Um Século de Desenvolvimento Industrial no Brasil: 100 anos da White Martins
Depoimento de Luiz Humberto Câmara
Entrevistado por Débora Querido e Monique Lordelo
São Paulo, 28 de outubro de 2011
Entrevista WM_HV046
Realização Museu da Pessoa
Revisado por Leonardo Sousa
P/1 – Bom Luiz Humbe...Continuar leitura
Um Século de Desenvolvimento Industrial no Brasil: 100 anos da White Martins
Depoimento de Luiz Humberto Câmara
Entrevistado por Débora Querido e Monique Lordelo
São Paulo, 28 de outubro de 2011
Entrevista WM_HV046
Realização Museu da Pessoa
Revisado por Leonardo Sousa
P/1 – Bom Luiz Humberto, seja bem vindo. Obrigada pela atenção, pela disponibilidade de nos conceder esta entrevista.
R – Obrigado, é um prazer.
P/1 – Para começar eu gostaria de pedir ao senhor o seu nome completo, local e data de nascimento
R – Meu nome é Luiz Humberto Câmara Melo. Eu nasci há algum tempo, 21 de julho de 58. Nasci em uma cidadezinha que se chama Arrifes, Portugal. Na Ilha de São Miguel. Eu vim para cá aos sete anos, por isso o meu sotaque é de brasileiro mesmo.
P/1 – E os pais do senhor são portugueses mesmo?
R – Sim. Minha mãe e meu pai são portugueses.
P/1 – Qual o nome deles?
R – Humberto de Melo Bulhões e Maria Luíza da Câmara Bulhões.
P/1 – Onde ficava Arrifes?
R – Arrifes é uma ilha do arquipélago de São Miguel, nos Açores, a Ilha de São Miguel. Arrifes é uma cidadezinha lá. É composta por sete ilhas.
P/1 – E os seus avós também eram de lá?
R – Toda a família era de lá.
P/1 – E o senhor sabe o que eles faziam?
R – Eles trabalhavam com agricultura. Plantação de chá, batata, essas coisas. Meu pai vendo que não era muito futuro, veio pro Brasil. Aí ele veio para Porto Alegre, ficou um tempo e voltou para lá. E aí casou, nasci lá e depois voltou de novo para o Brasil.
P/1 – E o senhor sabe como os seus pais se conheceram?
R – Lá na Ilha? Eles já eram conhecidos de lá. A Ilha é uma ilha pequena ele foi lá, casou e veio para o Brasil.
P/1 – E o senhor tem irmãos?
R – Eu tenho um irmão, dois anos mais novo do que eu, mas esse já nasceu no Brasil.
P/1 – Só o senhor é português mesmo. E aí quando voltaram para o Brasil voltaram para onde?
R – Porto Alegre.
P/1 – Então a infância do senhor foi...
R – É, até os 12, 13 anos eu morei em Porto Alegre, depois... Meu pai trabalhava lá. Ele tinha a função dele, tinha oficina, tinha tudo. Aí veio para São Paulo onde, talvez, o mercado fosse melhor. Ele trabalhava muito com essa parte de oficina, funilaria, pintura e ele também tinha táxis. Aí veio para São Paulo e montou uma empresa de táxi. Foi crescendo e chegou a ter 120 carros.
P/1 – E o senhor lembra da oficina? De ajudá-lo em Porto Alegre, aqui em São Paulo?
R – Em Porto Alegre eu era pequeno não ajudava. Estudava ainda, tinha 12. Eu vim para cá com 13 anos praticamente. Mas depois em São Paulo, sim. Eu ajudei, trabalhei com ele também. Estudava e trabalhava com ele.
P/1 – De Portugal o senhor não lembra nada?
R – Não, eu lembro lá a região, tudo... Eu fui e voltei lá só mais uma vez.
P/1 – Mas da infância mesmo, não?
R – Não.
P/1 – Como era a infância em Porto Alegre? O senhor ficou lá até mais ou menos 12 anos, não é isso?
R – Lá eu fiz o primário, comecei o ginásio. Mas era bem mais tranquilo. Não tinha o que tem hoje, criminalidade. Lá você brincava na rua, então não tinha muito problema não.
P/1 – Era pequena ainda a cidade?
R – Era pequena. Eu morava em um bairro um pouco afastado do Centro. Era bom morar lá. Até quando eu vim para São Paulo, eu não queria ficar em São Paulo. Eu queria voltar. Depois fui acostumando.
P/1 – E tinha mais portugueses lá?
R – Tinha. Depois vieram os meus tios, do lado do meu pai vieram todos. Da minha mãe ficaram lá no Canadá e Estados Unidos. Mas de Portugal mesmo, vieram só os da parte de pai para o Brasil.
P/1 – Os parentes da sua mãe foram para o Canadá?
R – Foram para os Estados Unidos. Para o Canadá foi só uma tia minha. Eles foram porque na época que começou a ter guerra com Angola, dois dos meus tios foram para guerra. Estão vivos. Aí minha avó para não ir o outro saiu de Portugal e foi para os Estados Unidos.
P/1 – E o senhor conheceu esses seus tios que foram para Angola?
R – Conheço. Todo ano eu vou à casa dele e a gente se encontra.
P/1 – Continua em Portugal?
R – Não, continua nos Estados Unidos. Saíram de Portugal e não voltaram mais. Teve uma época que eu também deixei de ir a Portugal porque se eu fosse eu ia para o exército. Porque estava em guerra e eu também ia para guerra, então por um tempo eu não pude ir a Portugal. Tive que pagar a taxa militar aqui no Brasil, para poder depois estar livre do exército lá também.
P/1 – Isso quanto o senhor tinha, mais ou menos, 18 anos?
R – Quando eu tinha 16 anos. A partir dos 16 anos não podia ir porque senão ia para guerra.
P/1 – E seu pai nunca mais quis voltar para Portugal?
R – Não.
P/1 – Eles ainda são vivos?
R – O meu pai faleceu, a minha mãe é viva.
P/1 – Me conta um pouco da sua infância em Porto Alegre. O senhor comentou que a cidade era pequena, mas como era a sua casa? Tinha os costumes portugueses.
R – Lá em casa... Em Porto Alegre as casas eram todas de madeira. Um pouco diferente daqui. Não tinha casa de tijolo, tudo era madeira no Sul praticamente. Grande parte ainda é assim. Brincava lá na rua com o pessoal, não tinha muito. Era um ambiente até meio pobre, não tinha muitas regalias lá. Mas era um lugar bom de morar.
P/1 – A sua casa?
R – Era uma casa no padrão médio. Tinha dois quartos, tinha o quintal. Era mais o menos um terreno de uns quatrocentos metros quadrados.
P/1 – Do que mais vocês brincavam? O que mais gostava de brincar?
R – Jogar bola, futebol, não é? Lá a gente chamava tocar taco. Tudo brincadeira de criança. Rodar o pião na rua.
P/1 – E o teu irmão?
R – Ele, também, fazia a mesma coisa.
P/1 – Brincavam juntos?
R – Um pouco mais novo, mas ele tinha os amigos dele. A nossa idade é um pouco diferente. Andar de bicicleta, tudo. Era uma cidade do interior.
P/1 – E as festas de família, como eram? Tinha?
R – Tinha. Era mais aniversário porque lá a família era pequena. Só no aniversário de um e de outro se encontravam. Agora comida, doces, massas, bolo, tudo mais para o lado português. Mais a tradição.
P/1 – E as danças? Vocês...
R – Não praticávamos não.
P/2 – A língua permaneceu dentro de casa?
R – O dialeto sempre continuava, não é? Meu pai e minha mãe falavam. Tinha amigos meus que não entendiam minha mãe, meu pai. Mas isso é difícil mudar. Mesmo o sotaque deles, até hoje é o mesmo. Até hoje tem gente que não entende a minha mãe falando. Porque o pessoal de Portugal, do continente, tem uma maneira de falar, nas ilhas é diferente. Às vezes o pessoal não entende muito bem o outro falando. Mas é português, não é?
P/1 – Mas o senhor pegou o sotaque brasileiro mesmo.
R – Eu até misturei porque morei em Porto Alegre, trabalho em São Paulo, trabalho em Minas, trabalho na Bahia. Então já misturou tudo. Nem sei mais se eu sou, o que eu sou. Uns já falam que tenho sotaque mineiro. É que eu já falo mais tranquilo, mais devagar, então já misturou um pouco. Por que no Sul já é mais rápido.
P/1 – Em Porto Alegre o senhor chegou a ir para escola?
R – Sim.
P/1 – O senhor lembra essa sua primeira escola, como era...
R – Lembro. Escola de pavilhão grande, no meio do mato, não havia muitas casas perto.
P/1 – E como o senhor ia para lá?
R – Ia a pé.
P/1 – Junto com o seu irmão?
R – É. O meu irmão estava numa fase diferente, mas mais para frente a gente até ia junto. Às vezes eu estudava de manhã e ele à tarde. Minha mãe no começo levava, mas depois a gente ia porque era perto.
P/1 – Não andava muito?
R – Não andava muito não. Mais ou menos um quilômetro, era perto. E lá é sempre mais frio do que aqui. Às vezes você saía e tinha gelo na grama e tudo, então era a diferença de São Paulo. Mas era bom lá. Era bom morar em Porto Alegre.
P/1 – O senhor chegou a pegar alguma geada?
R – Sim, pegava bastante. Lá em julho é muito frio. Hoje parece até que está menos frio do que era antigamente. Mas até as folhas, tudo.
P/1 – E aí não dá para jogar bola?
R – Até brincava, mas era mais frio.
P/1 – Quais as matérias que mais gostava? Havia um professor que o senhor gostava mais?
R – Eu sempre gostei mais da parte de Matemática. Português não era muito bom, não gostava muito. Mas a parte de cálculo eu sempre gostei. Tinha uns professores também que davam mais atenção e a gente gostava mais. Eu sempre gostava mais da parte de cálculos.
P/1 – O senhor já imaginava, quando pequeno, que profissão ia seguir?
R – Assim quando pequeno não. Até quando o meu pai trabalhava com carro, funilaria. Eu sempre gostei de trabalhar com carro também, desde pequeno. Mas aí quando vim a São Paulo eu comecei a fazer colégio, faculdade eu comecei a definir mais o que queria. Eu até comecei com eletrônica, que era moda na época. Eu sabia que eu não gostava muito, mas eletrônica era moda, então eu fui. Mas depois que eu fiz o técnico em eletrônica eu passei para mecânica. Eu fiz engenharia mecânica. Engenharia mecânica eu gostei de fazer.
P/1 – Isso aqui já em São Paulo.
R – Aqui em São Paulo. Eu vim com 12, 13 anos para cá.
P/1 – E o senhor se lembra quando o seu pai avisou que vocês iam se mudar? Como que foi essa mudança para cá?
R – Em São Paulo ele comprou um táxi e deixou aqui com o amigo dele tomando conta. Chegou uma época que a prefeitura falou: “Ou você...” Aí ele comprou mais um e ficou com dois carros. Aí a prefeitura falou: “Ou você têm um ou quinze.” Aí ele começou a pensar, falou: “Uma época teremos que mudar de vez será que vale a pena sair de Porto Alegre e ir para lá?” Ele vinha, voltava. Aí vendeu a casa, vendeu tudo lá. Por que aí ele comprou quinze carros e foi aumentando. De longe não dava. Aí viemos para cá.
P/1 – O senhor lembra quando?
R – A primeira não, mas eu lembro assim das vezes que a gente vinha. A gente vinha de Fusquinha mesmo. A mudança foi até no Fusca. A gente veio, eu, minha mãe, meu irmão, papagaio e tudo dentro de um Fusca. E viemos pra cá. E foi bom. Acostumar foi um pouco difícil, não é? Porque tinha todo o pessoal lá, parentes e amigos. Aí depois com o tempo mais dois tios meus vieram também com o meu pai. Eles fizeram a empresa de táxi, depois caminhões também. Fizeram a vida juntos.
P/1 – E a oficina lá foi vendida?
R – Foi. Ele vendeu, ficou com outro tio meu lá. Aí veio para São Paulo e fez tudo por aqui.
P/1 – E quando vocês chegaram a São Paulo, onde vocês moraram?
R – A gente morava na Penha. Não era a Penha, era pertinho da Penha, o nome era Cidade Patriarca. O bairro onde ele fez a empresa. Um bairro assim, quase de interior.
P/1 – O senhor falou das diferenças. Tinha? Quais eram?
R – Tinha. No bairro também e a escola, era uma escola de padre. Um pouco diferente de Porto Alegre. Era uma escola mais rígida, tinha as normas um pouco mais severas. Como escola de padre, foi uma escola muito boa.
P/1 – E como o senhor sentiu essa diferença? Sair lá do grupo, que era uma escola de madeira, e de repente ir para uma escola mais rígida, tinha?
R – Ah, eu acho que a gente vai se adaptando. Você sente “vou voltar para ver os amigos da terra todo ano.” Eu ia. Depois vai se afastando. Os amigos foram crescendo também. E você vai se distanciando mais, fazendo amigos novos aqui. Isso é normal. O ser humano se adapta muito fácil a mudanças. Dificuldades grandes, você estranha, mas não tinha dificuldades não.
P/1 – Nesse colégio religioso tinha alguma festa em especial? Tinha alguma comemoração?
R – Tinha as festas normais de escolas. Festa junina, festa de aniversário da escola, essas coisas sempre tinham. Faziam quermesse...
P/1 – E o senhor participava?
R – A gente participava sim.
P/1 – O seu irmão também estudava na escola?
R – Estudava.
P/1 – Precisava também ir a pé, andar um quilômetro?
R – Não, era mais longe. A gente ia de carro. Meu pai ou um funcionário dele levava a gente. De carro dava mais ou menos, acho que uns dez quilômetros de distância.
P/1 – Ia de táxi?
R – Às vezes ia de táxi, de carro da oficina...
P/1 – Só pra esclarecer aqui, o pai do senhor tinha a empresa de táxi e também tinha a oficina, é isso?
R – Com a empresa tinha tudo. Tinha oficina, posto de gasolina para manter os carros todos. Fazia tudo lá, era tudo da empresa mesmo, funilaria, pintura, tudo era feito na própria empresa.
P/1 – Certo, e aí quando o senhor saía da escola, o senhor ia lá ajudar? O que o senhor fazia depois?
R – Sim, eu até mexia com mecânica, funilaria. Eu aprendi tudo isso com ele lá também.
P/1 – Antes mesmo de fazer engenharia mecânica?
R – Sim, antes. Até quando eu fazia engenharia eu também trabalhava lá. Aí depois a gente... Meu pai gostava muito de barco. A gente fazia barcos de fibra. Fez vários barcos lá também, mas tudo para uso pessoal. Eu também já fiz lancha, tudo. Dava para se divertir bem.
P/1 – Que projeto fez nessa fase com o seu pai que você mais...
R – Uma lancha de corrida. Corria com ela, esquiava tudo. Deu para fazer.
P/1 – Onde o senhor esquiava?
R – No Guarujá.
P/1 – Vocês iam sempre ao Guarujá?
R – Meu pai sempre teve casa lá. Minha mãe, hoje, mora lá. Mora até sozinha, não quer morar com ninguém. Está trabalhando direto.
P/1 – O senhor acabou o ginásio naquela época e aí o senhor foi fazer o técnico?
R – Fiz o colégio técnico no Colégio Objetivo, lá na Avenida Paulista. Toda a parte de eletrônica. Depois fui fazer vestibular para engenharia.
P/1 – E no eletrônico, como o senhor já disse, já via que não era muito...
R – É. A base toda era igual, como se fosse uma mecânica. Mas só que a especialidade ficou eletrônica. Montei uns rádios, mas vi que não era bem o que eu gostava, não. Como eu tinha trabalhado com o meu pai em oficina e mexia em carro, eu gostava mais daquilo. Então foi a área que eu quis ir. De mecânica. Apesar de que hoje eu trabalho muito na área mecânica, porém voltada para o para química também porque trabalho com pintura. Mas mecânica eu gosto. Inclusive eu fiz vários projetos, estou fabricando um carro. Vai fazer já quatro anos que estou fabricando.
P/1 – Vou perguntar mais sobre esse projeto. Deixa chegar mais na atualidade. Nesse momento que o senhor estava fazendo o técnico, o senhor falou que hoje trabalha também com química. Nesse período não tinha interesse muito pela química?
R – Não. Química mesmo eu nunca gostei.
P/1 – Necessidade?
R – Mas como eu fui parar na pintura, não teve jeito.
P/1 – E o senhor foi fazer cursinho?
R – Fiz cursinho do Objetivo e eu já entrei na faculdade. O Objetivo já era um colégio preparatório para fazer vestibular, né.
P/1 – Sei.
R – Então os três anos lá já foram preparatórios para fazer o vestibular mesmo.
P/1 – E onde o senhor fez engenharia?
R – Eu fiz lá em Mogi das Cruzes. Na Universidade de Mogi.
P/1 – Que era longe da Penha?
R – Era.
P/1 – E aí como o senhor fazia?
R – Era fácil, pegava o trem. Eu tinha entrado aqui na Getúlio Vargas, mas não era mecânica, então eu preferi fazer mecânica lá. Era mais longe, mas... Eu ia de trem, era rapidinho, dava uma hora de trem.
P/1 – E era de manhã? Como era?
R – Engenharia era o dia inteiro ia de manhã e voltava só no final do dia.
P/1 – O senhor não pôde mais ajudar o seu pai, participar tanto da oficina.
R – Na oficina... Um dia ou outro não tinha aula à tarde. Então quando eu não tinha que estudar, eu ajudava também. Quando não tinha aula, aos sábados eu estava sempre lá com o meu pai. Eu sempre gostei de trabalhar, ajudar. Então eu sempre estava lá ajudando.
P/1 – E aí como o senhor estava na engenharia, tinha alguma coisa mais específica que o senhor ajudava?
R – Não. Ele usava muito... Como eu fazia barcos ele usava as programações de viagens dele pelo mapa. Eu ensinava trigonometria a ele, usar a carta náutica. Fazer as inversões, calcular os ângulos. Ele aprendeu fácil também. Ele se guiava pelo sol, pela estrela. Ele viajava mesmo. Pegava o barco dele e ia até o meio do mar, ficava uma semana fora. Então isso ele fazia bem.
P/1 – O senhor também foi com ele?
R – Eu fui com ele já.
P/1 – Para onde vocês já foram?
R – Pegava o meio do mar e ia lá para dentro. Para Ilha de Alcatraz, tudo. A gente viajava bastante assim.
P/1 – Hoje o senhor não navega mais?
R – Não. Não tenho tempo nem para ir para casa hoje.
P/1 – E nessa época da faculdade? O que o senhor lembra? As amizades? Tinha tempo para festa?
R – Não, tinha. Faculdade a gente aproveitava bastante. Ficava em Mogi das Cruzes, ficava lá de um dia para o outro. Tinha o pessoal, os amigos todos. Então aproveitava bem. Era outra vida.
P/1 – Nessa época o senhor ainda não namorava?
R – No começo não. Nos dois últimos anos eu comecei a namorar. É a minha esposa hoje.
P/1 – Vocês se conheceram na faculdade?
R – Ela fez Engenharia.
P/1 – Se conheceram na faculdade?
R – Na faculdade. Ela estava na faculdade, fomos namorando e aí nos formamos, continuamos e depois a gente se casou e estamos até hoje. 28 anos, já de casados.
P/1 – E ela era da mesma...
R – Ela era Engenharia Química. Não gostava de química e passei a gostar, até...
P/1 – E ela hoje ajuda o senhor?
R – Para o meu trabalho ela sempre me apoiou muito. Ela também trabalhava. Quando eu trabalhava... Ela trabalhou na Basf que era pertinho de onde eu ia trabalhar então a gente ia junto. E aí quando nasceu meu filho, ela ficou mais um ano trabalhando e depois ela parou de trabalhar em empresas. Mas ela trabalha por conta própria, com sistema ambiental, consultoria ambiental, licenças, essas coisas todas. Trabalha até hoje com isso.
P/1 – Não trabalha com o senhor na empresa.
R – Não, comigo não. Trabalhar junto não dá muito certo não. Só em casa tá bom.
P/1 – Nessa época da faculdade, não sei se havia muito tempo, mas o senhor fez algum estágio, alguma Iniciação Científica...
R – Sim. Logo no primeiro ano eu já consegui fazer estágio. Eu comecei estágio na Volkswagen. Foi até uma coisa assim, eu falava para o meu pai, antes de fazer engenharia, que eu queria trabalhar na Volks. “Quando crescer vou trabalhar na Volkswagen.” Mas eu era meio louco também. Aí entrei na faculdade. Por acaso meu pai vendeu um apartamento para um cara que trabalhava na Volkswagen e daí meu pai falou “meu filho gostaria de trabalhar na Volkswagen.” Aí o cara levou... Aí eu falei “estou na faculdade, não posso começar a trabalhar aí?” E ele falou: “Vou ver.” E eu falei: “eu trabalho até de graça, não tem problema não. Vou fazer estágio.” Aí ele me arrumou para fazer estágio lá. Comecei sem ganhar nada e aí comecei lá. No primeiro ano de faculdade comecei a ir, aí depois ele... Aí depois quando o pessoal me viu lá, depois de quatro, cinco meses, o pessoal começou a me pagar, eles: “não acho que vai dar pra aproveitar.” Começaram a me pagar uma bolsa de estágio. Aí fiquei lá. Fiquei direto lá. Depois me formei, continuei lá. Participei de vários projetos da Volkswagen, ganhei os prêmios de primeiro lugar sempre. Viajei para todo lugar pela Volkswagen.
P/1 – Quantos anos o senhor ficou na Volkswagen?
R – De quando eu comecei se contar estágio tudo, deu quase 20 anos.
Fiz um carro de fibra lá, mostrei pra todo mundo. Ganhei o prêmio, fui pra vários lugares. Colômbia, México, Estados Unidos. Tudo pra apresentar o projeto e depois... Quando voltei fui efetivado. Fiz várias coisas lá, assim.
P/1 – Mas o senhor era o que? Desenhista? Conta um pouquinho para gente sua trajetória e funções lá. Quando o senhor entrou como estagiário?
R – Como estagiário fiz pré-planejamento de carroceria. Meu primeiro trabalho foi até fazer tampa traseira da Parati, na época. Aí eu fiz o desenho da parte toda e fui fazendo. A gente fazia todo o desenho para ir passando para prensa, fazer a estamparia do carro todo. Eu fiquei mais ou menos uns dois anos nessa área. Depois passei para área de prensas, onde fazia a estampa mesmo, fiquei também um tempo lá.
P/1 – Fazia o quê? Desculpa.
R – Estampava. A prensa que faz a chapa do carro. Vem a chapa lisa, e você vai estampado para fazer o molde. Eu trabalhei nessa área. Depois fui para a galvanoplastia que é a parte de cromeação, zincagem, e aí começou a minha parte química. Comecei nessa área, depois comecei com manutenção dessa área e fiquei acho que uns 5 anos, mais ou menos.
P/1 – Na galvanoplastia?
R – Na galvanoplastia... Um alemão ele gostou de mim e quis me levar. Foi para pintura e quis me levar e eu fui para pintura com ele, trabalhar na área de pintura com ele. Trabalhei na área de pintura.
P/1 – A área de pintura está na galvanoplastia, não?
R – Não.
P/1 – Explica para gente um pouco a diferença.
R – Usava-se muito cromo. A peça cromada do carro. Então pegava a chapa, ela era fabricada lá dentro da Volkswagen mesmo, fazia a peça e depois ela entrava em uns tanques químicos. São 13, 14 estágios de limpeza, desengraxamento. Aí dava níquel, cromo. Depois tinha que polir, montar no carro, essa era uma área química. Hoje não usa mais o cromo, contamina o meio ambiente. É menos usual. Onde se pinta o carro é uma área separada. Você recebe o carro na chapa e têm vários processos, 13, 14 para se fazer a pintura do carro, até uma proteção que a gente chama de anticorrosiva que é o KTL, o coach. Essa parte é para dar resistência à corrosão. Depois dessa parte vem a pintura de fundo, aplicação de massa, pintura de acabamento. São várias fases da pintura. E foi onde eu peguei a manutenção dessa parte. Fui engenheiro de manutenção, depois de produção e aí fui nomeado, acho que com 25 anos, o Superintendente da Volkswagen. O superintendente mais novo que não era alemão.
P/1 – Isso em São Bernardo?
R – São Bernardo. Fui para Alemanha, trabalhei um tempo na Alemanha e aí voltei.
P/1 – Isso que eu ia te perguntar. Esse alemão que era da pintura, foi ele que te convidou a ir para Alemanha, é isso?
R – Não, ele me convidou para ir da galvanoplastia para a pintura. Fui para a pintura e lá fui desenvolvendo. Depois esse alemão foi embora e eu fiquei lá. Trabalhei em carros novos que vinham, treinamento e aí eu comecei a ir para a Alemanha. Comecei a montar equipe. Cheguei a ter na minha equipe mil e duzentos funcionários.
P/1 – Equipe de Pintura?
R – É.
P/1 – Que carros, os primeiros, o senhor acompanhou o projeto aqui?
R – Lá tinha desde Fusca, Parati. Tinha a Brasília, depois o Passat.
P/1 – E quando começaram?
R – Na minha época. Quase desde o começo. Depois o Santana, até os carros de hoje. Hoje eu continuo trabalhando para eles, mas fora da Volkswagen.
P/1 – O senhor chegou a morar na Alemanha?
R – Eu morei um tempo lá. Mas eu ia lá, ficava 6 meses em treinamento e voltava.
P/1 – Onde na Alemanha o senhor ficou?
R – Eu trabalhei muito tempo em Wolfsburg. Depois Dresden, Ingolstadt. Cidades onde havia empresas da Volkswagen. Que nem Audi, tinha Volks na Audi também. Audi era em Ingolstadt.
P/1 – Sempre em treinamento?
R – Exatamente.
P/1 – Nisso o senhor aprendeu alemão também?
R – Lá tinha que se virar com o alemão. Estudei alemão aqui, depois lá na prática fui aprendendo. Hoje está pior, vai fazer mais de quinze anos que não falo com os alemães.
P/1 – Aí na pintura o senhor ficou quanto tempo?
R – Na pintura deve ter dado mais uns dez anos também. Depois, desde 86, deu uns 20.
P/1 – Conta para gente esse desenvolvimento do para-choque, quando que foi?
R – A gente tentava trabalhar sempre para dar economia, não é? Para fazer o carro, quanto menos você gastar é melhor. Então toda vez que as coisas subiam, não podia ficar subindo o preço de carro, então a gente sempre tinha ideia de fazer reduções. Quando se fazia o para-choque do carro, que nem, por exemplo... Era naquele negócio redondo, para-choque cromado. E tem que fazer estampar, usar oito prensas porque como aquilo é uma chapa muito curvada não podia fazer de uma vez só. Então curvava um pedaço, depois outro pedaço, chegava a usar até oito ferramentas. Então num deles fiz um molde de fibra e depois com o molde eu fiz a peça. Faz o molde, vira ao contrário e faz a peça do outro lado. Fiz o para-choque. Coloquei no carro só que quando eu fiz, ficou preto. Aí o pessoal achou interessante, eu ia eliminar um monte de prensa, com o mesmo para-choque, a mesma resistência que dava. E o pessoal gostou. Na época eu tive até que fazer como se fosse projeto Volkswagen, não era meu, era da Volks. Em cima dele é que foi feito o para-choque de plástico. Porque a fibra tinha que ter... Fazer fibra é mais trabalhoso. Fazer a parte de plástico abriu caminho para eliminar as prensas. Tem até hoje pessoas em empresa de cromação, que falam comigo: “você acabou com a minha empresa.” Um falou que foi bom porque ele vendeu a empresa para outro. “Até ganhei dinheiro naquela época.” Aquele pisca-pisca do para-lamas também era de ferro. Eu também fiz. Depois começou a vender no mercado, o de plástico.
P/1 – E essas peças a Volkswagen aplicou em outros países?
R – Ah, sim. Depois começou o desenvolvimento. Depois não foi só a Volks que desenvolveu. Depois isso foi para todo mundo.
P/1 – Não, mas no caso do Fusca. Que foi o exemplo que você deu.
R – No mercado externo o de plástico, de fibra, tinha. No mercado externo. Na própria Volkswagen ficou ainda muito tempo indo na estamparia. O projeto foi para frente e depois começou a se desenvolver a parte de injetora. Porque a ideia mesmo que eu tinha dado era para fazer assim, de injetora. Só que eu não tinha injetora, eu não tinha como fazer. Então eu fiz de fibra. Porque de fibra, com a resina e a manta você consegue fazer.
P/1 – Explica um pouquinho para gente, porque a gente é leiga. O que é injetora? Qual é a propriedade?
R – Por exemplo, a fibra você... É uma manta, um tecido de fibra de vidro que você põe e aplica a resina em cima. Então você molda o que quiser com ela. Você pode pintar a cor que você quiser também. Branco, vermelho, azul. Essa é a parte de fibra. A injetora é um molde que você tem de ferro onde injeta o plástico quente. Ele fica em cima da peça e depois ele esfria. Quando pára de injetar esfria. Quando esfria fica o molde da peça, você solta e a peça está pronta. Pode ser da cor que quiser. Depende do produto. Põe vermelho, azul, sai da cor que você injetar.
P/1 – Mas em termos de custo, de praticidade, qual das duas técnicas, naquela situação...
R – Injetar um plástico era mais barato do que todo o sistema de fazer prensas. Prensa é um conjunto de ferramenta, que prensam mil toneladas. São peças caras. E a mão de obra também era muito grande. Em relação ao plástico, era bem mais barato. E hoje mais barato ainda. Como ficou usual, o preço caiu.
P/1 – Hoje continua sendo injetora?
R – Hoje são usados plásticos. O propileno, nylon, vários tipos de plásticos.
P/1 – O senhor falou muito dos treinamentos na Alemanha. O senhor percebia a diferença da tecnologia na Alemanha e aqui no Brasil? Como era essa importação de tecnologia?
R – Todas as novidades vinham de lá mesmo. Porque a matriz é alemã e o desenvolvimento sempre vinha de lá. Equipamentos novos, sistemas de pinturas que... Aqui antes se pintavam os carros, com essas, tipo, pistolas. Lá havia tubos com rotações de 23 mil rotações por minuto, a tecnologia vinha de lá. Como aqui não tinha, até o equipamento era importado, você tinha que ser treinado lá para implementar aqui.
P/1 – Mas vinha rápida essa tecnologia?
R – Vinha. Lá lançava e aqui o pessoal começava a ver que era importante, já importava. E hoje está praticamente no mesmo nível. Lança no mundo e já tem aqui também. Então hoje estamos emparelhados.
P/1 – Bom, aí o senhor ficou mais na parte da pintura da Volks.
P/1 – Mais na pintura. Depois eu passei para a armação, montagem do carro, estamparia. Quando eu entrei na parte de pintura, a minha vida toda foi na parte de pintura. Aí fiquei lá na pintura... Saí da Volks em 96, porque teve... Quando começou a crise o pessoal colocou um plano de voluntariado. Quem quisesse sair ganhava um salário por ano de casa. Eu tinha 2 carros que eu usava da fábrica, um para mim e um para minha mulher. Aí eles davam tudo, podia sair com tudo. Como eu tinha pretensão de fazer o meu negócio, eu peguei o pacote lá e saí. Foi quando montei a minha empresa. Só que eu não fiquei nem um ano com ela, porque eu comecei a trabalhar e o pessoal que me conhecia começou a me chamar e eu comecei a dar consultoria. Nessa empresa que eu trabalho hoje, eu fui dar consultoria lá em Minas. Eu comecei lá e depois eu fiquei lá, não me deixaram mais sair. Eu fiquei por lá mesmo. Aí vendi a minha empresa também.
P/1 – Várias coisas para perguntar. Quando o senhor saiu da Volks...
R – Superintendente.
P/1 – Superintendente. E aí o senhor abriu essa sua...
R – Eu saí e abri uma empresa. Fazia manutenção. Fazia manutenção da parte de cabines de pintura, eu tinha experiência com queimadores. Comecei a trabalhar com isso. Aí eu tinha uma equipe na Ford, uma equipe na Volkswagen. E aí assim, o pessoal que montou essa empresa em Minas, montou para fazer peças para Fiat. E como eles me conheciam, eles tinham um problema e me chamaram para ajudar. Fui lá dar uma consultoria para eles, organizar a parte de pintura. Fui desenvolvendo com eles, e falaram: “Você não quer ficar aqui ajudando direto?” Eu disse: “olha eu tenho a minha empresa não dá.” “Ajuda um pouco, você faz um pouquinho aqui, um pouquinho lá.” Aí foi indo, mas não dava para fazer os dois. Com isso eu vendi aqui a empresa e comecei a trabalhar com eles lá.
P/1 – Bom, continuando seu Humberto, o senhor estava falando então da empresa que o senhor abriu e do trabalho de consultoria. Como se chamava sua empresa?
R – Nem lembro mais direito... Ar... Manutenção e Ar Comprimido assim. Essa foi a primeira. Depois eu fiz com a HR Service, onde eu ampliei um pouquinho mais para fazer serviços mais de consultoria também. Tinha manutenção de queimadores, como te falei. Queimadores é a parte técnica de pintura. Mas quando eu passei mais para consultoria foi na HR Service.
P/1 – Que foi na que o senhor ficou mais...
R – Não, era a minha empresa que eu vendi.
P/1 – O senhor teve duas empresas?
R – Comecei com uma de manutenção, que era só manutenção, mas que não podia dar consultoria. Aí eu tive que abrir outra para dar consultoria.
P/1 – Entendi.
R – Na HR Service é que a empresa que está em Minas me chamou para ajudar, por que me conheciam da Volkswagen. Me viram uma vez lá, prestando serviço, então pediram ajuda para empresa lá, porque eles montaram uma linha para fazer pintura para a Fiat, mas não tinham experiência. Então começou a ter muito problema. Foi quando me chamaram e eu fui. Então eu lembro, foi em 97 e eu cheguei em fevereiro falei “em dois meses eu arrumo aqui.” Fui para lá no dia 01 de abril que é dia da mentira. “Pode vir que não é mentira”. Quando viram que estava tudo em ordem falaram “queríamos que você ficasse lá um tempo.” “Olha eu não tenho muito tempo, eu tenho a minha empresa e tal.” E aí foi conversando comigo e eu fui ajudando. Depois não deixaram mais eu sair de lá. Houve uma proposta para eu ficar por lá e aí só tinha essa empresa, que na época se chamava Colauto, vendia peças para Fiat e pintava. Então com essa empresa a gente começou a crescer o nome Colauto mudou. A gente separou. Colauto ficou uma empresa e Powercoat ficou o grupo de pintura.
P/1 – Que é a que o senhor dirige...
R – Eu tomo conta da pintura. Hoje para cada estado a gente colocou um nome diferente. Powercoat em Minas. Maxcoat na Bahia. Steelcoat em São Paulo. Existem duas aqui em São Paulo.
P/1 – Taubaté e São Bernardo do Campo. E é o senhor que dirige essas quatro?
R – São quatro. Agora vamos fazer mais uma talvez lá em Pernambuco. Junto da Fiat e Volkswagen vamos montar uma empresa lá e outra em Curitiba, porque a gente está tentando ir para Curitiba também.
P/1 – E aí então, essas empresas são criadas, assim, para as montadoras mesmo?
R – É. Nós fazemos toda a pintura dessas peças pretas. Tudo o que é peça preta a gente pinta. As peças que se compram em concessionária. Você vai comprar uma porta que bateu um capô, nós pintamos todas elas. Suspensão de carro, tambor de disco de freio, tambor de freio também nós pintamos. O pessoal fábrica, nós pintamos e vai para montadora.
P/1 – Entendi. A própria montadora fabrica e vai para vocês e vocês pintam e volta?
R – Não,só montadoras como fabricantes também. Empresas fabricantes de eixo do carro. Eles fabricam, nós pintamos e aí vai pra montadora montar no carro.
P/1 – Vocês também estão direto na questão do transporte?
R – Sim. A gente recebe de caminhão, entrega de caminhão. A gente faz parte da cadeia produtiva deles.
P/1 – E aí vocês se instalam sempre perto das montadoras?
R – Normalmente perto para gastar menos com transporte. Porque essa locomoção não é barata. Sair de uma montadora, ir para pintar e voltar. Quanto mais perto, menor é custo. Mas a gente lá em Minas pinta muita peça que vai até para Campinas, São Paulo. Porque a nossa estrutura é especializada em automobilística. Então o nível de qualidade nossa é diferente de qualquer outra empresa. A nossa geração de equipamentos é sempre última geração. Na Volkswagen tem um equipamento, o nosso é superior ao da Volkswagen. A gente está sempre na última geração. Como a empresa é menor tem mais facilidade e mais rapidamente acompanha as mudanças.
P/1 – E de onde vocês... De onde vem esta tecnologia que vocês estão sempre aprimorando?
R – Dos fabricantes de equipamentos que obtém a tecnologia. Como a gente está acompanhando a gente vê se é bom e aí a gente implanta. Porque todo o desenvolvimento de equipamento eu é que acompanho. Então eu faço tudo. Eu faço o comercial, o técnico, tudo. E aí depois eu tenho equipes que vão tocando aquilo que a gente vai definindo.
P/1 – O senhor tem hoje quatro equipes? Cada equipe tem mais ou menos quantas pessoas?
R – Lá em Minas, como é a matriz, eu tenho uma equipe corporativa, por exemplo, para engenharia principal que é lá. Se fizermos uma planta em outro lugar, nós damos todo o apoio de lá. Aí monta a equipe no local para tocar depois, mas a parte inicial sai sempre de Minas. Lá em Minas estamos com 500 funcionários. Na Bahia uns 90. Taubaté mais 90 e São Bernardo têm 60. Então, quase 700 funcionários, no total.
P/1 – Nesse corpo executivo em Minas inclui além do senhor...
R – É eu tenho um... Diretor não tem, tenho só gerente. Eu tenho um gerente financeiro, um gerente industrial, equipe de superintendente e encarregado. Em cada planta eu tenho um gerente responsável. Mas a diretriz de todas elas, controle de despesas, todas as compras, passa tudo por mim. Então tudo o que querem gastar, tem que passar por mim. E tem o dono da empresa também, só que eu... O que tenho a discutir se discute com o dono da empresa. Então está tudo na minha mão. Por isso fico passeando de lá para cá. Toda hora tem que estar em algum lugar.
P/1 – Abaixo do dono é você?
R – O dono é uma família. Tem um que é o presidente que é com quem eu trato mais, mas as empresas são de uma família.
P/1 – E o senhor está, cotidianamente, se reportando a ele?
R – Sim, eu falo com ele todo dia. Mas do serviço todo, não dá para passar tudo. No dia a dia eu vou tocando. Só quando tem alguma novidade que a gente vai se falando para ele estar por dentro.
P/1 – Eu sei que tem muita coisa, mas resumidamente, daria para você contar o seu dia a dia? Assim, uma semana normal?
R – Por exemplo, segunda feira. Segunda feira eu começo o dia indo para São Bernardo, vendo o volume de produção, se o pessoal está de acordo com o serviço para contratar, se não precisa de equipamentos como é que está o material. O pessoal vai me passando no dia a dia. Então segunda feira eu olho com eles como é que está e na terça já fui para Curitiba. Fiquei lá praticamente o dia inteiro vendo a parte de embalagem. Porque a gente pinta a peça, embala e entrega para a distribuição enviar à concessionária. A Renault, como não fica em Curitiba a gente não faz serviço ainda para eles. A gente está fechando isso com eles. Saindo de lá fui direto para Minas, chegando lá as onze horas da noite da terça feira. Em Minas fazendo toda a parte de serviço da estrutura. Fazendo instalação de pintura lá também, porque a instalação de pintura, pode ser que você não conheça, é uma linha que tem 300 metros de comprimento. Então as peças entram, passam por vários estágios, passa por limpeza, desengraxamento, fosfato, refinador, até pintar. Aí quando pinta entra numa estufa. Aí é que entra a White Martins. Uma estufa pra aquecer as peças, que chega a 180ºC pra poder secar. Depois que seca, o pessoal na mão vai embalando pra mandar para o cliente final. Para a montadora ou para quem mandou a peça para pintar, ou para a distribuidora da concessionária. Nisso a gente tem que estar sempre junto. Vai desenvolver o equipamento, a instalação, o tipo de material que vai colocar. Isso eu sempre acompanho com eles. Tem reunião na Fiat, tem que discutir preço, tem que fazer orçamento. Hoje temos pessoas que fazem orçamento, mas o preço final quem dá sou eu. Então eu vejo peça por peça para ver se está coerente ou não.
P/1 – Por que com cada montadora é um projeto diferente?
R – Cada montadora tem a sua peça diferente. Então você vai pintar uma porta de um, a maneira de pintar é quase igual, mas os tamanhos são diferentes então os preços são diferentes. Então tem que ver peça por peça.
P/1 – Em cada unidade tem uma estação de pintura?
R – Tem. O nosso negócio é a parte de pintura mesmo. Então cada unidade tem a pintura. Porque a gente não fabrica a peça, a gente só pinta a peça.
P/1 – O senhor comentou o abastecimento das concessionárias...
R – Se a peça pintada vai para a concessionária então ela vai para uma distribuição da montadora. Por exemplo, a de Taubaté que vem aqui da Anchieta. Nós as embalamos em uma caixa específica da montadora, com símbolo Volkswagen, Audi e nós enviamos para um centro em Vinhedo que é o distribuidor da Volkswagen, então a gente entrega lá.
P/1 – E de lá vai ser montado?
R – Não, lá fica guardado na caixa. De lá ela vai pra concessionária que pede. Em Manaus bate um carro lá e precisa de um capô de Fusca. Sai de lá, eles mandam para lá. A peça que monta no carro é outro tipo de peça. É a peça que nós pintamos e vai para montadora num dispositivo, aí monta no carro direto.
P/1 – Era isso que eu ia perguntar, como é essa logística?
R – Elas vendem para a montadora em racks, sem pintura e lá eles montam
P/1 – Mas o processo na ilha de pintura é o mesmo?
R – O processo é o mesmo, o que muda às vezes é a espessura da tinta.
P/1 – Por quê?
R – Porque peça para segurança e tudo têm que ter uma camada mais forte de tinta para não soltar com batidas de pedras. Específica para resistir à corrosão. Não é o embelezamento, o embelezamento vem em cima dela depois, que é a cor do carro. A nossa fica tudo preto. É o preto que é a base, a resistência a corrosão.
P/1 – E aí a cor da peça vai ser feita na montadora?
R – Na montadora, ou na concessionária. Se o seu carro que bater for vermelho, a peça chegou preta. O cara monta no carro e pinta de vermelho.
P/1 – Mas pensando nos carros de linha que ainda não...
R – Os de linha a peça também preta, ele monta lá e depois é pintado na linha. Que a linha deles é uma linha contínua que pinta na cor do carro. Às vezes sai um carro branco, preto, amarelo. Todos eles pintam. A gente não pinta a cor final, a gente pinta a preparação para resistir a corrosão.
P/1 – Qual é a maior demanda de peças das concessionárias?
R – Quando o carro é novo, no começo uma parte é para montadora montar no carro. Agora quando o carro já tem alguns anos de uso, a maior parte é para reposição. Tem muito carro no mercado, bate muito, então vende mais para reposição do que para o carro que está sendo fabricado.
P/1 – Mas aí a produção de vocês é em série?
R – Não, não é em série. Chegou vai pintando. Que a nossa linha é uma linha contínua. Chega lá, a gente vai pintando. Então é uma linha contínua. O transportador tem 300 metros, ele vai e volta e passa por todos os estágios. O que você pendurar ali vai pintando. Porque essa pintura é por eletrodeposição. Uma pintura em que você mergulha num tanque, a corrente elétrica é aplicada na peça, a peça é negativa e a tinta é positiva. Então pela corrente elétrica ela gruda a tinta na chapa. Quando ela sai, ela sai toda molhada, você pode lavar o excesso de tinta, não sai mais. Você pode lavar até água mesmo, porque a tinta é toda feita à base de água. Aí ela sai e tem que entrar na estufa para secar. Então é esse o tipo de pintura.
P/2 – É a jato então? A peça é mergulhada...
R – Ela é mergulhada. Pintada e mergulhada na tinta.
P/1 – Essa é a técnica mais moderna?
R – É.
P/1 – Qual que é a vantagem dela?
R – É a resistência dela à corrosão, à aderência dela na peça. A resistência que ela dá e por ela estar bem grudada na peça. Não sai. Se você não riscar com prego mesmo, com ferro, você não tira aquela tinta mais. E depois nela que aplica a outra que é puro spray, que é a cor do carro.
P/1 – Então na pintura tem duas camadas só? Que seria a da corrosão e...
R – A pintura tem uma camada que é a parte de fosfatização, depois essa parte de KTL que é a tinta em cima, depois vem um primer, vem uma massa de PVC, a base, depois o verniz.
P/1 – São seis camadas?
R – Dão seis sequências diferentes.
P/1 – E vocês são responsáveis pela...
R – Nós estamos fazendo só a parte primeira, a parte de fosfatização e o KTL.
P/1 – As duas primeiras etapas.
R – As duas primeiras. Depois na montadora eles fazem o resto. A massa de PVC a gente aplica também em algumas peças. Quando vai para concessionária a gente aplica. Aí depois o pessoal faz lá a primer. A gente faz três e eles fazem três.
P/1 – Mas o PVC, faz em todas as unidades?
R – Todas. E esse PVC também, é fabricação do nosso grupo. A massa PVC. Aquilo que tem embaixo do carro para bater a pedra, tipo uma borracha? Aquilo lá a gente fabrica também.
P/1 – O senhor participou desse desenvolvimento?
R – Da fabricação desta massa? Da fabricação não porque já é antiga. A fabricação é bem antiga é outro grupo. Grupo massa e o grupo pintura.
P/1 – E o senhor fica responsável só pelo grupo...
R – Grupo pintura.
P/2 – Quantos anos têm a Powercoat, contando com o nome anterior?
R – A Colauto tem uns 50 anos, que é a parte de massas. A pintura iniciou mesmo em 1996. Então tem, quase 15 anos já. Saí da Volkswagen em 1997, então ela começou em novembro de 1996. Aí começou a ter os problemas. Fui para lá em fevereiro, daí pra frente eu fiquei lá direto. Então eu estou há quase 15 anos lá também.
P/2 – Você entrou para implementar o grupo pintura, para ajudar nesse processo que até então eles não mexiam?
R – A parte deles era massa. É que a Colauto... Era 100% fornecedora da Fiat na parte de massa. E como recebeu cinco anos consecutivos o Prêmio de Melhor Fornecedor, a Fiat convidou a Colauto para fazer pintura. Aí os donos aceitaram, foram fazer. Como não tinham experiência houve muitos problemas. Eu fui para poder ajudar. Minha especialidade era essa na Volkswagen, então fui lá e ajudei. A partir daí a gente ficou junto até hoje.
P/1 – Mas nessas unidades acabam fazendo os dois, não é? A pintura e o plástico.
R – É, aplica a massa também. Só que a massa é fabricação da Colauto.
P/1 – Entendi.
R – É massa de PVC mesmo. Aquele PVC que você faz boneca, brinquedo. Aquele material mesmo. Só que vai no carro também.
P/1 – Esse material o senhor já falou, ele é comprado também, não é desenvolvido por vocês.
R – Não, a fabricação é da Colauto, do nosso grupo. Fabrica tudo. A pintura hoje, nós pegamos da Colauto e aplicamos nas peças, mas a fabricação é Colauto.
P/1 – Ah tá, entendi.
R – Então se compra a matéria prima e faz-se a massa de PVC.
P/1 – Mas a White Martins fornece não nessa etapa, só...
R – Ela fornece... Todo esse material que eu te falei pintar, aplicar a massa. Tudo isso precisa ser curado em uma estufa e para curar precisa ter a queima que é onde gera o calor. Para queimar isso, usa-se gás da White Martins. É aí onde entra a White Martins, na estufa.
P/1 – E aí ela fornece para as quatro unidades?
R – Não fornece paras quatro não. Porque as outras unidades tem gás encanado. Lá em Minas não temos o gás encanado então a gente usa o deles que é um sistema em garrafas. Um caminhão que vem com vários tanques onde tem o gás.
P/1 – Em Betim tem uma planta da White Martins...
R – Esse vem lá de Minas mesmo. Eles pegam lá em Minas. Eu não sei qual é o lugar certo que eles pegam, porque eles pegam o gás que vem encanado. Tem a cidade de Contagem lá. Eu acho que abastecem lá pela tubulação, enchem os caminhões deles. Esses caminhões que vão abastecer a gente lá.
P/1 – Entendi.
R – Mas eles têm o ponto de recebimento deles lá pela tubulação que já tem.
P/2 – É o gás natural comprimido? Que vocês...
R – É.
P/1 – GNC?
R – Nós usamos esse comprimido que são esses de garrafa. Porque o gás de tubulação é só gás natural, que vem na tubulação. O comprimido é esse que nós usamos. Nós somos os primeiros a trabalhar com gás comprimido. Nós desenvolvemos com eles isso aí. Então no Brasil fomos os primeiros a fazer.
P/1 – Desenvolver para ser aplicado na estufa de pintura?
R – É. Não só na estufa. Desenvolver para utilizar o sistema que eles tinham da carreta com os tubos de gás. É o mesmo que gás de cozinha, só que são aqueles tubos mais compridos. Na carreta vai uns quatro quatro desse daí. Cada garrafa daquela tem gás comprimido com a pressão bem alta. O sistema, para usar esse gás, nós fomos os primeiros a usar. Em abril de 2005, com eles. Eu antes só usava gás GLP. O GLP é um gás a custo mais alto. Esse gás com eles fica um custo mais barato. O gás encanado é o mais barato de todos, mais barato. Só que esse sistema deles encarece um pouco devido ao processo de levar em caminhões. Mas mesmo assim, mais barato que o GLP.
P/1 – Entre o GNC, o encanado e o GLP. Muda alguma coisa nessa parte da estufa, da secagem ou o efeito é o mesmo?
R – Não. Você muda a regulagem dos bicos de queimador. O gás GLP, ele é um gás com um poder calorífico maior. Então você tem a regulagem do bico diferente do gás GNC. O poder calorífico de um GNC é menor, você gasta mais gás para aquecer a mesma coisa que com o GLP. Gasta 25% a mais, só que ele é mais barato. Mesmo você gastando a mais, ele sai mais barato do que o GLP. Mas única coisa que você faz é regular os bicos dos queimadores. Não tem mais alteração. Alteração significativa não tem.
P/1 – E qual que seria a vantagem do GLP?
R – Hoje? O GLP, se você tiver os dois, o GNC é vantagem, o GLP não tem vantagem. Só vai ter vantagem se for mais barato, mais barato é melhor. Porque hoje é o custo, não é?
P/1 – É o custo que determina não é?
R – É, porque os dois queimam. A vantagem do GLP, se for pelo poder calorífico, é maior. O GLP queima gastando menos. Gastando menos em volume, mas o preço é mais caro. O volume é menor, mas o preço é mais caro por ser liquefeito.
P/1 – Antes de 2000... O senhor falou que tinha instalado o GNC na estufa. Antes dele era o GLP?
R – Sim. Para te falar a verdade nós temos os dois lá. Tenho o GLP e o GNC. Trabalho com os dois.
P/1 – E como que foi feita essa transição? O senhor falou que foi feito em conjunto com a White Martins.
R – O projeto foi apresentado na época por um gerente deles lá, que é até do Rio de Janeiro chamado Eduardo Lima. Ele me trouxe essa proposta, que era uma novidade, e como a gente quer fazer tudo para reduzir custo para montadora, então a gente aceitou o desafio: “vamos ver como é que é.” E aí ele apresentou direitinho, ele e o Rubens. Todo o projeto. Vimos que daria resultado. Então o que nós fizemos? Nós fizemos uma base lá, toda a parte de alvenaria, nós fizemos por nossa conta da empresa e eles colocaram todo o equipamento. Então, depois que a gente montou tudo isso, a gente fez a tubulação paralela ao que a gente já tem do GLP. Daí num final de semana a gente abasteceu com o dele pra sentir como é que funcionava. Funcionou bem. Foi pra frente. E a nossa parceria continuou até agora. Renovamos por mais sete anos o contrato com eles. E pra te falar a verdade eu tenho os dois pelo seguinte: se o cara quer subir o preço de um eu uso o outro, a gente vai equilibrando. Colocar o gás natural é bem mais barato, mas o pessoal começa a subir tanto o preço que chega uma hora está quase igual ao GLP. Se eu não tenho os dois, chego a ter o GNC muito caro em relação ao GLP.
P/1 – Por que a estrutura é a mesma, só precisa ajustar...
R – A estrutura é a mesma da hora que entra para parte nossa de estufa. Mas da tubulação para trás é diferente. Porque a pressão é diferente. Tipo de gás...
P/1 – A do GLP é maior...
R – Na realidade, o gás natural tem a pressão muito maior.
P/1 – Maior?
R – É, e tem um redutor de pressão para colocar na pressão normal de um quilo e meio. Quando chega a pressão é muito grande. Porque vem todo comprimido em uma garrafa pequena.
P/2 – Vocês têm que usar em garrafa porque a estrutura do tanque grande...
R – Não do grande... Eles não têm um tanque grande que resista a pressão que nem o gás. Porque eles são feitos em menores, a parede de ferro é grossa assim, porque a pressão é muito alta. E no outro que é grandão... O GLP é uma parede fina assim e é grandão, mas não tem pressão alta, então não tem tanto problema.
P/1 – Ainda sobre a parceria, o senhor estava contando quando começou, eles foram lá fazer a oferta.
R – Sim.
P/1 – O que eles ofereceram em sentindo de treinamento? Vocês fizeram o encanamento, a tubulação, mas como foi esse treinamento, essa aplicação de tecnologia?
R – É deles toda essa parte de tecnologia de uso do gás. A tubulação também. Até chegar ao nosso equipamento, eles é que fazem. Tubulação, diâmetro, tudo é calculado por eles lá. O sistema, por exemplo, de alimentar nossas estufas com gás GNC, onde mostraram que não teria nenhum problema, porque gasta mais, pelos cálculos, a gente falou que era viável. Valia a pena até usar o gás da White Martins do que o GLP, que é o concorrente dele. A parte, depois, de treinamento para uso eles também fizeram. É o treinamento na hora de abastecer o gás e fazer a mudança das manobras das tubulações, só. Esse treinamento eles passam para o nosso pessoal. Como entender o que é, mas nós não operamos. É a própria White Martins quem opera. A saída do caminhão para ligar na nossa tubulação eles é que fazem isso. Temos uma área toda de acordo com as normas. Com distância, porque qualquer probleminha que tiver, tem que ter um espaço de segurança para não acontecer nada. E o sistema deles, é muito seguro. Tivemos um problema lá e não afetou nada.
P/1 – Na verdade era essa a minha próxima pergunta. Como é assistência deles nesse sentido de segurança?
R – A assistência deles é boa porque eles sabem que se não cuidar pode dar um problema bem grande. E o sistema das garrafas deles, dos tanques, todas elas tem a sua segurança. Nós tivemos um problema lá, foi o ano passado. O rapaz que foi fazer o abastecimento do caminhoneiro cometeu alguma coisa lá que deu uma faísca e ele não fechou a válvula. Aí pegou fogo. Por causa da estática pegou fogo. Queimou tudo. O cara foi embora e deixou aquilo pegando fogo. Todo o sistema, que tem de segurança, foi bloqueado, nenhum fogo foi para as nossas instalações. Duas horas ficou queimando lá.
P/1 – Queimou todo aquele tanque?
R – Queimou. Queimou caminhão, queimou tudo. Mas como é em área afastada não teve problema. Não afetou nada. Na hora que parou o fogo nós apenas soltamos aquela válvula e já tinha condição de ligar outro caminhão naquele e continuar trabalhando. O sistema é seguro.
P/2 – As outras garrafas também...
R – É tudo o que estava no caminhão... Até as rodas do caminhão, derreteu tudo. Tem que deixar queimar, não é? Porque bombeiro, ninguém apaga, porque tem o gás saindo. Tem que acabar o gás primeiro, não tem jeito. Aí deixou queimar.
P/1 – E esse caminhão...
R – O caminhão é deles, acho que o seguro pagou tudo. Para nós não teve prejuízo nenhum, quer dizer, o prejuízo foi parar como nós paramos lá um pouco. Não ia trabalhar daquele jeito, não é? Com fogo ali perto. Mas aí depois que parou foi só tirar as válvulas da ligação, pôde vir já com outra carreta, colocar do lado e continuar trabalhando normal. Não é que, por exemplo, estourou, pode explodir, pode ir gás, fogo pela tubulação, pegar fogo lá na nossa unidade. Esse sistema é seguro, não acontece isso não.
P/1 – O senhor falou dessa troca das mangueiras, de quanto em quanto tempo elas acontecem?
R – Toda hora que o caminhoneiro vai trocar a carreta. Trocamos três por dia. Dia eu falo 24 horas. Uma de manhã, de tarde e de noite. Estão sempre trocando. Porque o nosso consumo é duzentas toneladas por dia.
P/1 – São necessárias três carretas por dia?
R – É. Porque sempre fica trabalhando com duas e uma de reserva. Esvaziou uma, liga na outra e aquela vai buscar gás de novo. No local ficam duas e uma sempre no trânsito para fazer a troca.
P/1 – É contínuo?
R – Contínuo, direto, 24 horas. De segunda a segunda.
P/1 – E a estufa também funciona?
R – É a estufa funciona direto.
P/2 – Chegou a ter algum problema de transporte? De ficar sem?
R – Tivemos dificuldades em Minas uma vez, acho que foi em Paulínia um caminhão para lá. Mas nunca faltou não. Nunca tivemos um problema de falta de gás, não. Como nós estamos, também, ampliando a fábrica, fizeram em outro local e foi tudo feito pela White Martins.
P/1 – Você já tem dois locais para receber?
R – Não. Esse local que era o primeiro a gente desativou. Porque a gente está construindo um prédio, movimentando a parte de pintura. Pegou fogo na hora certa. A gente aproveitou e tirou fora, porque tinha que aumentar o prédio. E aí fizeram outro, em outro local. Então é bem feito, bem seguro e tudo mais. Esse negócio pega fogo, como é que faz? Mas é seguro.
P/1 – E, tem visita de alguém da White com frequência?
R – Tem direto.
P/1 – Além das carretas?
R – O pessoal técnico deles lá sempre vai. Tem o Rubens que atende a gente. A gente fala direto com ele por telefone, ou vai lá. Se a gente tem alguma dúvida, ele vai lá também mostrar, explicar. O atendimento da White é muito bom. Um parceiro que deu certo.
P/1 – E tem algum outro projeto? O senhor falou que fez mudança, nova construção.
R – É eles fizeram nova construção para continuar abastecendo. Porque a estrutura tem a carreta, mas têm várias válvulas, os componentes que fazem a distribuição, a mudança da pressão para poder usar na linha. Tudo isso queimou. Eles tiveram que fazer tudo novo. Eles fizeram tudo novo em uma nova área que a gente passou para eles, por que a gente queria usar aquela área. Passamos para outro local, mas eles montaram tudo de novo. Depois de três meses estava tudo funcionando de novo lá.
P/1 – E durante esses três meses?
R – Como eu te falei, nós temos dois gases, nós temos o GLP. Mas o dele dava para usar normal, por que com a tubulação e o caminhão de diminuição de pressão que eles têm, podia ligar direto, não tem problema. Depois do incêndio, duas horas depois, dava para usar normal. A gente mudou tudo pra lá, a gente desativou aquela parte e nesses três meses fiquei usando GLP, mais por conveniência nossa. A gente não quis ficar trabalhando com gás e fazendo parte civil junto. Só por isso. Mas se tivesse que trabalhar com o dele, trabalhava normal.
P/1 – Mas o GLP daí não é da White Martins?
R – Não. O GLP é do concorrente dele e para nós é mais caro.
P/1 – Humberto, a gente estava comentando da Powercoat com Betim, com a White Martins. Teria como o senhor comparar os principais desafios da Powercoat quando começou com essa parceria e hoje? Pensando mais na questão da cadeia produtiva, do uso da estufa.
R – O uso da estufa não muda muito. Porque a gente está usando o gás, como usava o outro, só que com algumas regulagens nos bicos do queimador. O queimador é de onde sai o fogo para aquecer a câmara para trocar calor lá com a peça. O que ajuda a gente nisso é que o nosso custo final fica menor. Por exemplo, na situação que está se você vai pedir um reajuste para a montadora, eles não dão, eles querem desconto. Então se a gente não consegue meios de baratear a nossa cadeia produtiva, o nosso custo vai subir e se eu tenho concorrente que começa a ter um custo menor, a gente perde serviço, porque a concorrência é muito forte. Montadora se tem o preço melhor compra se não tem não compra. Por isso que a gente está no mercado, sempre tem coisa para reduzir de algum lado. Então com a White Martins foi uma parceria que deu certo por isso. Eu falei do uso de dois gases por segurança, não que um é melhor do que o outro. Eu uso por segurança. Se um quer começar a subir o preço eu tenho a bagagem lá, quer dizer, uma maneira de conseguir negociar que aquele aumento invés de ser tantos por cento seja menor, porque eu também tenho concorrente. Quer dizer, ele vai ter concorrente. Então por isso que para nós foi muito bom. E a White Martins além de ter um produto bom, é mais barato, a assistência é boa. Não tem problema nenhum. Aquilo que eu te falei das outras unidades nossas, não dá para usar White Martins porque eu tenho a tubulação ligada direto, que é o gás natural. Que é mais barato até que a White Martins, porque é ligação direta. Mas a White Martins em lugar que não tem tubulação é a melhor coisa.
P/1 – Essas que tem tubulações, da onde vem daí o gás? Vem da BR, não?
R – Vem. Tem até gás que vem da Bolívia. A tubulação vem direta tudo, passa pelos lugares de mediação e vai para as ruas, pelas estradas, aqui passa pelos tubos e depois só alimenta as unidades das fábricas aí.
P/1 – Mas eu digo daí vem também de uma refinaria no caso, esses GNC.
R – Vem daqui de São Paulo, eu não sei se vem de Paulínia. Não sei a distribuição. Mas que nem... Falo que dentro da Volkswagen eu uso o que eles usam mesmo, eles alimentam os deles também. Lá em Camaçari vem da parte da Bahia lá. A gente também usa a tubulação da Ford. Normalmente é a Comgás que alimenta. Você pode ver que é tudo Comgás. Se eles pegam, por exemplo, vem da Bolívia, vem de outros lugares. Aí eu não sei de onde vem. Não é minha área, também não procurei saber muito não.
P/1 – Então era mais as outras empresas mesmo.
R – Tudo Comgás.
P/1 – E a de Betim é principalmente a Fiat, não é?
R – A gente não usa outra tubulação, mas a Fiat também tem alimentação direta pela tubulação. Lá acho que tem a Minas Gás e a Comgás, também. A gente fica a 11 quilômetros de distância, então para gente não dá. Tem que usar o da White Martins que é a solução quando não tem tubulação.
P/1 – Em Curitiba vocês têm ideia se vai ser perto da Renault, ou se vai precisar também...
R – Eu ainda não sei certo o local. Estamos discutindo, pode ser que seja até dentro da Renault. A gente está discutindo ainda. Se for dentro, também tem tubulação de gás. Fora também tem, mas eu não sei. Tem que olhar o terreno por lá, onde vai ser. Tem que olhar a parte de meio ambiente, onde pode fazer indústria química, não é?
P/1 – Tudo isso tem que ser levado em conta?
R – Tem. Porque querendo ou não a nossa indústria é química. Tem tratamento de efluentes, tem tudo. Tem que ser lugar que pode fazer. A gente não contamina nada, tudo é colocado de acordo, mas tem que ter área específica pra isso.
P/1 – Não só para o tratamento de efluentes, mas para o que mais?
R – Exaustão, não é? As chaminés de queima. Tem lavadores de gases, tudo, mas mesmo assim se tem residência perto, queira ou não, tem algum odor diferente. De tudo sai gás. O pessoal acaba reclamando. Não dá para ter residência perto desse tipo de indústria não. O pessoal começa a reclamar, aí complica.
P/1 – Então é difícil instalar a planta.
R – É difícil. Tem que ser área industrial mesmo. Área industrial que tenha condição, que não seja área de manancial, tem tudo isso. Tudo tem que ser tratado. Vamos supor que tenha algum problema. Um acidente. Então tem que ser lugar que não contamine ninguém.
P/1 – E afastado. Você tava falando da questão da busca pelo menor custo. Queria perguntar um pouco para o senhor essa questão dos ajustes dos preços. Como que é essa relação da economia? Como a economia, como o governo pode influenciar.
R – Isso é uma coisa que é bem complicada, porque o governo não se preocupa muito não. Ele sobe o preço dele e pronto. Sobe energia, sobe gás, sobe água. E tudo isso você paga mais caro, como é que você vai fazer? Você tem que colocar isso para teu cliente final, o cara não aceita. Achar alguma maneira de tirar de algum lugar. Muitas vezes vai até na mão de obra. Eu estou com dez pessoas. Você não vai trabalhar para perder. Então eu acho que a parte do governo podia ajudar um pouco mais. Eles vão subindo as coisas e nós não temos como só repassar isso para frente. Se todo mundo fosse só repassar, ia para longe, não é? A gente vai apertando tanto que tem uma hora que não tem mais de onde tirar. Nas montadoras também. Você viu hoje a situação. Tem um monte de carro importado entrando com carro nacional. Carro importado paga menos imposto que um nacional. Então quem está trabalhando aqui não consegue competir com o que está chegando. Por isso e a gente está entrando numa crise automobilística de novo, não é?
P/1 – O senhor falou dessa questão das novas montadoras. Quando elas vêm, elas também seriam novos clientes? Ou...
R – Sim, são novos clientes.
P/1 – E como está esse mercado, os chineses?
R – Estão trazendo muita coisa de fora ainda. Mesmo quando eles montam uma planta deles, eles trazem já muita coisa pronta, só monta aqui dentro. Então, em matéria de serviços nossos para prestar para eles, é pouco ainda. Hoje vendemos são 10 mil carros fabricados por dia. Se você vendia dez mil agora vende sete mil. Três mil a menos. O carro importado está ocupando espaço. Então o serviço nosso é menor. A quantidade é menor. Nesses últimos dois meses aqui, o volume caiu bastante. É a concorrência que vem do exterior.
P/1 – E o jeito para resolver isso, como o senhor vê?
R – Eu acho que tem que ter uma política de impostos acertada para isso. Hoje um carro tem mais ou menos 50 e poucos por cento é imposto. E quando o carro é importado, você até paga menos do que isso. Não adianta subir só o imposto do importado, tem que baixar o imposto do nacional. Para quem compra só sobre, não é? Isso que tem que dar uma estudada melhor. Talvez reduzindo um pouco imposto, vai aumentar a venda. O comércio vai girar muito mais, não é hoje não. Hoje está parado. Por isso começaram as várias demissões na área de montadora e fornecedor de montadora. Alguma coisa tem que ser feita.
P/1 – Mas quando eu me referi ao custo desses gases, não se tem muito que fazer né?
R – Não.
P/1 – Desses gases para...
R – Até tem, por exemplo. Vamos supor, na hora que você faz o preço de uma peça lá, o gás participa lá com 10%. Se de 10% você reduz para nove, você tem um ganho. E isso aí é o que se consegue fazer. Eu reduzo um pouquinho no gás, um pouquinho na água. Por exemplo, eu gasto aproximadamente 15 mil litros de água por hora, se subir o preço, em 15 mil litros por hora é... Se subir um centavo o preço no final é grande. Então eu tenho que... O que eu tenho que fazer? Eu tenho que achar uma maneira de reduzir no consumo também, mas tem um limite. Eu não posso ficar reduzindo porque eu tenho um problema de qualidade no final. Mas são coisas que a gente vai fazendo. Vai usando outro produto químico melhor, outra coisa pra poder ganhar de algum lado. Teria que se achar a maneira, talvez, de não repassar todo aumento. Teria que pensar um pouquinho mais nessa parte. Principalmente de impostos, sobe por causa de imposto. Quando você sobe o imposto de uma coisa, o frete é mais caro, tudo é mais caro. Tudo vai encarecendo no final da cadeia. Então, quando a gente parte para o gás da White Martins. Agüenta até um tempo. Depois começa a normalizar de novo, e aí tem que achar outra saída. Esse que é o problema.
P/1 – Além disso, o senhor estava falando muito dessa questão de redução e me fez pensar muito na questão da sustentabilidade. A Powercoat tem ações, pesquisas, nesse sentido de conseguir gastar cada vez menos os recursos, ou aplicá-los cada vez mais?
R – Lá em Betim, por exemplo, todos os prédios que nós fazemos os telhados são feitos de uma maneira que a água de chuva a gente aproveita. Então todas as calhas são ligadas por tubulações, fizemos um lago de um milhão e oitocentos mil litros de água. Então a água da chuva cai nos usamos aquela água. Ela passa por um filtro e a usamos até no processo. Que o nosso consumo é grande. Toda essa água depois que a gente usa no processo, a gente tem um sistema que faz a regeneração da água. Refiltra ela e usa. Para ser reusada de novo. Para o banheiro, para molhar jardim. Os sistemas, por exemplo, de resíduos industriais, nós temos um equipamento, também, que reduz a quantidade que se joga em aterro. É um equipamento que nós importamos uma vez da Bélgica, inclusive até fechou lá e estamos fabricando esse equipamento. Ele limpa todos os dispositivos de pintura. Porque a pintura você vai pintando as peças, acaba aumentando as crostas dos dispositivos, tem que limpar aquilo. Ele é limpo num dispositivo desse, que o resíduo da tinta. Reduz 4% o volume. É um tanque com areia fluidizada. A areia chega a quatrocentos graus em contato com essa tinta ele queima, aí tem uma chaminé onde a gente retira a fumaça e a fuligem. Volta para máquina de novo, num cesto, um funil, a gente joga na máquina de novo. Então a gente não gera resíduo no meio ambiente porque é classe 1... Um resíduo que não pode ser aproveitado para nada.
P/1 – O que é classe 1?
R – Classe 1 é resíduo perigoso. Não pode ir para a terra. Contamina a terra. Então ele tem que ser queimado, não é nem queimado, ele teria que ser co-processado. Normalmente se usa quando se faz cimento. Usa aquilo para queimar cimento, para fazer cimento. Porque ele incorpora matéria prima. Não tem aterro pra isso, e não pode jogar em qualquer lugar. Tem que dar um destino final assim, usando esse método. Então são coisas que a gente está trabalhando em cima. Porque hoje tem que achar solução para isso. O resíduo industrial é uma situação bem complicada hoje.
P/1 – O resíduo de vocês seria basicamente, na tinta mesmo.
R – É a tinta, é o fosfato, a borra de fosfato. Mas borra de fosfato você consegue até reaproveitar para adubo. Mandar para algum lugar que faz até adubo para fertilizantes. Mas a tinta em si é classe 1, tem que dar um destino. O que sobra a gente manda para forno de cimento. É co-processado. A gente paga para o pessoal usar isso como matéria prima para cimento.
P/2 – Esse tratamento de água, vocês utilizam em algum momento gases?
R – Sim, nessa parte dessa máquina que a areia chega a quatrocentos graus é o gás que aquece. A gente usa gás da White Martins também.
P/1 – E aí é o mesmo processo...
R – A gente usa na maior parte o GNC, mas se não tiver eu posso usar o outro também.
P/1 – Mas eu digo, a dinâmica de ter os tanques é o mesmo?
R – Todas as nossas linhas têm alimentação dos dois. Qualquer pane que eu tenha com um, eu tenho o outro. Porque você não pode parar, não é? Se eu parar uma montadora um minuto, é um carro que deixou de fazer. Se a gente para a multa é muito grande. Por isso a gente não pode parar, tem que ter alternativa para tudo.
P/1 – O senhor estava falando do lago, do aproveitamento da água, isso a gente começou comentar da unidade de Betim, mas as outras unidades também têm, seguem o mesmo...
R – Têm. O do telhado não porque a gente pega empresas... Por exemplo, que nem na Volkswagen. Eu estou lá dentro da Volkswagen. Num prédio antigo, não consigo fazer nada. Agora se eu vou construir a gente vai fazer no mesmo esquema. A gente tenta sempre reaproveitar a água. Mas, por exemplo, aqui em São Bernardo, como o prédio estava feito, o que nos colocamos? Uma unidade de reaproveitamento da água. A água que nós usamos, nós temos todo um tratamento de efluentes, para tratar a água e mandar embora para o rio de acordo com que se pode receber e não matar os peixinhos lá. Só que nós reaproveitamos essa água. Então 95% da água é reaproveitada. E esses equipamentos são caros. São equipamentos de mais de um milhão de reais, para você poder reaproveitar a água.
P/1 – Vocês importam esses equipamentos?
R – Não, é tudo nacional. Hoje os equipamentos aqui praticamente, tudo nacional.
P/1 – Qual que o senhor falou que vem da Bélgica...
R – O da Bélgica foi esse para fazer a queima do resíduo. Que é um leito de areia fluidizada.
P/1 – Esse só tem em Betim?
R – Só tem em Betim. Nós compramos... Eu fui comprar na Bélgica, fui uma vez procurar e achei esse na Bélgica. Aí eu trouxe. Trouxe para cá em 1997 também. E depois a gente tentou trazer outro, mas a empresa faliu. Lá na Bélgica não tem mais. Aí nós copiamos e fabricamos um aqui. Em Betim eu tenho dois, um comprando e um fabricando.
P/1 – Vocês mesmos que desenvolveram?
R – Hoje nós fabricamos até instalação de pintura. Nós fabricamos tudo lá.
P/1 – Além da pintura, além da massa vocês também produzem equipamentos?
R – Nós produzimos equipamentos que nós vamos utilizar. Nós sempre compramos, mas esse ano nós estamos partindo para fabricar. Para reduzir custo, porque se eu fosse comprar um equipamento ele ia custar, no mínimo, 20% mais caro. Como nós temos a tecnologia, pegamos a engenharia, fizemos o desenho todo e estamos fabricando um equipamento.
P/1 – Mas a ideia...
R – Não, não. É só pra uso nosso. Para uso próprio.
P/1 – Por que aí tem a questão da exclusividade.
R – Não. O equipamento não é... Tem parte que sim a gente faz o nosso processo. Mas no geral o equipamento de pintura tem padrões. Tudo vai pelo tamanho. Cada um tem a sua engenharia o seu desenvolvimento, mas não é exclusivo. Pode fazer. Volkswagen tem, Ford tem. Qualquer empresa por aí tem esse equipamentos. Cada um tem no tamanho que é necessário para sua planta. O nosso a gente faz de acordo com a nossa a nossa necessidade.
P/1 – Dentro dessa questão do mercado, a gente está vendo que é um mercado muito concorrido mesmo, esse da pintura. Dentro das montadoras, como funcionam esses contratos?
R – Você não tem um contrato de fidelidade se o preço está bom vai, se o preço não está bom, eles viram para outra.
P/1 – Não tem nada fixo?
R – Não. Eles colocam lá um pedido para você ir trabalhando. “Seu preço aqui tá caro, você consegue baixar? Não? Se outro faz mais barato, eles vão mandar para o outro. Desde que atenda as normas de qualidade. Tem uns padrões de atendimento de normas, se atende a norma e é mais barato vai pagar por outro. Mesmo que você esteja montado dentro da montadora e ficar mais caro, mandam para qualquer outro lugar. A concorrência é grande. E as vezes é desleal também. Tem empresa que às vezes joga o preço lá embaixo só para começar a fazer e na segunda começa a cobrar mais caro, aí o pessoal acorda e volta de novo para nós. Mas o pessoal atrapalha.
P/1 – Então não é estável a demanda?
R – Não é estável. Sempre sobe, desce. A montadora tem poder, não é?
P/1 – Bom Humberto, a gente falou muito deste mercado automobilístico, dessa demanda. Da questão energética também, tem mais alguma coisa que o senhor acha que é extremamente importante nesse mercado? Que a gente ainda não falou? Que define também no final os preços?
R – O que define muito o preço, hoje na nossa atuação é até parte de impostos. Eu acho que a parte de imposto é um pouco alta para tipo de atividade. Mesmo na folha de pagamento. Tudo isso hoje pesa bastante. Fiz lá uns estudos de conseguir melhorar um pouco, diminuir um pouco a carga tributária que nós temos. Porque hoje o mercado está isso, o pessoal consegue fornecer um material tudo com preço mais competitivo, esse cara vai fornecer mais. Com ele fornecendo mais, o custo dele vai abaixando. E é o que não acontece hoje, porque nós temos muito custos assim, de impostos, que atrapalham demais na nossa parte de trabalho.
P/1 – Tirando essa parte... Mudando um pouco de assunto. Como é o seu dia a dia? O senhor estava falando de viagem e tal, mas na parte pessoal, na família. O senhor mora aqui em São Paulo? Como conciliar tudo?
R – Eu saio de casa na segunda cedo e só volto na sexta à noite. Aí quando eu estou em casa de sábado e domingo eu tento ficar um pouco com a minha mulher e meu filho, não é? Apesar de que eu te falei, eu fabrico um carro lá e estou lá mexendo. Um pouco eu fico lá, um pouco com a minha mulher, dou um passeio. Mas é corrido. De segunda a sexta eu trabalho direto. Eu durmo mais ou menos umas 4 horas por noite, quando eu durmo. Chegou a Betim, eu fico na fábrica até tarde, quando vou para casa é meia noite, uma hora. Aí quando é quatro e meia, cinco horas estou levantando. O meu dia a dia é assim. Agora quando eu estou em casa não. Sábado eu levanto, eu jogo bola. Eu levanto e vou mexer no meu carro, enquanto a minha esposa está dormindo, até nove e meia. Depois das dez horas vou jogar bola, volto uma da tarde. Aí fico em casa de novo. Aí mais a noitinha quando ela está vendo televisão, eu vou mexer no meu carro de novo. Sábado e domingo eu faço isso.
P/1 – Que carro o senhor está fazendo?
R – Eu estou montando uma réplica de uma Ferrari F40. É um carro de 1987. Vai ficar igualzinho a original. Tamanho tudo. Quem olhar assim, pensa que é original. Fabriquei desde o início. Do chassi e tudo. Está agora quase na parte de pintura já.
P/1 – Em quanto tempo o senhor fez esse projeto?
R – Um pouco mais de quatro anos já.
P/1 – E o senhor começou desde o chassi? Comprou peças?
R – Fabricando peças. Comprar não porque a Ferrari é muito cara.
P/1 – O senhor mesmo que produz na sua oficina?
R – Eu peguei aquela pequeninha de um para 18 que é de ferro. Tirei as medidas e aumentei 18 vezes tudo. Aí ficou o tamanho certinho. O chassi mandei soldar fora porque na minha casa não tem como fazer. A bolha, que é a carroceria de fibra, o cara tirou molde e eu fiz o resto. Aí eu fiz tudo. Parte de porta, tudo... Motor....
P/1 – E o senhor tem todos os equipamentos?
R – Lá em casa eu tenho. Motor eu peguei de um carro, de um Mustang, fiz a adaptação, coloquei o câmbio de um Gol GTI para adaptação. Está tudo funcionando, já está andando e tudo. Só que agora tem que acabar de pintar.
P/2 – Fez sozinho?
R – Eu fiz tudo sozinho. A parte de solda mandei fazer fora. Mas a parte de acabamento, desenvolvimento, fazer os reloginhos eu faço tudo. Por isso demora, porque tem que fazer... Até a pintura eu é que faço a preparação.
P/1 – E a pintura? Vai ter que comprar gás também?
R – Não, essa não. Ela é fibra.
P/1 – Entendi.
R – Pensar que se eu mandar pintar lá fora para ficar num nível melhor, o cara vai usar gás também. Gás para secar.
P/1 – Pode conversar com a White Martins então? E o seu... É filho que o senhor tem?
R – Filho.
P/1 – Ele não se interessa por isso?
R – Meu filho foi para outra área. Ele faz medicina. Quando ele era menor eu o levei a lugares que eu trabalho e ele não gostou muito não. Isso aqui é muito quente, muita estufa. Aí foi para medicina. Mas está bem lá. Com 22 anos já se forma esse ano médico. Entrou com 16 na faculdade. Então está bom, se formando está bom.
P/1 – Bom a gente está chegando aqui na parte final da entrevista. De todo esse tempo, o qual o senhor acha que foi o seu maior aprendizado? Teve alguma dificuldade maior, um obstáculo que o senhor tenha orgulho de ter....
R – Não, aprendizado a gente está sempre aprendendo. Principalmente nesta área química de pintura. Porque a pintura varia muito. O tempo se está frio é uma coisa, se está calor é outra, se chove é outra. Então todo dia é um aprendizado. Mas o importante que eu vejo são os desafios, que eu gosto é disso, não é? Tem um problema, a gente vai, corre atrás, acha uma solução. E sempre tem aquele negócio de reduzir custo para estar sobrevivendo. A gente está sempre em cima disso. Que eu gosto é disso aí. O problema é que eu gosto de trabalhar. Não é que eu... Que o pessoal fala, às vezes... Mas eu gosto de trabalhar. Eu me sinto bem trabalhando. Eu praticamente não tiro férias. Quando tenho que tirar férias eu tiro dez dias para sair com a minha esposa, para dar um passeio. Senão ela reclama. Porque se eu puder ficar trabalhando direto eu fico. Eu gosto do que eu faço. Eu não vi nenhuma dificuldade. A gente vê os problemas, mas a gente sempre sabe que tem um caminho que dá para dar uma solução. Às vezes é trabalhoso, mas dificuldade mesmo assim eu não cheguei a sentir muito não.
P/1 – Mas algum projeto que o senhor tenha orgulho de ter...
R – Todos esses projetos das instalações que a gente fez eu tenho orgulho, porque a instalação toda foi desenvolvida por nós lá, nós desenvolvemos, fizemos e o resultado é bom. No mercado hoje a Powercoat é a primeira. Em todo mercado nacional. Tem qualidade nós já ganhamos prêmio e tudo. Tenho orgulho disso. E é uma equipe. Eu não vou fazer nada sozinho, o pessoal vai passando e vai se envolvendo trabalha em conjunto. Nosso grupo não tem aquele que quer puxar a perna de um, de outro, para subir. Não tem não. Cada um sabe a sua posição, até onde vai chegar. Então todo mundo trabalha como amigos. Essa é a vantagem. Eu gosto do que eu faço e, assim, dificuldade maior eu não senti. Por enquanto eu estou bem de saúde.
P/1 – Dentro desse projeto de falar da industrialização, de falar dos 100 anos da White Martins. O que o senhor achou, sendo ouvido? De vir aqui contar a história do senhor?
R – Para mim, eu achei... Sinto-me até honrado com isso. Eu sei que tem grandes clientes por aí. Pra nós é importante isso. Eu gostei. Pelo menos o pessoal reconheceu que a gente tem um trabalho com eles desde o início. Aceitamos o desafio de ser uma novidade, porque praticamente partiu com a gente lá, isso aí. Gostei de reconhecer e a gente ser honrado com isso de estar aqui também.
P/1 – O senhor falou que partiu de vocês, isso talvez até fuja da sua alçada, mas essa aplicação de gás também foi a primeira da White Martins com a Powercoat?
R – Sim. A aplicação desse gás a, comprimido, nós fomos os primeiros. Nós desenvolvemos o projeto com eles. Nós fomos a primeira unidade a usar esse sistema. A partir daí nós fomos a porta de entrada para outros clientes deles. Qualquer cliente que quisesse conhecer ia lá na gente. Nós abrimos a porta para eles lá. Não tem problema nenhum. Foram lá, conheceram, viram o sistema todo e começaram a desenvolver isso baseado em nós. No início as válvulas, tudo que tinham lá, apesar de ter boa segurança até hoje, cada vez ele estão aprimorando mais. Para nós também foi uma honra estar desde o início, não é?
P/1 – E vocês foram os pioneiros?
R – Fomos os pioneiros. Nós fomos o primeiro a fazer, a desenvolver. A primeira a pegar fogo. A primeira que resolveu o problema.
P/1 – E nesse sentindo, o que significa para o senhor a White Martins estar fazendo 100 anos?
R – Você vê que ela é uma empresa sólida e que trabalha direto. Porque se não fizesse isso não estaria hoje nessa condição. É uma empresa confiável. E as pessoas mesmo que trabalham lá. O Eduardo Lima, o Rubens que está com a gente até hoje lá. O pessoal também... Pessoal trabalhador, honesto. Que está lá para desenvolver, não ficar enrolando. Eles tinham a metodologia deles a gente ia até o fim resolvia e por isso estamos juntos.
P/1 – E se cria amizades?
R – Cria sim. Respeito, amizade. Bem profissional, o cara vai lá. A gente tem tudo bem separado. Amizade de ficar saindo, não é assim. Mas é um pessoal que a gente confia, tem amizade, tem confiança no pessoal. Isso é importante. Trabalhar com alguém que você confia é diferente. É uma empresa boa.
P/1 – Mais alguma coisa que o senhor gostaria de contar da sua trajetória? Dos seus projetos?
R – Os projetos que eu mais gosto é isso aí de mexer com carro mesmo.
P/1 – Mas que o senhor pretende continuar...
R – De continuar mexendo com carros antigos. Já restaurei carro antigo, já participei de concursos. Inclusive fiz um carro que era o Ford 1927, tipo Calhambeque. Peguei um velho uma vez, de um senhor que está lá no Rio de Janeiro. Esse eu fiquei contente, porque era um senhor bem velhinho, que inclusive estava ficando cego, aí ele falou que estava vendendo uns carros para poder se tratar. Aí comprei um carro dele, paguei até um pouco mais do que valia porque o velhinho vendeu o carro para mim e depois de um tempo ele me contou que fez a cirurgia e que está enxergando. Então já foi bom. Restaurei esse carro todinho. Desmontei todinho e restaurei. Deixei 100% original. A Ford pegou o carro botou nas reportagens deles lá e eu comecei a participar de concurso. Eu ganhei 3 concursos com ele. Quando eu ganhava um, eu só podia concorrer só depois de 3 anos. Então fiquei com o carro nove, dez anos. Da última vez que eu ganhei eu vendi o carro. Foi de onde eu peguei o dinheiro para fazer essa Ferrari agora. Agora eu vou acabar essa daí e vou... Eu gosto mais de fazer do que até usar. Pode ser que um cara queira comprar, eu venda também para começar a fazer outro. Eu gosto de fazer essas coisas assim.
P/1 – Falou que conseguiu as peças originais...
R – Do Ford?
P/1 – Isso, do Ford.
R – Consegui tudo original. Porque nos Estados Unidos tem. A gente pega. Eu viajava para lá, trazia. Nessa Ferrari que eu estou fazendo o que eu tenho de original, são os pneus e o escapamento. O escapamento, eu fui para os Estados Unidos uma vez, tinha uma no desmanche lá, acidentada, eu comprei o escapamento. Aí eu trouxe e botei nela. Agora do resto é tudo fabricado.
P/2 – E o senhor de quem você comprou o carro, chegou a vê-lo reformado?
R – Não. Depois eu nunca mais falei com ele. Ele me ligou uma vez dizendo que tinha feito a cirurgia que estava enxergando, mas ele nunca viu. Só se ele viu a reportagem, porque de vez enquanto no SBT aparece. Quando a Ford fez 100 anos usou o meu carro lá. E eu apareço falando do carro e tudo, então de vez enquanto eles mostram. Só se ele viu lá.
P/1 – Daqui um tempo será uma reportagem para Ferrari.
R – Vai sair, porque o Boris Feldman que é o jornalista lá de Minas, do Jornal do Carro, já falou que quer fazer. Só que eu não deixei ninguém filmar por enquanto. Mas vai fazer.
P/1 – Humberto muito bacana essas informações. As coisas que o senhor nos contou. O que eu posso agora é agradecer em nome do Museu da Pessoa e da White Martins. Obrigada pela atenção e pela disponibilidade de vir para cá.
R – Obrigada por terem me atendido também.Recolher