Museu da Pessoa

Erguendo encontros além-muros

autoria: Museu da Pessoa personagem: Rivalino Cândido Rodrigues

Projeto CTBC Telecom
Depoimento de Rivalino Cândido Rodrigues
Entrevistado por Luiz Egypto de Cerqueira e Rosali Henriques
Uberlândia, 18/04/2001
Realização Museu da Pessoa
Entrevista CTBC_HV048
Transcrito por Marcília Ursini
Revisado por Ana Calderaro

P/1 - Luiz Egypto de Cerqueira
P/2 - Rosali Henriques
R - Rivalino Cândido Rodrigues

P/1 - Boa tarde, Seu Rivalino, obrigado por ter vindo. Em primeiro lugar, eu queria que o senhor nos dissesse o seu nome completo, o local e a data do seu nascimento, por favor.

R - Meu nome é Rivalino Cândido Rodrigues, nascido em 26 de agosto de 1934 em Araguari.

P/1 - O nome do seu pai e nome da sua mãe, Seu Rivalino?

R - Meu pai era João Cândido Rodrigues, minha mãe Jorgina Maria de Jesus.

P/1 - O senhor conheceu seus avós?

R - Não, conheci só uma avó.

P/1 - Da parte de mãe?

R - É, parte de mãe.

P/1 - O senhor tem notícias de onde vieram seus avós ou se eram da região de

Araguari mesmo?

R - Ah, deve ser da região de Araguari mesmo, né? Assim, dos mais antigos era minha avó... Eu não me lembro dela falar de onde eles vieram. Minha irmã mais velha fala que ele veio de um tal de São Francisco. Eu nem sei onde é esse São Francisco, que região era essa.

P/1 - O senhor tem recordação do nome dos seus avós paternos e maternos?

R - Era só do... O pai da minha mãe era Jorge, e o pai de meu pai era José Cândido. A mãe de meu pai eu não sei. Acho que [quando] ela faleceu, ele era pequenininho também.

P/1 - E a mãe da sua mãe?

R - A mãe da minha mãe, ela chamava Maria. Maria, mas não sei. Eu acho que era Maria Joana.

P/1 - Seu Rivalino, qual era a atividade do seu pai?

R - Ah, meu pai toda vida foi agricultor, sempre trabalhou na lavoura.

P/1 - Era terra própria, terra dos outros?

R - Ah, ele possuiu terra mas depois foi acabando. Com umas três mudanças que ele fez, acabou tudo. Quando ele faleceu, ele não tinha nada mais.

P/1 - Que tipo de mudança, Seu Rivalino?

R - Ah, ele vendeu uma terras que tinha no município de Araguari, foi para comprar umas terras em Goiânia e as terras parece que eram meia enroladas. Depois eu acho que ele perdeu quase tudo e voltou, voltou pobre. Acho que ele não teve coragem de enfrentar a barra pesada que era lá, sabe?

P/1 - Seu Rivalino, e a casa do senhor... O senhor tem irmãos, irmãs?

R - Eu tenho. Agora restam três irmãs.

P/1 - Mas eram quantos, inicialmente?

R - Ah, inicialmente, eu acho que era doze, mas faleceram muitos. Eu era pequenininho, nem conheci. Que eu conheci mesmo... Nós éramos em sete, que eu conheci, mas o meu irmão mais velho faleceu também, eu tinha uns seis anos. E depois os outros faleceram. Agora restam... Nós restamos em quatro, eu e mais três irmãs.

P/1 - E na casa do senhor, era onde? Era na sede do município, fora, era uma fazenda? Como é que era essa casa?

R - Antes? O meu pai faleceu, eu tinha oito anos, né? Passou dois anos só, a minha mãe faleceu também. Aí, depois, eu já fui morar com parente, com irmã. Aí já não teve uma morada certa mais. Ele mudava demais, né? Morava uns tempos em um lugar, uns tempo em outro. E não tinha terra, você morava em fazenda dos outros.

P/1 - Mesmo o senhor sendo muito criança, ajudava de alguma forma o seu pai?

R - Não, meu pai não, né? Ele faleceu, eu era pequeno ainda.

P/1 - E aí, como é que o senhor ficou, o senhor e os seus irmãos?

R - Ah, é muito difícil, né? Família ficar assim, pequena, e ainda sem pai. Eu era o mais novo. As outras já eram mais velhas, né? Então para eles... eles se viraram bem mais, né? Eu também já tinha uma irmã casada e eu fui morar com eles, na roça. Eu fui trabalhar na roça, município de Araguari. E aí moramos em diversos lugares: Capinópolis, Itumbiara, Santa Helena. E até que, quando eu entrei na CTBC, aí foi que eu parei, sosseguei mais, né?

P/1 - Nessa época de trabalho na roça, o senhor tinha alguma tarefa definida?

R - Não, eu sempre trabalhava para os outros, só ajudando os outros. Esse meu cunhado mesmo, eu ajudei ele a criar a família dele porque os meninos dele eram todos pequenininhos ainda, né? E eu, já com oito anos, já na roça ajudava muito, né? Que uma criança de oito, dez anos na roça ajuda muito.

P/1 - Que tipo de ajutório o senhor dava ali?

R - Era aprender a arar chão com boi, arar terra com boi, plantar... Plantava, usava a plantadeira de animal também. Da capina até a colheita, tudo.

P/1 - Para criança dessa idade não é um trabalho pesado, não?

R - Ah, é, né? (risos) Mas naquela época... Hoje em dia é que eles… Eles falam isso hoje, né? Até proibido. Mas quem não tinha, quem era pobre, trabalhava mesmo, né? Não tinha jeito e menino homem, por exemplo, ajudava muito na lavoura. Eu sempre trabalhei muitos anos na lavoura, mas ajudando os outros mesmo. Para mim mesmo, quando eu era solteiro ainda, fazia muito pouco.

P/1 - Tinha alguma forma de diversão dessa criançada, dessa meninada? Se divertiam de algum modo?

R - Ah, lá na roça era muito divertido, né? Antigamente, qualquer brinquedo servia para menino, né? Desde nadar no ribeirão, andar a cavalo, jogar futebol, caçar passarinho... Tudo era diversão. Embora, sim, tinha que trabalhar muito, né? Não sobrava muito tempo, não, para diversão.

P/1 - Tinha uma diversão.

R - É... Não tive, a minha infância de criança foi muito ruim. Eu não tive muito tempo para brincar.

P/1 - Das brincadeiras, tinha alguma que o senhor gostava mais?

R - Ah, a que a gente gostava mais era nadar, né? Era nadar no ribeirão. Pescaria, por exemplo, eu nunca gostei.

P/1 - O senhor chegou a frequentar uma escola nessa época? Tinha alguma outra escola?

R - Eu frequentei escola enquanto a minha mãe ainda era viva. Fiquei dois anos só na escola.

P/1 - Onde era isso?

R - Em Araguari.

P/1 - Araguari.

R - Era o Colégio São Luiz em Araguari. Hoje não existe esse colégio mais. Aí depois, uns tempos atrás, na CTBC, tinha uma aula lá para quem quisesse estudar, quem estudou muito pouco. Aí nós estudamos mais uns meses, né? Era na própria CTBC mesmo, na hora que a gente parava o serviço, à tarde. Aí estudava até lá para as 21. Aí eu aprendi mais um pouquinho.

P/1 - Nesse Colégio São Domingos tinha algum professor, alguma professora que tivesse marcado o senhor, de quem o senhor se lembra?

R - Lá tinha umas freira, né? Tinha a Irmã Coleta, que foi a minha primeira professora, e tinha mais umas outras. A Astrogilda, que era muito boa professora. O tempo foi muito pouco, né? Só dois anos.

P/1 - Depois do falecimento do seu pai e, dois anos depois, o da sua mãe como o senhor disse, o senhor ficou na casa dessa sua irmã, né?

R - Essa minha irmã que já era casada.

P/1 - E ficou lá muito tempo? Como é que foi isso?

R - Ah, eu morei na casa deles acho que uns cinco anos. Aí depois eu saí, morei uns tempo na casa de um irmão, que o irmão também já tinha casado. Morei uns tempos na casa dele, depois morei uns tempos na casa de um outro cunhado. Isso já foi em Goiás. E na casa de outras pessoas que não eram parentes também.

P/1 - E como é que era essa mudança frequente na cabeça do garoto ali, do pré- adolescente?

R - Era muito difícil, mas a gente levava tudo, parece que a vida era tão... Eu sempre fui um menino alegre. né? A gente trabalhava muito, não ganhava quase nada mas levava a vida, sabe? Tranquilo. A minha sorte é que, quando minha mãe morreu, eu já tinha essa irmã casada, né? E aí eu fui morar em casa de parente, mesmo com as brigas, que nós às vezes brigávamos. (risos) Porque só tinha menino pequeno e eu não tinha muita paciência com os meninos. Às vezes batia nos meninos e ela ficava muito nervosa, mandava eu sumir. Mas depois voltava tudo às boas.

P/1 - A sua função principal era cuidar das crianças?

R - Não. A função era trabalhar na roça mesmo, né.

P/1 - E qual era a atividade no plantio ali? O que mais se plantava?

R - Plantava era arroz, milho e feijão. Eram as três. As três culturas que mais se plantava naquela época.

P/1 - E o sítio tinha alguma criação?

R - Não. Trabalhava sempre era em terra de outros, né? Trabalhava de ameia. Meu cunhado trabalhava de ameia, né? Então o dono dava a terra e os boi, o arado para arar a terra e, igual meu cunhado, plantava e era ameia. No fim da colheita, partida no meio.

P/1 - Colhia-se bem, era produtivo?

R - Era bom. Tinha muita fartura. Pelo menos fartura tinha, né? Tinha muita fartura. Naquela época não tinham muito valor as coisas, né? Se criava galinha, se fosse vender frango na cidade, quase não compensava levar porque era baratinho, não compensava. Então a vida era essa. Esse meu cunhado nunca teve terra, nunca possuiu terra. Era sempre... Ele trabalhava uns tempo na terra de um fazendeiro, depois passava para outros. É assim: onde estava dando certo, ficava. E eu acompanhava.

P/1 - E ia mudando de casa também?

R - Mudava de casa também. Ele mudava muito, não parava muito tempo, igual a cigano.

P/1 - Qual é o nome dele?

R - Jovino.

P/1 - E da sua irmã?

R - Minha irmã era Isaura.

P/1 - O nome dela era Isaura. Seu Rivalino, e como é que era um dia típico do rapazola que ajudava o cunhado na roça? Acordava que hora, fazia o quê, voltava, almoçava que horas?

R - A vida na roça era... A gente levantava cedo, né? Bem cedo. O sol saindo, a gente já levantava, tomava um cafezinho fraco, que nem um leite não tinha. E ia trabalhar. Almoço às nove. Às duas e meia vinha a janta e, depois, à noite, tornava a jantar. Eram três vez ao dia.

P/1 - Voltava para casa para fazer as refeições ou fazia na roça mesmo?

R - É. Quando a roça era perto, na porta de casa, às vezes, aí era em casa mesmo. Mas muitas vezes a roça era longe, aí tinha que levar a comida. Levava almoço, depois levava a janta, era assim.

P/1 - E esquentava por lá mesmo?

R - Não, chegava quente ainda, né? Porque sempre era de cavalo, ou mesmo quando era a pé. Não era assim, muito longe, né? Então quase chegava... A comida chegava quente ainda.

P/1 - E o que era? O que vinha na comida? Me fala o cardápio.

R - Mistura na roça era a coisa mais difícil. (risos) Quando era tempo, quando já tinha abóbora, era abóbora, era um molho de macarrão. Comia carne quando matava um porco, né? Assim, de meses em meses. Carne de vaca nem se via. (risos) Quase ninguém comia carne de vaca. Era muito difícil. Passava muito mal de _______, alimentava muito mal.

P/1 - Mas o básico era...?

R - O básico era o arroz e feijão, ovos, algum frango um dia, né? Era isso. Era comida muito fraca para aguentar aquele serviço, que era tão difícil. A gente trabalhava, trabalhava descalço, nem botina a gente tinha para calçar. Era desse jeito.

P/1 - Seu Rivalino, nessas mudanças todas, tem alguma casa de que o senhor tem uma boa recordação, que o senhor tivesse gostado muito?

R - Não, nenhuma. Não tem assim... Tem gente que põe amor no lugar que tá morando. Eu não sei se é porque a gente mudava muito, nunca coloquei amor em lugar nenhum. Enquanto o meu pai era vivo, que eu lembro pouco dele, nós moramos em Dianópolis, depois ele veio para Araguari, mas já veio muito doente. E depois que ele morreu, a minha mãe também pobre, morou em diversas casas em Araguari e depois, na roça, era a mesma coisa. Então não tenho lembrança assim, de saudade de nenhum lugar, não.

P/1 - Como é que era Araguari nessa época?

R - Araguari, naquela época, eu acho que era maior que Uberlândia, né?

P/1 - É?

R - É. Só que depois Uberlândia cresceu e Araguari parou. Eu lembro da primeira vez que eu vim aqui para Uberlândia, o meu pai ainda era vivo ainda, eu vim com ele, que ele já estava fazendo tratamento. Lembro aqui que era tudo serradão. Onde era a estação, onde era a Praça Sérgio Pacheco, para cima da estação era tudo serrado, tudo mato ainda. Araguari, naquela época, era maior que Uberlândia. Aí depois Araguari parou e Uberlândia cresceu.

P/1 - Araguari era assim por quê? Por causa do trem?

R - Não sei. O motivo eu não sei. Que ela cresceu um pouco no início e depois muito. Acho que os políticos de Araguari, toda vida, foram muito fracos. Os prefeito nunca... E acho que o próprio local também, né? Araguari não desenvolveu muito.

P/1 - Nem por Araguari o senhor pegou uma certa afeição?

R - Não. Porque quando... Depois que eu casei é que eu morei em Araguari. Mas aí eu já trabalhava na CTBC e era só viajando, né? Eu vinha para casa de quinze em quinze dias. Passava mais o tempo fora, né? Então eu não fiquei muito em Araguari. Era mais viajando. E também eu não fiquei fixo lá, né? Até que eu não conheço muita gente de Araguari porque, naquela época, eu quase não parava lá. Vinha fim de semana, chegava no sábado, às vezes, e no domingo a noite já tinha que viajar. Era isso.

P/1 - Nessa fase da sua vida de jovenzinho mudando daqui para lá, não chegava um momento em que o senhor pensava assim: “Quero fixar em um lugar, quero parar, quero sentar raiz?”

R - É, a gente pensava, né? Mas, é... Nunca que dava certo, né? Porque enquanto estava solteiro, né? Então o lugar que estava dando mais certo, eu ia ficando. E no momento que a gente foi ficando mais velho, aí já fui pensando: “Pois eu preciso dar um jeito de sossegar em um lugar, né? Dar um jeito de casar e ficar quieto.” Porque não tinha nem pai, nem mãe, não tinha uma residência fixa, né? Então eu já comecei a pensar em parar.

P/1 - E nessa época o senhor ainda morava com a sua irmã?

R - Não, aí já não morava com eles mais, não.

P/1 - O senhor morava onde?

R - Eu morei no município de Itumbiara. E já era o pessoal lá da região, lá mesmo de Itumbiara, sabe? Que só o último ano que eu trabalhei na roça, solteiro, que eu morei de novo na casa desse meu cunhado também, foi de novo no município de Araguari. Um lugar chamado Barra Alegre. Aí depois eu vim para cidade, né? Entrei na CTBC e fiquei quieto.

P/1 - Foi lá em Araguari que o senhor conheceu a sua senhora?

R - Não, a minha esposa... Nós somos primos. Nós somos primos primeiros. Conheço desde criança. Nossas mães eram irmãs.

P/1 - Ah, certo. Era amor de primeira vista ou foi uma coisa que foi acontecendo?

R - Foi acontecendo, né? (risos) Era uma família boa, né? Uma moça muito boa, então pensava: era boa para casamento. Uma pessoa que a gente já conhecia. É onde nós... E foi, até que deu certo, nós casamos.

P/1 - O senhor se casou já na CTBC?

R - É, eu já trabalhava na CTBC.

P/1 - Como é que foi a sua chegada na CTBC? Como é que o senhor…?

R -

A CTBC... Eu comecei em 1958. Eu vim para cidade, né? E emprego não existia. Aquela época também... O povo fala muito de desemprego hoje, mas toda vida foi isso, né? Aí já tirei meus documentos, carteira de trabalho, que naquela época só tirava em Uberaba. Aí cheguei aqui em Uberlândia e fui batalhar, né? Emprego... Mas muito difícil. Aí eu tenho um cunhado que era parente do empresário Simonides Neto. Aí o Simonides Neto era muito amigo do Alexandrino e arrumou serviço para mim. Mas arrumou assim, o Alexandrino prometeu para eu trabalhar uns dias. “Manda para cá para trabalhar uns dias. Não garanto.” Que quase não tinha serviço, né? E aí, naquela época, eu trabalhei três anos. Depois eu casei, casei em 1960 e não parava em casa, né? Serviço muito difícil, vinha em casa fim de semana, tinha dia de domingo e a gente estava dormindo, eles já chegavam chamando a gente para trabalhar. Aí eu saí, resolvi sair e voltei para a roça de novo, para a lavoura. E aí trabalhei na lavoura mais cinco anos e resolvi voltar para a CTBC de novo em 1966.

P/1 - O senhor fez uma trajetória, então, mais acidentada?

R - É.

P/1 - O que motivou o senhor a vir para Uberlândia? Só trabalho?

R - É, trabalho, né? Já estava cansado de trabalhar na lavoura, então vim tentar na cidade qualquer serviço que achasse. Mas emprego era muito difícil. Aí, eu tinha... Até eu vim, foi na época que a Companhia estava fazendo esse asfalto aqui de Uberlândia para o lado de Itumbiara. Eu fui na firma lá no Trevão para arrumar serviço lá, arrumei, mas eu vi os alojamentos, o jeito que era, tinha que pousar no meio daquele povo, esse pessoal tudo estranho, aí voltei de lá com intenção de voltar para a roça de novo. Aí quando cheguei aqui em Uberlândia, o meu cunhado falou que o Simonides tinha arrumado o emprego na CTBC com Alexandrino.

P/1 - O senhor entrou para fazer o quê?

R - Eu entrei de ajudante, já ajudando a puxar poste, sabe? Puxar poste de aroeira. Nós buscávamos postes nas fazendas, Goiás, já para construir as rede de linha física. Entrei como ajudante junto com o Chiquinho, que eu falei que ele foi meu professor. Aí com o Chiquinho, ele me ensinou a dirigir caminhão. Aprendi, tirei a carteira de habilitação, aprendi também a construção de rede e fiquei. Entrei para trabalhar uns dia e fiquei três anos, naquela época.

P/1 - E nessa época, solteiro ainda, ia buscar poste onde tinha, como é que é?

R - É, nós buscávamos poste lá em São Simão, não tinha ponte. Nós dávamos volta para... Era tudo estrada de terra, dava volta ali pelo Porto do Gouveinha, ia lá em Quirinópolis e voltava para São Simão. Pegava poste lá em São Simão, Goiás e Joviânia. Buscava poste em Joviânia. A gente buscava os poste de aroeira já para as construções de rede. No início foi assim. Depois já passei a trabalhar na construção de rede.

P/1 - E transportava como esses postes?

R - Era caminhão. A CTBC tinha um GMC 1952, era o caminhão que nós... Tinha o reboque, engatava na carroceria, trazia os poste em cima. A CTBC naquela época era pobre, né? (risos) Estava iniciando, era muito difícil.

P/1 - E quando ia buscar poste, quantas pessoas tinham que ir?

R - Não, era só eu e o Chiquinho. Lá nós arrumávamos mais gente para nos ajudar, que aquilo era tudo na mão mesmo. Aqueles postes de aroeira pesados para pôr em cima do caminhão, tudo era na mão.

P/1 - O senhor e o Seu Chiquinho chegavam para cortar o pau ou já estava cortado?

R - Não. Já estava. A CTBC comprava os postes já preparados, já lavrados, madeira. Os postes já estavam prontos.

P/1 - Mas davam um gabarito? Eram postes com tais e tais características?

R - É, tinha que ser o mínimo, a ponta deles tinha que dar uns quinze centímetros de grossura, sabe? Era o mínimo. Muito fino não servia.

P/1 - Que altura que tinha?

R - É o mínimo, o mínimo eram sete metros de comprimento. Era de sete acima. O mínimo eram sete, não podia ser menos também senão ficava a rede muito baixa.

P/1 - E tinha muita madeira por ali?

R - Ah, não tinha muito, não. Eram umas madeira muito ruins. Uns postes muito tortos. Era meio difícil achar madeira. Depois pegou... A CTBC pegou [para] usar esses trilhos de ferro. Eles compravam da Companhia Mogiana e usavam aqueles trilhos para fazer postes para as redes.

P/1 - O poste, por exemplo, s senhor falou que a madeira era ruim. Aroeira é uma madeira ruim assim?

R - Não. A madeira era boa, né? Só que os poste eram muito tortos, né? Eram os postes às vezes grossos, tortos, era muito difícil trabalhar com eles. Não era uma madeira certinha, tipo eucalipto, que dá aquela madeira certinha, bom para trabalhar, bom para fazer o alinhamento da rede, aplumar. Os poste de aroeira geralmente vinham muito tortos, era difícil de trabalhar com eles.

P/1 - E o senhor e o Seu Chiquinho ali não refugavam esses poste, não?

R - Era só quando era muito ruim, porque tinha vez que eles estavam precisando tanto dos poste que, às vezes, a gente trazia até poste ruim também. A gente era obrigado a trazer.

P/1 - E quantos vinham em cada viagem dessa?

R - Tinha viagem que vinha quinze postes só, caminhãozinho pequeno e velho ainda, então trazia muito pouco. Ficavam muito caras as viagem dessa.

P/1 - Quanto tempo demorava para chegar lá e voltar?

R - Ah, era uns dois dias para ir e voltar, para descarregar.

P/1 - Quinze postes por viagem, tinha que fazer um...

R - Eram muitas viagens, tinha que dar, né?

P/1 – Por isso que o senhor vivia fora de casa?

R - É. Aí, o Chiquinho já era casado, eu ainda era solteiro. Então nós trazíamos uma viagem, descarregava, por exemplo, em Ituiutaba. Município de Ituiutaba. De lá mesmo nós já voltávamos, íamos buscar mais. Às vezes passava um mês, até mais, sem vir aqui pra Uberlândia.

P/1 - Certo. Vamos fazer uma interrupção, Seu Rivalino, só para trocar a fita. Seu Rivalino, eu queria que o senhor me falasse um pouco do Seu Chiquinho, que o senhor me falou que foi o seu mestre, como é que era trabalhar com ele?

R - Ah, eu mais o Chiquinho, nós sempre demos muito certo para trabalhar juntos, sabe? Ele era meio nervoso, sistemático, mas parece que desde o início as nossas naturezas parece que já combinaram, sabe? Então o tempo que eu trabalhei com ele, nunca tive nada a reclamar dele. Ele me ensinou, tinha muita paciência e eu tinha muito medo de pegar o caminhão porque era responsabilidade dele, né? Então, na primeira viagem que fizemos, ele já me perguntou se eu tinha vontade de aprender dirigir caminhão. “Ah, eu tenho.” Aí ele falou: “Se você for continuar trabalhando comigo, vou te ensinar.” E ensinou com muita paciência, eu pegava com muito medo, né? Com medo de esbarrar alguma coisa porque a estrada de terra [era] muita cheia de buraco no meio dos matos. Mas eu aprendi em num instante, consegui aprender e também fui aprendendo. Já tirei a carteira de motorista, né? E nós demos muito certo. Quando nós paramos de puxar os postes aí, já fui construir rede também junto com ele. Então nós demos muito certo para trabalhar juntos.

P/1 - Também, convivendo esse tempo todo, tinha que dar certo.

R - É, é.

P/1 - Dia e noite junto. Como é que era a vida de vocês dois?

R - Ah, não sei. Para buscar os postes, chegava na... Quando a gente pousava... Tinha vez que a gente ia, às vezes pousava lá. Naquele tempo era Paranaiguara, né? Se chamava Mateira, naquela época era Mateira. Era onde nós buscávamos os postes. Era juntinho ali com São Simão. E aí, à noite nós... Eram nossas farrinhas, tomava uma cervejinha. Era uma vida, uma vida até alegre. Era bem melhor do que na lavoura.

P/1 - Certo. O senhor, um rapazola, devia estar gostando bastante?

R - É, gostava bastante. (risos)

P/1 - E aí, fazia as refeições...

R - Onde desse para almoçar, né? Jantar, nós fazíamos as refeições.

P/1 - Dormia no caminhão?

R - Não, sempre dormia. Tinha aquelas pensão de beira de estrada, né? Tinha vez que a gente ia, pousava na beira do rio, lá Paranaíba no Porto Gouveinha. Aí às vezes tinha que pousar na beira. Se a gente chegasse a noite ali, para às sete, a balsa já não funcionava mais. Aí a gente tinha que pousar na beira do rio, mas tinha dormitório lá, tinha lugar de dormir.

P/1 - Essas viagens... Quando saía das viagens, as instruções delas era o seu Alexandrino quem dava?

R - Era. Era só o Seu Alexandrino, né? Quem mandava era só ele mesmo.

P/1 - Como foi que o senhor conheceu o Seu Alexandrino?

R - Esse primeiro dia que eu fui trabalhar, né? Eu fui, cheguei lá na CTBC, na João Pinheiro, aí procurei pelo Alexandrino e ele estava lá conversando com as telefonistas. Aí procurei ele, ele falou: “Você vai, combina com o Chiquinho. Você vai trabalhar com o Chiquinho.” O Chiquinho estava lá na telefônica também, né? A conversa dele foi só aquela. “Você combina com Chiquinho lá, você vai trabalhar com ele.” E aí foi o primeiro contato. E aí, depois disso, quando já passou, ele já jogou a responsabilidade nas minhas mãos, né? Com caminhão, já pôs na minha responsabilidade e, mesmo tocando serviço, aí já passei... Aí o contato era só com ele, e já começava as briguinha. (risos) O Alexandrino era muito exigente, né? Era difícil. A gente tinha que ter muita paciência mesmo. Tinha que ser exigente, né? Porque senão a firma não tinha crescido igual cresceu.

P/1 - Que tipo de briguinhas assim, que o senhor…?

R - Ele era muito exigente, né? Todo tanto que a gente fazia, trabalhava, ele achava que tinha que fazer mais um pouco ainda. (risos) Nunca ele falava: “Não, está bom, está beleza.” Ele falava: “Não, está bom, mas pode fazer mais um pouco.”

Era muito exigente.

P/1 - Isso incomodava o senhor, assim... Chegava?

R - Incomodava porque eu era meio sistemático também. A gente ficava… Quando a gente via chegando assim, já pensava: “Já vem bronca por aí.” (risos) Mas até que deu para conviver bem, eu trabalhei muitos anos com ele.

P/1 - Você se lembra de um episódio que fosse um exemplo disso que o senhor acabou de dizer?

R - Como assim?

P/1 - Desse tipo de relação que o Senhor Alexandrino...?

R - Ah, esses desentendimentos?

P/1 - É.

R - É, muitas vezes... Igual teve uma época em São Gotardo, né? Em São Gotardo, Doutor Luiz mandou eu fazer um serviço de um jeito. O Doutor Luiz foi lá e mandou fazer aquele serviço. Aí passaram uns dia, o Alexandrino foi, e aí ele ficou muito brabo que... Mas, ele ficou brabo comigo, sendo que era o Doutor Luiz é que tinha mandado fazer daquele jeito. Aí mandou desmanchar tudo. Teve que desmanchar tudo porque não podia ser feito daquele jeito. Então era assim esse desentendimento.

P/1 - Mas ele chegava a ter com o senhor uma relação também de amizade?

R - Tinha. O Alexandrino é... Eu almocei na casa dele diversas vezes. Quando ele estava assim, na “veia boa”, né? Então era muito bom com a gente. Ele era, como se diz, franco. Tudo que ele tinha que falar, falava. Mas não era só para a gente, que era empregado mais humilde. Era com qualquer funcionário, ele agia assim. Mas era muito bom. Fora isso, a gente chegava na casa dele, era uma pessoa simples. Ele não era igual, porque tem muitos patrões, que nem dão bola para empregado. Então o Alexandrino, nesse ponto, era muito bom.

P/1 - O senhor chegou a criar amizade com ele?

R - É, nós tínhamos amizade, né? Às vezes até viajou junto.

P/2 - O senhor falou, uma hora, dos postes, não de aroeira, mas os poste de trilho da Mogiana. Como é que era, vocês desmontavam esses trilhos?

R - É, eles compravam... A Mogiana, na época que começou a trocar os trilhos, tirando aqueles trilhos velhos mais finos e colocando, fazendo rede nova, pondo aqueles trilhos mais grosso, mais longos, mais compridos. E aí aqueles trilhos velhos era uns trilhos... Uma média de nove metros de comprimento. Aí a CTBC comprava e aproveitava esses para fazer postes. Aí furava ele já no ponto de colocar as cruzetas, né? Que era para passar os fios, e a gente aí usava eles como postes. Inclusive, depois, a maioria das redes delas eram todas com trilho. Saía daqui a Ribeirão Preto, tudo era poste de trilho, trilho de ferro. Essas redes daqui, de Itumbiara, depois passaram a ser todos postes de trilho de ferro.

P/2 - E qual dá mais trabalho, de aroeira ou de ferro?

R - De ferro era bom porque o raio não estragava eles, né? Mas tinha o problema que, quando ventava muito, costumava derrubar. Eles eram mais fracos, né? Pesava quando davam aquelas tempestade muito bravas, derrubava até cem postes de uma vez.

P/1 - Aí, era uma operação ________?

R - Era muito difícil. Porque antes, as redes... Quando eu comecei na CTBC, as redes velhas que tinha, eram muito, muito ruins. Por exemplo, daqui para Itumbiara, de certa altura de Monte Alegre para frente, era um fio só. Para você falar daqui em Itumbiara, era um arame de ferro, aqueles postezinhos baixinhos. Então eram muito ruins as redes. Aí depois que a CTBC já foi construindo, fazendo as redes boas, com os postes mais altos, com fio de cobre. Aí depois veio o alumínio. Mas, as rede primeiro, quando a CTBC pegou, era tudo... Algum lugar que falava, né? Porque daqui, acho, o lugar que falava era Itumbiara, Tupaciguara, mas essas outras... Monte Alegre, essas outras cidadezinhas, nenhuma comunicava. A primeira comunicação no Prata, por exemplo, a primeira vez, foi a primeira rede que eu fiz para a CTBC, foi de... Eu fiz do Trevão ao Prata. O Prata já tinha telefone, só que esse telefone antigo, de magneto, mas não falava para lugar nenhum. Era só dentro da cidade mesmo.

P/1 - Eu queria voltar um pouquinho, Seu Rivalino, desse tempo que o senhor se cansou dessas viagens aí, de puxar poste para tudo quanto é canto, resolveu voltar para a roça? O senhor ficou três anos na CTBC, o senhor disse, né?

R - É, fiquei três anos. Entrei em 1958 e sai em 1961.

P/1 - Aí o senhor falou para o Seu Alexandrino que não queria mais, “estou indo embora, não vou ficar aqui”?

R - É, eu pedi conta e saí.

P/1 - E ele?

R - É, ele não segurava não, né? No início já vinha meio enrolado. Já, antes, uns dias, já vinha, sempre falava... Ele... Aí foi. Até que chegou um fim de semana, em um sábado, aí eu resolvi pedir conta. Mas é porque eu já estava cansado, né? E, nesse sábado, eu já tinha combinado com o chefe, que era um tal de Nelson, aqui em Uberlândia. Nessa época eu estava trabalhando já na cidade, eu não estava trabalhando nas linhas físicas, não. E aí eu já ia casar um cunhado em Araguari. Eu já tinha até comprado as passagens para ir e combinado com esse Nelson, que eu ia trabalhar só até o meio-dia no sábado. Falou: “Tudo bem, combinado.” Mas quando foi, aí mandaram eu ligar um telefone no Edifício do Valdileno, já eram onze horas já e era muito difícil. Lá, a tubulação já estava cheia, para passar o fio ia demorar demais, aí eu avisei o Nelson que não ia dar para eu fazer o serviço, não. Porque, se eu mexesse, não ia ter. Mas depois é que eu fiquei sabendo que o Alexandrino estava de pareia com ele, junto com ele. Na hora, ele: “Não, é para fazer, é para fazer, não é para deixar sem fazer, não.” E eu já estava com vontade de sair, né? Falei:

“Não, quer saber... Então vocês mandam outro vir fazer que eu não vou fazer, não. Eu vou sair.” Aí eu fui, entreguei o caminhão na CTBC, passou uns três dias, eu voltei lá pra CTBC só para acertar e saí.

P/1 - E foi para onde?

R - Aí eu fui para a roça de novo. Aí a minha sogra tinha um sítio no município de Araguari e eu fui para lá. Eu fiz uma casinha lá no sítio dela e fui tocar a lavoura.

P/1 - O senhor se casou já na CTBC?

R - É eu já estava casado, né? Eu casei em 1960 e saí da CTBC em 1961.

P/1 - Como é que foi o seu casamento, o dia do seu casamento?

O senhor folgou, pelo menos, no dia do seu casamento?

R - É, eles me deram férias, né? (risos) Que eu estava trabalhando já há um tempão e ainda não tinha tirado férias ainda, aí, eles me deram férias para o casamento.

P/1 - Como é que foi esse dia do seu casamento?

- Ah, simples, né? Casamento simples, não teve nada de especial, não.

P/1 - O senhor casou em que igreja?

R - Na Igreja Matriz lá de Araguari. Nem sei o nome daquela igreja.

P/1 - Mas, voltando para a roça, o senhor foi tocar o quê? Que tipo de lavoura?

R - Plantar, plantar arroz também, né? Arroz, milho...

P/1 - Era uma época de muito arroz na região, né?

R - Ishi... Naquela época... Essa região aqui só abastecia a região toda de arroz.

Não precisava nem arroz de outros lugar, não. Município de Araguari, Indianópolis, Nova Ponte... Era muita lavoura que tinha.

P/1 - E o senhor foi plantar lá no sítio desse seu...?

R - Não, aí eu só morava no sítio da minha sogra, mas fui tocar a lavoura com outras pessoas.

P/1 - Até rendia bem?

R - Ah, a gente não... Quer dizer, não fazia muita coisa, mas dava para viver, né? Quando o tempo corria bem, né? Quando não vinha o sol e estragava a lavoura. Porque lavoura tem isso, às vezes, a planta aí... Às vezes, chove uns três... Três meses... Que, naquela época, os arroz era cinco meses que levava, né? Desde a planta até a colheita. Então, depois se desses oito dias de sol, perdia tudo. Mas eu sempre tive sorte. Graças a Deus, nunca perdeu. Nunca plantei muita coisa também, não. Era só eu. Mas estava com a vida boa, mas depois já vêm os filhos. E morando na roça, já a colheita precisava... Os filhos precisavam da escola, né? Precisava estudar, e se eu fosse ficar na roça ia ser muito difícil. Ia acontecer com eles igual aconteceu comigo, não estudar.

P/1 - E o senhor, nesse tempo, chegava a sentir saudade do trabalho que tinha aqui com o seu Chiquinho?

R - Ah, no início eu sentia porque o serviço na lavoura era muito mais pesado, muito difícil, além de passar muito mal, né? Assim, a comida muito fraca, ainda serviço muito pesado. Aí sentia falta no início. E nem tinha intenção de voltar, não, para a CTBC. Mas, depois, voltei para a cidade e aí voltei para Araguari. Mas emprego não existia também. O jeito é voltar para a CTBC. Aí telefonei para o Doutor Luiz e qualquer dia que eu quisesse vir, eu podia vir. E aí eu voltei de novo, trabalhei mais um tempão.

P/1 - O senhor tratou com o Doutor Luiz, que já estava formado na época, né?

R - É, foi com o doutor Luiz. É já era formado.

P/1 - Ele conhecia o senhor?

R - O Doutor Luiz conhecia. Doutor Luiz era um amigão também, desde solteiro nós... Eu acho que eu casei primeiro do que o Doutor Luiz. Na época que eu saí ele estava... Não sei se ele estava estudando ou fazendo algum curso no exterior. Eu tenho a impressão de que, se ele tivesse na época aqui, era capaz que eu nem tinha saído. Que eu perdi muito com essa saída de, da Telefônica para ir para a lavoura, né? Que depois, eu comecei de novo, [com o] salário já muito baixo. Na época que eu saí, eu estava ganhando até bem. Depois comecei de novo, o salário muito baixo, depois para melhorar que foi difícil.

.P/1 - O senhor voltou nessa época já em que função aqui?

R - Eu voltei já na função de construção de rede… Construtor de rede. Aí trabalhei só mais uns dias com o Chiquinho de novo, lá no Estado de São Paulo, mas aí, o Alexandrino já mandou eu vir descer lá para Campina Verde, Iturama, já para fazer rede lá. Que as rede de Iturama até Paranaíba, Mato Grosso, fui eu que fiz. Aí eu já voltei e fui para lá. Mas aí eu já tinha três filhos, já levava a família. Alexandrino falou: “Você pode levar a família, lá tem casa para você ficar, fica à vontade.”

P/1 - ___________?

R - Iturama. Eu fui para lá e, às vezes, eu passava três, até quatro mês sem vir aqui para Uberlândia.

P/1 - A família ficava em Iturama, mas o senhor ficava circulando?

R - Iturama, né? Mas, o serviço... A gente ia, trabalhava na estrada, nos matos, mas toda tarde voltava, né?

P/1 - Voltava?

R - É.

P/1 - Aí o senhor já era responsável por uma equipe?

R - Já era responsável por uma equipe. Lá, eu fui trabalhar na prefeitura de Iturama, que dava os peões, era por conta dela. No início, até o caminhão, mas como a prefeitura só tinha um caminhão velho naquela época, eu trabalhei umas duas semana, telefonei para o Alexandrino, que não tinha jeito porque eles levavam a gente, deixavam na estrada... Depois não tinha como buscar, era difícil, né? Aí ele mandou um caminhão para ficar comigo lá.

P/1 – Quer dizer que o Senhor Alexandrino não guardou muita mágoa do senhor, não, de ter saído?

R – Ah, eu acho que não, né? Acho que não porque nós andávamos discutindo bastante. (risos) Que depois... Aí eu fiquei trabalhando aqui dentro da cidade uns tempos transportando gente. Foi uma época que entrou muita gente na CTBC para trabalhar ampliando as redes, então eu tinha que levar uma turminha para um lado, uma turma para o outro, e o Alexandrino de cima. Às vezes a gente ficava muito irritado, discutia. Então estava meio desgastado. Aí eu saí uns tempos, depois voltei, voltei numa boa, né?

P/1 – Como é que ele comunicou para o senhor que o senhor ia ficar responsável por uma equipe para construção de rede?

R – É, eu estava lá com o Chiquinho. O Chiquinho tinha uma equipe lá no Estado de São Paulo, aí ele ligou lá, que era para eu vir embora, vir aqui para Uberlândia para pegar um caminhão e descer para Campina Verde e Iturama. Aí, dessa vez em diante, a gente já... Aí já foi direto, arranjaram uma turma. Nós já passamos a... Já arrumei uma equipe fixa da CTBC para que, todo lado que eu ia, eu levar o pessoal. Aí a CTBC dava casa para a gente morar e os peões moravam tudo junto ali. Ficou mais fácil porque os peões já apanhavam prática, né? Era melhor na... Ajudava mais na construção porque no início eu ia... Por exemplo, era só eu que sabia fazer o serviço. Então os outros tinham que ficar mandando todo mundo e eu que tinha que pegar no pesado. O dono do boi pega no chifre, né? (risos)

P/1 – Sobrava para o senhor?

R – É, sobrava mais para mim, né? Que ninguém sabia fazer nada. Mandava... Tinha que mandar furar um buraco ou... Mas não sabia fazer, alinhar um poste, a hora de passar os fio, regular um fio para ficar tudo certinho. Então era difícil.

P/1 – Essas equipes eram muito grandes, Seu…?

R – Não. Era sempre a média de dez, doze. Trabalhava sempre com essa média assim. É porque era tudo na mão, né? Naquele tempo não tinha esses caminhão Munck, era tudo na mão. Carregar os poste, era no ombro. Hora de levantar os poste, era tudo na mão. Quando você ia mexer com cabo ou bobina de cabo, aquelas bobinas muito pesadas para pôr em cima do caminhão, era tudo na mão. Era... Era muito difícil aquela época, as construção.

P/1 – E as estradas, como é que circulava com caminhão com esses equipamentos nessas estradas que não tinham asfalto, não tinha nada?

R – Não, na época... Depois já começou de... Quando eu entrei, em 1958, não tinha asfalto para lá, nenhum aqui ainda. Era tudo estrada de terra. Era difícil principalmente quando chovia. Era difícil.

P/1 – Como é que constrói uma linha física, como é que era o procedimento assim, como é que era...?

R – Nós, por exemplo... Que muitas firma que vão construir rede têm o engenheiro, os projetos, tudo. Agora, nós não tínhamos nada disso, não. Era o engenheiro, era a gente mesmo. Era eu mesmo que marcava onde ia passar a rede. A distância dos postes, igual à margem da rodovia, por exemplo, tinha que ser um metro, um metro e meio distante da cerca. Da rodovia e ali, a gente mesmo é que fazia os alinhamento, marcava, passava. Quando tinha que passar em terra dos outros, alguma fazenda dos outros, aí a gente passava sem ordem, muitas vezes tinha que arrancar os postes de novo porque eles não aceitavam.

P/1 – Já aconteceu isso?

R – Aconteceu. Para o lado de Patos de Minas aconteceu isso.

P/1 – E o que houve lá?

R – Eles passaram poste em fazenda sem pedir autorização. Inclusive, o Olegário teve que ir em uma fazenda para resolver problema lá com fazendeiro. Nós atalhamos a rede na terra dele, no meio de uma roça que ele tinha, e ele achou ruim. E o homem, acho que era muito valente. Olegário foi lá, com muito medo, conversar com o homem, mas depois resolveu. Muitas vezes, as estrada muito cheia de curva, né? Tinha lugar que, às vezes, a gente tinha que atalhar, senão a rede ficava muito, muito torta, muito cheia de curva.

P/1 – Mas não chegava a ultrapassar a cerca, não, né? A cerca...

R – Ah, tinha lugar em que eu ultrapassava, né? Às vezes, no caso igual foi essa lá, lá perto de Lagoa Formosa, essa nós tivemos que ultrapassar a cerca e atalhar porque a rodovia fazia uma curva. Depois voltava e, além disso, tinha um mato, uma mata fechada na beira da rodovia, então nós passamos por trás daquela mata. Só que eles tinham que ir lá, conversar primeiro, pedir autorização do homem. Eles deixavam tudo por conta da gente, a gente chegava e...

P/1 – Iam pelo caminho mais prático?

R –Vê o que que vai dar. (risos) Começar... Às vezes tinha que roçar, aquelas regiões. Que tinha umas regiões aqui, do Triângulo Mineiro para baixo, não tinham problema, não. Você roçava, ninguém falava nada. Mas para esses lado de Alto Paranaíba, aí... Nossa, se você cortasse um raminho de terra de um lá, eles achavam ruim mesmo. Não podia cortar nada. Agora, quando passava uma rede sem fazer a picada, não tinha como.

P/1 – E como é que se resolvia esse impasse?

R – Ah, depois o chefe ia lá, conversava com o dono e eles se entendiam, né? No fim, concordavam, né?

P/1 – O senhor falou que não tinha projeto, o senhor era... Os líderes de equipe eram os próprios engenheiros. Como é que o senhor sabia o rumo certo? Tinha medição, trabalhava com aparelho?

R – Não tinha nada, era tudo no olho mesmo. Você pegava uma reta, por exemplo, e aí ficava bom, né? Qualquer engenheiro que fazia um alinhamento daquele... (risos) A gente apanhou prática assim, para aprumar os poste e fazer o alinhamento.

P/1 – Mas, como é que... De onde é que o senhor tirava a garantia que a direção estava correta?

R – Ah, porque era sempre às margem de rodovia, né? A gente pegava também pela rodovia, quando ainda não tinha a cerca. Porque muitas das rodovia novas ainda não estavam, não tinham cerca. Então a gente media do centro ali da rodovia até lá, onde ia ser a cerca, para a gente fincar o poste.

P/1 – Quanto de distância era preciso?

R – Ah, depende da rodovia, né? Alguma vez dava 45 metros do centro lá na cerca, outras vez, menos.

P/1 – Senhor Rivalino, nós vamos precisar trocar a fita de novo, só um minutinho, por favor. Seu Rivalino, como é que era... Como é que o senhor decidia? Enfim, o alinhamento era seu, a direção o senhor mesmo que decidia. Mas como é que era uma boa linha montada? Como é que era uma linha padrão, que distância tinham os postes, como é que se pregavam os fios, como é que funcionava isso?

R – Era, os poste eram, era a distância.... Nessas rodovias, essas redes de linha física eram... A média era de oitenta metros de um poste no outro. Algum lugar, às vezes, punha de menos quarenta metros, outros sessenta metros, era essa média. Eram quarenta, sessenta ou oitenta metros. Mais de oitenta, não. Não podia. A não ser, às vezes, em algum lugar montanhoso, por exemplo. Às vezes dá um poste aqui, depois tem aquele muito baixo, aí para pôr o poste lá no alto, talvez aí a distância tinha que ser mais um pouco. Agora, o alinhamento, por exemplo: a gente fincava um poste primeiro ali, na medida certa, fincava; aí fincava o outro segundo; aí já a gente já fazia a base, que nem entrando para o lado da rodovia, nem saindo para o lado do mato; então a gente ia com os balizas. A gente cortava umas varas, umas varas certinhas e balizava primeiro. A distância ia com as vara balizando, fincado pondo elas todas em um alinhamento certinho. Aí depois, é que vinha furando os buraco e pondo os poste. Então, com os poste de trilho se tornou mais fácil porque eles eram retinhos, né? Já com os de aroeira, às vezes, o poste era muito torto, né? Você punha o poste lá, o pé dele ali está certo alinhamento, mas talvez a ponta já saía fora.

P/1 – Isso era problema para...

R – Não, ficava mais feio, né? Ficava uma rede feia.

P/1 – Esses postes de aroeira ainda... Vamos falar primeiro das aroeiras e depois dos trilhos. Eles tinham que ser enfiados na terra em que medida?

R – Os que eram de sete metros, por exemplo, a gente fincava um metro. Agora, os mais compridos de nove metros, aí já era de um metro e trinta, um metro e quarenta acima. Dependendo do comprimento do poste fincava mais fundo.

P/1 – Quando tinha que ultrapassar, por exemplo, uma capoeira lá, aí tinha que abrir a picada...

R - Tinha que abrir a picada primeiro. Primeiro, abria a picada... Primeiro de tudo, era roçar né? Fazer a picada, né? Aí depois é que vinha fazer o balizamento com aquelas varas, as balizas, para depois fincar os poste. Para não sair fora, né? Se não você começa, vai reto e, às vezes, uns dez poste... Às vezes é um lugar que tem uma reta igual essas rodovias. Por exemplo, quem tem lugar, que casebre que some de vista. Mas, às vezes, você começa ali, você finca uns dois... Um poste fora, você consegue pôr ele, vai fugindo, vai fugindo do alinhamento.

P/1 – Quer dizer, a função dessas balizas era…?

R – Era não sair fora do alinhamento.

P/1 – Entre um poste e o outro, o senhor fincava quantas varetas?

R – Não, era só no local do poste.

P/1 –Ah, só no local do poste?

R – É, no local do poste. Onde fincava a baliza certinha, ali vinha furar o buraco. Tinha que ser, aquela baliza era o centro do buraco, né? Aí tinha que furar o buraco ali. Ela ficava no centro.

P/1 – E como é que tirava alinhamento das balizas, era no olho?

R – Era no olho. A gente ficava aqui, por exemplo, e mandava uma pessoa na frente para fincar a segunda. Depois, a gente mesmo já ia. Por exemplo, se eu começava daqui para cá, aí eu ia, começava aqui e ia pulando a baliza.

P/1 – E como é que o senhor distribuía o trabalho da sua equipe? Quer dizer, um pessoal balizava, outro furava, quem que carregava os postes?

R – Na hora de carregar os postes, juntava todo o mundo. Carregar poste... Tinha poste que, para levar ele lá no local de fincar, tinha que juntar todo mundo. Muitas vezes tinha até que arrastar, que não dava conta de carregar. Poste muito pesado, lugar muito acidentado, cheio de morro, cheio de buraco. Tinha lugar que a gente tinha que levar poste naqueles altos de morros, lá em cima, lugar que não tinha jeito de entrar com caminhão, era levado na mão mesmo.

P/1 – Quanto pesava um poste, em média, de Aroeira?

R – Ah, depende. Eu não tenho... Acho que eram uns duzentos, trezentos quilos. Tinha mais quando era poste muito grosso.

P/1 – E aí, quando vinha um morro para subir, a equipe dava uma...

R – Era muito difícil. Igual... Eu fiz rede para lá, lado de Luz, né? Aquela Serra de Luz. Ali você conhece, né? Ali, eu finquei postes naquelas serra, naqueles morros, aquelas montanhas, tudo ali, parada de Minas. Parada de Minas indo para o lado de Pequi, Maravilhas...

P/1 – Como é que... A equipe ficava no mato lá, ficava no campo?

R – É. Nós sempre morávamos na cidade, né? Trabalhava no campo, ali na estrada, mas sempre morava na cidade. Aí, quando o serviço ia ficando longe, já levava o caldeirãozinho já com a marmita cedo. Aí já levava cedo, de manhã, a hora que ia para o serviço. O cozinheiro já tinha que fazer o almoço ali cedinho, quando a gente saía, já levava o almoço pronto. E, na hora do almoço, onze horas, esquentava lá no meio do mato mesmo. Fazia um fogo lá e esquentava.

P/1 – E não tinha nenhum perigo, bicho peçonhento?

R – Ih... Cobra. (risos) O perigo maior era cobra, né? É o que mais tinha. Graças a Deus, ninguém... Cobra nunca mordeu nenhum de nós, não.

P/1 – Cobra, marimbondo?

R – É, marimbondo... Isso era direto, né? Abelha, abelha-europa.

P/1 – E como é que fazia para evitar?

R – Ah, quando via já estava era ferroando. (risos) Aí tinha que dar um jeito de tirar, né? Fazia uma fumaça... Sempre tem aquelas pessoas que não têm medo. Enfrentava, por exemplo, abelha-europa. Aí arrumava uma pessoa, ele ia lá, tirava, cortava aquele pau onde tinha as abelhas, tirava para depois a gente passar. Agora, marimbondo… Ia roçando, a gente só via quando mandava a foice, o marimbondo ferroava nele. (risos) Não tinha jeito.

P/1 – O senhor chegou a passar por algum momento de muito risco nesse trabalho?

R – É... O maior risco que eu já passei, esse foi de atravessar o fio, o cabo no rio, Rio Paranaíba, lá na divisa de Minas com o Mato Grosso. Atravessar a rede para Paranaíba, Mato Grosso.

P/1 – O que é que aconteceu lá?

R – É. A primeira vez, quando a gente fez a rede, o rio era estreito. Aí já atravessou fácil assim. O rio era estreito, com uma canoa boa motorizada a gente deixava a bobina de cabo no barranco, pegava a ponta e levava. Mas era rápido, em um instante saía de lá e já amarrava no poste, porque senão a água ia levando. Mas, depois, fizeram a barragem para baixo e lá inundou tudo. Então ficou muito largo. Aí eles montaram uma torre do lado de Mato Grosso e a outra para o lado de Minas, que era para gente passar os cabos da rede que funcionava lá. Mas aí, a companhia que deixou essas bobinas, deixou uns cabos muito grossos, uns cabos de aço muito grossos, muito pesados. E no dia que a gente foi para atravessar esses cabos, a balsa grande que tinha lá não estava funcionando. Aí arrumaram uma lancha, uma lancha velha. Ela era grande, cabia umas vinte pessoas, mas já estava muito gasta. E nós fomos tentando. Inclusive, um dia antes, o Alexandrino e o Doutor Luiz estiveram lá na beira do rio. Eles mesmo olharam lá e acharam muito difícil. Para o resto, eles falaram: “Rivalino, vê o que você pode fazer.” Vieram embora e nós fomos tentar. Aí, nós pegamos, amarramos esse cabo para atravessar, mas quando faltavam uns cem metros para chegar no barranco de lá, nós não dávamos conta de arrastar mais aquele cabo. Quanto mais eu forçava, ele ia descendo rio abaixo. E o meu medo dela, porque ela era velha, dela arrancar uma tábua ali. Uma tábua amarrada aquele cabo, se arrancasse uma tábua, nós morríamos todo mundo afogados. Que aí ela afundava, né? Foi o momento mais difícil que eu passei, muito medo, foi dessa vez.

P/1 – Quantas pessoas tinha dentro da lancha?

R – Ah, acho que nós estávamos em uns seis dentro dela e já tinha algum do outro lado, para a que chegasse ajudar. Só que eles não tinham nada de lá para jogar para nós, para ajudar, por exemplo. Aí, o que eu fiz: a hora que eu vi que a lancha não dava conta de arrastar mais, eu soltei aquele cabo de novo e eles arrastaram para trás de novo para, depois, nós tornarmos a tentar outro dia.

P/1 – Desculpe, eu não entendi. O senhor soltou o cabo da lancha?

R – Soltou da lancha, né? Desamarrou da lancha para o pessoal que estava no barranco puxar de novo de volta, para nós deixarmos a lancha livre. Que não adiantava porque ela não dava conta de puxar mais, que já no momento que ela desceu na água, ele já afunda. Ficou muito pesado, o motor da lancha não tinha força para puxar. Puxou até uma certa distância, mas faltavam uns cem metros, não ia mais.

P/1 – Aí foi possível recuperar o cabo?

R – Foi. Aí puxou para trás de novo, enrolou ele de novo e depois é que foi pedir ajuda em Paranaíba. E aí eu já preveni muita corda porque eu já sabia. A hora que dava aquela distância, já vinha uma outra pessoa com uma canoa encontrar, né? Aí, com a corda que nós amarramos na lancha e eles ajudando, a gente conseguiu. Era para passar quatro cabos, eu passei só dois, não quis arriscar mais, não. E ficou com aquele só.

P/1 – Mas aí o senhor teve que usar a mesma lancha?

R – A mesma, era a única que tinha.

P/1 – Era um trabalho em série. Assim, um sujeito abre a picada, outro fura, outro...

R – Não, eram todas as mesmas. Quando era lugar que as companhias... As prefeituras ajudavam às vezes, a prefeitura fazia a picada primeiro, né? Aí depois a gente ia só para fincar os postes, fazer a rede. Mas tinha lugar que não. Éramos nós mesmos que chegávamos e já iamos começar. Igual de Ituiutaba para Santa Vitória. Por exemplo, cheguei, nós tivemos que começar tudo. E ali, o cerradão, lá era bravo. Tinha cada sucupira dessa grossura, tinha que cortar tudo.

P/1 – Cortar para abrir a picada?

R – É, e depois que roçava aquele mato, ficava alto assim, cortado. A gente tinha que andar no meio daqueles matos carregando poste nas costas.

P/1 – E como é que era o equipamento que o senhor usava?

R – Eram todos simples. Eram umas, umas... Soltar os fios, por exemplo, eram umas rodas, uma desenroladeira simples que eles fabricavam na CTBC mesmo, sabe? O Sebastião fabricava que nós usávamos para desenrolar fio.

P/1 – Mas calçava bota, tinha?

R – Nada, era botina. Mas não tinha... Eram essas botinas simples, “mateira” mesmo.

P/1 - Não tinha proteção.

R - Naquela época a telefônica não dava, não dava equipamento nenhum para a gente. É, bota... O certo era usar umas botas que pegassem bem em cima, para evitar cobra, né? Mas, não tinha, não. Tinha gente que a gente arrumava para trabalhar, queria trabalhar até de chinelo.

P/1 – Mas o senhor deixava?

R – Não. No primeiro dia que ele ia de chinelo: “Não, isso aí não tem condição, não.” Mas alguma vez ia de tênis. Eles, mesmo de tênis, não podiam, que se

pisasse em uma ponta de toco, machucava.

P/1 – Quando tinha um plano, o terreno era plano, o senhor garantia que a linha dos postes tinham ficado absolutamente retinhos?

R – Ah, garantia. (risos) Ficava certinho.

P/1 – E aí, evidentemente, era mais fácil, mas a distância era a mesma?

R – A distância era a mesma. Só quando a gente ia fazer uma rede, essas redes menores, é que os postes eram mais baixos, então a gente punha os vão de um poste no outro, sessenta metros. Que era para o fio não cair muito. A rede fica mais alta.

P/1 – Como é que subia neles?

R – Nós só usávamos escada mesmo. Nos poste de aroeira, de madeira, era escada, e nos poste de trilho a gente usava espora para subir.

P/1 – Tem que explicar duas coisas. Quer dizer, no poste de aroeira era escada, então além de abrir picada, além de balizar, além da madeira, tinha que carregar escada ainda?

R – Tinha que carregar a escada também, só usava a escada. Existia espora para poste de madeira, mas na Telefônica não tinha, só usava escada mesmo.

P/1 – E quando os senhores começaram a usar o poste de trilho, o que é que isso significou no trabalho do senhor e da sua equipe?

R – Ah, é. Melhorou o serviço, parece que rendia mais, né? Quando você pegava um trecho reto, por exemplo, que a terra não é muito dura. Então rendia muito. Os poste de trilho eram mais fácil de trabalhar. Eles já vinham furados, era só colocar a cruzeta e aparafusar. Já o de Aroeira, não. A gente tinha que furar ele para colocar a cruzeta. Quando era cruzeta, muitas vezes... No início, as primeiras redes, era... Só colocava um isolador de um lado e outro de outro, roldana de um lado e do outro. Então tinha que furar um buraco de um lado, um buraco do outro, além de furar buraco já para a cruzeta porque o dia que fosse...

P/1 – Já deixava pronto?

R – Já, colocava a cruzeta já estava pronto. Não seria preciso de furar depois dele fincado no alto.

P/1 – Isso fazia lá no local?

R – Era no local.

P/1 – Que equipamento usava?

R – Para furar… Para o parafuso, para cruzeta, é trado, a gente usava um trado. É tocando... E para parafusar a mão francesa da cruzeta em baixo, era o arco de pua.

P/1 – Arco de pua?

R – É.

P/1 – Como é que é o arco de pua?

R – Arco de pua, você coloca a broca nele ali, aperta, você firma ele aqui e roda ele. É o arco de pua.

P/1 – Seu Rivalino, com a chegada dos trilhos, embora tenha ficado mais prático, o peso deles era menor do que o peso da aroeira?

R – Não, os postes de trilho eram melhores para carregar porque eram retinhos. Então a gente carregava de quatro: dois de um lado e dois de outro nas ponta dele. Aí o meio ia balançando porque ele é mole, mas era mais prático, você forrava bem o ombro. E tinha que forrar bem porque, com o sol quente, eles ficavam, os postes ficavam no chão, ali ficava igual a um forno, não aguentava pegar eles, esquentava tanto... Tinha que forrar até para pegar neles, você tinha que arrumar um forro, um trem qualquer. Você pegava e forrava bem o ombro e ia para o mato afora. O que era mais alto sofria mais. O peso ficava em cima dele. A hora que dava naquela lombada, tinha hora que o peso ficava em cima só de um, outrora do outro, era mais fácil. Já o poste de aroeira, ele é muito torto, cheio de curva, então era muito difícil de carregar ele.

P/1 – E quando saía para carregar um poste até o lugar da cova dele, ia direto ou o pessoal pedia: “Olha, pára um pouquinho.”

R – Não, ia direto. Tinha que ser direto. Tinha lugar que a gente carregava poste aí, uns até quinhentos metros. Eu fiz uma rede de cabo de Paranaíba indo para São Gotardo: só tinha marca onde ia ser a rodovia, a rodovia nova que eles iam abrir. Então, já tinha as marcas ali da rodovia, então eu tinha que seguir aquelas marcas já para fazer a rede já no local, que a hora que fizesse a rodovia, a rede já estava lá na beira da... Mas, aí eu... O caminhão ia levar poste para nós, deixava na estrada velha, aí eu tinha que caçar aquelas estradinhas de fazenda. Entrava punha uns poste em cima do caminhão que eu trabalhava, deixava uma certa distância ali, aí eles já pegava, os poste e carregava, pela picada afora, dobrava o espigão, carregava muito longe.

P/1 – E o pessoal não reclamava não?

R – Ah, reclamava bastante naquela época. Hoje em dia não arranja gente para fazer uns tipo de serviço daquele mais não, né? Mas, naquela época, o pessoal era muito bom de serviço. Emprego muito difícil, né? A maioria das pessoa, de toda a gente, assim quase analfabeto, né? Não tinha um emprego bom, então era obrigado a enfrentar aquilo.

P/1 – Era obrigado a ser forte também, né?

R – Tinha que ser forte. Fraquinho não aguentava, não.

P/1 – O senhor chegou a ver gente assim, que desistiu no meio do caminho?

R – Ah, tinha muitos que começava assim: trabalhavam uns três dias e não voltavam mais. Agora, tinha aquela turma que acostumou. E quando já tinha uma turma já acostumada, já treinada, era bem mais fácil. Já estava com os ombros calejados. Aí aguentava serviço.

P/1 – Cria calo no ombro?

R – Cria, criava calo no ombro. Ixi! No início era difícil, que as pessoas... Era o ombro muito dolorido. Você pegava um poste daquele ali de dois, por exemplo, mas sempre, às vezes, pegava mais um pouquinho em um do que no outro. Nunca pegava igual, porque se pegasse o peso igualzinho, se você andasse assim, no asfalto, certinho... Mas na hora que saía no mato, aí já uma hora... Um estava lá embaixo, outra... Aí já fica difícil. Então, no início, o ombro era muito dolorido… Essa pessoa que estava ______________. Se não tivesse muita opinião, firmeza, não aguentava, não.

P/1 – O senhor tinha folga de quanto em quanto tempo?

R – Nossa, rapaz, trabalhei cinco anos na CTBC sem tirar férias, direto. E a gente, naquela época, sempre trabalhava um fim de semana e o outro não. Sempre quando eu estava, que sempre era longe. Então, naquela semana que eu estava no local, a gente trabalhava no sábado o dia todo, e tinha dia, às vezes, que a gente trabalhava até no domingo, até o meio-dia. Isso era direto. Depois trabalhei cinco anos sem tirar férias desse jeito. O dia que vinha em casa, muitas vezes quando a gente estava trabalhando longe, igual na época para o lado do Pará de Minas, já tinha que ficar na beira da rodovia à noite, o dia de eu vir embora esperando o ônibus que vinha de Belo Horizonte. Mas, na maioria das vezes, ele já vinha cheio. A gente vinha em pé à noite de... Muitas vezes eu vim de Luz até Uberaba, outras vezes até “Bate O Sino”, em pé no ônibus que não cabia. Isso foi muito desgastante. Isso foi muitos anos assim.

P/1 – Só para matar a saudade de casa?

R – Ah, tinha que vir, tinha família. A mulher que ficava cuidando dos filhos. Meus filhos foram educados, mas quase só com ela, porque naquela época que eles eram pequenos, eram meninos, eu trabalhava só fora, vinha para casa de quinze em quinze dias.

P/1 – A mulher não reclamava?

R – Ah, reclamava, coitada, mas fazer o quê? Se saísse, não arrumava outro emprego.

P/1 – E nessas folgas dava tempo para relaxar um pouco?

R – Não. Descansava nada. A gente cansava mais porque as viagem, desse jeito, cansam muito mais. A gente, vinha às vezes chegava em casa no sábado de madrugada ou cedinho. Que naqueles ônibus que vinham de Belo Horizonte, a gente chegava cedinho. Tinha vezes que chegava em Uberlândia, que eu morava em Araguari naquela época, e ainda tinha que esperar cedo para ter o primeiro ônibus que ia de Uberlândia a Araguari. Tinha que ficar na rodoviária até aquela hora. Aí ficava em casa o sábado, domingo, e domingo à noite já tinha que pegar o ônibus de novo de volta para, quando fosse segunda cedo, já estar lá no serviço. Porque, se não tivesse, o pessoal ficava todo a toa lá, eles não trabalhavam enquanto eu não chegava.

P/1 – Está certo. O senhor falou dessas dificuldades toda de estender rede, o que é que era uma boa, uma boa performance, um bom resultado para se estender uma rede no plano? Por exemplo, quantos metros ou quantos quilômetros, o senhor... Quantos postes o senhor fincaria?

R – Por dia?

P/1 – Por dia.

R – Ah, isso aí é igual eu te falei, depende. Quando é lugar da terra macia, esses terrenos arenosos, era muito bom de furar buraco. Em um instante furava um buraco, então você fincava trinta, quarentas postes, até mais. Mas, conforme o lugar, às vezes não chegava nem isso, nem à metade. Porque o trabalho tinha para furar um buraco até chegar na fundura de fincar um poste, dava um trabalhão danado. Lugar, às vezes, de muita pedra, terra muito dura, é difícil. Tinha lugar que o serviço rendia e muito, sabe? Igual, por exemplo, quando eu fiz essa, para o lado de São Gotardo, depois de São Gotardo a Campos Altos, depois de Campos Altos a Luzes, até _____________. Lá o serviço rendia muito. É um local bom de trabalhar, tanto para fincar os postes quanto para puxar os fios depois. Então rendia muito esse serviço. Quando chegava à tarde, você tinha feito um servição.

P/1 – Nessa linha, por exemplo, o senhor demorou quanto tempo para botar a área em pé?

R – Ah, eu não me lembro quanto tempo, não. Devem ter sido uns seis, oito meses, mais ou menos.

P/1 – Seis, oito meses. O pessoal lá esperando seis meses para falar no telefone?

R – É, em algum lugar eles já tinha colocado aqueles DHF, . Aquilo era muito ruim também, era pior do que a linha física ainda, mas algum lugar, às vezes, já falava. Eles falavam lá um dia, dois. Ficava três, quatro isolado, aí com a linha física... A linha física, pelo menos assim, quando... Era só quando caía raio, essas coisas, que ela parava, mas funcionava bem. Essas redes novas que nós fomos construindo depois, eram muito boas, funcionavam muito bem. E além de... A gente puxava linha, a linha física, e eles colocavam equipamento nela que, às vezes, em um circuito de linha, transformava em doze circuitos, então podia falar duas pessoas de uma vez. Então foi melhorando bastante. Muitos lugares que não tinham comunicação para lado nenhum, nós fomos levando rede, passaram a comunicar com o mundo.

P/1 – Certo. Mas, na verdade, era um equipamento para duplicar a capacidade da linha física?

R – É, é.

P/1- E se aplicava na própria linha?

R – Aplicava na própria linha, né? Você puxava uma linha, por exemplo, que eram dois fios. Então, em cima daquelas linhas, eles colocavam um equipamento nelas que transformava, aumentava a capacidade das linhas. Então, com uma linha daquela, com um circuito daquela transformava ela em muitos.

P/1 – Sim. E esse equipamento estava em todos os postes?

R – Não, você usava em cada... Por exemplo, aqui na CTBC, usava na CTBC e usava... Por exemplo, no local que tinha ela igual. Tinha lá em Itumbiara. Tinha na ponta da linha aqui na CTBC e na ponta da linha lá, em Itumbiara.

P/1 – Central a central?

R – É. Isso era do DG em DG, né?___________________.

P/1 – Seu Rivalino, vou só trocar a fita para a gente finalizar. O senhor falou que liberava a equipe, era responsável, enfim, pela construção das linhas físicas, mas de quem que o senhor recebia as instruções assim? Quem que falava assim: “Aqui que o senhor tem que pôr aqui, ali…”?

R – Não, assim... Lá no local de serviço?

P/1 – Para chegar no local. Antes de chegar no local, quem é que chegava?

R – Não. Por exemplo, você... Eu sempre estava aqui em Uberlândia, então o Alexandrino mandava: “Você vai, sai para Parada de Minas. Vai construir uma rede de Parada de Minas para Pequi, né? Maravilha.” Mas eles não iam lá para falar onde você vai passar a rede.

P/1 – Ah, não?

R – Não. Eu que tinha que ver por onde eu ia passar a rede. O local mais fácil. Quando não era rodovia, eram essas estradas simples, que não era... Então a gente procurava pôr o mais perto da estrada possível os postes.

P/1 – Para o caminhão poder levar?

R – É. Porque o lugar que já tinha rodovia, já tinha a cerca, já tinha tudo. Então aí já tinha. Agora, quando não tinha igual... Por exemplo, eu fiz de Iturama até Paranaíba, fincava os poste na beirinha da estrada, sabe? A prefeitura primeiro fez a picada beirando a estrada, que é a estrada estreitinha, que lugar que para você cruzar um caminhão com outro era bem difícil. Então a gente já aproveitava o máximo de bem perto. Para ficar mais fácil para a gente. Então era assim. Construía assim. Só quando tinha rodovia que a gente tinha que obedecer aquela distância do centro da rodovia, a faixa. Agora, quando era uma estrada simples, aí não. Aí a gente punha onde a gente visse que dava certo. Se era uma estrada muito cheia de curva, a gente ia atalhando. Mas sempre assim, sempre margeando a beira da estrada. Era mais fácil para trabalhar e mais fácil para, depois, olhar a linha quando tivesse defeito. Era mais fácil.

P/1 – Como é que funcionava o apoio para a equipe? Quem levava suprimento e equipamento quando o senhor estava precisando de alguma coisa?

R – É, quando eu precisava… Quando eu estava precisando de material, ligava aqui em Uberlândia e eles mandavam. Agora, lá era eu que me virava, eu que arrumava os peões para trabalhar. Se não prestasse, eu mesmo dispensava. O pagamento deles, no fim de semana, eu passava, passava o ponto aqui para Uberlândia. Esse só passava para cá, onde eu tivesse, tinha que passar para cá. Aí passava o nome de todos, os dias que trabalhavam, as horas extras, que nós fazíamos muita hora extra. Depois é que eles mandavam o pagamento para eles.

P/1 – O senhor passava por telefone?

R – Era por telefone.

P/1 – Essa linha que o senhor estendia já dava para o senhor falar?

R – É. Assim que a gente ia construindo, já ia deixando ela ligada. Se eu começasse ela no Cabo de Paranaíba, por exemplo, ela já ficava ligada no Cabo de Paranaíba. Então eu já tinha aqueles pontos que, no dia, se eu precisasse ligar, eu vinha ali e ligava lá da estrada.

P/1 – E esse controle que o senhor fazia da equipe, de hora extra, de pagamento e tudo mais, era o senhor mesmo que fazia?

R – É, eu passava para eles, eles mandava para mim, né? Já o envelope de cada um, ia na minhas mãos. Aí, eu que passava para cada um deles e eles assinavam a folha. Já ia um para cada um assinar, assinava e devolvia.

P/1 – Mas essa anotação anterior... Quer dizer, esse controle anterior era o senhor que fazia?

R – Era eu, eu fazia.

P/1 – O senhor tinha um livro? Como é que era? Um diário?

R – É, tinha um caderno. Eu já anotava o nome de cada um e, todo o fim de semana, a gente passava. Já passava na sexta-feira. Sexta-feira à tarde, a gente já passava. Funcionava bem.

P/1 – Aí alguém de Uberlândia encontrava o grupo lá para fazer os pagamentos, é isso?

R – É, depois eles mandavam pelos malotes, né? Aí eles chegavam lá e já era entregue para mim mesmo, e era eu quem fazia o pagamento para eles no local.

P/1 – Responsabilidade, um montão de dinheiro na mão?

R – Muita responsabilidade. E aguentar as choradeiras. (risos) Tinha aquelas pessoas que às vezes falhavam, depois achavam ruim a gente descontar o dia. Mas são essas complicações. Às vezes a gente passava as horas extras, às vezes eles não pagavam todas. Aí a reclamação toda vinha pra cima de mim. Se precisasse casa, por exemplo, era tudo na minha responsabilidade, eu que tinha que alugar a casa para nós ficarmos, fazer o pagamento, pegar os recibos para depois. Quando eu vinha aqui pra Uberlândia, é que eu ia acertar. Aí eu ia acertar na CTBC.

P/1 – O senhor tinha que fazer tudo isso e, nas folgas, no meio tempo, ainda fincar poste?

R – É.

P/1 – Certo.

R – Quando já estava essa turma mais prática, aí, às vezes, eu ficava mais por conta de aprumar o poste. Você levantar um poste para por no prumo, tudo certinho. O alinhamento da cruzeta certinho. Então já ficava mais por conta disso. Já tinha mais alguém que já praticava, sempre aparece alguém assim, mais inteligente, que já ajuda a gente muito. Nesses pontos já ficava mais fácil. Aí não precisava mais ajudar a carregar poste, não precisava do fura-buraco. Já não é igual quando ia trabalhar fora. Por conta de prefeitura, muitas vezes, eu tinha também que furar buraco, levantar os postes porque eles não davam conta, não tinham prática.

P/1 – Certo. Para fazer esses alinhamentos tinha alguma técnica especial?

R – Não é só ter um bom olho, né?__________________: “Esse negócio está fora do prumo, né?” (risos) Pode chegar no olho assim, a gente vê. O Alexandrino para isso era bom também, no olho. Se a gente fincasse um poste, se ele chegasse assim, se ele tivesse meio fora de um prumo, um pouquinho, ele olhava: “Ah, esse poste está fora do prumo. Pode aprumar ele direito.” (risos) E no alinhamento também, ele era bom. Ele chegava, se a gente fizesse errado, ele chegava, ele batia o olho e falava: “Não, isso está errado, está fora do alinhamento.”

P/1 – E aí?

R – Tinha que corrigir. (risos)

P/1 – Ele costumava ir lá?

R – Ixi! Ia direto, o Alexandrino. O Alexandrino ajudava a gente até levantar poste, fincar poste. Ele ajudava. Você ia carregar um caminhão, ele ajudava. Ixi! O Alexandrino agarrava mesmo. O Doutor Luiz também. O Doutor Luiz ajudou até a puxar fio um dia, ele e o José Leonardo, o cunhado dele. Nos ajudou a puxar uns fios na estrada, sabe? A turma já não estava dando conta porque já estava ficando pesado e ele foi lá na frente, agarrou com eles e ajudou até acabar o rolo de fio. Ele tinha que puxar até acabar aquele rolo de fio. Eles ajudava também. Não tinha esse negócio, não.

P/1 – O senhor disse que tinha que acabar o rolo de fio, não podia sobrar?

R – É, a gente põe um rolo de fio, então puxava ele até acabar. Aí puxava para até não torcer, não precisar ficar cortando ele, fazendo emenda. Mas, quando pesava demais, muitas vezes, aí não dava, o jeito era cortar mesmo. Às vezes a gente estava com pouca gente. Porque foi ficando muito difícil depois, que depois foi surgindo mais emprego, muitas barragem, então foi ficando difícil arrumar gente para trabalhar na CTBC nessas rede. Aí a gente já não arrumava fácil, a gente trabalhava com muito pouca gente.

P/1 – O pessoal ia para as barragens, era isso?

R – O pessoal ia para as barragem, pagavam mais bem essas barragem. E a gente não arrumava gente para trabalhar, não. Tinha lugar que a gente chegava, era muito difícil arrumar gente para trabalhar.

P/1 – O senhor falou dos postes já agora, pensando em poste de trilho. O senhor falou que usava espora para subir no poste de trilho, como é que funcionava isso? Espora?

R – Espora é o tipo de uma braçadeirinha, que o trilho tem aquele vinco de um lado e do outro assim, né? Então a espora pegava ali naquele vinco, firmava, encaixava ali e punha o peso no pé, aí ela firmava ali, e subindo. Subia até sair lá em cima. Era muito prático, era muito melhor do que carregar ele, as escadas no meio dos matos.

P/1 – E não tinha perigo de ninguém despencar lá de cima?

R – Ah, de vez em quando acho que alguém despencava. (risos) Chegou a cair algum alguma uma vez, mas não machucou nada grave, não.

P/1 – Tinha algum?

R – Escorregava às vezes, ele não era muito prático. Às vezes ele vinha, _______________, a espora escorregava e os braço não resistiam ao peso.

P/1 – Teve alguém que se machucou muito com essa ____________?

R – Não. Assim, com cair do poste, não. Comigo que acidentou uma vez, mas foi com choque. Choque de alta tensão.

P/1 – De alta tensão?

R – É. Porque nós fazíamos essas rede de fio nu. Entrava dentro da cidade cruzando com as redes de energia. Então o maior perigo dessas rede era esse. Então a gente entrava. No caso, igual dessa vez, foi em Franca, no Estado de São Paulo. A companhia desligava a energia para a gente passar os fios. Na hora que ia arrastar os fios em cima das cruzetas, desligava. Aí, depois que passava, a gente esticava os fio, os fio levantavam, aí eles ligavam a energia de novo. Mas a alta tensão, não, aquela ficava ligada. E lá, sempre tem alguém descuidado. Já o pessoal lá em cima do poste, trabalhando, regulando e amarrando os fio. Em um desses, distraído, pegou, suspendeu o fio com bambu, e era em uma travessia de rua, encostou aquele fio na alta tensão. Aí, eram três que estavam lá em cima dos postes, queimou as mãos tudo, as pernas, poste de ferro, né? Em cima de um poste de ferro, em um encosto de energia, era fatal. Sorte que ninguém morreu.

P/1 – Mas caíram, não se machucaram?

R – Não, eles ficaram presos lá em cima, que eles subiam, esgarranchavam em cima da cruzeta, que as cruzetas eram compridas, as cruzetas de dois metros e meio. Então a ponta dela ficava muito longe. Para uma pessoa pequena, por exemplo, ele subia, esgarranchava, mas o braço dele, para ele alcançar lá na ponta e amarrar aquele fio, ficava difícil. Então eles esgarranchavam lá em cima e ficavam para chegar mais perto, onde ele caiu. Tinha um que era meu sobrinho, esse desmaio lá em cima, ficou desmaiado lá em cima. Só depois que eu subi para tirar ele, que eu vi que ele estava vivo. Senti que o coração dele estava batendo. Aí nós descemos ele. Era bem perto do hospital e não morreu, não.

P/1 – Deus me livre, Seu Rivalino.

R – Ixi! Era muito perigoso. O perigo dessas linhas físicas era mais esse. Que o pessoal de, de... Igual a CEMIC, por exemplo, se eles vão mexer em uma rede, eles sabem que ali é energia. Então eles desligam e vão com cuidado. Agora, nós não. Nós entrávamos na rede, por exemplo, vem a rede de linha física até a porta da CTBC, descia na Machado de Assis e vinha até a porta da CTBC. Tinha outros que vinham do lado da avenida Goiânia, vinham até a porta da CT. Então vinha cruzando muito fio de energia. Se eu tivesse em cima de um poste trabalhando, um caminhão batesse num poste de energia e o fio caísse em cima, atingia a gente. O próprio raio mesmo. E se você estava trabalhando em uma rede e cai um raio lá no Monte Alegre afora, atingia a gente que estava aqui mesmo.

P/1 – É complicado, Seu Rivalino. Aí chegou um momento em que essas linhas físicas já não fizeram mais sentido, né?

R – Não. Aí foi acabando, o povo começou a roubar os fios, foi vindo o microondas, essas linhas, esses rádios. Começou em Patos, por exemplo, mas lá em Patos fez uma rede, eles montaram uma torre lá no alto, fora da cidade. Então tinha que descer linha física, fio nu lá da torre, até a CTBC. Aí ia no alto até na torre, mas depois pegava os fio para a CTBC. Mas aquilo acho que não deu muito certo, dava problema demais, foi acabando, foi melhorando, aí foi.

P/1 – Dava problema, no caso, mais no rádio do que no fio?

R – É, o rádio também parece que estava em fase de teste ou dava muito problema também, mas o fio também dava porque não combinava, né? Assim, por exemplo, combinar, ligar para ele passar de um rádio para uma linha física, aí já dava muita interferência, muita confusão. Acho que é onde não funcionou bem.

P/1 – Seu Rivalino e esses rolos de... É fio de cobre, né? É um metal valioso, é isso que…?

R – É, eles começaram no cobre, depois passaram a roubar o alumínio também. Acabou. Acho que não existe mais. Por fim, eu estava trabalhando já assim, já em manutenção. Ainda tinha bastante linha física aqui ainda que eu olhava. Muitas linhas de fazenda, acho que até aquela depois que eu saí, acho que foi, acabou tudo.

P/1 – Quer dizer, aí, quando já não fazia mais sentido construir linha física, o senhor partiu para... O seu trabalho passou a ser…?

R – Passei a trabalhar só aqui em Uberlândia.

P/1 – Aí o senhor veio para a cidade?

R – É. Aí eu não viajei mais.

P/1 – A sua esposa deve ter ficado muito feliz.

R – É. Achou bom.

P/1 – E os seus filhos também.

R – É. Que a gente estava em casa todo dia, né? Aí eu morei alguns tempos em Araguari, vinha e voltava, mas estava ficando difícil, mudei para cá.

P/1 – Aí o senhor veio para cá em definitivo quando?

R – Eu acho que foi em 1983.

P/1 – E o senhor ficou na companhia até quando?

R – Eu aposentei em 1994. Saí da CTBC em 1991, trabalhei três anos na ENGESET [Engenharia e Serviços De Telecomunicações]. Aí aposentei.

P/1 – O senhor saiu da CTBC por conta de quê?

R – Que a CTBC acertou com todo mundo, né? Foi acabando, diminuindo os quadros de funcionário, mas aí passou para ENGESET, que era a o mesmo grupo. Quer dizer que a gente saiu, por exemplo, acertou na CTBC hoje, amanhã já começou na ENGESET. Só mudou de firma.

P/1 – Então, o senhor não foi demitido para ficar desempregado, não?

R – Não.

P/1 – E na ENGESET o senhor fazia o quê?

R – O mesmo serviço: era manutenção de rede, linha física, olhava telefone rural.

P/1 – E essas linhas físicas, o senhor chegou a trabalhar em linhas que o senhor tinha construído?

R – Trabalhei. Trabalhei em muitas que eu tinha construído.

P/1 – Estavam firmes e fortes lá?

R – Ah, isso aí, iam apodrecendo as cruzetas, os isoladores iam quebrando, a gente sempre tinha que estar dando manutenção. O povo já começou a ir roubando fio. O lugar que eles roubavam o cobre, a gente já punha alumínio e já foi modificando.

P/1 – O senhor falou, em um momento da conversa, que os postes de trilho eram mais fracos, chegava a tombar.

R – Não, era mais fraco assim, com o vento, quando davam essas ventanias muito fortes, derrubavam muito porque pesavam muito, que eles são finos. Então, eles no sentido assim, por exemplo, já são mais fortes; mas no correr da linha eles eram mais fraco, eles envergam à toa. Então, as cruzetas cheias de fio, ficava muito pesado, né? Se pega um vento forte de lado, se quebrasse um poste, cedesse, os outros iam todos cedendo. Acontecia de caírem muitos postes assim, de uma vez. Uns quebravam, quebrava em três pedaços, outros só entortavam. Era difícil por isso, mas era melhor que de aroeira, porque aroeira caía muito raio também. Nessas linhas que são de poste de aroeira, caía raio assim, de estourar muitos poste de uma vez também, às vezes.

P/1 – Aí ficava uma cidade sem comunicação?

R – Aí a gente tinha que trabalhar quase dia e noite, até pôr para funcionar. Um circuito que parava daqueles, parava doze. Igual tinha uns equipamento ligados neles. Ixi! Tinha que pôr para funcionar logo. Aí passava uns fio provisório, esses fios encapados que usam na cidade, esses fios drop. Então, quando ela caía, a gente ia... Aquele trecho que caía, caíam os fio, arrebentava tudo, embaraçava. A gente isolava aquelas parte e passava aqueles fio no chão mesmo para ir funcionando.

P/1 – E funcionava?

R – Funcionava. Até repor a linha de novo.

P/1 – E aí... Quer dizer, ia fazer isso em qualquer tempo?

R – Qualquer tempo. Era debaixo de chuva, de tudo. Geralmente, quando caía assim, é quando estava o tempo chuvoso. Porque o poste de trilho é, ele é... Se fizesse uma base de concreto no pé dele, então ele ficava mais forte .Mas, porque era muito fino e pesado, com o vento ele cortava a terra. A terra dele não aguentava, cedia e tombava.

P/1 – Certo. Seu Rivalino, como é que identificava onde é que tinha dado o problema? Caiu a rede onde?

R – Tinha os equipamentos. Media a própria mesa lá no DG, Centro de Distribuição. Tinha mesa, já media as distância. Se uma linha se fechava em curto, por exemplo, se encostasse um fio no outro, então media, já sabia mais ou menos a distância. Às vezes variava ali, uns quinhentos metros, um quilômetro, mas a gente podia ir, sim. Mas, quando eram muitas linhas que tinham dado defeito, tudo de uma vez, aí já podia ir sabendo que tinha era caído poste mesmo. E quando dava só em uma, só uma linha, então a gente ia saber que era uma só, mas quando parava tudo, parou tudo, já podia ir sabendo que tinha dado vento e derrubado.

P/1 – Seu Rivalino, e na ENGESET, depois desse tempo de manutenção. Era uma coisa mais urbana, era só aqui dentro da cidade, né?

R – É, mas eu não, Eu continuei na roça mesmo.

P/1 – Roça. O senhor sempre gostou de roça?

R – Olhava os telefone das fazendaS. Não é que eu gostava, não. (risos) É que eles punham para eu fazer porque eu tinha prática. Eu tinha prática na construção, que se pusesse um desses que trabalha na cidade, na rede, para sair caçando um defeito em uma linha física, eles não achavam nunca. É muito difícil.

P/1 – E a equipe que o senhor montou, essa nova equipe era…?

R – Aí, depois que... A manutenção era só eu e mais um outro companheiro, né? Nós trabalhávamos em dois. Só fim de semana que de plantão era só um. Um fim de semana eu ficava, no outro ele ficava.

P/1 – Seu Rivalino, aí o senhor se aposentou e foi fazer o quê?

R – Ah, não mexi com nada mais, não. Descansar mesmo.

P/1 – Dar atenção em casa... E seus filhos?

R – Ah, meus filhos casaram. Já casaram todos novos. Hoje em dia estamos só eu e minha esposa.

P/1 – Tem algum deles que trabalha na CTBC?

R – Não. Teve um que trabalhou, mas na área de ar-condicionado. Mas, saiu também nessa mesma época. Agora, tem dois que mora em Brasília, tem dois que mora em Araguari e tem um que mora aqui em Uberlândia.

P/1 – Como é que o senhor vê hoje, na distância do tempo, essa sua trajetória toda na CTBC? Como é que o senhor olha para trás? O senhor vê hoje, tem um celular, tem...

R – É tudo. Hoje é muito mais fácil que na época. Na época, quando eu saí, quando eu aposentei, estava começando o celular aqui em Uberlândia. Mas a gente mesmo não usava, né? Eu saía para os mato, não tinha um celular. Enquanto eu não achasse o defeito da linha, a rede que eu estava procurando, eu não tinha como comunicar aqui em Uberlândia. Só depois que solucionasse o defeito. Se desse um problema no carro antes, ficava difícil.

P/1 – O senhor usa celular hoje?

R – Não. Não uso, não.

P/1 – E o seu dia a dia hoje, como é que é? Como é a sua vida?

R – Comer, dormir... (risos) Não mexo com nada mais. Saio de casa muito pouco, só por precisão mesmo. De vez em quando dou uma caminhadinha para não ficar muito parado e é isso.

P/1 – Rever os amigos?

R – Não, os amigos não vi mais, depois que eu me aposentei. Só vi o José Simão um dia, mas nos encontramos por acaso no banco.

P/1 – Ele já falou com a gente.

R – É, o Simão começou mais tarde, não foi no início. Quando o Simão começou, a CTBC já estava bem grandinha. Agora, igual eu comecei, a CTBC não tinha nada. Era pequenininha, só tinha dois veículo a CTBC. Quando trabalhava na cidade, que eu trabalhava também em instalação, telefone, a gente saía à pé carregando a escada. A gente saía sempre de dois carregando escada, fio, aparelho telefônico, ferramenta. Tinha vez que a gente saía da João Pinheiro aqui, ia lá na ponte do ______, saindo ali para... A gente ia a pé carregando escada. Era difícil, que era só nas linhas físicas, nas estradas que era difícil, não. Setor urbano também era difícil.

P/1 – Seu Rivalino, o que o senhor diria para uma pessoa que ia começar a trabalhar amanhã na CTBC?

R – Ah, hoje... Nossa! A CTBC está tão diferente. Acho que ela emprega mais, hoje, só parte técnica, para esse serviço de rede, essas coisas. Acho que nem existe mais CTBC. Agora, as pessoas que vão começar hoje, geralmente, já têm que estudar, têm curso, então, para eles, acho que é mais fácil. (risos)

P/1 – Seu Rivalino, o que o senhor achou de ter dado esse depoimento para nós?

R – Bom... A gente lembrar, recordar as coisas que a gente fez, que a gente passou... E o tempo bom também, alguma coisa boa que tem... Muito bom. Só não sei o que vocês vão achar, né? (risos)

P/1 –

Tudo... Nós vamos achar... O senhor queria ter dito alguma coisa que não disse?

R – Não. Só isso mesmo.

P/1 – Está bom. A gente agradece muito o senhor, viu, Seu Rivalino. Foi muito bom ouvir as suas histórias e as suas lembranças.

R – Tem umas histórias simples, né? Umas coisas simples mesmo, daquela época. As dificuldades que eram… O quanto era atrasado a comunicação. Então, A gente ficava satisfeito quando eu levava uma linha, até quando chegava na cidade ali, que ligavam as pessoas... Às vezes, conseguia a primeira vez falar. Então era, era... A gente ficava satisfeito. O serviço dava muito trabalho, mas ficava satisfeito. Igual quando eu levei a rede até Paranaíba, Mato Grosso. Quando eu cheguei com ela na beira do Rio Paranaíba, então, lá, eu deixei a ponta. Estava a ponta... Estava feito até lá, só. E o Alexandrino apareceu um dia, estava morando lá no Carneirinhos, para lá de Iturama. Apareceu um dia lá, ele e o Seu João Alves. Já de tardezinha, já escurecendo, quis ir comigo à noite lá na beira do rio, lá no porto, Porto Alencastro para ele pegar, pôr o telefone na ponta da linha e falar com o Doutor Luiz aqui em Uberlândia. Então a gente está satisfeito. Quando chegava, então, com a linha na cidade, que o povo conseguia falar a primeira vez, era bom. Eu achava bom porque, também, se eu ficava naquele lugar, ficava isolado, né? Não tinha como eu me comunicar com a minha família, nem eles se comunicarem comigo. Era mais difícil, as estradas muito ruins de Iturama para baixo. Se chovesse, tinha uns locais em que a gente não passava, não tinha como passar. Foi difícil mas foi bom. Passou.

P/1 – Foi ótimo. Isso aí. Muito obrigado, seu Rivalino, foi muito legal. Essa história de construção é uma história...

Fim do depoimento.