BNDES 50 Anos de história
Depoimento de Antônio Inácio Xavier
Entrevistado por Paula Ribeiro
Rio de Janeiro, 12 de abril de 2002.
Realização Museu da Pessoa
Entrevista BND_CB039
Revisado por Fernanda Regina
P/1 – Paula Ribeiro
R – Antônio Inácio Xavier
P/1 - Boa tarde, senhor Antônio,...Continuar leitura
BNDES 50 Anos de história
Depoimento de Antônio Inácio Xavier
Entrevistado por Paula Ribeiro
Rio de Janeiro, 12 de abril de 2002.
Realização Museu da Pessoa
Entrevista BND_CB039
Revisado por Fernanda Regina
P/1 – Paula Ribeiro
R – Antônio Inácio Xavier
P/1 - Boa tarde, senhor Antônio, eu gostaria de começar o nosso depoimento, pedindo que o senhor me dê o seu nome completo, local e a data de nascimento, por favor?
R – Antônio Inácio Xavier, daqui? Daqui do Rio, ou de onde eu nasci?
P/1 - Onde o senhor nasceu?
R - Eu sou Antônio Inácio Xavier, nasci em Massaranduba, Paraíba.
P/1 - Em que data?
R – Dia 09 de janeiro de 1948.
P/1 – Aqui, no Banco, o senhor é conhecido como, qual o nome que o pessoal te chama?
R - É Xavier.
P/1 - Xavier? Um pouquinho da sua origem, como era a vida lá na cidade de Massaranduba?
R -
É interior, trabalhava com gado, na terra, né? Puxando cana, cortando palma, carregando água de longe, que lá são muito longe as águas que a gente apanhava. Levava quatro horas para buscar água no interior, de jumento. Aí, meu pai acordava a gente 3:00, 3:30. Em 1958, nós fomos lá... Naquela época, eu tinha 10 anos. O meu pai me acordava às 3:00. Nós levávamos mais de quatro horas para ir e voltar. Quando nós voltávamos, íamos trabalhar na ração, botar ração para o gado, buscar água em outro lugar para o gado de novo e aquilo levava o dia todo, nessa, nesse, nessa, nesse
jeito da vida lá, né?
P/1 - Quer dizer, o seu pai tinha o gado ou trabalhava?
R - Não, não, ele tinha.
P/1 – Ele tinha.
R – Ele tinha o sítio com criação de gado e animais; cavalo, burro, né? E nós... Ele era daqueles que mais tinham alguma coisa, que dava melhor do que alguém que não tinha, né? E a gente veio trabalhando para ele, até os 18 anos.
P/1 – Teve a chance de frequentar a escola, o senhor?
R – É, assim, eu terminei... Fazer primário, o primário eu terminei no Rio, só aquela escola que nunca tem o beabá, bebeí... (risos) Quando eu vim para cá, entrei no quartel tinha uma escola regimental do Exército e, dali, que eu comecei.
P/1 – Mas qual foi o motivo da sua vinda para o Rio de Janeiro?
R – É porque eu me alistei no Exército em Campina Grande, aí de Campina Grande, podia fazer transferência naquela época. Eu tinha um tio aqui no Rio, aí decidi que eu tinha ir, pedi transferência e me mandaram aqui, para o Rio. Aí, dessa transferência, eu fiquei por aqui.
P/1 – Qual foi a sua primeira impressão quando chegou ao Rio de Janeiro?
R – Ah, quando eu cheguei ao Rio de Janeiro, uma coisa encantadora, uma cidade encantadora. A gente fica num encanto de conhecer uma cidade tão grande assim, venho de uma cidadezinha. Eu fui registrado com 17 anos e seis meses (risos). Quer dizer que a pessoa não conhecia nada, é igual índio na mata. Aí, quando chegou à cidade, a primeira coisa que fiz foi me alistar em Campinas. De Campinas, eu acho que com uns seis meses, que eu estava enrolando o trânsito, eu estava com medo de vim aqui para... Isso é uma história da vida da pessoa muito difícil.
É o que eu falo para as pessoas que a gente foi criado naquele interior bravo, carregando lenha, cortando cana, que nunca pensava isso, só em revista, as pessoas quando mostra para gente é uma coisa bem... Parece que a gente nunca via chegar naquele lugar e quando encontra uma coisa assim, a gente fica tudo... Acha a coisa mais difícil do mundo. Graças a Deus, cheguei (risos). Cheguei, fiquei.
P/1 – Em relação ao seu ingresso aqui no BNDES, em que ano veio e por que veio trabalhar no Banco?
R – Eu, quando saí do Exército, eu fui para a PM, Estado do Rio, que naquele tempo, era Guanabara e Rio de Janeiro. Eu fui para Guanabara. Aí, com um ano e sete meses que estava na PM, eu fui desligado da PM. Fiquei pedindo, eu pedia para voltar e pedi o emprego, que eu estava desempregado. Um coronel foi mandar me apresentar um general que trabalhava no Banco, foi aí que eu fiquei aqui dentro, desde 1974.
P/1 – O que você acha que houve essa indicação do seu nome para o BNDES?
R – Houve porque eu acho que esse coronel conhecia o general, e o general me chamou, deu a carta, trouxe a carta, e dessa carta que eu fiquei.
P/1 – Em que ano foi isso?
R – Em 1974.
P/1 – E qual foi o seu primeiro... Você lembra do seu primeiro dia aqui?
R – Me lembro.
P/1 – Como é que foi, por favor?
R – Foi no 53 da Rio Branco, na sede velha, que era na Rio Branco. Aí, foi muito trabalho nesse dia (risos). Voltei a fazer teste de tudo, foi tubulações, mais difícil, mais pesada. Fiquei, mais ou menos, uns dois meses nesse tipo de trabalho.
P/1 – Fazendo o que?
R - Nas tubulações muito pesada na época, que era na sede, lá no 53 e já outras pessoas devem ter falado aqui já, que quando, nesses anos, o Banco era pequeno, só tinha a sede, só tinha um prédio. De 1974 para cá que, o Banco cresceu. Aí, o pessoal todo, a maioria dos funcionários entraram de1974 para cá, 1975, 1976, mas em 1974 eram poucas pessoas que tinha. Eu entrei na manutenção e estou até hoje.
P/1 – Mas nesse prédio antigo, a manutenção era um trabalho muito pesado, era difícil?
R – Era, eles fizeram pesado porque era um teste comigo, né? Então, passar no teste, demorei passar no teste, fique lá só para passar, quando eu passei, aí depois melhorou, foi... Ficou mais leve, que nem é hoje. Hoje, eu trabalho, mas não é tanto que nem era antigamente.
P/1 – Mas qual é a diferença?
R – A diferença é que hoje as coisas são mais modernas, as montagens. Quando tem uma coisa mais difícil, bota as empresas para fazer, a gente faz só a manutenção, só manter o prédio. Isso conserva o prédio. Em 1976, aí o Banco cresceu. Eles alugaram vários prédios aqui, na cidade, mas esse prédio aqui, não era feito ainda não. Eles botaram para correr os prédios, andar nos prédios, ver se tinha alguma coisa com defeito. Era Rua da Matriz, Rio Branco, era Rua da Quitanda, era... Só na Rio Branco tinha uns quatro prédios. Rio Branco, na Rio Branco... Assim, a Rio Branco tinha uns quatro ou cinco prédios. Na Presidente Vargas tinha três. Tinha na Rua da Quitanda, tinha na Rua da Matriz, a gráfica era na Rua da Matriz. Isto, eu tinha que manter. Todos os dias eu tinha que passar nesses lugares todos.
P/1 – O senhor se lembra de algum episódio, onde tenha dado uma coisa séria que foi preciso correr e resolveu?
R – Ah, deu.
P/1 – Pode contar um episódio deste?
R – Ah, quando já teve um problema assim, de estourar tubulações e a gente ficar até tarde da noite, água... Que nem uma vez estourou um tubo na... Onde tinha na Rua da Quitanda, estourou o tubo, era umas 18:00, aí fomos até no outro dia para... Encheu de água do oitavo andar até na rua, a água desceu tudo pelas escadas. A água chegou a mim aqui, quase no joelho, dentro do andar que eu estava. Era no oitavo andar. Aí, foram chamados os engenheiros de casa para verem esse problema que estava dando. Mas que isso foi um dos grandes, né? E teve outro aqui, na Rio Branco, 409, do entupimento também, que é desentupir no andar e o entupimento saiu no andar que era no Bradesco. Aí, os engenheiros vieram porque a água estava bombeando do outro andar. Eu estava no meio, né? Todos os lugares, esses cantos, eu sempre estava no meio.
P/1 – Sempre requisitado.
R – É.
P/1 – E hoje, como que é um dia-a-dia seu aqui, Antônio, no prédio do BNDES?
R – Graças a Deus, é bem mais tranquilo. A gente chega 9:00, aí dá uma revisão em todas... Hoje, é por tipo de requisição, né? Que você chega, pega as ordens de serviço e vai usando a área, o local, onde tem o problema. Cada um executa o seu tipo de trabalho. São vários bombeiros, tem mais aí. Cada um faz o seu serviço. Todo dia é assim.
P/1 – Quer dizer, além do trabalho do BNDES, o senhor tem uma atividade paralela, não é isso?
R – É, eu sou maratonista, graças a Deus. Um bom maratonista, hein? (risos) Eu acho que da candangada eu sou um dos bons. (risos)
P/1 – Como é que se deu esse envolvimento com o correr a maratona?
R – Não, eu comecei desde o tempo de quartel, né? Do quartel, eu gostei de correr e pratico maratona há 21 anos. Já completei 80 maratonas de 42 quilômetros.
P/1 – Alguma que se recorde mais, ou pela dificuldade, ou pela...
R – Todas elas são difíceis, né? Completar a maratona é muito difícil, cada uma é muito pesada. A que eu acho que foi importante foi quando, eu em 1998, fui o primeiro veterano em São Paulo de maratonista, 50 anos. Eu fui convocado para Estados Unidos, fiz a maratona e mais seis quilômetros de outro dia. Eu fiz duas provas lá.
P/1 – Um dia depois?
R – É, fiz. No dia, eu fiz seis quilômetros. No outro dia, fiz a maratona. Teve duas provas lá, né? Foi uma no sábado e a outra no domingo. Para mim, foi uma coisa muito importante, que é um candango chegar de graça nos Estados Unidos, para mim é importante. E aqui no BNDES foi pedido a várias pessoas, diretores e tudo, para me ajudar e ninguém nunca deu. Então, foi até carta para diretor, para todo mundo já foi, ninguém nunca me deu ajuda de nada.
P/1 – Mas o senhor corre pelo BNDES?
R – Já corri, né? Que nem as olimpíadas, quando eu fiz as olimpíadas, eu fui o primeiro nos três mil metros.
P/1 – O senhor foi o primeiro colocado...
R – Primeiro colocado nos três mil metros.
P/1 – Em que ano foi isso?
R – Em 1992, que o Banco fez 40 anos. Muitas medalhas eu ganhei do BNDES. Medalha, eu ganhei umas seis, oito medalhas já do BNDES, segundo, terceiro lugar tirei um montão. Eu também ganhei medalha também, de primeiro lugar. Ganhei medalha e troféu.
P/1 – E o senhor treina aonde?
R – Eu treino em Niterói e treino também no mato, nas trilhas, né? Que nem no dia 24, eu fiz 36 quilômetros em Ribeirão Pires, só na Serra, né? E 36 chovendo, que domingo no dia 24, lá em São Paulo chovia muito. Eu nunca tinha feito, nunca fiz essa tentativa, e fui muito bem, fui sétimo na minha faixa, né?
P/1 – Quer dizer, o senhor trabalha, tem um dia duro de trabalho e treina que horas?
R – Eu treino 5:00, de 5:00 às 7:00, de 5:00 às 7:30. Tem dia que eu chego até quase 8:00. Chego aqui um pouco atrasado, pego 9:00, chego em cima da hora, correndo aqui. Mas eu tenho treinado _______. Essa semana, eu treinei 80 quilômetros. Um dia de 15, outro dia de 15, dois dias de 20 e hoje foram 10. Hoje, eu completei 80 quilômetros nessa semana, mas para essa semana, eu vou aumentar porque vai ter revezamento aqui, no Rio. Aí, eu vou no dia, eu quero estar bem lá, né?
P/1 – Tá bom. Quer dizer, o senhor trabalha no Banco há mais de 25 anos?
R – É, mais de 25... 26 anos, né?
P/1 – 26 anos no Banco, né? Quer dizer, gostaria de perguntar, o que é o BNDES para o senhor?
R – O BNDES para mim é... Eu acho que foi tudo, né? Que eu cheguei, um cara que vem de uma escola, eu fui expulso... Não fui expulso, fui desligado da PM e chegar aqui, dentro, hoje. Graças a Deus, tenho a minha casa, a minha família. Os caras disseram que eu ia ser um bandido: “Você vai ser um futuro bandido”. Graças a Deus, eu sou um cara que nunca penso mais isso, nem nada mais. Vivo tranquilo a minha vida, sem arma, sem nada, né? Para mim foi uma coisa muito boa, a minha vida, e o BNDES deu mais apoio, né? E está dando, né? Deu e está dando. E todo mundo me ajuda, uma ajuda pra cá... Chego atrasado, um fala aquele negócio, e pá: “Vai à luta”, e está tudo bem até hoje, graças a Deus. Há 26 anos não são 26 dias não, né? É uma vida. Eu entrei aqui com 26 anos (risos). Pô, um garotão com 26 anos. Eu já estou com 54 anos. São mais de 26 anos, né?
P/1 – O senhor está aqui há quase 28 anos?
R – São quase 28. É a vida de uma pessoa, né? 26 anos com mais 26 dá 52. Acho que está do cascudo aí. (risos)
P/1 – Está bom. Antônio, para finalizar, o que achou de ter dado seu depoimento para o projeto de memória 50 anos do BNDES?
R – Ah, para mim, eu acho importante. Quem me procurou foi o Hugo, não sei o que ele falou para vocês. O Hugo é da (SIPAT?), é da SIPA. Ele falou: “Xavier, eu marquei horário para você lá, às 14:50, para você ir lá”. Ele falou para mim ontem à tarde. Foi muito importante falar isso para mim, aí eu vim hoje.
P/1 – Então, a gente agradece o seu depoimento.
R – Eu mais ainda. Vocês agradecem, eu agradeço mais ainda. (risos)
P/1 – Muito obrigada então.
R – Que na vida a gente só ganha essas besteiras, que da vida ninguém leva nada, né? Só leva essas coisas assim mesmo. Os apoios assim. Que nem os caras, ganha uma medalha: “Porra, medalha, isso não vale nada!”. Mas é aquela alegria, aquela festa. Os caras pensam que o que vale muito é dinheiro, não é o dinheiro é a festa da pessoa. A demonstração, você estar naquele meio, naquela alegria das pessoas. Eu acho que a vida é essa: de viver daquela alegria com as pessoas, praticando uma coisa que tudo mundo está bem. Não tem aquela maldade, a gente querendo massacrar o outro, jogando pedra na casa do outro. Isso não é uma coisa boa, né? Quando o cara chega limpo com todos. Você anda na rua, o cara pensa que o cara é até maluco: “Pô, está falando com todo mundo.” É, porque, graças a Deus, o cara. Está...
P/1 – Está bem.
R – Está bem, está feliz, para ele tudo está bom, né?
P/1 – E uma trajetória como a sua, né? Uma pessoa que começou a trabalhar cedo, com a vida dura, né?
R – Dura, vida dura.
P/1 – Na roça lá.
R – Vida para um moleque... Eu falo para os caras que quatro da manhã um garoto de 10 anos estar na roça: “10 anos!”. Três horas da manhã já estava com a distância daqui a Niterói.
P/1 – Será que a maratona não começou aí, já? (risos) Será o maratonista Antônio já não foi isso?
R – Já foi uma ajuda, né? Isso aí já foi uma das coisas que concretizou da época, né?
P/1 – O senhor tem filhos?
R – Tenho três.
P/1 – São cariocas?
R – São. Eu tenho um mais velho, tem 23 anos, é fuzileiro.
P/1 – É fuzileiro?
R – É fuzileiro naval e tenho um garoto de 10 e a menina de 12.
P/1 – Todo mundo estudando?
R – Estudando. O pai é duro, né? (risos). Nisso ai o pai tem que dar duro, né?
P/1 – Está bom. Eu te agradeço mais uma vez, pelo seu depoimento, Xavier. Muito obrigada.Recolher