de maio. É isso.
P/1 – Teve algum aniversário seu que você lembra, que você tem alguma memória marcante?
R – Eu tenho memória assim, como eu falei, bem pequena. Eu me lembro que o meu de cinco anos no jardim de infância minha mãe fez um bolo que era um palhacinho. Isso eu lembro. Gostei muito. Foi na escola, não era como é aniversário hoje, que é praticamente um sei lá o quê, um evento, tipo todo mundo, mágico, isso, aquilo, não sei o quê. Mas que eu gostei bastante, os meus primos iam também. E outro também que quando eu fiz sete anos era Margarida, sabe a mulher do Pato Donald? Ela carregando uma margarida que eu achei uma graça aquele bolo, achei o máximo. Mas era assim, era o bolo, isso era o máximo, o bolo com o tema, um monte de bola, aí você comprava no máximo... Fazia aquelas balas de coco enroladas e botava, por exemplo, na garrafa aqui tinha uma coisa que você botava a roupinha com o personagem. Então era isso, mas eu gostava também dos aniversários.
P/1 – Você mencionou o jardim da infância, você lembra qual é que foi a sua primeira escola, o seu primeiro dia de aula?
R – Lembro. Era o Colégio Salesiano que é em Rocha Miranda. E eu lembro perfeitamente o meu primeiro dia de aula. Eu tinha quatro anos de idade. Os meus pais foram me levar e como eu falei, a minha mãe era muito protetora, então foi um monte de tio, tem 40 crianças, não era essa coisa pequenininha, não. Devia ter umas 40 crianças, aí quem que está lá o pai e a mãe, pede para entrar na sala de aula, eu lembro que estava com a minha irmã no colo, os meus pais, lembro de dar tchau. Porque minha mãe estava com medo de que eu chorasse, ela falava assim: “A Cristina sempre foi independente. Primeiro dia de aula, aquelas crianças choronas, a Cristina lá dando tchauzinho”. Tipo assim, sabe: “O que é que vocês estão aqui me vendo? Vai embora. Tchau”. Mas assim, feliz. Isso minha mãe fala. Sempre fui excelente aluna e gostava de ir na escola, fiquei independente, sempre fui uma pessoa independente.
P/1 – E durante essa sua trajetória escolar, depois primeira série, segunda série, quais é que eram as atividades? Você lembra se você teve educação religiosa, tinha coral, tinha festinha na escola?
R – Tinha festinha na escola. Coral eu nunca fiz, não. Como eu disse era de uma família bem religiosa, então esse Colégio Salesiano é um colégio religioso. Depois eu fui para o colégio na Ilha do Governador ainda no primário, que era colégio para filho, ou parentes de militares. Só que o meu tio que casou com a minha tia, com o irmão do meu pai, ele era general. Então eu entrei no colégio que era para, enfim, no Ministério da Aeronáutica. Um amigo dele assinou para mim, enfim. E só que era o seguinte, era um colégio rigoroso, mas tinha um capelão para a gente rezar. Olha, duas coisas que eu sei tudo, todas as rezas e todos os hinos porque esse colégio era da aeronáutica... Eu sei tudo. Da Independência, da República, sei cantar tudo. Porque que eu estou dizendo isso? Porque essa questão de dias religiosos sempre foi, você preservar dias religiosos sempre foi uma coisa forte.
P/1 – E teve alguma professora ou professor que te marcou?
R – Eu acho que eu gostei mais dos professores, por exemplo, do primário sinceramente, não. Engraçado, né? Mas não me marcou. Do segundo grau, se falar assim, ninguém assim que eu fico vendo que às vezes as pessoas têm um professor que inspirou. Tive vários professores muito bons de português. Também é assim, sempre a matéria que você gosta mais vai ser a matéria... Por exemplo, eu até contei sempre gostei de história, de geografia, de português, mas não acho que possa considerar assim que um professor, que eu tive assim uma superligação com o professor, não.
P/1 – E você lembra, você ficava só de manhã na escola, à tarde, a sua rotina. Tinha alguma outra atividade que você fazia?
R – Depois assim, eu mais velha, com 11, 12 anos, eu também adorava ir para a Cultura Inglesa. Era outro evento, porque aí eu já... Foi quando eu comecei a pedir para os meus pais para pegar ônibus sozinha, andar, como eu falei, eu sempre gostei dessa sensação de independência, de eu poder... Porque vigiada ali você... Então eu lembro que eu gostava dos meus amigos da Cultura, de ir sozinha para a Cultura. Isso sim. E eu fiz também mais ou menos com essa idade, também cheguei a jogar vôlei, nada de mais, dança também, sempre fiz uma ou outra atividade.
P/1 – Você que escolheu estudar inglês na Cultura, ou foram os seus pais?
R – A minha mãe achava que era o melhor inglês e me colocou lá. Mas foi bom, muito bom para mim. Ela me colocou com 11 anos, você vê, meus pais não têm muita instrução, mas foi uma coisa assim que minha mãe... Lembro-me eu com nove, dez anos indo lá da Cultura. Aí falaram na época que eu tinha que entrar com 11. Então foi a minha mãe que escolheu. Eu falo, até hoje eu tenho que falar bastante inglês no trabalho, quer dizer, foi uma coisa muito boa para mim.
P/1 – Cristina, você foi crescendo, a sua história foi se desenrolando e você começou a ter interesse por alguma, você que falou que gostava de história, geografia, alguma coisa te chamava mais a atenção, começou a pensar na sua carreira, no que você ia fazer da vida?
R – Se eu te falar que desde os 11, 12 anos eu queria ser jornalista.
P/1 – Sério mesmo? Mas por quê?
R – Engraçado. Eu lembro quando eu era pequenininha eu sempre achei banca de jornal uma coisa incrível. Aquelas revistas. Sei lá, revistinha em quadrinhos. Eu sempre gostei, sempre gostei de ler. Eu sempre fui curiosa. Sempre fui curiosa. Sabe essa coisa de você, que eu falei que eu ficava entrevistando minhas tias, escrever, então era uma coisa prazerosa. Eu comecei a ver, eu me lembro de que uma tia avó minha quando eu estava falando do que eu gostava de fazer, ela falou: “Por que você não pensa em Comunicação?”. Juro por Deus, foi uma coisa assim tão. Aí é que eu fui descobrir o que era Jornalismo, o que era Publicidade. Mas eu sempre quis ser jornalista. Fazer comunicação, porque eu acho que é uma, achava assim, puxa, você aprender uma coisa diferente cada dia, você entrevista uma pessoa, você está entrando em contato com o mundo, com a visão, com a perspectiva daquela pessoa. Então foi fácil escolher.
P/1 – Antes de a gente entrar na sua carreira, eu queria te perguntar. Durante a sua adolescência, sua juventude, o que é que você gostava de fazer? Onde você gostava de sair?
R – Eu adorava sair. Desde pequena. Pequena assim, tinha 14 anos, por exemplo, todo domingo tinha uma boatezinha lá na Ilha que os adolescentes iam. Eu ia. Sexta-feira a gente ia em um clube lá na Ilha também. Era assim, sexta o tal do Iate Clube, no domingo era o tal do Bicão e sábado tinha uma festinha em cada lugar. Eu sempre adorei isso, sair, dançar, namorar. Aí depois mais velha gostava de ir à boate. Eu gostava.
P/1 – E você tinha um grupo de amigos da escola, do bairro?
R – Tinha que eu saía, que eu ia. Era todo mundo da Ilha, como eu estava dizendo. Tem uma amiga minha, que é minha amiga até hoje, da Cultura, que estudava no mesmo ano que eu da escola, não na mesma sala, mas no ano, Alessandra. Meus amigos da escola também, minha irmã, amigos também do bairro. Ah tinha, você encontrava um monte de gente, era legal. E depois mais velha... Também o pessoal da Ilha, o pessoal da faculdade.
P/1 – E alguma história pitoresca, ou marcante dessas suas saídas?
R – Ai meu Deus, assim para contar. Eu me lembro disso, que aí quando eu já era maior, que foi quando eu comecei a querer: “Ah meu Deus, que saco morar na Ilha”. É que quando estava na faculdade tudo era na Zona Sul. Então eu me lembro, meu Deus do céu, como é que pode, eu com 18 anos pegava aquela avenida Brasil enorme para ir para a Zona Sul. Aí saía com os amigos, divertia, era tudo ótimo. Não tem nenhuma história assim especial muito... Realmente não estou lembrando. De repente estou até me censurando para não, me boicotando.
P/1 – E aí, Cristina, conta como foi esse processo de entrar na faculdade, o seu último ano da escola.
R – Eu sempre fui excelente aluna. E aí eu estudava em um colégio na Ilha do Governador que nem é tão bom assim, por exemplo, hoje eu estava vendo no ENEM é a 157ª, algo nessa linha, mas eu sempre fui excelente aluna. Eu não fiz cursinho, não fiz nada. Passei em Comunicação na UFRJ, que era assim, naquele ano foi até mais disputada do que Medicina na relação candidato-vaga. Então assim, foi um dos momentos mais emocionantes da minha vida. Não sei se vocês entendem, apesar de eu ser excelente aluna, era bem difícil você passar. Não fiz cursinho, não fiz nada. Foi realmente assim... Quer dizer, o que é o certo, né? Você adquirir o seu conhecimento na tua vida escolar. Então eu me lembro, olha que coisa interessante, eu fiz o vestibular, senti que eu fui bem, e eu fiz muito ponto em história, geografia, português, inglês. Não fui tão bem, fui na média ou acima da média de química, física, matemática fui bem também. Mas assim, história, geografia eu fiz muitos pontos. E eu fui buscar o resultado do meu vestibular na porta do jornal O Globo. Quando eu vi que eu passei, eu não posso descrever, porque eu me lembro das minhas amigas falando assim: “Cristina, você entende que metade da turma de humanas é só Comunicação?”. Eu falei: “Tudo bem, mas é o que eu quero. Deixa-me fazer, senão vou fazer outro ano de cursinho”. Quando eu vi, aí eu fui vendo lá as faculdades menos procuradas. Eu fiz o último ano unificado aqui no Rio, fui vendo as faculdades, Gama Filho nada, UERJ nada, UFE nada, a última era UFRJ, eu falei: “Agora não”. Quando eu vi meu número, eu chorei tanto, mas chorei muito. E aí depois... Está vendo isso. Eu sabia que ia chorar.
P/2 – Você estava sozinha?
R – Não. Com os meus amigos. E mesmo os que não tinham passado... Aí eu virei tipo um mito na escola. “Mas você passou para Comunicação na UFRJ?”. Falei: “Passei”. E aí... (choro) E aí quando eu me formei também fui fazer prova para O Globo. Aquela coisa. Um monte de gente candidata a jornalismo. Aí no ano que eu fiz para estágio, 500 pessoas, eram sete vagas e eu passei. Então, quando eu terminei a faculdade já estava empregada no O Globo. Eu passei, eu fui buscar o resultado na porta do Globo e eu me lembro de eu falar isso: “Que bom. Graças a Deus”. Porque eu terminei, quando eu me formei já estava com emprego no Globo. E aí desses sete ficaram três, eu fiquei, então assim, foi sei lá, achei bem interessante ter fechado um ciclo.
P/1 – E como foi assim entrar na faculdade, seu primeiro ano?
R – Foi bem interessante. Para mim foi um choque também ao mesmo tempo. Porque eu fazia um colégio para filhos de militar, na Ilha do Governador, pegava um ônibus, depois eventualmente até mais velha já ia algumas vezes de carro. Só que assim, você imagina, estudei praticamente a minha vida inteira, ou boa parte da minha vida escolar, num colégio militar. Quer dizer, não como escola militar, mas um colégio que era do Ministério da Aeronáutica. Tinha, como eu falei, um brigadeiro para tomar conta da escola. Aí lá vai a Cristina para a Comunicação da UFRJ. Achei aquilo uma loucura. As pessoas andavam no corredor, aquelas pessoas, até os alunos mesmos, sabe, porque eu sempre fui mais certinha. É um pessoal com uma cara de maluco, sabe? Gente fumando maconha no corredor. Falei: “Meu Deus do céu, onde é que eu vim parar?”. Ela está rindo porque ela sabe o que eu estou falando. Gente eu falei, o que é que é isso. Aí o professor, logo para me arrasar, imagina, eu me achava, estava me achando inteligente, ainda mais que eu tinha passado na Comunicação na UFRJ. Ninguém tinha feito curso, não estudava num bom colégio, eu passei, estava me achando o máximo. Gente na primeira prova, um professor chamado Saboga, sociologia, o cara deu nota baixa para todo mundo. Acho que eu tirei 2,5. Nossa Senhora, o que é isso? Tirei 2,5. Então foi assim, foi um choque por isso. Eu queria, sempre sonhei em morar na Zona Sul. Então estava estudando na Zona Sul, várias amigos dali. Mas eu confesso que foi, sabe, eu tive uma estranheza assim, poxa você vai, estuda tudo certinho, agora não sei como é que eu estudo, esse pessoal doido aqui, enfim. Mas me adaptei.
P/1 – Alguma matéria que te marcou?
R – Essa matéria foi bem emocionante. Eu me lembro que uma prova também no terceiro período de um outro professor louco, nem sei, é que era tanta matéria de sociologia que eu até me perco. Ele tinha sido torturado na ditadura e aí todo mundo dizia que ele tinha ficado um pouco desequilibrado. E realmente eu acho que ele tinha ficado desequilibrado. Sabe que o cara dando aula ficava assim: “Você, filhote da ditadura, você sua burguesa não sei o quê. Eu fui torturado...” O cara começava a chorar no meio da aula. Aí ele deu uma prova para a gente fazer em casa, que eu lembro que eu virei uma noite com umas amigas minhas. Tinha uma que era mais velha, porque nesta época se eu tava no terceiro período, eu tinha 18 anos, tinha uns seis anos a mais do que a gente, já era casada, estava fazendo um mês de casada lá fazendo a prova com a gente. Eu virei a noite. Hoje eu falo, gente, não é possível que a prova fosse aquilo tudo. Passei na prova. Aí eu me lembro que eu voltando da faculdade, nesse dia que eu virei a noite, entreguei a prova para o louco, eu me lembro de eu voltando no ônibus assim, sabe, batendo, dormindo, todo mundo rindo da minha cara. Falei: “Pode rir da minha cara que eu quero dormir aqui nesse ônibus”. Enfim, por exemplo, esse aqui eu acho que é uma característica minha, eu sempre fui muito assim certinha sabe. Então, por exemplo, sei lá, dane-se que eu tirasse nota vermelha. Mas não, eu queria fazer a coisa certa. Mas foi isso. O que eu achei da faculdade de Jornalismo é que é muita coisa assim de filosofia, sociologia. Não que eu não goste, mas eu queria uma coisa mais prática. Então logo fui fazer um monte de estágio. Fiz oito estágios na faculdade. Vários dois ao mesmo tempo. Então, foi lá que eu achei que eu peguei, que eu aprendi. Claro que te dá uma base teórica, mas você também, sabe, eu falei: “Mas eu vim aqui para estudar Jornalismo”. Então eu fui correr por outros lados.
P/1 – Antes de eu perguntar os seus estágios, deixa eu só te perguntar. Os seus pais como é que eles encararam a sua escolha profissional? Eles te apoiaram? Eles queriam que você seguisse para alguma área?
R – Não. Engraçado, os meus pais sempre me apoiaram para eu fazer comunicação. Por quê? Porque os meus pais achavam que eu... A minha irmã já foi um pouco mais complicado. Ah, porque eles achavam isso, que eu gostava de falar, que eu escrevia bem, que eu queria, sabe? Não teve uma coisa assim: “Ah por que vai fazer jornalismo?”. Porque às vezes tem um estranhamento. Não. Eles acharam assim, eu era tão segura, eu sempre fui nova, articulada. Então meus pais achavam isso: “Puxa a Cristina realmente nasceu para isso”. Digamos, achavam que tinha a ver então não teve muita questão, não. Meus pais também ficaram muito felizes quando eu passei para a faculdade. Então foi tudo bem. Não teve nenhum tipo assim de crítica, não.
P/1 – E o seu primeiro estágio, você lembra o primeiro dia?
R – Engraçado, eu não lembro o primeiro dia, mas óbvio eu lembro onde é que foi. Foi na Notícias da UFRJ. Eu estava no terceiro período e fui fazer um estágio na faculdade. Sabe quando é que foi? Foi no quarto período eu acho. Foi em 1989. Por que eu me lembro de 1989? Eu me lembro eu saindo do Fundão que aí, eu fazia na Praia Vermelha, mas o Notícias do UFRJ era lá no Fundão. E eu me lembro de a gente saindo assim do Fundão para ir para as passeatas, sei lá, no comício do Lula, contra o Collor. Eu me lembro perfeitamente hoje. Que eu votei no Lula, em 1989, fui aos três comícios. Eu fiz aquilo tudo. Meu primeiro voto foi naquele ano e era tudo muito assim dicotômico. Tipo assim, imagina, fazia Comunicação na UFRJ. Eu lembro que a turma eram 25, olha, era exatamente isso 22 votavam no PT, dois no Brizola e um no Roberto Freire que era o comunista. Lá na minha turma era assim cara o Collor, ou você é... A gente achava assim, quem votasse no Collor, ou era um pobre coitado, um ignorante, ou então você era muito mau, muito uma pessoa assim sem caráter. É uma coisa assim. Não tinha o meio termo. Ou você era um ser humano digno de pena, coitadinho, um ignorante que não teve acesso à educação para entender que ele era um safado, ou então você era um mau caráter. Uma loucura. Enfim, voltando para o Notícias da UFRJ. Agora que eu estou me lembrando, foi um amigo meu que está até no Globo até hoje, Luís Ernesto, que deu a dica para mim e para uma amiga minha, que hoje também trabalha lá no condomínio da White Martins, mas ela trabalha na TIM. A gente foi lá, fomos entrevistadas, eles gostaram do nosso texto e a gente ficava ali procurando notícias para escrever para o veículo. A gente procurava notícias nas faculdades, as pessoas passavam coisas para a gente. Então foi legal.
P/1 – Você comentou essa coisa do Lula, do Collor. Como é que foi essa formação política dentro da faculdade, você se envolveu?
R – Não. Eu nunca fui de grêmio, dessas coisas, não. Mas eu sempre fui, pelo menos sempre me achei, desde nova, eu sempre li muito, sempre gostei de jornal, de jornalismo, de jornal. Então eu sempre tive opiniões, firmes, fortes. E claro, eu não podia ser a favor da ditadura. Como eu falei eu peguei um final, já era uma coisa mais distante. Mas se lembre que eu estudei um colégio para filhos de militares, tinha brigadeiro. Então também assim... Mas eu acho até que conviver aquilo tudo, eu achava aquilo um absurdo, sabe, a gente não poder votar. Que aí, quer dizer, quando o Collor foi eleito que foi a primeira eleição presidencial eu já tinha 19 anos, tinha passado a minha vida. Não é que teve assim, não vou dizer que eu acho que tive a influência de alguém, mas acho assim, lendo os jornais, você discutindo, você abrindo, não tinha como ser a favor da ditadura e você minimamente também informado, quer dizer, na época tudo bem... Você está vendo, o Collor um cara sem passado político, um cara... Enfim, eu não gostava direito da plataforma política dele, de nada. O Lula é claro que eu tinha muita inocência em relação ao Lula e ao PT. Mas a gente achava que era um, enfim, eu e as pessoas como eu achávamos que era uma alternativa mais séria para o país. Uma alternativa, era uma visão até ingênua, mas tinha certeza. Eu lembro de que tinha um namorado também, mas este morava na Ilha, fazia Economia. Nossa, mas a gente ia aos comícios, ele ainda ficava com raiva quando via as pessoas votando no Collor. Discutia com o tio, era uma coisa assim muito engraçada.
P/1 – E os outros estágios, quais foram as outras experiências?
R – Eu fiz na ONU. Porque também sempre fiz várias línguas, estudei inglês desde novinha, depois fui para o francês, cheguei a estudar um pouquinho de alemão, só que não dava tudo, com a faculdade não conseguia conciliar tudo. Então espera aí, deixa-me contar.
P/1 – Da ONU você fez em qual?
R – Logo na sequência da UFRJ. Na ONU, no escritório da ONU, aqui no Rio de Janeiro. Tem um escritório da ONU no Rio de Janeiro. Fiz na Secretaria de Saúde do Rio de Janeiro. Eu trabalhei numa revista do Iate Clube da Ilha do Governador que eu lembro que era uma marajá na minha... Que como eu já tinha carteira assinada, sei lá ganhava, devia ser uma miséria, devia ser três salários mínimos, sei lá. Não sei. Cinco, não sei. Não me lembro mesmo. Mas lembro que não era um salário, que eu tipo comprei um monte de coisinhas para mim e tinha outro estágio. Aí no Globo. Eu fiz tanto estágio. Espera aí que eu vou me lembrar. Notícias do URFJ, ONU, o Globo. É que eu já não coloco nem mais no currículo você até esquece. Eu vou lembrar, mas eu fiz outros estágios com certeza. Eu lembro que eu tinha encerrado oito períodos, eu tive oito experiências profissionais como estágio.
P/1 – Você começou a pensar: “Não, eu quero seguir para essa área, eu quero focar nisso, naquilo”?
R – Foi assim, você na Comunicação, pelo menos naquela época, por exemplo, eu botei na primeira opção Jornalismo, na segunda Publicidade. Já passei para Jornalismo, eu já comecei no Jornalismo. Era o que eu queria mesmo. Era também a carreira mais procurada. E aí o seguinte, quer dizer, é diferente de hoje, era um momento de hiperinflação, o Brasil tipo não era o país do futuro. Então você não tinha tantas oportunidades de emprego. Então o que eu fiz foi o seguinte, o único lugar naquela época que fazia concurso, prova, era O Globo. Não tinha pro Dia, não tinha na TV Globo, a TV Globo naquela época não abriu estágio. Então foi assim, eu me candidatei para o... Lembro de que eu fui para Folha, para fazer também em São Paulo prova de estágio, só que aí, claro, preferi O Globo, não precisava mudar de cidade. E quando eu passei para O Globo, então poxa: “Que bom. Eu estou onde eu podia estar, onde eu queria estar”. Eu passei, depois fiz um estágio no Globo muito bom, foi com certeza o melhor estágio. Eu fui aproveitada no segundo caderno. São várias vitórias, é bom que você vai olhando para trás e vai reconhecendo. Geralmente você começava pelos jornais de bairro, pelos jornais de bairro e eu fui para o segundo caderno. Mas assim, eu fazia, naquela época tinha notícias de TV dentro do segundo caderno, então eu fazia notícias de TV. Eu me lembro de que uma vez lançou uma novela que tinha sido gravada no interior de Minas, eu fui e voltei. Porque eu fui ver como é que a pessoa tinha visto a novela na cidadezinha. Peguei seis horas de carro, com motorista, fui lá, vi o pessoal e voltei para o Rio. No dia seguinte tive que ficar o dia inteiro com a Xuxa, eu odiava aquilo. Tipo um dia com a Xuxa, vendo onde a Xuxa ia gravar, aquelas pessoas falando de Xuxa. Que ódio que eu tinha daquilo. Porque eu queria fazer esse tipo de jornalismo. Eu recebi um convite para ir para a TV Manchete fazer esportes. Aí eu decorei, comprei álbum de figurinhas, decorei a cara de todos os jogadores de futebol, juro por Deus. Fiquei um ano lá, também foi um grande aprendizado para mim, já como profissional. No ano seguinte que foi 1993, já conhecia muita gente no Globo, eu não queria ficar fazendo aquele negócio de novela, por isso que eu saí. Aí fui para a internacional que era o assunto que eu achava que era o máximo, estava muito feliz. Eu fiquei no Globo até 2000.
P/1 – Conta um pouquinho dessa última fase?
R – No Globo de 1993 a 1995 eu era redatora da internacional. Adorava escrever. Conflito de Oriente Médio, Europa, o Euro, não sei o quê, que estava na formação da União Europeia. Só que na internacional também não é também digamos lugar, por mais que seja bacana, não é o lugar mais nobre. Eu me lembro de quando chegaram para mim, chegou um diretor lá e falou: “Cristina, você tem que ir assim para a economia, para a política”. Aí eu fui para economia. Surgiu uma oportunidade, eu fui. Da economia fui repórter, fui redatora. Fui lançar quando teve o lançamento... Ah, e teve o seguinte no Globo, quando eu era redatora da economia, tinha 26 anos, eles fizeram um concurso, é que eu sou boa de concurso, para escolher quatro jornalistas... Não. Seis jornalistas. Não. Quatro, depois eles estenderam para mais quatro. Fizeram prova de informática, de português e de inglês, para ficar um dia, toda segunda-feira só estudando e depois a gente ia para a universidade de Columbia estudar new media. Aí quem passou? Eu passei, a Germana passou, da Approach, e mais dois, e depois estenderam para mais dois. O que O Globo fez? Ele queria que a gente entendesse que internet é essa. Então eu fui aproveitada, virei subeditora do Globo online, na época do lançamento do Globo online. Eu era a pessoa em cargo de chefia do Globo mais nova. Com 26 anos, foi uma experiência incrível. Aí dali, era assim, o embrião na internet, o lançamento do Globo online. 1996 isso. Ou em 1997? Agora eu estou na dúvida. Estou na dúvida se foi 1996 ou 1997. Eu acho que lançou em 1996 e eu fui para Columbia em 1997. E depois de um tempo O Globo ia lançar o jornal Extra, eu fui para a equipe que foi quatro meses antes de lançar o Extra. Fiquei lá também um ano e pouco. Eu voltei para a economia do Globo, como subeditora da economia do Globo. Foi onde eu fiquei até 2000. Subeditora responsável por negócios e infraestrutura. Do jornal eu fechava a primeira página, era responsável pela edição de domingo da economia. Umas coisas que eu acho que não estava nem preparada para fazer, mas só Deus sabe como é que eu fiz. Quantas gastrites eu tive para pegar uma coisa que era maior do que na época. Eu vou contar uma história que eu juro que é real. Eu tive a minha primeira filha, voltei de licença maternidade estava no Extra, aí me puxaram com 15 dias para O Globo. Puxaram para O Globo, que bom, subeditora, o Globo, melhor do que subeditora no Extra. Falaram: “Cristina, além de você pegar negócio de infraestrutura você vai fechar a economia de domingo”. Que é assim, a coisa mega importante. O jornal de domingo é o mais importante. Falei, cheguei para a minha chefe na época, falei: “Vem cá, não estou entendendo...”. Ótimo. Tudo bem e eu voltando de licença maternidade, não é nem um bom momento para você pegar um desafio grande. Eu falei: “Explica aqui uma coisa, por que é que você me escolheu para fechar o jornal de domingo sendo que tem outros subeditores aqui? Eu sou a mais nova de tempo e de experiência e acabei de chegar?” “Ah, Cristina, porque todo mundo já brigou com a editora executiva responsável e você como é nova não brigou com ela”. Então foi um momento tenso da minha vida, porque você está voltando de licença maternidade, você quer tranquilidade. Tudo bem, vão e te promovem. Bom. Dão um desafio desse, realmente foi uma loucura. E acabou que no meio daquele ano eu me separei do meu marido, que eu fiquei divorciada três anos e voltei a ser casada com ele. Tanto que uma filha, eu brinco, de cada casamento com o mesmo homem. Foi um ano tenso para mim 2000. Foi um ano bom assim, aquela coisa, né? As crises que te empurram. E foi o ano que eu decidi ir para a comunicação corporativa, que foi um movimento excelente que eu fiz na minha vida, mas foi também corajoso. Porque bem ou mal já tinha uma carreira consolidada no Globo. Só que eu não queria mais aquilo, eu cheguei a conclusão, não queria mais trabalhar fim de semana, não queria mais trabalhar até de madrugada. Eu me separei e comecei o outro emprego. Sabe assim, comecei o ano, era casada, estava no Globo, agora hoje eu sou assessora de imprensa.
P/1 – Só voltar um pouquinho, a sua viagem para Columbia, você lembra? Como foi a experiência?
R – Lembro. Foi em 1997. Agora estou na dúvida... É foi 1997. Foi ótimo, porque foi assim, como eu falei a gente ficou primeiro um ano, toda segunda-feira estudando, um convênio do Globo com a PUC. E tiveram momentos incríveis, exemplo: primeira aula, quem abriu a aula para esses jornalistas, e tudo ali era secreto, off the records, como se diz, nada que podia ser publicado. O Cesar Maia deu uma abertura, fez a aula inaugural para a gente ali, para aqueles oito, dizendo como é que ele manipulava a imprensa. Você acredita nisso? Eu tive essa aula. Ele explicando como é que ele fazia, você acredita? E o diretor do Globo presente e o Cesar Maia abrindo a boca, falando tudo e eu assim: “Gente, esse homem é louco”. Engraçado que hoje eu sou amigona de uma sobrinha dele. Você acredita? Do Cesar Maia. A gente ficou um ano, você imagina, é um privilégio você ficar toda segunda-feira estudando e só com gente assim bacana. Por exemplo, outro ponto interessante, naquele ano teve uma segunda-feira que, aquele caso da Escola de Base é famoso, não sei se vocês se lembram do que é que foi. Uma escola de São Paulo, agora não vou lembrar a cidade, acusaram os donos da escola de abusar sexualmente de crianças de três, quatro anos. E foi um escândalo no jornalismo porque eles foram apedrejados, acusados e depois viram que eles eram inocentes. Você acredita que o Globo, olha como o treinamento do Globo foi profundo, chamou os donos da Escola de Base para conversar com a gente. Não para fazer matéria, para conversar, para mostrar o seguinte: olha como é que vocês podem destruir a vida de uma pessoa. Eu juro por Deus. São lições acho que você aprende. Não que eu não fosse consequente, mas são experiências interessantes. Então, no fim daquele ano, que a gente teve esse tipo de aula, de discussão, a gente já sabia que podia haver uma possibilidade e foi fechada uma parceria com a universidade de Columbia. Nós fomos para Columbia, tipo foi um programa montado para o Globo, passamos lá uns dias, não chegou a ser um mês, não. Eu estou realmente na dúvida, quanto tempo. Foi um programa montado pelo jornal O Globo. A gente aprendia assim, primeiro a linguagem, mas entende, eram os primórdios. Como é que se montava uma homepage, os hiperlinks, o tipo da linguagem, mas assim, parece que foi a idade das pedras, entendeu? Foi uma experiência super rica e também todo mundo, jornalistas jovens, o mundo da internet começando, então foi muito legal. Você também em outro país. Foi bem interessante.
P/1 – Conta alguns aprendizados durante essa sua carreira, o que mais te marcou, o que você traz com você.
R – Na minha carreira de jornalismo?
P/1 – Só no Globo.
R – Eu acho o seguinte, que valores que eu trago do jornalismo? Valores, assim, cada um é a soma das experiências que teve, também com sua personalidade. Então eu acho assim, eu sou uma pessoa, como é que eu vou explicar? Não é que eu seja... Uma pessoa quente, no sentido assim, não de arrumar confusão, nem de não ser pensada, não é isso. Por exemplo, como o jornalismo tem um compromisso com a notícia, com informar as pessoas, por exemplo, se alguma coisa aconteceu oito horas da noite e jornal estava quase fechado, aí diziam assim: “Vamos virar...”. Vou dar um exemplo. Oito horas da noite, saiu um novo plano econômico: “Vamos virar o jornal inteiro”. Tipo mudava tudo. Tudo o que você fez o dia inteiro ia para o lixo, para quê? Para você informar da melhor maneira possível. Então a gente não era preguiçoso. O Globo gosta de edição quente. Então, por exemplo, eu acho que às vezes eu tenho isso. Eu consigo dar conta de um monte de coisas ao mesmo tempo, ou então: “Não, gente, isso aqui vai ser legal para a gente fazer”. Eu acho que também assim o compromisso com a ética. Lá em Columbia eu ouvi uma coisa que eu falei: “Esse cara falou perfeito”. Esqueci o nome do professor. Ele falou assim: “Ninguém faz jornalismo para ser milionário. Você faz jornalismo para você mudar o mundo”. E eu acho que é isso, entendeu? Eu acho que eu carrego um pouco isso. Eu acho que eu tenho um compromisso de que a gente está aqui para você evoluir, para fazer um mundo melhor entendeu, eu tenho essa ilusão. Eu gosto disso. Eu gosto de enxergar um propósito no que eu faço. E eu acho que eu tenho um propósito, inclusive a minha carreira na White Martins, eu enxergo, eu gosto da White porque eu vejo propósito no que eu faço. Então essa questão da ética, de você querer colaborar para um mundo melhor são coisas que eu carrego comigo. E de você se comunicar, de você transmitir uma informação, de você querer... Por isso eu falo coisas de história, dessas coisas porque acho que tem um aprendizado. Eu gosto de gente. Eu gosto de gente. Trocar experiências. Eu gosto disso.
P/1 – E depois do Globo?
R – É como tudo que eu gosto, de desafio grande. Quando eu tive a minha primeira filha eu fui fazer, logo na sequência eu falei: “Cristina, não quero mais trabalhar, sabe, tanto”. Gente vocês não têm noção do que é fechar um jornal todo dia assim. Economia, você entende? É muito puxado, como eu falei, fechar a primeira página. Quando você erra na sua vida profissional, às vezes só você sabe que você errou. Dependendo do tipo de erro. Ou então uma coisa que você: “Puxa, poderia ter feito melhor”. Sei lá, por exemplo, vocês: “Poderia ter feito aquela pergunta, não fiz”. Quando você erra no jornalismo, no papel impresso, você entende que eu já escrevi matéria que chegou hoje de manhã, eu falei: “Cristina, você errou”. Parece que o mundo... Você vai nos lugares, as pessoas estão lendo aquilo. Sabe assim, um ministro ligar, entendeu, por uma coisa que você... Pior se ele ligar por uma coisa que você acha que está certa tudo bem e, o cara reclamar, o ministro ligar e falar... Eu não tenho, graças a Deus, essa experiência. A não ser que eu apaguei da minha memória, é tão traumática. Mas isso acontece direto. “Olha, está errado”. Ligar o ministro. É um impacto muito grande você dar uma informação e cair a bolsa, ai meu Deus do céu. Lembro de uma vez, por exemplo, quando eu era da internacional, sempre fica alguém no segundo clichê. O que é o segundo clichê? É aquele jornal que vai para a última rodada. Por exemplo, se acontecer uma coisa quente nos Estados Unidos, você mudava, tirava uma matéria e colocava outra. E um dia que eu cismei, eu lembro de chorar de madrugada, esperar o jornal acordada, achando que eu tinha escrito viajando, sei lá alguma coisa assim, com “g” e não com “j”. Não sei se, eu acho que era isso. Viajando. Eu achava assim, mas o gerúndio, você errar. Eu achei que tinha trocado, cometido um erro ridículo. Eu lembro de que era uma matéria sobre os Estados Unidos, do Clinton. Eu não me lembro, eu lembro de eu chorar de madrugada. Falei: “Cristina, cala boca, pelo amor de Deus, dorme”. Esperar o jornal embaixo, acordada, esperar o jornal chegar. E estava escrito certo. Gente, olha, sério, eu fico pensando no que eu já me... Para o jornal virar embrulho de peixe, mas assim a seriedade do negócio. Eu lembro que eu era assim. Sempre fui muito correta, me cobrar muito. Qual foi a pergunta que você fez? Até esqueci.
P/1 – Depois do Globo. Deixa só eu te perguntar depois do Globo. Durante esse teu tempo na economia, acompanhando o que estava acontecendo, você pensava acompanhar um pouquinho a questão do gás, do universo do gás, alguma coisa assim?
R – Gente, eu me lembro da White... Eu nunca entrevistei a White Martins, mas eu me lembro da White Martins, porque a White Martins tinha ações na bolsa. É que eu não fazia mercado financeiro. Eu fazia negócios e infraestruturas. Claro que no dia a dia até eventualmente você acaba fechando a parte de finanças. No dia da confusão, plano econômico, dá aqui sobre bolsas que eu fecho. Fechar, colocar o título, riscar a página. A matéria é desse tamanho, você colocar desse, mexer. Fechar matéria é isso. Que um editor assistente, um subdiretor, ou editor, é a tarefa dessas ocupações no jornalismo. Eu me lembro da ação da White ser uma ação que não variava muito, era uma ação segura. Lembro-me disso. Mas eu não acompanhava, apesar até de eu fazer negócio, eu não me lembro de matéria sobre gás, não. Até porque aí o Globo, por exemplo, se é a Gazeta Mercantil, já acompanha mais o setor, entendeu? Mas a bolsa, a ação da White Martins, eu me lembro de ser uma ação segura, uma ação sabe até o Sérgio Breyer, meu antigo chefe, lembrou uma coisa que eu falei é mesmo. A pessoa dizer que a ação da White Martins era uma ação para cardíaco, porque ela sempre subia, mas pouco. Ou seja, o cara não ia ter grandes problemas do coração se comprasse a White Martins.
P/1 – Agora pode continuar, depois do Globo.
R – Como é que eu fui. Aí então nessa época eu não queria sabe mais passar por esse sofrimento de trabalhar fim de semana, feriado. Ficava sexta-feira até duas horas da manhã fechando o jornal de domingo. São essas assim: “I'm done. Acabei. Não estou mais a fim”. Fui fazer, logo depois que a minha filha nasceu, MBA de Marketing e adorei. E nessa época também eu lá na economia do Globo também cobria a Telecom Itália, que na época era sócia das organizações Globo, na Globo.com. E eles estavam metidos numa super confusão com o Opportunity, o Daniel Dantas, na Brasil Telecom. É uma história longuíssima, mas assim, foi super bem coberta pela imprensa. Foi descrita como a maior guerra empresarial desde que Cabral chegou ao Brasil. Foi no início da briga e aí os italianos não falavam nada e viram o seguinte: “O Daniel Dantas vai derrubar a gente”. O Daniel Dantas na época era tido assim com o garoto de ouro da economia. Depois é que se viu que ele era um, enfim, acabou preso. O mal que esse cara fez para o Brasil. Então eu fui trabalhar para a In Press Porter Novelli, que é uma assessoria de comunicação, na conta da Telecom Itália. Porque eu conhecia as pessoas da Telecom Itália. Quer dizer, conhecia por telefone, entrevistava. Eu falei: “Cristina...”. Separei, um mês e pouco depois veio o convite de eu ir trabalhar nessa conta como assessora de imprensa, eu falei: “Ah, Cristina, você tem que fazer um... É agora. É muito perfeito para você”. Por quê? Porque eles precisavam de alguém... Então eu não tinha experiência como assessora de imprensa, que é um trabalho diferente, mas era uma vaga sênior. Tinha cargo de chefia, fui para um salário que eu consegui... Na verdade eu troquei seis por meia dúzia, mas eu escolhi outra carreira. E aí é que eu fui fazer uma série de cursos para comunicação corporativa.
P/1 – E o que é que você teve que aprender nessa guinada nova?
R – Marketing, comunicação de marketing, muita, entendeu? E até o seguinte, o jornalista critica muito o marqueteiro. E foi interessante porque depois eu trabalhei para a Ambev como sendo In Press, em marketing. Então até, por exemplo, esse pessoal todo que está mandando hoje na InBev, o Carlos Brito que é o presidente mundial, cheguei a dar media training para ele. O diretor de marketing que hoje quem manda na Ásia, o Miguel Patrício, também trabalhei com ele. Então assim, eu pude acompanhar muito assim as estratégias de lançamento da Ambev. Aprendi marketing com eles. Tinha reuniões com Nizan Guanaes, como assessora de imprensa para trabalhar a imagem da empresa, com o Fábio Fernandes da F/Nazca. Depois eu fui trabalhar na Claro. Também tive mais contatos com publicitários brilhantes. Com Marcello Serpa da Almap. Tinha muita reunião. Então você, não só fui buscar a informação, mas esse tipo de reunião, de contato, de você trabalhar com a estratégia foi muito rica. E fui também fazendo... É claro, o meu leque foi ampliando das empresas que eu trabalhei. Na Claro passei por muita coisa também de relações institucionais. Treinamento de executivos para falar em audiências públicas, em CPIs, entendeu? Porque eu estava na Claro, pensando em São Paulo, lembra daquela do PCC, primeira vez fechou tudo em São Paulo? Não sei se vocês vão recordar, mas eu recordo bem. Primeiro dia, o que o mundo fala mal? Não falou mal de como é que as armas vão parar nos presídios, é porque os celulares os deixam falarem. Só que se fala muita besteira e as empresas também estavam apavoradas, né, a alta direção da empresa. Então, por exemplo, as pessoas achavam que se Claro, a Vivo chegasse lá e desligasse um interruptor, tiravam o sinal. Não é isso. Você tira de um raio. Nisso quando a justiça, tudo em uma semana, quando a justiça falou: “Tira” tirou-se o sinal. O que aconteceu? Pessoas morreram. Por quê? Porque hospital fica sem celular, a ambulância. Então assim, foi uma loucura só que também tinham ligações para as empresas ameaçando os presidentes: “Olha, a gente vai matar vocês”. Gente, foi o caos. Então logo naquela semana além de ter que lidar tudo isso com a imprensa, tinha que ser uma coisa corporativa, era a gente com a Tim, com a Vivo, o que vamos fazer? Aí chamaram logo a gente para dar explicações no congresso. Tive que treinar executivo para falar. Foi muito rica a experiência, mas também foi um período... Eu acho que eu gosto assim, sabe, também essas coisas assim mais, não turbulentas, mas desafios, sabe? Desafios grandes.
P/1 – Essa coisa de treinar os executivos, de trabalhar com a imagem das pessoas. Como que é? Quais são as dificuldades? O que é difícil pra você trabalhar com eles?
R – Olha, várias coisas, mas vai depender muito do executivo. Por exemplo, um alto executivo tende a ter uma decisão rápida, tende a achar que ele conhece de tudo, que ele às vezes não está acostumado a ser contrariado. Aí eu acho o seguinte, qual é o meu papel? Pode ser ruim no curto prazo, mas no médio e no longo prazo é bom. Para mim. Falar assim: “Fulano, deixa eu te explicar: se você falar assim, assim, assim, vai dar isso, isso, isso.” “Não, mas não sei o quê lá, não sei o quê lá.” “Então assim, você não quer preservar... Por causa disso você vai falar isso”. Ele pode ficar chateado, mas no médio e longo prazo ele vai ver que eu tava certa, entendeu? Então eu acho que a dificuldade primeiro é isso, você tem que trabalhar com o ego da pessoa, você um momento... Isso é outra coisa, você trabalhar com prevenção ou com comunicação de crise, você entende que a pessoa está altamente pressionada. Exemplo, falei dessa questão do PCC, vou falar outra crise que eu trabalhei forte. Lembra do Zeca Pagodinho foi para a Brahma? Só se falou naquilo. Foi “Páginas Amarelas”. Eu trabalhava para a Brahma. Eu era diretora da conta da Brahma. Você entende que as pessoas estavam altamente pressionadas? Eu tive várias reuniões, as pessoas querem explodir, gritam, as pessoas ficam nervosas. Porque, por exemplo, quando acontece uma crise dessas tipo do PCC, da Brahma com o Zeca Pagodinho, o que acontece? A mãe do cara está lendo sobre aquilo, o vizinho do cara está lendo sobre aquilo, você vai na rua as pessoas só falam daquilo e elas emitem opinião sobre a tua empresa ou até sobre você. Então é uma pressão incrível. Tipo, o filho do cara pergunta: “Papai, você é culpado?”. Eu não estou dizendo... Estou citando essas duas para exemplificar, que são crises fortes, estou pegando já esse negócio: “Papai, você é culpado?”, já enfim, não são dessas crises, mas são assuntos que todo mundo tem opinião, entendeu? É uma coisa que domina a opinião pública. Então é um momento de grande estresse e você, o que eu aprendia, até na White Martins já passei também por situações dessas, nós temos 2000 caminhões rodando. Enfim, outras situações também que não cabe falar aqui. Mas é o seguinte, numa situação de muito estresse, o pessoal de comunicação tem que ter a tranquilidade de falar o seguinte: “Eu tenho que falar o que é certo, o que é o meu papel”. E você tem que falar pro cara: “É isso, isso, isso, pra dar isso, isso, isso” e com tranquilidade. Você tem que saber aceitar pressão, entendeu? Outra coisa, grandes empresas, grandes conglomerados, você geralmente, o acionista, está lá fora, né? O cara lá fora acha que sabe como é que funciona no Brasil. Não é. É diferente. Então, são coisas que você tem que ter muita calma, muita segurança profissional e passar isso, e saber o seguinte: “Olha, segura o estômago aí que vai vir pressão”. Não é... Agora, é nessas horas que você mostra o seu valor, concorda? Mas tem que ter, tem que saber segurar a pressão.
P/1 – E como que foi essa coisa de um lado na Globo você estar produzindo, transmitindo a notícia, o conhecimento e do outro lado, na verdade, você está tendo que cuidar das consequências exatamente dessa produção.
R – É. Eu acho assim, eu sou uma profissional de comunicação corporativa, eu acho assim, eu gosto do que eu faço e eu acho que eu sou valorizada pelo que eu faço. Eu devo muito pela minha experiência no jornalismo. Então, por exemplo, quando acontece uma crise eu falo assim, o que eu penso? Eu penso como é que o cara vai editar, o que o cara vai dizer lá dentro, o que ele gosta de fazer, o que é valorizado. Então eu falava: “Se você falar isso, isso vai sair ou não vai”. Por exemplo, quando é uma crise você quer que não saia, né? E quando é, por exemplo, a Claro, eu te contei coisas ruins, mas a Claro já patrocinou os Rolling Stones, U2 e eu tinha que fazer a Claro aparecer, não o Rolling Stones, entendeu? Então achei uma estratégia legal. Tinha 200 ingressos dos Rolling Stones pra dar pra jornalistas, sei lá quantos do U2, não me lembro, foi um show seguido do outro. Você imagina, todo mundo era meu amigo: “Cris, você está linda.” era a coisa assim, básica que falavam pra mim. Então eu acho que é isso. O que eu tento fazer é: primeiro, construir uma relação de confiança. Então exemplo, mesmo quando é uma situação ruim pra empresa, e você tem que dar sempre o feedback pro jornalista: “Fulano, nós vamos te dar um posicionamento, ninguém vai conversar com você porque a empresa está lá reunida, não sei o quê. A gente vai ter um posicionamento...”. Aí ele faz perguntas que não têm a ver, você tenta ir construindo. Mas assim, eu não acho que são lados opostos, digamos, eu sou de um lado e fui pra outro. Não. Mas que são lados complementares e quando você trabalha com ética, por exemplo, eu não me envergonho de nada, nada, nada que eu fiz na minha carreira. Eu nunca menti pra jornalista nem nunca menti como jornalista. Eu nunca... Enfim, acho-me uma pessoa muito correta. Mas você, como eu digo, tem coisas que é de interesse da empresa falar ou não, e o jornalista sabe que existe isso. Agora, tem que ser uma relação... Bases são acertadas. Como também eu acho que a questão do tempo de resposta, sabe, que você dá para... Uma consideração que você sabe como é que funciona aquele trabalho, eu acho que também faz diferença.
P/1 – Pode continuar depois da Claro.
R – Então, depois da Claro eu vim para a White Martins.
P/1 – O que foi essa história de você vir para a White?
R – Foi assim, eu morei em São Paulo cinco anos. Morava na Vila Madalena pertinho de onde era o Museu da Pessoa. Na outra sede eu sempre via ali o Museu da Pessoa. Eu me lembro do Museu da Pessoa porque vocês fizeram um trabalho pra Ambev quando eu estava lá. Eu trabalhava na Claro essa época, tive minha segunda filha e aí o meu marido, que eu voltei um casamento três anos depois, em 2003, o meu marido foi transferido. Enfim, a carreira dele tava indo pra ele ficar em São Paulo, ele trabalha na TV Globo, e aí ele precisou... Enfim, a Globo é dividida a sede entre Rio e São Paulo. Na verdade nós fomos para lá por minha causa, para São Paulo, quando a gente retomou o casamento, deu pra ele encaixar para ir a São Paulo, eu tava com uma filha de seis meses a TV precisou que ele assumisse um programa no Rio de Janeiro de uma hora para a outra. Então ele voltou pro Rio, eu tinha uma filha de seis meses, ele trabalhou um monte de fim de semana, porque ele trabalha com esporte. Assumiu o Esporte Espetacular, ele é a pessoa responsável pelo Esporte Espetacular. Então ele trabalha assim, todos os domingos. A minha família é do Rio, não tinha sentido eu ficar em São Paulo com duas filhas. Aí eu liguei para três pessoas, isso foi maio, a gente combinou até julho: “Deixa-me ver o que eu vou fazer”. Tipo não tomar nenhuma decisão. Aí eu falei: “Agosto eu vou ligar para algumas pessoas dizendo que eu estou procurando emprego no Rio”. Um amigo meu que trabalhava na Vale... Eu liguei pra três pessoas, entre elas um amigo meu que trabalhava na Vale. Ele falou: “Cris, tem uma vaga que é a tua cara na White Martins”. Eu lembro que ele perguntou assim: “Você fala espanhol?”. Eu falei: “Falo. Esqueceu que eu trabalho para mexicanos?”, que a Claro é de mexicanos. Então eu escuto espanhol o dia inteiro, falo. Claro, é um portunhol ali, mas me defendo bem. Aí até onde eu sei já tinham até escolhido outra pessoa pra ser o Gerente de Comunicação da White Martins, quando chegou o meu currículo eles achavam que cabia bem. Eu sei que em uma semana eu fui entrevistada pelo meu chefe anterior, por RH, pelo VP de Comunicação que é americano que tava aqui no Brasil. Depois eu fui pros diretores executivos, pro presidente... Eu sei que em uma semana o processo concluiu. Eu comecei em outubro aqui na White Martins no Rio.
P/1 – E como que foi esse começo? Porque você chegou também numa época que algumas pessoas tinham saído. Como foi?
R – É. Foi um pouco tumultuado, por quê? Tava sem o gerente, mas a equipe estava traumatizada porque tinha falecido uma pessoa. Então o gerente saiu, digamos, a pessoa abaixo dele ou uma das pessoas ali morreu de acidente de carro, uma coisa super trágica, né? E tinha saído outra pessoa. Então tava tudo meio desarticulado. Não tinha memória, exemplo: “Gente, como é que vocês fizeram isso ano passado?”. Era muito segmentado, as pessoas, não sei se era o gerente com a menina que faleceu. Várias coisas eu ouvia isso. Parece também que salvavam muita coisa num desktop deles, não tinha na rede. Então foi um período tumultuado, mas logo de cara eu me identifiquei com a White. Foi a primeira vez que eu trabalhei sendo a frente de comunicação de marketing. Então para mim também foi um ganho profissional, mas foi a primeira vez também trabalhando em indústria, o que é diferente também. Como eu falei, quando você trabalha... Eu trabalhei no Globo que é uma coisa alta exposição, a Ambev também, a Claro também. Tipo, sei lá, todo mundo tá dependendo do celular, de propaganda, é um produto que está muito na vida das pessoas. Então a White já é indústria, já é uma coisa mais low profile, então foi uma mudança também. Mas foi interessante, adaptei-me super bem.
P/1 – Como que foi pra você entender a White Martins e todo esse processo do gás, todas as utilizações? Como que foi isso pra você?
R – É uma área, um setor complexo. Por exemplo, uma coisa que eu descobri, claro, descobri pesquisando quando eu entrei no processo seletivo, é que o gás está presente em tudo. Praticamente todos os processos industriais você precisa de gás. Outra coisa que eu aprendi logo também, lidando com jornalista, por exemplo, como nós somos infraestrutura para infraestrutura, qualquer aquecimento ou desaquecimento da economia começa pela gente, entendeu? Por quê? Porque, por exemplo, se a Vale do Rio Doce for diminuir a produção ela fala: “White Martins, eu vou parar de comprar”. Até a Vale parar demora um pouco, entendeu? Então assim, nós somos logo uma das que vai ser, enfim, dos primeiro setores, né, de termômetro. Como também quando começa o aquecimento, estamos recebendo mais demandas. Então às vezes os jornalistas também querem saber um pouco sobre isso. O que eu achei também bacana na White Martins, eu tava falando nisso, nas questões de você ver um propósito, então eu acho que a White é um empresa séria, sabe? Eu me lembro que amigos meus falaram: “Ah, Cristina, você sempre trabalhou com coisas glamourosas”. Tipo, São Paulo Fashion Week, a Motorola era patrocinadora, dava ingresso, eu tava na primeira fila. Sabe aquela coisa assim? Show dos Rolling Stones. “Você não vai gostar. É indústria, não sei o quê”. Eu já via por esse lado que eu ia ter comunicação de marketing, logo na sequência eu tive responsabilidade social, sustentabilidade, depois diversidade. Então são coisas que eu vejo propósito no que eu faço, né? Sabe, trabalhar com responsabilidade social corporativa, eu estou ajudando a imagem da empresa, eu estou protegendo a imagem da empresa, que você mostra que é uma empresa séria, 200 mil pessoas são afetadas pelos nossos programas sociais aqui na América do Sul. Mas ao mesmo tempo assim, poxa, eu estou fazendo bem, né? Então isso tudo assim, o fato de viver um propósito é muito bom. Ontem eu fui falar num evento lá na Firjan sobre diversidade. Então assim, eu tenho que falar que eu fico feliz com aquela experiência da White Martins, o que a gente fez, como é que a gente está fazendo, sabe? Entrar em inclusão de deficiente, para mulheres em cargo de liderança. Então eu acho que isso é um propósito. Eu acho que eu fico muito mais feliz com isso do que você eventualmente ir pra um show, sei lá, ter... Eu vejo isso. Eu vejo propósito no que eu faço.
P/1 – Como que foi o seu primeiro dia de trabalho?
R – Eu cheguei cedo, aí tive uma reunião com a equipe e assim já sabia que elas estavam nervosas porque estavam há muito tempo sozinhas, né? Mas logo eu me enturmei, falei para as pessoas que eu queria aprender. Foi um período também tumultuado porque foi outubro, aí teve que fazer o contrário, meu marido teve que falar com a Globo porque ele teve que ficar lá até o fim do ano em São Paulo, porque a minha filha mais velha em outubro você não tira ninguém da escola. E foi uma confusão. Fiquei dois meses na ponte aérea com a minha pequenininha aqui, a outra lá, o meu marido lá. Foi uma confusão. Aproveitei pra trabalhar muito. Às vezes a minha mãe ficava com a minha filha pequena, vendo babá, apartamento, foi uma confusão. Mas foi muito bom.
P/1 – E quais foram os maiores desafios assim que você entrou que você percebeu?
R – Formar a equipe. Entendeu? Por exemplo, implantar um novo método de trabalho, conquistar... E é engraçado o seguinte, eu sempre quando chego em uma nova função, eu primeiro fico assim, claro já ia mudando o processo, mas eu sei que eu tenho três meses pra entender aquilo ali, concorda? Antes você não consegue entender. E a primeira coisa que eu fiz foi o seguinte, falei: “Eu não vou mudar nada. Eu vou falar pra eles que eu não vou mudar, que eu vou manter as pessoas”. Por quê? Porque as pessoas estavam muito traumatizadas, entendeu? Tinha morrido gente, saído gente, sabe? Eu logo vi que as pessoas eram ótimas profissionais, sérias. Eu falei: “Deixa aqui dar um pouco de carinho para as pessoas e montar, mostrar que eu sou tranquila, sou simples, mas sou exigente”. Concordo. Sou exigente, quero implantar coisas novas, não tenho medo de mudanças, gosto de mudanças. Até para ser bem sincera eu gosto de mudança. Eu acho que você tem que evoluir. O meu maior desafio foi isso, foi passar para a equipe confiança, foi mostrar que ia ser uma coisa boa. E como o presidente tinha falado para mim que a coisa mais importante era a comunicação interna, o meu primeiro foco forte foi comunicação interna, mudar revista, estruturar o processo de comunicação interna. Depois menos de um ano, quer dizer, as coisas foram dando certo, aí eu peguei a área de Sustentabilidade que era nova aqui no Brasil. Então foi muito legal também. A Praxair montou uma área de Sustentabilidade, contratou uma diretora global e eu pude implantar aqui no Brasil. Então foi uma coisa também bem bacana.
P/1 – E como foi esse processo de implantar a área?
R – Pois é. Primeiro entender mesmo o que era sustentabilidade. O meu primeiro diagnóstico é que a White Martins já tinha ações muito consistentes na área, por exemplo, mas que não estavam reunidas. O que eu vou falar? Por exemplo, desde os projetos sociais, tudo bem, que sustentabilidade é a dimensão econômica, a social e ambiental. Mas, por exemplo, tínhamos projetos ou tínhamos tecnologias que melhoravam o desempenho ambiental dos nossos clientes. Então na verdade era também reunir tudo isso e você mostrar tanto pro público interno como pros clientes, ajudar o pessoal dos Estados Unidos com o Índice Dow Jones, que a gente se candidata todos os anos e estamos atuando desde 2003. O Brasil tem um papel aí importante para mostrar no Índice Dow Jones como que a Praxair trabalha globalmente sobre o tema. Mostrar pros nossos clientes o que a gente podia ajudá-los e como que nós somos sérios. Então foi muito bom. E é o tipo de coisa que também é motivacional para os funcionários, entendeu? O que eu gosto da White é isso, sabe, o que eu tenho que trabalhar de reputação, da marca. A empresa é uma empresa séria, que faz coisas bacanas, interessantes, é socialmente responsável. Você contar isso pro funcionário é motivador para ele, é energizante, mostrar isso pro cliente, sabe? Eu participo às vezes de algumas reuniões, ou alguém da minha equipe, geralmente a Carolina também, com cliente ou com uma pessoa de negócio para mostrar, enfim, como a White Martins é séria seja em responsabilidade social, seja em sustentabilidade. É bom participar disso, ver a cara do cliente encantado.
P/1 – Cristina, vocês trabalham com projetos, tem algum projeto que foi desenvolvido agora que você quer contar?
R – Estou com o projeto de 100 anos da White Martins, né? Eu já até brinquei que eu vou fazer aniversário em novembro e que vão colocar a velinha para mim “100”, porque eu só penso nesse projeto. Esse projeto é realmente um projeto enorme, prevê uma série de ações, entre elas os livros, vídeo, comemoração interna e para o cliente. Eu acho assim, eu acredito em sincronicidade. Eu estou aqui, eu acho um momento mágico, 100 anos da empresa, quer dizer, então a gente deve contar essa história, participar dessa comemoração. Todo mundo que veio antes da gente, né? Eu acho também quem vai vir depois conhecer essa história. Eu acho que é uma coisa que vai ter um valor incrível para os funcionários também, para os clientes. Então esse é o meu projeto grande agora, garanto que esses 100 anos de White Martins.
P/1 – E outra coisa que eu queria te perguntar, a diversidade. Como que foi essa conquista de poder trabalhar...
R – Na verdade foi assim, uma coisa levou a outra. Então eu cheguei como Gerente de Comunicação. Depois ganhei Responsabilidade Social. Depois ganhei Sustentabilidade. Como Sustentabilidade logo a gente, como eu disse, não foi um trabalho, digamos assim, enorme. Foi mesmo organizar ações que a empresa já vinha fazendo e você, sabe, embrulhar, fomentar certas ações. E poxa, até para a área de negócios, se você fizer dessa maneira a gente consegue... O que você tem aí para me mostrar? Para a gente contar essa história para um cliente ou falar na imprensa, mostrar como a gente é sustentável. E aí como logo a empresa entrou bem em sustentabilidade, aí a gente tinha que trabalhar diversidade. O que é diversidade? Nos Estados Unidos a Praxair colocou como meta de diversidade mulheres e US minority, minorias americanas. Aqui no Brasil são mulheres e também pessoas com deficiência, que é lei aqui no Brasil. Só que a gente, por exemplo, a White Martins é benchmarking pelo Instituto Ethos de inclusão com pessoas de deficiência, seja intelectual ou física. Então é um trabalho que a White Martins faz desde a década de 1970. Diversidade não é um assunto novo. Mas qual o nosso desafio? Nós fazemos parte de uma indústria que, muitos engenheiros, muitos operários, então é uma população predominantemente masculina. Só que é o seguinte, o mundo muda que é uma loucura. O mundo está mais globalizado. A guerra pelo talento está aí. Então assim, você olhar a população feminina, 49,5% das mulheres no mercado de trabalho têm pelo menos 11 anos de estudo. Entre os homens, I'm sorry, desculpa, 78,5%. Então você não pode desprezar esse público porque é feminino. E o que a gente aprendeu assim como diversidade, foram vários treinamentos? Que muitas vezes você tem padrões e você tem, qualquer pessoa, pontos cegos, pré-conceitos, que você faz sobre determinada situação. Vou dar um exemplo, vocês aí que são paulistas. Várias vezes lá em São Paulo a pessoa falava assim: “Ah, Cris, agora você tá trabalhando aqui em São Paulo, né?” “No Rio eu trabalhava mais, heim?”. Segundo o IBGE o carioca trabalha mais que o paulista. Você tá entendendo? Não é um pré-conceito achar assim, agora aqui em São Paulo você está trabalhando, né? Então é assim, a pessoa você acha que ela quer me magoar ou ela acha que... Não. Ela está com uma boa vontade. Então o trabalho nesses últimos dois anos, quase dois anos, foi nesse sentido de você capacitar as pessoas, treinar, de você mostrar os meios de comunicação internos. É isso gente. O que é a diversidade para a White Martins? É o talento, é o mérito independentemente de qualquer característica, seja raça, religião, gênero, condição física, condição social. Então assim, é o mérito, deixar que cada um contribua com o que tem de melhor. Alguns impactos que nós já tivemos, nós assim... Quer dizer, quando eu entrei aqui eram pouquíssimas mulheres na alta gerência, nenhuma diretora. Agora já temos três diretoras, já temos... Eu tava fazendo um levantamento com a Carolina, Carolina Werneck que trabalha comigo, acho que de 2008 para cá, tudo bem que a meta era pequena, mas quintuplicou o número de mulheres na alta gerência e na direção se você somar. Então assim gente, são três anos, quer dizer, é uma coisa que é rápida. E, por exemplo, pessoas com deficiência. A gente tem esse histórico de ser benchmarking pelo Instituto Ethos e, por exemplo, a gente vê em várias áreas, temos três empresas aqui no Brasil, duas nós cumprimos a cota, outra parcialmente. Mas, por exemplo, áreas como jurídico, como finanças, como RH a gente já tem pelo menos cerca de 5% de pessoas com deficiência trabalhando. Temos pessoas também negras na organização. Então você mostrar isso, trabalhar isso, mandar mensagens, estruturar isso é muito bom. Você vê que é isso, é o talento. E a White Martins ser reconhecida como, enfim, como uma empresa que trabalha com diversidade também é muito bom para a reputação da empresa. Então é uma coisa também que eu tenho orgulho.
P/1 – Cristina, você pode contar um pouquinho pra gente sobre alguns dos projetos, ou pegar um que tenha um exemplo de responsabilidade social?
R – Ahã. Tá. Posso contar. Vou falar de alguns. Então vou falar de um momento marcante na minha vida. O momento em que eu percebi, que eu falei: “Realmente aqui é um lugar assim, que eu falei, gente, que bom eu estar aqui agora presenciando esse momento, sabe? Que eu fiz essa escolha, que eu estou aqui agora”. Teve uma vez que a Diretora de Sustentabilidade veio ao Brasil. Foi a primeira vez que ela veio ao Brasil. E ela é uma sul-africana que já morou em Londres, agora mora nos Estados Unidos. Ela, enfim, está há 20 anos no mercado de Sustentabilidade, é uma pessoa que eu gosto muito que se chama Riva Krut. Ela veio ao Brasil e ela queria conhecer alguns projetos sociais. Um dos patrocínios históricos da White Martins – depois eu posso falar de uns mais recentes – é do Saúde Criança da Vera Cordeiro, que era o antigo Renascer, é Saúde Criança. E aí a gente marcou com a Vera, vamos lá no Jardim Botânico, no Parque Lage. É um trabalho fantástico, depois até, não sei se vocês chegaram a ver o material, é que para eu explicar aqui é muito longo, mas eu posso mandar pra vocês. É o seguinte, ela basicamente quebra o ciclo da miséria. Ela era uma médica do Hospital da Lagoa que descobriu o quê? Gente, quem mandava às vezes a criança oito, nove vezes com pneumonia, não é a doença, é a miséria, entendeu? Como que ela mora numa condição insalubre que não tem nutrição, um pai que bate na mãe, ou o pai que abandonou e a mãe não tem autoestima nenhuma, não trabalha, enfim. É aquela desestruturação geral. E aí ela trabalha com um plano familiar que dá profissionalização para a mãe, vai à casa e muda a casa da pessoa. Também cuida da parte, claro, de saúde, mas ela modifica a história daquela família. Depois de dois anos a pessoa tem alta, a família tem alta e a mãe já tá sustentando a criança, a criança já está recuperada, não vai mais pro hospital. E aí nós fomos lá no dia de atendimento, quarta-feira eu fui com a Riva e aí a Vera falou: “Vamos conversar com umas mães aqui”. E puxou lá uma mãe e eu tinha que fazer a tradução, da mãe falar pra Riva: “Riva, é assim.” e vice versa. Aí a mãe me dá um depoimento assim: “Olha o meu filho...” a mãe chama o filho dela, bonitinho o garoto “Meu filho nasceu com Síndrome de Down, outra síndrome lá que eu não sei, não sei nem dizer o nome. Tinha sido internado sei lá quantas vezes no hospital, desenganaram o garoto não sei quantas vezes. Eu não tinha profissão, meu marido me largou quando me viu com aquela criança...”. Eu estou simplificando muito: “Quando eu me vi com aquela criança...”. Assim, sabe? “Não tenho estrutura para isso. Aí eu vim aqui com a dona Vera...” e a mulher começou a chorar. E o garoto tão fofinho, tudo arrumadinho, bonitinho, garoto esperto, Síndrome de Down, mas o garoto um fofo. Aí ela dizendo assim: “A dona Vera me disse que quem dá o dinheiro para isso são vocês”. E eu traduzindo para a mulher: “Eu queria dizer o seguinte, eu rezo todo dia pra família de vocês. Eu queria que vocês soubessem nos Estados Unidos, fala para ela que é americana, para dizer pras pessoas o seguinte, para saber que elas salvaram a minha vida...”. É aquela coisa, tudo bem, aqui eu estou chorando, mas digamos na vida real, eu tento ser assim, bem profissional, tentar não me emocionar. Gente, a mulher falando aquilo, sabe, dizendo assim, chorava dizendo: “Olha, eu sou muito feliz. Por causa de vocês o meu filho está bem”. E eu tendo que traduzir aquilo, a Riva chorando, a mãe chorando, eu chorando. Assim. Eu me contendo, juro, para não desabar.
P/2 – E o inglês saiu?
R – Olha, teve uma hora que eu falava em inglês e em português (risos). E assim, a Vera Cordeiro, o Saúde Criança é referência mundial, tá? Ela dá palestras pro Al Gore. Eu posso depois mandar, até acho bacana ter... Então é muito forte você ouvir. Por mais que eu saiba de tudo aquilo e eu também... Quer dizer, é um projeto que já era patrocinado pela White antes de mim, mas que eu reforcei. Você vendo aquilo tudo, então é o que eu falo, vai dizer que não dá mais propósito na vida você ver isso do que eu ficar lá na primeira fila dos Rolling Stones? Por exemplo, outro projeto que nós somos os maiores patrocinadores é o Doutores da Alegria. Então quando chegou aqui, eu cheguei aqui, eles tinham convencido a gente a fazer um patrocioniozinho pequenininho, começou em São Paulo e depois também teve uma de regional. E eu acredito também que o patrocínio de responsabilidade social tem que ser alinhado com o teu negócio. Exemplo, poxa, o oxigênio vai para os hospitais. Então saúde, concorda? E aí já conhecia, porque os Doutores são bem conhecidos, né? Mas aí tive a oportunidade de falar muito com o Wellington [Nogueira], nós fomos aumentando o patrocínio, hoje damos 600 mil pra eles, é o maior apoio que eles têm. Também vendo as histórias deles e assim, até o filme que foi patrocinado, sabe? Então, por exemplo, é uma imagem que a gente... Eles já vieram aqui dar várias palestras, o Wellington e os Doutores da Alegria, aquele Riso 9000, não sei o quê. Então, por exemplo, tem uma cena do filme que é super tocante, um garotinho com câncer com dois anos, a mãe lá, sabe como é criança em hospital público, né? Muitas vezes os pais largam ou os pais não podem ficar com a criança, é um sofrimento terrível. E aí o garotinho assim, sabe, magrinho, magrinho, o filme mostra assim os doutores indo lá um dia, outro dia, depois o garotinho magrinho dançando, sabe? E o Doutores da Alegria, por exemplo, é considerado uma das melhores práticas de saúde pela ONU. E têm provas do seguinte, os hospitais no Brasil que são atendidos pelos Doutores da Alegria diminuem o tempo de internação, entendeu? Uma série de coisas. Então você vendo... E a gente patrocina o Doutores da Alegria independentemente se é em hospitais que sejam eles clientes ou não da White Martins. Então você fazendo parte disso é uma coisa que você vê que a empresa é uma empresa séria. E aí o que a gente tem aumentado os nossos patrocínios nos últimos tempos, o nosso patrocínio esportivo é todo para atletas paraolímpicos, questão de saúde também, da diversidade. Ou então, por exemplo, vamos patrocinar agora uma corrida, o Race for the Cure, que é a favor do... Para levantar fundos para o combate do... Enfim, para pesquisa do câncer de mama. Então assim, são coisas que eu acho que a empresa valoriza, os funcionários, o público, que você vê como que a empresa impacta positivamente na vida das pessoas, entendeu? Nós somos benchmarking mundial pela Praxair, eu vou fazer uma apresentação videoconferência em novembro. A VP de comunicação veio aqui, de responsabilidade social americana veio em novembro, a gente fez uma apresentação para ela. Ela me pediu pra repetir essa apresentação pros outros países via videoconferência justamente para a Praxair aprender a trocar experiências com a América do Sul. Então é isso. Isso também eu sabia que ia chorar, mas...
P/2 – Você falou de projetos ainda dos 100 anos da White Martins. Por exemplo, tem projeto dentro da empresa, como é que a Comunicação atua para fazer todo mundo participar?
R – Ah, legal essa... Ótima pergunta. Nós temos, também foi uma coisa que foi desenvolvida há uns três anos, nós criamos a figura do... Porque a White Martins é muito espalhada, né? Ela está espalhada no Brasil inteiro, muitas unidades, então nós criamos a figura do ponto focal de comunicação. Quem é esse ponto focal? Não é ninguém de comunicação, pode ser uma secretária, um auxiliar administrativo, alguém, sabe aquele cara que gosta de organizar festa de aniversário? E temos esses pontos focais e temos uma rede de colaboradores de mais de cem pessoas que aí são nomes apontados pelas equipes, que a gente aciona sempre eles atrás de notícias. Eles já sabem que somos nós, mandando notícias, ou quando a gente precisa assim: “Ah, eu preciso de um funcionário...”. Quer ver, por exemplo, queremos fazer uma matéria com funcionários que são surfistas. Aí eu pergunto para o Brasil inteiro, o pessoal manda, a gente vê os mais interessantes. Então tem as pautas deles e tem as nossas pautas. A Anna [Rezende] que é a minha chefe, que vocês entrevistaram hoje, a gente já está lá no nosso cronograma do plano dos cem anos, que hoje o presidente aprovou, a gente vai ter um conference call com todos os pontos focais e com todos os donos da casa, enfim, é como se chama a pessoa que é a autoridade máxima de uma unidade, para falar sobre o projeto de cem anos, entendeu? Porque o desafio de comunicação interna na White Martins é a dispersão geográfica. É diferente de você ter todo mundo num prédio só, mesmo que sejam 2000 pessoas só num prédio.
P/1 – Cristina, eu queria que você contasse pra gente um pouquinho como que você vê a relação do que você faz na prática, o seu dia a dia de trabalho com a vida das pessoas que recebem o gás, entendeu?
R – Você tá querendo dizer tanto industrial...
P/1 – Tanto industrial, quanto o medicinal.
R – No cliente... É. Eu acho assim, a minha equipe... Então vamos lá falar do cliente final, né? Não só do cliente, mas também assim, o que eles sabem da White Martins via imprensa, do que eles veem no caminhão. Eu vejo assim, a gente muito presente. Porque, por exemplo, quando você vai fazer uma estratégia com o cliente, a força de vendas precisa de um material, a força de vendas precisa tanto um material que seja uma apresentação, que seja um folheto, que seja uma forma dele comunicar. Isso está junto com a minha área, então a gente tem que conhecer tanto o negócio da empresa, mas saber qual a forma mais efetiva de você comunicar. Porque muitas vezes o executivo ou a pessoa da força de vendas é muito técnico, então ele não vai saber comunicar da maneira mais clara. Então precisa estar muito alinhada com o negócio. Então também nos hospitais, o público que a gente vai também atingir, quer dizer, para o tomador de decisão, é o médico, a pessoa de suprimentos, então você também tem que saber se relacionar com essas pessoas, com o material de comunicação. Outra coisa que eu acho é o seguinte, qual é o nosso papel? É alavancar e proteger a reputação e a marca da White Martins. Então, por exemplo, trabalho de sustentabilidade, de responsabilidade social é como eu falo, é para passar a essência da empresa para o público em geral, concorda, que vai criar um colchão de reputação também para a White Martins. Então a gente tem que ter as mesmas mensagens, uma mensagem unificada seja para a imprensa, seja para o público interno, seja para o cliente, seja para a imprensa que vai formar a nossa opinião. Então assim, eu vejo com grande responsabilidade o que a gente faz. Não sei se eu te expliquei bem.
P/1 – E assim, como que é a relação com a comunidade ao redor das plantas?
R – Nós temos o Dia do Voluntariado. O que a gente sempre tenta ser presente? Como eu falei, é uma dispersão geográfica enorme. Então a gente tenta ser presente na vida das comunidades do entorno. Em alguns projetos, nós temos um Dia do Voluntariado que reúne, se não me falha a memória, o último reuniu 4000 pessoas entre funcionários, parentes. E aí a gente sempre escolhe uma instituição do entorno para fazer uma melhoria. Outro projeto, que eu não sei se vocês conhecem, foi o Apadrinhar, que a gente conseguiu... É até legal também fazer essa pergunta pro Carlos Paiva que é o CFO, depois eu falo porque ele foi bem envolvido nisso. Nós conseguimos uma linha de crédito com o BNDES e com isso nós lançamos um concurso interno o seguinte, você tem um projeto de responsabilidade social, uma instituição que você quer apoiar? Lançamos um edital, uma coisa super séria, criamos uma logo e aí nós apadrinhamos 26 instituições no Brasil apontadas por funcionários. Aí mais trabalho, emociona dizer, que eu falo: “Ah, meu Deus”. Por exemplo, eu me lembro que tem uma, eu acho que foi no Piauí, eu tenho que pegar ainda, foi bem lá no Nordeste, bem assim no norte do Nordeste digamos. Não sei se foi Maranhão, Ceará ou foi o Piauí. Alguma coisa por ali. Que o seguinte, você imagina, a criança para ir para a escola tinha que caminhar quatro quilômetros. O que eles faziam? Até mais eu acho. 20 quilômetros. Acho que quatro é pouco. Depois se quiser até eu recupero a história direitinho. Então um funcionário escreveu, nós doamos uma Kombi, enfim, para uma ONG que aí faz o transporte daquela criança. Então, por exemplo, até uma coisa que às vezes eu tento explicar muito para os americanos, eles vieram super bem intencionados, uma coisa que eu acho ótima, que é você patrocinar no Brasil, enfim, globalmente a higher education. Eu posso falar assim, uma educação... Mas aí já é assim para universitários, pós-graduação. Aí eu tive que explicar, falar: “Eu achei a ideia ótima. Acho que a educação é o caminho realmente para a mudança, mas assim, a gente passa em frente a um monte de favela, a gente vê as pessoas...”. Então assim, aqui no Brasil o negócio não é... Eu to querendo chegar lá. O nível de vida das pessoas está mais embaixo, as pessoas ainda passam fome. E aqui é a América do Sul, a sede da instituição. Eu falei: “Olha, Caracas é a mesma coisa, Bogotá é a mesma coisa, Lima é a mesma coisa”. Então assim, bem vindo à América do Sul. A gente, enfim, tem muita coisa para ajudar, para colaborar. Então são esses projetos, como agora também a gente está numa linha de patrocinar muitos projetos para pessoas com deficiência. Então Ler sem Ver, uma biblioteca para cegos. Muita coisa bacana, como eu falei dos atletas paraolímpicos através do Instituto Superar. Olha, é tanta coisa que a gente patrocina.
P/1 – Agora a gente vai encaminhar para a parte final.
R – Tá bom.
P/1 – Fala um pouquinho o que você gosta de fazer nas suas horas de lazer, com o teu marido.
R – De lazer? Ah, eu gosto de... Agora eu estou correndo e eu moro bem perto da praia, eu moro entre a praia e a Lagoa. Moro em Ipanema, então eu adoro ter uma vida assim de acordar, sabe? Agora vai começar a época de praia, né? Andar de bicicleta a família inteira na Lagoa. Eu com a minha pequena vamos na frente e as outras... Ou atrás, dependendo da bicicleta que a gente pega. A minha maior que tem 12 anos, o meu marido. Gosto de cinema, adoro receber os amigos para tomar vinho em casa. Adoro ler, estar com a família. Então é isso que eu gosto. Viajar. Adoro viajar também. Então adoro isso.
P/1 – E o seu marido? Como que vocês se conheceram? Ele também é jornalista?
R – Ele é jornalista. Ele trabalhava no Globo, né? Eu era estagiária, lá ainda na época eu era estagiária do segundo caderno, ele era correspondente do JB em Paris, né? Ele é quatro anos mais velho do que eu, mas ele já tinha... Era correspondente lá do JB, fazia um curso na Sorbonne. Aí todo mundo falou pra mim: “Ah, vai vir o Sidney Garambone. O Sidney Garambone”. Não sabia quem era. Aí ele veio pro Globo. Lá começou dando em cima de mim e eu olhava aquele cara. Enfim, começamos a paquerar e começamos a namorar, dois anos depois casamos. Mas foi lá no Globo que a gente se conheceu.
P/1 – Cristina, quais foram as maiores lições, os maiores aprendizados desse seu tempo de White Martins?
R – Eu acho, como profissional...
P/1 – Pessoal ou profissional.
R – Maior aprendizado. Vamos lá que tem que ser... Eu acho que pessoalmente tentar ser uma pessoa mais serena. Eu tive muito treinamento, sabe? Porque assim, sempre como eu falei, sempre aguentei pressão, o problema não é esse, mas também tentar ser mais concentrada. E aprendizado profissional, acho que eu ampliei o meu leque profissional, era muito comunicação institucional, assessoria de imprensa, relações públicas, né? Comunicação institucional em treinamento de executivos para falar em público. E aí então, sabe, comecei por uma área de Comunicação de Marketing, Responsabilidade Social, Sustentabilidade, Diversidade. Eu acho que eu estou vivendo mais assim a estratégia da empresa, de uma empresa mais de cima também. Eu sou muito grata a empresa por eu ter tido essa oportunidade e por estar desenvolvendo esse trabalho que é novo pra mim. Quer dizer, claro, agora já não é mais tão novo, mas foi uma porta de entrada pra mim.
P/1 – E até agora o que você considera ser a sua maior conquista na White?
R – A minha maior conquista na White. Profissional?
P/1 – Pode ser pessoal também. O que você quiser contar.
R – Eu acho que essas áreas mesmo que eu fui adquirindo e o trabalho sendo bem feito, sendo reconhecido. Eu acho que eu diria que é isso. Como também até o trabalho de prevenção, né? De crise, quer dizer, a White mesmo tendo 2000 caminhões rodando, uma operação que é complexa, o trabalho de prevenção de crise, de comunicação de imagem também é muito bem feito. Eu acho que a equipe também. Eu tenho muito orgulho da minha equipe, ter ajudado a formar. Eu acho assim que tudo é um todo, né? Então desde as pessoas que te ajudaram na vida, as oportunidades que eu fui tendo e que eu fui aprendendo, como também ter ajudado também algumas pessoas a evoluírem. É em tudo.
P/1 – O que significa cem anos, esse aniversário de cem anos?
R – Eu acho assim, quer dizer, se você parar para pensar, são poucas as empresas que completam cem anos aqui no Brasil e que faturam o que a White fatura. Quer dizer, você estar cem anos com uma empresa de sucesso, que ajudou a industrialização no Brasil, que introduziu uma série de tecnologias, é motivo de muito orgulho. E é uma empresa que foi fundada no Brasil, depois foi adquirida por americanos, né? Mas enfim, nós também mesmo dentro da Praxair somos um exemplo para o mundo Praxair e para o Brasil. Então eu acho que assim, é um motivo... Foi o que eu falei, eu acho que esses cem anos a gente tem a obrigação de contar essa história para quem vai vir depois, enfim. Para retribuir tanto a quem fez a empresa chegar até aqui, a quem está aqui neste momento, como quem está por vir.
P/1 – E agora eu vou te fazer uma pergunta para a gente deixar registrado essa resposta, porque na verdade você é uma das idealizadoras do projeto.
R – Tá.
P/1 – O que você acha de contar essa história através da memória, da vida das pessoas.
R – Eu acho que é uma oportunidade única porque, enfim, quem faz a empresa, quem faz a história são as pessoas. Eu acho que você puxando na tua memória o teu relato de vida, você consegue trazer experiências. É um livro que é vivo, que é quente, que é feito por gente, que nem a empresa. Então isso que eu acho que é o melhor. Foi muito bom.
P/2 – O que você acha que ainda a White Martins tem para contar? Que história ela ainda tem para contar futuramente?
R – Eu acho que a White Martins se reinventa sempre. Eu acho assim, aqui a gente tem que... Não temos ainda o negócio de hidrogênio e que, enfim, a gente talvez venha a ter. Eu acho que é uma história nova, vai colocar a empresa em outro patamar. Como também é mostrar isso, quer dizer, uma empresa que é ética, uma empresa que é feita por pessoas que acreditam no trabalho e eu acho que a empresa vai crescer ainda muito e vai trazer novas tecnologias. Essa história de sucesso, de inovação vai continuar. E eu como sou de Sustentabilidade tenho que dizer que eu acho que a empresa tem muito a mostrar o que ela... O mundo é um mundo novo que está mudando numa velocidade incrível e vai mostrar que a gente vai se adaptar a isso e que a gente vai contribuir muito para o país, para o mundo.
P/1 – O que a White Martins, o legado, o que a White Martins agrega ao processo de industrialização, à história do Brasil?
R – Eu acho assim, a história da industrialização do Brasil é ligada a história da White Martins, a confiabilidade, a segurança. A empresa tem que garantir que não haja falhas. Então, por exemplo, darei uns exemplos. Você não pode parar um alto forno da CSN ou da Vale, né? Como também quando teve aquela tragédia aqui no Rio, em Nova Friburgo, por exemplo, a White Martins entregou oxigênio. As estradas estavam fechadas e a White Martins entregou oxigênio. Também teve outra, não sei se vocês sabem isso já foi no Chile, mas tinha uma equipe da FEC, da fábrica, lá no Chile quando teve o terremoto lá que devastou. E assim, as pessoas, muita gente querendo sair do Chile e os nossos funcionários ficavam lá dormindo na grama. Por quê? Vocês entendem, numa tragédia não pode faltar oxigênio. Então eu acho assim, a Vera Cordeiro fala isso, a White Martins não vende só oxigênio, ela vende vida, né? A idealizadora do Saúde Criança. Então eu acho assim, sabe, é uma empresa que é comprometida com o Brasil, comprometida com os países onde ela atua, sabe? Com o desenvolvimento. Eu acho que esse exemplo lá da tragédia de Friburgo, do Chile, mostram isso. Os funcionários quererem, não terem nem medo de arriscar a vida porque sabem que o país está precisando deles. Então isso eu acho muito bonito. Eu acho que isso que a empresa também agrega, uma história de comprometimento social, entendeu? Uma história de sucesso, de inovação, enfim, de ética. Isso que eu acho que a empresa deixa como legado.
P/1 – Tem mais alguma coisa que você queira falar?
R – Não. Eu é que espero que tenha sido a contento. Mas por mim eu acho que foi bem completo. Não senti falta de falar de diversidade, sustentabilidade, né? Acho que tá ok.
P/1 – Para a gente terminar, como que foi para você sentar, contar a sua história, relembrar algumas coisas?
R – Foi bom. Eu sabia que ia me emocionar, por isso que eu até perguntei no início e realmente deixa mais conforto sabendo que tem coisas que são mais privadas. Então a parte pessoal vai ficar... Porque assim, eu acho já que eu estou aqui, eu tenho que me soltar, concorda? Tenho que me entregar aqui de coração. Até porque eu entendi também que é importante, até para a memória da empresa. Então foi uma experiência única. Relembrei um monte de coisa num dia só. Meus bisavós de Portugal até chegar aqui.