Projeto Vale Memória
Depoimento de Elza Gonçalves Cunha Lima
Entrevistada por Heloísa ______ e Miriam Collares
Local: Rio de Janeiro - RJ
Data: 19 de novembro de 2003
Realização: Museu da Pessoa
Código da entrevista: CVRD_HV148
Transcrito por Marcília Ursini
Revisado por Grazielle Pellicel
P...Continuar leitura
Projeto Vale Memória
Depoimento de Elza Gonçalves Cunha Lima
Entrevistada por Heloísa ______ e Miriam Collares
Local: Rio de Janeiro - RJ
Data: 19 de novembro de 2003
Realização: Museu da Pessoa
Código da entrevista: CVRD_HV148
Transcrito por Marcília Ursini
Revisado por Grazielle Pellicel
P/1 - Heloísa
P/2 - Miriam Collares
R - Elza Gonçalves Cunha Lima
P/1 – Bom, vou perguntar novamente o seu nome, local e data de nascimento.
R – Eu sou Elza Gonçalves da Cunha Lima. Nasci em São Paulo, [na cidade de] Urepês, em 21 de maio de 1944. Papai era Ermenegildo Gonçalves. A mamãe, Augustinha Sueiro Gonçalves. Ambos nascidos em São Paulo. Papai em Urupês, mamãe em (Criciúma?). Os meus avós paternos: a minha avó [era] italiana e meu avô brasileiro. Meus avós maternos [eram] portugueses.
P/1 – E qual era a atividade dos seus avós?
R – Bom, os avós paternos, eles tinham uma fazenda e uma padaria em Urupês. Não é bem uma fazenda, [era] um sítio que tinha plantação de café, tal e uma padaria na cidade, que era muito próxima. Os avós maternos, eles... Nem mamãe conviveu com eles, ela os perdeu quando tinha quatro anos. Eles vieram de Portugal e, na verdade, não sei a atividade do meu avô, quer dizer, pouco ela lembrou ou lembra para contar deles. Então eu não sei te dizer. O que mais?
P/1 – Qual é a atividade profissional do seu pai?
R – Papai trabalhou a vida inteira. Não só no sítio, quanto na padaria. Na padaria, como conseguiu fazer além do Primário, que era, na época, o curso mais comum para as pessoas que viviam na região de, na região de campo. Ele tinha uma caligrafia, como diziam na época, muito boa e conseguiu fazer o que seria hoje o Ginásio. Então ele fazia a parte de escrita da padaria, quer dizer, se identificou sempre mais com esse tipo de trabalho. Ele trabalhou durante o tempo que eles tiveram a padaria, trabalhou nessa parte. Até que mais tarde, por problemas de saúde, eu tive que ir para São Paulo para um tratamento aos dois anos para três. E a partir daí, até mesmo por questões de saúde, eu teria que ficar em São Paulo para tratamento e acabei ficando na casa de uma irmã da mamãe, que morava na capital. E fiquei. No começo, era só por um tempo, e acabei ficando, como filha mais nova. Minha tia e meu tio eram meus padrinhos e acabei morando com eles para o resto da vida até me casar. Aí, meus pais se mudaram lá da região de Urupês, vieram mais para próximo da capital. Se instalaram perto de Sorocaba, num sítio lá também. Papai passou a se dedicar. Isso era o que ele tinha de experiência de família, tal e passou o resto da vida vivendo numa pequena fazenda até morrer em 1981. Eu continuei em São Paulo. Acabei estudando. Fiz, na época, curso que hoje seria o Pedagógico, que era o antigo Normal e depois fiz Relações Públicas. O curso, na época, não era ainda regulamentado, mas durante a frequência do curso, saiu a lei que o regulamentou. A gente terminou o curso com o diploma pela USP, mas houve necessidade de uma complementação e eu ganhei uma bolsa de estudos para [a] Fundação Getúlio Vargas [FGV] aqui no Rio. Na época, não tinha Fundação em São Paulo.
P/1 – Eu vou retornar bastante. ______ alguma coisa, a gente vai voltar a falar nisso. Tem irmãos, quantos, quais são...?
R – Eu tenho um irmão mais novo, um ano [de diferença], que hoje mora em Sorocaba. Ele é um empresário. Ele tem uma empresa de, que faz transporte de combustível e tem postos de gasolina. Morou a vida inteira com os pais, quer dizer, a gente tem, assim, teve uma relação a vida inteira de férias e hoje em dia um pouco mais até. Mas durante a adolescência, na verdade, a gente não viveu juntos, né? Ele sempre viveu com os meus pais e eu sempre vivi com os meus tios.
P/1 – Em São Paulo, né?
R – Em São Paulo.
P/1 – Em que bairro?
R – Eu morava em Santana, em São Paulo. Bom, hoje, ele continua em Sorocaba. Os negócios dele, as empresas estão em São Paulo, lá em Sorocaba, e a gente se vê porque a mamãe ainda é viva. Então eu vou para lá sempre que eu posso, quando não... De dois em dois meses. Pelo menos nas férias aqui da Vale, eu sempre vou para lá. Ela está com 85 anos e está muito bem ainda, graças a Deus. Então eu sempre que posso vou para lá.
P/1 – E como era Santana durante a sua infância? Esse bairro, a casa...
R – Era um bairro bastante residencial. Hoje, quando eu volto para lá, assim, percebo que, é claro, né, houve uma mudança muito grande. Hoje é um bairro bastante comercial. Na época, era um bairro bastante residencial. A escola que eu frequentei, o Colégio Salete, era em frente, praticamente, à minha casa. Eu morei na Rua Salete, então tinha uma relação, assim, com o bairro. Bem, como vou dizer... Não dá para comparar com a relação que a gente tem hoje. Era aquela relação de você conhecer o vizinho do lado, o vizinho que mora em frente, conhece... Na rua, por exemplo, a minha casa era a única que tinha telefone na época. Então, era muito comum que os vizinhos fossem lá para utilizar o telefone. Eu fui criada por esses meus tios padrinhos. Ele era militar, então tinha uma situação financeira relativamente boa que dava um certo conforto, como carro, que não era comum na época. E isso fazia com que houvesse mais amizade entre os vizinhos. A gente se conhecia mais. Por exemplo, em frente à minha casa morava uma pianista famosa brasileira, Eudóxia de Campos Barros. Então eu cresci ouvindo Eudóxia estudar de oito a quinze horas por dia, piano. Então, embora eu tenha, nunca tenha estudado música, assim, a não ser por entusiasmo durante um período na minha adolescência; De tanto ouví-la, eu quis aprender piano, mas não tive sucesso nenhum. Eu conheço muita música clássica de tanto ouvi-la tocar. O que hoje eu reconheço que foi uma coisa muito boa, quer dizer, então, eu noto que, embora hoje eu more numa casa que não é muito comum aqui no Rio, mas é muito diferente, a gente não conhece direito mais os vizinhos, não sabe nada da vida deles. Embora, naquela época, não... Eu não queira dizer com isso que houvesse aquela coisa de um estar na casa do outro, não é bem isso. Era o fato de você conhecer mesmo. Era quantidade de pessoas menor na rua, menos movimento. Então você acabava conhecendo todas as pessoas. Bom, então eu tenho boas lembranças daquele bairro, daquela época, mas me mudei para o Rio quando me casei e descobri que eu gosto muito do Rio, tanto que eu não voltaria [a] morar em São Paulo de maneira nenhuma. Eu descobri que eu tenho muito mais afinidade com cidade de praia, com [o] clima daqui. Então eu descobri com isso que eu devia ter me mudado a muito mais tempo. Quando eu vim ao Rio pela primeira vez, em 1962, eu trabalhava na escola e eu vim fazer trabalho aqui no Rio. Então eu não tinha ideia, não imaginaria, que um dia eu fosse morar no Rio. E, de repente, descobri que gosto muito. Não quero me mudar do Rio, não trocaria mais por São Paulo não só por me identificar... Não sei se é porque eu moro em Niterói. Eu morei aqui no Rio durante dois anos só, depois que eu me casei. Meu marido, na época, trabalhava no DNR em Niterói. Então eu acabei, a gente acabou mudando para Niterói, mais por necessidade do trabalho dele, e descobri que Niterói era muito mais parecido com São Paulo, por ser uma cidade menor, uma cidade mais tranquila. E eu já tinha uma filha, então criei minha filha em Niterói, o que [é] muito bom, que até hoje é um lugar um pouco mais tranquilo que o Rio e está muito próximo. Então a gente não perde nada, além das praias serem muito boas, de lá.
P/1 – E você, ainda do tempo de infância, você comentou que você convivia com seu irmão nas férias. Então estou supondo que você saía de São Paulo [e] ia para a fazenda.
R – Isso.
P/1 – Como é que era essa...
R – É, nós convivíamos sempre nas férias. Eu fui criada no meio de outros quatro primos, que eram os filhos dos meus tios. Então eu fui criada numa família grande e aprendi aquela socialização com muita facilidade. E quando ia de férias - passava todas as férias sempre em São Paulo. Já na adolescência é que fazíamos ao contrário: o meu irmão é quem vinha para São Paulo e ficava. Até para... Porque para aproveitar, que era uma coisa interessante sair lá de Sorocaba - e, na época, já morava em Sorocaba, - e ficar em São Paulo, passar umas férias lá. Mas a convivência era muito boa, embora fosse sempre... Assim, no início, os primeiros dias, até meio constrangedor, porque a gente não tinha a mesma intimidade que irmãos que convivem no dia a dia têm. Eu tinha muito mais isso com os meus primos, embora tivesse uma diferença grande de idade. Eu tinha a convivência com eles com muito mais facilidade. Mas isso também nunca criou problema de distância. Ao contrário, nós nos identificamos muito. Nós temos muita coisa parecida, eu e meu irmão. A diferença é só o estilo de vida profissional, que ele escolheu ser um profissional... Ele é advogado, mas ele escolheu ser um profissional, um empresário. Ele não quis ser um empregado assalariado. Já não é bem o meu perfil. Eu optei por essa vida, porque gosto disso, gosto desse trabalho em instituições, em empresa. Prefiro isso.
P/1 – Você gostava dessa vida na fazenda também, você acostumada na cidade?
R – Gostava. Eu não saberia te dizer... Não foi muito tempo, né? Foi muito pouco tempo, porque de boas lembranças, assim, de coisas que eu me lembre bem, foi um período de quê? De uns 15 anos, talvez. Que eu me casei aos 24, então já... A partir dos 18, já não era uma coisa tão agradável quanto na adolescência mesmo, que a adolescência você... A fazenda tinha um certo conforto, tinha piscina, então não era desagradável. Eu podia levar pessoas, que eu levava, às vezes, amigas [e] tal. Mas, depois dos 18 anos, eu já tinha outros interesses na cidade. Eu já trabalhava. Eu comecei trabalhar bem cedo, então já tinha outros interesses e aí já não passava, às vezes, as férias inteiras lá. Às vezes, eu ia... A gente tinha um imóvel em Santos, então eu já passava as férias lá, quer dizer, aí já não tinha... Preferia passar com grupos. Foi na época que a gente já tinha liberdade de viajar com amigos, então já não ia com tanta frequência. E também porque eu já não ia só nas férias, eí eu já tinha liberdade para finais de semana, quando eu já trabalhava, tinha uma certa independência financeira. Então quando eu resolvia, eu ia final de semana para lá para ver meus pais. A relação sempre foi bastante boa, não com muita intimidade quanto acho que a convivência com os pais. Eu tinha, na verdade, muito mais intimidade com os meus tios e tive como modelo de criação esse meu tio, que teve muita influência na minha vida. Não só no caráter, na parte de disciplina. Por ser militar, ele era bastante disciplinado e ensinou bem isso aos filhos e, em consequência, a mim também, que me ajudou bastante na vida. Eu me considero uma pessoa, relativamente, disciplinada hoje, em função da educação que eu recebi, que para a época, eu acho que foi... Eu posso me considerar [que é] um privilégio eu poder ter recebido esse tipo de educação, que não era tão comum. Não só pela parte financeira, que eu percebo hoje as dificuldades que a maioria das pessoas... Nós não éramos uma família rica. Era uma família de classe média, mas uma classe média com muito mais conforto que hoje, com muito mais possibilidades de fazer viagens e conforto dentro de casa. Hoje, a gente está, que as coisas são... Eu acho as coisas um pouco mais difíceis. Você tem todos os membros da família, tem que trabalhar [e] tal e, naquela época, não. Quem trabalhava era só meu tio, e não havia essa necessidade. Eu sempre estudei em escola particular, que era considerado uma coisa que não era tão comum, mas nunca houve necessidade de precisar de ajuda. Nem meus próprios pais nunca precisaram ajudar na criação. Meu irmão, em consequência disso, teve uma criação diferente por ter sido criado num lugar menor, mas isso não fez diferença na nossa relação. No distanciamento, não houve isso. O que mais? Hoje temos uma relação bastante boa. Ele é um profissional bastante bem sucedido, muito mais do que eu, que eu estou por ser um profissional liberal. Então ele é muito mais bem sucedido. Tenho três sobrinhos maravilhosos, já adultos. Também todos os três já bem sucedidos. E o que mais? Da minha filha. A minha filha mora comigo até hoje. Hoje os jovens, eles optam morar com os pais, né? Ela mora comigo até hoje. Tem 33 anos. Ela fez Artes Cênicas e hoje ela trabalha com promoções e eventos. A gente tem uma relação muito boa. Ela não é filha única por acaso, eu não pude ter mais filhos. Eu gostaria muito de ter tido mais, mas não pude. Mas ela não teve, assim, uma criação de muito: “Ah, muito paparicada.” Não. É lógico que por ser filho único, você centraliza as atenções, né? Mas ela é bastante, sempre foi bastante independente, e hoje ela é. Moramos juntas porque nós temos uma relação muito boa. É por opção mesmo que se mora junto. Não sei que mais que você gostaria.
P/1 – O que você lembra da tua escola? Assim, alguma coisa marcante, a escola influenciou na tua escolha profissional?
R – Não, eu noto o seguinte: uma coisa que eu posso falar hoje com bastante clareza, é que eu vivi numa fase que a política foi a coisa que mais marcou na minha adolescência. Pelo fato de ter sido criada por uma pessoa que estava ligada à parte militar, então, vamos dizer assim, de Direita. Quando aconteceu o movimento, [a] Revolução de 1964, a família teve que ter uma posição. Era uma posição muito firme de Direita. Isso fez com que eu acho que a minha geração e pelo menos a minha família, nós nos abstemos de todo e qualquer... Toda e qualquer participação em escola, em movimentos que fossem contra, vamos dizer assim, ao regime na época. A gente aprendeu que tinha que conviver com aquilo. Por eu ter também entrado para o serviço público, por uma estranha coincidência, eu fiz... Saiu no Diário Oficial, vamos dizer, a admissão no dia 31 de março de 1964. Nós achávamos que seria cancelado, que ia ser anulado esse concurso. Não foi. Então você imagina que foi uma coisa... Naquele momento, foi uma coisa, que eu entrei para a vida pública, para um emprego público, então isso reforçou aquela posição de não participação. Não [fazer] comentário de nada, nada. Isso marcou bastante a minha, vamos dizer assim, a minha... Não seria mais adolescência, mas essa primeira fase da vida, porque a gente aprendeu a não comentar, não pensar. Então isso eu acho que fez com que hoje eu perceba que eu não tive uma, eu não tinha interesse político durante um bom tempo da vida. Eu procurava me afastar desses assuntos, eu não queria participação. Eu tinha uma tendência muito forte à Direita. Então eu não tinha... Não me interessava nada, absolutamente, do outro lado. Acho que a escola ajudou a isso. A escola era uma escola particular, de classe média-média e média-alta. Então isso reforçava isso [de ser à Direita]. O que mais?
P/1 – E como era a escola? Como é que foi a escola...
R – Era uma escola muito boa. Ela era uma escola, assim, meio que experimental para a época. Foi a primeira escola em São Paulo que usou, deixou de usar aquelas carteiras, aquelas carteiras tradicionais de escola padrão, de... Ela usava mesas e a gente trabalhava em grupos. Foi a primeira escola em São Paulo que fez essa experiência de trabalhos de salas com trabalhos em grupos. Isso foi uma experiência... Hoje ela é uma universidade, essa escola. Ela tinha um diretor, assim, extremamente vanguardista; Ele buscava muitas técnicas fora do país. Então isso marcou bastante. Eu já estava terminando o que seria hoje o Segundo Grau, quando começaram essas experiências. Eu, praticamente, tive os últimos cinco anos só desse, e estudei durante muitos anos nessa escola. E os últimos cinco anos, só, que eu peguei essa fase mais experimental. Isso fez com que o meu sentido de equipe e de comunidade, de trabalho em grupo, se acentuasse muito. Eu noto hoje que era bastante incentivado na escola, esse trabalho em equipe. Então eu percebo que até hoje eu tenho isso muito forte. Eu defendo muito trabalho em grupo, trabalho em equipe, de toda... Da participação do grupo todo, de não ter uma opinião única. Só aquele ali não, todos têm que falar, têm que opinar e chegar ao consenso. Isso sempre foi muito forte em mim. Acredito que tenha sido fundamentalmente por causa da escola e pelo fato de ter sido criada numa família maior, numa família não muito pequena. Mas a escola, eu diria que o que ela contribuiu foi com isso e uma outra coisa. Apesar de eu já estar com quase 60 anos, eu tenho uma coisa que é bastante forte em mim: eu gosto de enfrentar novos desafios. Eu não tenho nada, assim, de pé no passado. De: “Ah, aquela técnica que eu usava lá atrás era ótima e eu tenho saudade.” Não. Eu gosto de coisas novas. Logo que a Vale começou a parte da tecnologia, chegou a nossa área [e] eu me adaptei com bastante... Embora o grupo tivesse tido uma certa resistência, como a gente trabalhava no jornal, o pessoal adorava máquina de escrever, tal, [e] eu tive facilidade de ter uma ligação boa com a parte de micro. E, na época, só tinha correio eletrônico. Eu não tive menor dificuldade. Eu gostava muito disso, eu gosto dessas coisas. Eu acho que isso foi também devido a formação, porque a escola incentivava muito essas tecnologias, coisas experimentais, trabalhos em, Essas Feiras de Ciências que hoje tem. Embora não seja comum, eu vivi isso em 1962, 1961, eu já vivi isso, quer dizer, não é bastante... Não era comum isso.
P/1 – E, assim, entre as experiências novas que eram feitas na própria escola, tem alguma que tenha te marcado fazer...
R – Olha, teve uma... Eu descobri numa dessas experiências, teve um Feira de Ciência que era, o tema dela todo era sobre o corpo humano e eu descobri nessa feira que eu tinha muita facilidade para desenhar, porque eu consegui um ótimo resultado. Porque eu fiz... Todo trabalho que era feito em grupo, a parte dos desenhos de crânio, de tudo aquilo que a gente ______, que o grupo apresentou, eu fiquei com a parte de desenho. E eu descobri sem querer... Eu já gostava bastante de desenho, mas eu descobri sem querer que eu tinha muita facilidade, tanto que isso, mais tarde, me fez, me levou a um curso de pintura. Quando eu fiquei durante um período sem trabalhar, eu fiz durante cinco anos pintura. Pintura em óleo, em tela, fiz aquarela. Porque descobri lá, naquela época, essa facilidade que eu tinha para desenhar. Eu tenho uma memória visual muito boa até hoje, então eu tenho muita facilidade de ver uma imagem e depois retratá-la com bastante facilidade. É claro que com os anos, se você se afasta, como ocorreu comigo, a gente perde isso um pouco, mas até hoje eu tenho uma memória visual muito boa, muito melhor do que a auditiva. Eu não sou capaz de cantar uma música. (risos) Não consigo repetir um som, mas [a] memória visual minha é muito boa. Eu me prendo a detalhes e sou capaz de lembrar num texto em que o local do texto está uma determinada palavra. Isso... Quer dizer, foi uma coisa que eu descobri lá, durante essa Feira, que isso fez com que mais tarde, nos outros cursos, sempre que tivesse um grupo que tivesse trabalhos de desenho, aí acabava que ficava comigo essa parte. Foi uma época boa, eu tenho recordações boas. Não tenho muita lembrança das fases antes, vamos dizer assim, do Primário, não me lembro muito bem, mas essa fase [do período experimental da escola] foi muito boa. Eu tenho amigos que eu conheci nessa escola até hoje, que eu mantenho amizade até hoje, quer dizer, passados aí 30 e tantos anos, eu ainda tenho amizade com essas pessoas. O que mais?
P/1 – Enfim, além dessas coisas que a escola te marcou, o ambiente escolar foi determinante para a sua escolha profissional?
R – Não.
P/1 – Um pouquinho mais a diante?
R – Não, não foi não. Isso é uma coisa que eu vejo hoje, que é muito mais forte hoje, é você incentivar o adolescente desde muito cedo. Eu vejo isso nas escolas, eu vi na minha própria filha, que o adolescente é incentivado muito cedo a escolher alguma coisa. Naquela época, não. Naquela época, como eu estava fazendo um curso que no final era um curso profissionalizante, parece que era uma coisa meio que certa: “Ah, ela vai ser professora. Ela está fazendo Pedagógico.” Foi uma opção, realmente. Tinha o Científico, na época, e tinha o curso Pedagógico, que era um ano a mais só, que o Científico eram em três anos; O curso Pedagógico era de quatro anos. Mas a opção foi porque achei que eu me identificava com didática. Na experiência, não foi bem assim. Eu, depois, quando fui trabalhar numa escola, não gostei muito da experiência. Eu trabalhei só dois anos, dando aula, porque descobri que não era bem aquilo. Mas eu não sabia exatamente o que eu queria. Na época, se fosse mais comum, eu teria escolhido, com certeza, ter feito Direito. Mas não era comum isso para mulher, principalmente. Então eu acabei fazendo Relações Públicas até por essa questão inovadora. Era um curso novo, que eu já trabalhava. Eu tinha um amigo que se interessou em fazer o curso e me mostrou currículo, e eu fiquei interessada. Era uma novidade. A Comunicação era, vamos dizer assim, era ainda um curso muito... Era pouquíssimo conhecido. Não era nem bem visto. Não era, assim, muito... Não se incentivava ninguém [a] fazer Comunicação na época. Então foi uma novidade. Eu acho que fui muito mais atraída por essa novidade. Eu gostei muito do curso. O curso foi dado, parte dele, por Theobaldo Miranda, que foi um dos precursores em Relações Públicas. Foi ele mesmo quem nos deu aula durante alguns módulos. Só que tinha, o curso não era bem, não estava bem montado para época. Mais tarde, quando da regulamentação, é que se descobriu que faltavam várias matérias. Que hoje está bem montado, comparado com o de hoje. Na verdade, eu nunca tive oportunidade de trabalhar com Relações Públicas. Como eu já tinha uma profissão, já trabalhava, já tinha um emprego; Isso não me deu oportunidade de trabalhar com Relações Públicas. A única vez que eu tentei, que foi aqui no Rio, eu não acabei não conseguindo a vaga e acabei que tendi para o lado administrativo e permaneci. Embora sempre trabalhando junto a área de comunicação, mas acabei ficando sempre na parte administrativa.
P/1 – E havia alguma expectativa na sua família para que você seguisse alguma carreira específica?
R – Não. Na verdade, na época não tinha... A expectativa dos pais, naquela época, era que você fosse uma ótima professora. (risos) Era grande a expectativa. Fazer já um curso superior. Eu me lembro que algumas pessoas do meu grupo, que nós tínhamos um grupo da, que já tinha esse trabalho em equipe. Então a gente teve esse grupo, ficou muito amigo, tal e ficou depois do afastamento da escola, uma delas optou... A maioria optou por Pedagogia mesmo e uma delas optou por Sociologia. Nossa, foi uma coisa, assim: “Mas que absurdo! Ela vai fazer Sociologia.” Que era um negócio meio revolucionário na época. Então a expectativa dos pais era essa mesmo, de você chegar... Se você ser uma professora, já era uma vitória. Então, tanto que quando eu quis... Quando eu ganhei a bolsa de estudos aqui para a Fundação [Getúlio Vargas], no começo, foi um pouquinho complicado convencer a família de me deixar vir para o Rio sozinha, né? Na época, não era muito bem visto. Foi complicado eu conseguir. Eu acho que só o valor da... Vamos dizer, assim, do fato de ter sido uma bolsa de estudos, foram só cinco pessoas contempladas no curso. Foram as cinco melhores notas de um determinado período, é que nos deu a oportunidade de ganhar essa bolsa de estudos aqui na Fundação. Isso é que, talvez, tenha motivado os meus tios e meus pais a permitirem que eu viesse, porque não era comum, e na época, não acho que tenha sido muito bem visto por eles. Só que eu já era maior, tal e eu falei que queria. Eu queria. Já que eu tinha feito o curso, eu queria complementar para poder ter o curso e até conhecer. Eu sempre gostei dessa coisa de novidade. Então fiz durante um ano o curso aqui na Fundação, que foi muito bem sucedido. Ele trazia gente de todo Brasil, esse curso reuniu equipes de todo Brasil. Então foi muito bom como troca, que eu que nunca tinha viajado para outros lugares, então eu conheci gente do Piauí, que me marcou muito saber como é que era a vida naquela época de uma mulher no Piauí e elas tinham uma consciência política já muito diferente da que eu disse que eu percebia. Lá era muito mais... Eles eram muito mais politizados do que eu imaginava na época. Eu não diria para vocês que... Vamos dizer assim, que a Fundação, ela me deu uma base boa, principalmente, de administração. Ela me deu uma base bastante boa, não só para vida minha, para a minha vida particular, como para o trabalho. Ela me ajudou bastante aqui na própria Vale. Mas se eu pudesse voltar atrás, se eu tivesse que voltar lá, eu teria optado por fazer Direito, que é uma coisa que eu tenho muito forte dentro de mim, no sentido de justiça, de coisas, vamos dizer assim, de justiça social. Isso tudo... Não sei como, de que forma que isso apareceu, mas de qualquer maneira, é uma coisa muito forte dentro de mim. Eu noto, assim, não gosto de injustiças sociais; Quando eu vejo diferenças de classes, isso tudo me incomoda de uma certa forma. Eu, durante algum tempo, eu fiz alguns trabalhos comunitários que me mostraram que esse é o caminho mesmo. Eu acho que é o caminho do ser humano. É uma coisa que eu quero me dedicar quando me aposentar. Eu pretendo me engajar aí num grupo que possa, ou no mesmo grupo que eu já fazia parte na época, que hoje eu não posso continuar por causa de tempo. A Vale, queira ou não, ela... Eu dedico número de horas bastante grandes à empresa. Então não me sobra muito tempo para esses trabalhos sociais. Mas é uma coisa muito forte, que eu sinto vontade, e eu vou voltar a fazer, com certeza.
P/1 – Além dessa experiência de você ter conhecido pessoas diferentes no curso, como foi viver no Rio de Janeiro nessa época?
R – Olha, nessa época não tinha violência. Então não era... Eu descobri que aquele medo todo que a minha ______ sentiu ao comunicar a eles que eu gostaria de vir ao Rio para morar durante um ano, - não chegou a ser um ano, foram dez meses praticamente - era infundada. Na verdade, o Rio era uma cidade como São Paulo. Não tinha, além das... Não comparando a beleza do local, mas eu digo, era uma cidade onde as pessoas... Não era aquela historinha: “Ah, a gente vai para lá, só vai para praia se divertir.” Não é nada disso. Quando você está aqui, você vê que não. O teu dia a dia mal dá para você ir a final de semana para um clube ou para uma praia. Então eu conheci essa realidade. Era uma cidade tranquila. Eu fiquei morando bem perto da Fundação. A Fundação, ela fazia... Ela tinha um serviço de busca de famílias ou de imóveis para esse grupo que vinha de fora, para poder ficar esse tempo. A gente não ficou “hotelado”, nada. Nós ficamos, eu fiquei com as duas outras pessoas que vieram de São Paulo. Nós ficamos morando num apartamento na Senador Vergueiro, que na época era, tinha algum, não sei se era convênio. Enfim, tinha lá algum acordo com a Fundação. Então foi uma convivência muito boa, não só com a cidade. Eu conheci vários lugares bonitos, interessantes. Não voltávamos todos os finais de semana para São Paulo porque ficava muito caro. Na época, a gente vivia de bolsa de estudos e a família ajudando um pouco. Então, a gente ia, assim, de dois em dois meses só para São Paulo e conversava mais por telefone, tal. Foi uma experiência muito interessante o fato de conviver na Fundação com gente de todo Brasil. Nós fizemos... Os grupos eram formados, eles procuravam montar os grupos com... Separavam as pessoas que vinham juntas, por exemplo. Eu, raramente, fiz trabalhos com os dois colegas que vieram de São Paulo comigo. Tanto é que eu fiz bastante amizade com a Terezinha que era do Piauí, porque ela fazia parte do meu grupo. E nós tínhamos muitos seminários e algumas palestras que eram feitas com o grupo, com o pessoal que cursava Administração na Fundação, o curso regulamentar, que foi onde eu conheci o meu marido, meu atual marido. Ele fazia o segundo ano de Administração na EBAP [Escola Brasileira de Administração Pública]. Então a gente fazia, algumas matérias eram feitas juntas. Isso também era interessante, embora a gente notasse, assim, uma certa, vamos dizer assim, eles tratavam, o grupo tratava com uma certa distância. Era um grupo diferente, era um grupo passageiro, então a gente não fez tanta amizade com esse grupo da Fundação. As amizades foram feitas mais com o grupo que estava ali com o propósito de fazer aquele curso intensivo. Foi uma experiência muito boa, eu acho que bastante marcante.
P/1 – Qual era a duração desse curso?
R – Eram oito meses.
P/1 – Oito meses.
R – E eram módulos que você ia fazendo. Eu não saberia te dizer hoje, porque a gente não frequentava... Todo grupo, não frequentava as mesmas matérias. Então eu tenho impressão de que havia interesses. Tinham órgãos públicos que mandaram empregados fazer esse curso, quer dizer, pagaram curso para o empregado. Então eu tenho impressão de que havia interesses em determinados blocos de matéria, tanto que a gente tinha aula por módulo, que tinha módulos de estatística, administração, relações humanas. Enfim, eram grupos... Não era o grupo todo fazendo as mesmas matérias sempre. Eram módulos e eram grupos diferenciados.
P/2 – Em que ano que foi?
R – Isso foi em 1966.
P/1 – Foram durante esses oito meses, então, que você conheceu o seu marido. Começou namorar logo, amor à primeira vista? Como é que foi?
R – Exatamente. Foi... Não, foi uma coisa tranquila. Eu o conheci na faculdade, na cantina na faculdade, e aí fizemos amizade. Começamos... Quando tinha os seminários ou as palestras acabava sentando perto e trocávamos bilhetinho. E aí começou o namoro e eu, na época, na verdade, namorava em São Paulo. Então tinha um namoro, assim, firme em São Paulo, que eu tive que desmanchar. (risos) E aí, quando terminou o curso, ele fez uma surpresa, que o curso terminou no dia... Nós recebemos o certificado no dia 14 de dezembro de 1966 e ele fez uma surpresa, que quando foi... Uma semana depois, eu já tinha ido embora para São Paulo, uma semana depois ele apareceu em São Paulo. Então isso marcou o compromisso e acabou que, num primeiro momento, achei que ia ser uma coisa que: “Ah, isso com o tempo vai acabar, [por ser] namoro à distância. É possível que não dê muito certo.” Mas no fim, não. Devia estar escrito em algum lugar que tinha que ser, porque aí acabou se firmando. Um ano depois, nós nos formamos depois porque, na verdade, esse curso, ele foi intermediário. Eu acabei me formando e ele também em 1968. Nós nos formamos. Esse curso foi o quê? Quando o curso foi regulamentado, eles perceberam que faltavam matérias no nosso currículo. Nós viemos fazer esse curso na Fundação para completar essas matérias e acabou que o último ano foi em 1968. Então nós nos formamos em 1968. Já estávamos noivos na época. Era moda ficar noivo, de aliança, tudo mais e nos casamos um ano depois. Em 1969... E aí embora houvesse oportunidade para trabalho em São Paulo para ele, eu continuaria no que eu já fazia. Teria, talvez, oportunidade de crescimento, de mudança de função, mas para ele as oportunidades aqui no Rio foram melhores. As ofertas foram melhores. Então como ele tinha família aqui, tal, eu é que abri mão da minha família e vim para o Rio. Não me arrependo. Acho que foi uma boa experiência o fato de eu começar a vida longe da família. Isso, embora tenha trazido, assim, um pouco de solidão no começo, que você enfrenta uma cidade nova, sem parentes, fez com que eu tivesse [que] abrir mão do trabalho quando a minha filha nasceu, porque não era comum. Hoje em dia tem creche, né? Mas naquela época não tinha creche. Quando muito, você tinha que conseguir uma boa babá, mas por opção minha e dele, não foi a opção nossa de deixar com babá. Então eu abri mão do trabalho. Não me arrependo. Acho que foi uma experiência muito boa, não só para mim como para a minha filha. Isso foi marcante na formação dela. A gente... Eu devo, acho que devo a boa relação que eu tenho a essa facilidade. Financeiramente, houve a oportunidade, a possibilidade de fazer isso. Hoje, eu acho que não é assim mais. Hoje, a mulher, não só não abre mão mais da sua vida profissional, como eu fiz, e também ela tem que contribuir financeiramente para que a pessoa tenha uma condição melhor. Naquela época, não. Não era complicado. Havia facilidade financeira, então eu pude me dar ao luxo de ficar em casa cuidando dela por um bom tempo. Foi uma experiência muito boa. Eu costumo dizer que não foi... Tem gente que tem hábito: “Ah, eu tive que abrir mão da minha vida por isso...” Não, não. Não reclamo absolutamente nada. Eu fiz, durante esse período, eu fiz muitas coisas interessantes. Fiz muitos cursos que eu queria muito ter feito durante a vida. Foi esse de pintura, eu fiz durante cinco anos, e fiz um monte de cursinho [de] decoração, jardinagem, uma porção de coisas para ocupar o tempo e acompanhei a vida dela escolar, a primeira infância e segunda bem de perto. Isso facilitou muito, vamos dizer, a adolescência dela. Pelo menos, eu acho. Para mim foi uma coisa que a gente criou uma relação muito boa, muito aberta. Ela não teve, assim, o menor problema de crise de adolescência, essas histórias todas que hoje eu percebo às vezes: “Ah, meu filho acabou se voltando a droga, etc.” Eu, realmente, a gente não teve o menor problema, eu não tive o menor problema com isso. Agradeço muito o fato de ter tido a chance de acompanhar de perto o crescimento dela e isso facilitou muito a relação de... Ela não tem, absolutamente, vício nenhum, nunca teve. Nunca fumou, nunca bebeu. Não tem a menor atração por nada disso. Que mais de experiência que eu posso contar?
P/1 – Só voltar um pouquinho para já começar entrar um pouco na trajetória profissional. Em 1964, você falou que fez um concurso?
R – Pois é. Em 1964, eu fiz esse concurso para, era concurso público para Secretaria de Fazenda de São
Paulo. Eu passei e saiu no Diário Oficial no dia 31 de março [de 1964]. Acabei fazendo os exames médicos e tal, eu comecei trabalhar no dia 17 de abril, que por coincidência, mais tarde, descobri que foi o dia do aniversário do meu marido, que é meu atual marido. Muita coincidência. Mas comecei a trabalhar e a vida parecia não ter [a] menor influência com tudo aquilo que estava acontecendo no país. A verdade é essa, que trabalhando lá, a gente não percebia todo aquele movimento que estava acontecendo na sociedade. Por quê? Porque na primeira entrevista, quando eu fui levada a um diretor para conhecer o local que eu iria trabalhar, ficou muito claro isso. Eles, na entrevista... Não foi só comigo, foi com o grupo que estava entrando. Eles deixaram bastante claro: “Não se comenta política, não se...”
P/2 – Chegaram a pedir atestado ideológico nesse...
R – Tinha, tinha. Tinha toda uma documentação, que você tinha... Eu acredito que, vamos dizer assim, a chamada dos aprovados tenha passado por um crivo qualquer de, não sei se teria tido tempo porque foi muito em cima, mas acredito que sim. Na época, o (SMI?) trabalhava muito. Então acho que houve o fato, a impressão que eu tive é que o fato de eu ser de uma família de militar e era militar atuante, então estava... Era de Direita, tal, isso deve ter feito com que o atestado de bons antecedentes tenha saído com muita rapidez. Eu acho que isso foi importante sim, porque eu [me] lembro de muita gente que foi aprovada e que não foi chamado. Na época, o que alegavam eram as vagas, que foram preenchidas as vagas que estavam abertas. Eu nunca soube direito se essas pessoas vieram a ser chamadas ou não. O concurso foi estadual. Foi bastante grande, então tinha muita gente, muita gente aprovada e... Enfim, lá no lugar, eu fiquei em São Paulo mesmo. Teve gente que foi para outras cidades menores, mas eu fiquei. Pelo número de pontos acabei ficando em São Paulo mesmo. Foi uma vida, lá eu trabalhei durante cinco anos e meio só porque eu tentei, inclusive, quando me casei, eu tentei transferir. Havia a possibilidade de transferir aqui para o Rio para... Na verdade, tinha um escritório da Secretaria de Fazenda de São Paulo aqui no Rio. Mas como o ministério tinha sido recentemente transferido para Brasília, não foi possível. Não havia vaga, tal. Então eu, infelizmente, tive que pedir exoneração do cargo lá. Eu pedi licença. Enfim, eu empurrei o quanto pude para poder depois... Quando eu vi que não havia a menor possibilidade, eu me desliguei.
P/2 – E esse foi o primeiro trabalho?
R – Não, ele foi, na verdade, concomitante com a escola. Na verdade, foi o primeiro emprego, vamos dizer assim, entre aspas, de carteira assinada, porque no colégio não se assinava carteira. Não tinha. Tanto que eu não tive que contar esse tempo de escola para aposentadoria. Por isso que eu ainda estou aqui, porque eu não tive como contar esses sete anos de colégio. Não era hábito, né, assinar carteira de professor, tal, então não foi possível contar esse tempo. O primeiro emprego oficial mesmo foi esse. Eu tive poucos empregos, na verdade, porque acabou sendo esse o primeiro oficial. Depois foi aqui no Rio, na Capemi [Caixa de Pecúlio dos Militares]. Depois disso, eu fiquei nesse tempo todo, eu fiquei um bom tempo parada, e acabou que depois foi a Vale, onde eu permaneci o maior número de anos, onde eu estou aí. Pretendo ver se eu consigo me aposentar, talvez, ano que vem já. Por idade, eu poderia. Então, eu devo tentar me desligar até 2005.
P/1 – Em que momento você sentiu necessidade de voltar ao trabalho, de...
P/2 – Voltar ao trabalho depois de parar de trabalhar em casa.
R – Ah, é.
P/1 – Trabalho fora de casa, né?
R – Ah, é. Exatamente. Porque, na verdade, eu descobri com isso que em casa a gente trabalha muito. Hoje eu percebo que eu trabalhava muito mais do que... É engraçado que me serviu também, esse período todo, para uma experiência muito interessante. Naquela época, a gente achava que só mulher que trabalhava fora é que era, assim, ela era mulher atualizada. “Nossa, ela trabalha fora e não sei o quê. A mulher que fica em casa, meu Deus, deve ficar por fora de tudo. Ou então, é madame”. Se bem que, na época, não tinha tanto Shopping da vida para poder fazer compras, tal. Eu mesmo nunca fui muito chegada a isso. Não gosto desse movimento, tal. Mas tinha-se aquela ideia de que a mulher que estava fora de casa, trabalhando, é que era a mulher mais bem informada. Hoje eu descobri que isso é uma grande mentira, um engodo [engano]. Por quê? Eu percebo [que] as minhas amigas que estão em casa, que não trabalham, elas são muito mais bem informadas do que a gente, porque elas têm tempo de ler mais, elas têm tempo de assistir um monte de entrevistas, ainda mais agora com televisão com milhões de canais diferentes. Então elas têm muito mais tempo de absorver isso tudo, tudo que está acontecendo, do que a gente que acaba tendo que se dedicar durante, no mínimo, oito horas por dia a um trabalho. Você acaba que... Você limita. Se você não tem oportunidade aqui dentro de ler alguma coisa, ou no trajeto de casa quando você não dirige ou nos finais de semana, que às vezes não dá muito tempo. Você fica muito mais por fora de tudo do que esse pessoal que está em casa. Então essa foi uma experiência que eu percebi que é real mesmo. Eu lembro que nesse período que eu estava em casa, eu acompanhava Bolsa de Valores - sempre tive um interesse por isso. Eu me lembro que ficava ouvindo pregão de Bolsa, eu tinha bastante interesse nisso na época. Imagina hoje, se dá tempo disso! Nem pensar. A gente escuta o dólar, porque escuta todo dia no jornal, sabe da cotação etc. Mas na época, eu lembro que eu acompanhava isso de perto. Eu tinha... O meu marido fazia, assim, algumas aplicações, então eu estava muito por dentro disso; Dava palpite, tal. Essa experiência de estar em casa, embora trabalhando em trabalhos aparentemente sem horário, tal, você assume muito mais compromisso. Você não deixa de ser uma grande babá dos seus filhos, porque você é que carrega por aqui, por ali. Acompanha para a aula de inglês, para aula de natação, para aula de ballet, para aula de não sei o quê, quer dizer, então você vira motorista deles. Você acompanha, você vira uma secretária do marido, porque você resolve tudo para ele, já que ele não tem tempo. Você vira... Você faz imposto de renda, você _____ com os documentos, você paga todas as contas. Enfim, hoje tem muita facilidade eletrônica. Você faz tudo por internet. Naquela época, não. Então você que era o “office boy” da casa. Você paga tudo, você que vai ver contrato disso, contrato daquilo. Ah, você tem que fazer... “Ah, eu estou interessado em ver um imóvel assim, assim.” É você quem vai lá. Marca com o corretor. “Ah, uma obra assim, assim, em casa.” Você quem cuida, trata com... Porque o marido é o grande ausente. Eu noto que hoje você divide mais isso, os casais dividem melhor essas tarefas. Naquela época, você fazia isso, até porque: “Ah, mas está em casa.” Então, seria quase que obrigatória [a] tua função fazer essas coisas. Isso foi bom, eu aprendi a resolver um monte de problemas dentro de casa. Eu não sinto, assim, a menor dificuldade de... Nunca senti a menor dificuldade dessa administração, porque a necessidade me fez... Até para consertar pequenas coisas dentro de casa, eu fui obrigada, porque você está em casa, quebra um negócio [e] você tem que se virar, quer dizer, isso eu acho que é uma experiência muito boa também. Não sei se ela cabe nos dias de hoje, porque hoje a sociedade exige outras coisas, né? Exige um status mais... Quer dizer, você tem que contribuir muito mais financeiramente. Você não tem que ter essa contribuição de, vamos dizer assim, física em casa. A permanência física não é tão necessária. Os filhos hoje são já acostumados desde pequenos a terem mais independência ou viverem mais afastados do pai, dos pais. Se isso é bom ou ruim, não saberia dizer para vocês. Não tive essa experiência, então não sei dizer se a experiência de filhos criados longe dos pais se é melhor ou pior. Não sei, não saberia dizer.
P/1 – Elza, quando a Vale do Rio Doce começou a se configurar como uma opção profissional para você?
R – Embora não tenha saído o assunto, mas o meu marido trabalhou na Vale desde 1971. Ele entrou, ele fez o concurso para Vale em 1971, então ele trabalhava na Vale. E a Vale então era a minha conhecida já desde essa época. Eu convivi com a Vale mesmo sem estar aqui dentro durante, a partir de 1971. Minha filha costuma dizer que conviveu a primeira fase, o pai sendo o grande ausente por causa da Vale do Rio Doce, e na segunda, ela diz que, já adulta, ela dizia: “Agora é a minha mãe.” Porque ele saiu da Vale em 1989, então eu conheci a Vale através da relação que existe entre a família do empregado e a empresa. E através até do serviço médico, que me fazia vir aqui muitas vezes, tal, eu conheci amigos dele daqui. Então a convivência com a Vale foi muito, vamos dizer assim, foi muito natural na minha vida. O que aconteceu? Quando criaram o projeto do Jornal da Vale, eu já estava, já tinha demonstrado, já tinha conversado que eu tinha vontade de voltar a trabalhar. E a minha filha, na época, já estava adolescente e eu já não me sentia, assim, tão... Me sentia com, mais à vontade para me afastar de casa por um período maior. Então surgiu a oportunidade de... Não me lembro se foi uma confraternização, em alguma coisa que eu vim aqui na Vale, eu conheci esse grupo que fazia parte desse projeto do Jornal da Vale. Fui apresentada para várias pessoas desse grupo e uma delas, uma pessoa que trabalhou no jornal, que era, na época, assistente do editor do Jornal, que [é] o editor de Jornal, era o Mariozinho (Rula?), e ele tinha uma assistente, a Françoise Verneau, que eu fui apresentada e a gente ficou conversando. E quando ela soube que eu tinha feito Comunicação, tal, ela me perguntou: “A gente está aumentando o grupo aí. Nós precisamos de algumas pessoas no projeto. Você tem algum interesse?” Eu, lógico, falei que teria, que embora eu não tivesse experiência nenhuma na área de comunicação, que eu nunca tinha trabalhado com isso... Ela falou: “Não, mas tem até... Nós até precisamos mais na parte administrativa.” E aí, então, desse encontro é que depois ela me convidou para um almoço para a gente conversar sobre se esse interesse era real, se eu tinha mesmo, se eu gostaria de fazer uma experiência e foi quando eu vim. Aí, depois de alguns dias, acabou que, então, resolveram que eles me contratariam. E eu, então, fiquei trabalhando para o Jornal durante, eu trabalhei durante três anos e meio mais ou menos. Três anos como autônoma, né? Aí é que o grupo todo foi absorvido, quer dizer, todo não, parte do grupo foi absorvido pela Vale. Já havia um interesse na Vale... Da mesma forma que o projeto Carajás foi primeiro feito um projeto e aí, então, as pessoas foram absorvidas. O projeto do Jornal foi um processo, mais ou menos, parecido.
P/1 – O que era esse projeto do Jornal da Vale?
R – Era a elaboração do Jornal. Era [a] confecção do Jornal. Hoje o Jornal é um dos seis veículos da Vale. Hoje nós temos [o] Jornal da Vale como um [de vários] dos veículos de comunicação, sendo que na época era só tinha dois veículos. Tinha o Jornal da Vale e uma revista, que já estava, assim, no final. Já tinha, já não havia tanto interesse na manutenção dessa revista da Vale. Ela não era mensal, tal. O Jornal era um projeto de elaboração de um veículo de comunicação. Ele era... Aqui, era o único. Sendo que nas operacionais, já tinham aqueles veículos pequenos das regionais, né? Sempre teve jornal local e o Jornal da Vale tinha as pautas que eram trazidas por colunistas, não só de fora como também por representantes nas operacionais do próprio jornal. Eles não eram empregados do Jornal, mas traziam matérias e traziam, tinha uma coluna de interesse dos empregados, que era a Coluna do Cabrito. Então era a Manuela, que era repórter do Jornal, que fazia essa coluna e ela, na verdade, ela reportava tudo que o empregado tinha de, para dizer, reclamar, sugerir, tal. Um meio de você se comunicar através do jornal. Jornal tinha... Eu não conheço tão bem a parte de redação do Jornal, porque nunca fiz parte da redação. Tinha área de redação, tinha uma área de pesquisa e documentação. Tinha o jornal de recortes. Ele era composto, mais ou menos, de quatro partes. Tinha, então, a parte de redação, a parte de pesquisa e documentação, tinha o jornal de recortes e a parte administrativa. Isso tudo compunha o Jornal da Vale. E o projeto englobou essas quatro atividades dentro do jornal, mas vieram só metade das pessoas que participavam do projeto, porque não havia condições. A Vale tinha um número certo de vagas que ela poderia... Ela estava limitando a 35 vagas [para] o projeto, na época. Então, embora tivesse muito mais gente, mas não havia possibilidade. Aí o Jornal foi absorvido pela superintendência de comunicação, então ele ficou subordinado na época ao João Manoel, que era o superintendente de comunicação. Na verdade, o Jornal, ele era, no primeiro momento, ele era subordinado à presidência. Subordinado à secretaria geral com a formação que tinha a Vale na época. E quando foi absorvido o projeto é que ele veio para a Comunicação. Aí ele foi, ficou subordinado à superintendência de comunicação. E permaneceu, depois, até os dias de hoje; Só que hoje ele faz parte da comunicação interna. O que mais eu tenho para dizer?
P/1 – Só uma curiosidade, esse nome Coluna do Cabrito tem a ver com alguma coisa específica? Era o quê?
R – Era uma forma de dizer que podia berrar, podia reclamar, você tinha liberdade para isso. Você ligava para Manuela, - quando não escrevia, você podia ligar para ela - por isso que era Coluna do Cabrito, por isso. Era uma forma de você berrar se tivesse alguma coisa que tivesse te incomodando ou até que você quisesse exaltar na tua área, que você quisesse elogiar. Era uma maneira que você tinha de externar a sua opinião. Então, não só no jornal local você podia fazer isso, mas [também] através do Jornal da Vale, era através dessa coluna. Ela tinha um ramal que ficava aberto direto para as sugestões, para os berros e tinha o desenho de um cabrito mesmo.
P/1 – Isso era nos anos 80?
R – Isso durou até, a Coluna do Cabrito deve ter durado até 1991, 1992. Isso veio desde a criação do jornal, que foi, na verdade, a criação do jornal foi muito anterior a isso. Foi, eu tenho impressão... Eu me lembro bem. Aí eu já, eu não fazia parte da Vale, mas eu tenho impressão de que a criação do jornal foi em 1982, por aí. 1982, 1984, que era feito por um grupo muito pequeno ainda. Quem tem uma memória melhor dessa época é o João Lara, que é o nosso precursor aí da área de comunicação. Eu acho que [ele] é a pessoa, eu tenho a impressão de que é a pessoa mais antiga da área de comunicação daqui. É o João Lara.
P/1 – Qual era o teu cotidiano de trabalho? O que exatamente você fazia?
R – Naquela época? Olha, na época, nós cuidávamos de toda parte administrativa do jornal, ou seja, tudo que, vamos dizer assim, o expediente que precisaria ser submetido ao editor. A parte, tinha uma pessoa que cuidava da folha, da folha de pessoal, que passava os dados para a Vale. Essa relação administrativa entre o jornal e [a] Vale era feito por esse grupo. Éramos em três pessoas que trabalhávamos com a parte administrativa. Então, na verdade, eu passei a conhecer muita gente da Vale do Departamento Pessoal, do Departamento Contábil. A minha amizade com esse grupo até hoje vem dessa época porque, naquela época, a gente fazia essa mediação dos problemas que o jornal tinha para resolver. Por exemplo, na hora de montar a folha, que tinha uma pessoa própria para isso era. Se tivesse algum problema em algumas das RPs, todos eram autônomos, então se faltasse algum documento... Enfim, aquela parte toda administrativa de pessoal era cuidada por essa equipezinha de três pessoas e mais essa quarta que era, exclusivamente, dedicada a parte da folha. Então, a relação com a Vale começou aí de eu conhecer as pessoas. Foi a partir desse momento, dessa troca de necessidade de adaptação, por exemplo, da... No último ano, eu me lembro que tinha uma pessoa da área de Comunicação já da Vale que foi para o jornal para tentar ver qual era a pessoa que poderia, vamos assim, fazer o intercâmbio da parte orçamentária do jornal, do custo do jornal, para que ele fosse coerente com a linguagem contábil da Vale. E eu fui essa pessoa. Como no meu currículo tinha lá que eu tinha feito um curso de orçamento e programa na época que eu estava em São Paulo ainda - eu fiz na USP um curso de Orçamento e Programa. Isso deve ter alertado para esse assessor, na época, [que] procurou alguém do jornal que pudesse fazer isso. Ele testou a mim e uma outra pessoa, e acabou que ficou comigo isso. Eu tive, realmente, bastante facilidade em identificar custo do jornal com a linguagem que a Vale tem até hoje, que é uma linguagem relativamente, eu não diria complicada, mas ela é muito própria da Vale do Rio Doce. A Vale do Rio Doce trata a parte contábil... São contas, são códigos contábeis que ela identifica nomenclaturas, gastos dentro da empresa. Esse acompanhamento orçamentário eu já conheço desde daquela época [e] eu faço isso até hoje. Acabei me especializando nisso até porque eu tenho facilidade com essa linguagem, não tenho muita dificuldade para entender isso. Então a minha relação com a Vale foi maior através disso. Esse conhecimento que eles tentaram ver [de] quem é que do jornal poderia passar para eles, [de] como é que eram interpretados os custos do jornal. Eu comecei esse trabalho com esse assessor, que foi o Antônio Marques, que trabalhava na assessoria da superintendência de comunicação. Aí quando nós fomos admitidos pela Vale, ele acabou, eu acabei continuando no jornal. Eu continuei no jornal por mais um ano. Como eu já conhecia esse trabalho desenvolvido por esse assessor, eu acabei, acabou que ele convidou, ele me convidou para trabalhar com o grupo dele. Nós éramos em quatro trabalhando com a parte orçamentária da Comunicação. E a partir daí, foi no que eu fiquei, vamos dizer assim, durante, de 1991, no final de 1991, início de 1992. Eles, então, me transferiram para superintendência de Comunicação. Eu saí do jornal. Me transferiram para essa assessoria e eu trabalhei com esse assessor até 1996. Aí ele faleceu. Acabou que, aí veio logo em seguida a privatização. Nessa época, eu já era gerente de divisão. Fui na gestão dele. Ele, a gente tinha ele como assessor, mas a minha área antes de ser gerência, era subordinada a ele. Que mais que [eu] teria a dizer? Bom, a experiência com a Vale... Eu tinha muita relação com outras pessoas da Vale, muito maior relação com as pessoas da Vale, na verdade, de que, às vezes, com as pessoas da própria área de Comunicação. Porque o assunto que nós tratávamos, ele era muito mais com a Vale, com a área Contábil da Vale, com a área financeira, com o Departamento Pessoal. Isso facilitou muito o conhecimento das pessoas, com os grupos da Vale, os outros grupos.
P/1 – No tempo que vocês prestavam serviço, [com] a Vale fazendo jornal, vocês trabalhavam aqui dentro da Vale ou vocês trabalhavam em outra?
R – Nós trabalhávamos no Edifício Santos Dummont, que é esse redondo aqui do lado, que a Vale tinha salas lá. Tinham várias áreas da Vale lá e nós trabalhávamos lá. Depois que as pessoas foram absorvidas em 1990, é que viemos para o Barão de Mauá. Aí vieram todas para cá. Nós fomos, quer dizer... Aliás, não. Por um tempo ainda ficamos lá, porque não tinha espaço suficiente aqui no décimo sexto. Depois, em 1992, é que o jornal veio todo para cá. Mas no primeiro momento nós trabalhávamos lá no Santos Dummont.
P/1 – Então você sempre trabalhou nessa área orçamentária?
R – É, acabou que eu fiquei, quer dizer, aí fiquei completamente afastada, vamos dizer assim, da minha formação. Valeu muito mais para o meu trabalho, no fundo, o que eu aprendi de administração. Acabou que eu utilizei até muito mais. Isso foi, lógico que a experiência, o dia a dia, é lógico que... Claro que eu não posso esquecer que eu entendo bastante disso, mas da linguagem de comunicação. Eu não posso nunca esquecer que é fundamental e é o que eu conheço bem. Por exemplo, eu conheço bem quanto custa alguma coisa relativa a comunicação. Eu sei cuidar muito bem disso com relação às coisas ligadas à comunicação. Eu não poderia dizer: “Ah, eu sou...” Eu conheço bem a parte orçamentária da área, sei lá, da área de RH [Recursos Humanos], Da área comercial, não. Não é isso. Eu conheço bastante bem a parte orçamentária da área de Comunicação. Sei como é que funciona, como... Quais são as... O que tem de influência, o que é que muda, o que é que pode influenciar quando a empresa... Esse ano eu quero que a minha imagem seja x, aí eu sei o que isso representa financeiramente. O que é que precisa de investir, vamos dizer assim, para... Como você precisa acompanhar o orçamento. Onde é que precisa gastar mais para isso mudar. Então eu, na verdade, eu entendo é disso. Embora...
P/1 – Os próprios produtos, né?
R – Exatamente.
P/2 – Tem um diálogo grande com...
R – Tem. Não, isso com certeza. A minha linguagem é completamente, tanto que no meu trabalho a gente bolou essa equipezinha que trabalhou lá atrás em 1992, 1993, nós criamos uma planilha, um relatório que até hoje é utilizado, que ele apresenta a linguagem Vale do Rio Doce do lado esquerdo e do lado direito. A linguagem da comunicação num único documento, que foi a forma que nós encontramos de conseguir estar falando com a Vale [e], no mesmo momento, você conseguir conversar com o jornalista, conversar com o técnico de, o técnico de Relações Públicas. A pessoa especialista hoje em material promocional que, eventualmente, é uma pessoa formada em programação visual, porque é complicado para uma pessoa da área de comunicação para você falar a linguagem financeira da Vale. Não é uma linguagem comum. A Vale, ela tem uma linguagem muito própria para a área financeira dela. Então, e a comunicação é uma coisa estranha para a Vale, vamos assim dizer. Ela não é um produto fim [principal atividade da empresa]. Então, na verdade, a Vale entende bem dos seus produtos, [como], minério etc. Quando você fala de comunicação, você conversa hoje com a área, por exemplo, financeira sobre divulgação. Para nós, isso tem todo o detalhamento que é um relatório anual, que é um filme institucional. Tem toda uma... O que é que você precisa para fazer um filme, o que você precisa para montar um relatório, que não é a mesma linguagem de um engenheiro, não é a mesma linguagem de uma pessoa da área de RH. Embora hoje todas [as] profissões já pensem e vejam esse lado da comunicação, mas isso 10 anos atrás não tinha essa conotação. Então essa transição, essa, vamos dizer assim, essa tradução do que a Vale pensava de dinheiro com relação aos custos de comunicação eram traduzidos nesse trabalho que a gente fazia nesse relatório, onde tinha as duas linguagens, que era linguagem da comunicação [e] linguagem da Vale. Isso existe até hoje, funciona muito bem. Facilita muito o entendimento do técnico em comunicação. Na hora que ele faz a leitura mensal, a gente faz o acompanhamento do orçamento e produz esse relatório mensalmente. Isso fica disponível na rede. A pessoa pode entrar a qualquer momento, mas eventualmente quando nós fechamos o mês, a gente sempre faz quando envia o relatório para uma área que faz o acompanhamento orçamentário da Vale toda. A gente alerta que está pronto o relatório do mês tal e a gente nota que eles têm facilidade quando eles fazem a leitura, cuja a linguagem é de comunicação. Quando você vê lá, “gastos com recepção de visitantes” é diferente de você ter lá, como a Vale tem listado “gastos com fretamento”, “gastos com carro”, gastos com não sei o quê; Quer dizer, isso aí é transformado num pacotinho e que vai lá para o RP [Relações Públicas]. Ele acaba entendendo o que é que ele gasta quando ele recepciona um grupo de visitantes na Vale, quer dizer, então... Vamos dizer assim, a elaboração desses relatórios facilitou um pouco a linguagem para todos os lados, não só para nós de Comunicação, como também para a própria Vale, para a própria área hoje que acompanha todo o orçamento.
P/1 – Quais foram os principais desafios que você enfrentou nesse tempo de Vale?
R – Foi conseguir dentro dessa atividade orçamentária a Eco. Isso foi um grande desafio. A gente ficou, nós ficamos 1992 e 1993 fazendo experiência com esse projeto, com esse sistema para a partir de 1994, oficialmente, a gente utilizar com segurança, a ponto de você entrar lá no sistema. Listava, punha o número do projeto ou o nome, ele trazia, não só na época [e] na moeda corrente, como em dólar, todo custo do projeto em todas as regiões; Quer dizer, foi quando a gente conseguiu levantar e ver todas as ações que eram feitas de comunicação. Por exemplo, tinham muitas coisas que eram feitas em Vitória, de apoios que a Vale fazia, patrocínios, eventos, feiras. [Já] a participação em vários projetos da região, a gente não conseguia. A gente não conseguia ter aqui no Rio uma noção disso. Era complicado trazer esses dados, as informações demoravam muito ou então não eram 100% confiáveis. A partir do momento da instituição desse sistema, a gente passou a poder fornecer mensalmente. A gente tinha a relação de todos os projetos que estavam sendo desenvolvidos em cada uma das regionais. Isso aí passou a ser uma, foi um grande desafio. Foi um desafio porque era uma coisa completamente nova, não tinha nenhuma outra área que usasse um sistema de acompanhamento de projetos como a nossa área, né? Isso foi usado até 1997, na época da privatização. Depois, com a reestruturação da área, deixou de ser usada. Hoje nós temos novamente, mas hoje com os recursos, já que são... Hoje a gente tem “link” direto com Vitória, com as nossas regionais: com Carajás, com São Luís, com Minas. Então hoje, nós temos isso na tela pelo sistema de controle, que é o sistema de gestão, mas na época, isso foi um dos maiores desafios que nós tivemos. Um outro segundo desafio foi a condução do processo de privatização, do qual eu, eu como profissional, não participei diretamente, mas a área participou. Eu diria para você que foi uma coisa, assim... Como é que eu vou classificar para não parecer que foi uma coisa pesada... Foi uma coisa... Foi uma novidade, e como toda novidade, eu tinha, não aceitei de forma ruim porque era uma coisa, era um fato... Não adiantava, não tinha o que questionar. Mas ao mesmo tempo, em alguns momentos, era um pouco constrangedor, porque dava a impressão para as outras áreas, pelo menos era o que eu sentia, dava impressão às outras áreas que a gente tivesse mais informações que eles, que a gente soubesse de mais coisas que a maioria do empregado soubesse. Não era o caso. Realmente, não existia dentro da área de comunicação... Existia um órgão, uma área que foi criada, exclusivamente, para tratar desse assunto. Então não era assim, não se tinha tanta...
P/1 – Era uma novidade muito polêmica...
R – Exatamente, exatamente. Foi um processo, que eu diria, um pouco doloroso mais pelo lado emocional, pelo lado das pessoas que a gente via se desligando por medo. Muita gente se desligou antes do tempo porque não sabia o que ia acontecer. Eu diria que eu me arrisquei. Eu acho que essa é uma característica que eu tenho. Dificilmente eu largo um jogo na metade, seja ele qual for. Mesmo que tenha característica que eu vou perder, não importa, eu vou até o final. Esse é o meu perfil. Eu tenho isso como característica: eu vou até o final. Não quero saber, mesmo que seja para chegar lá na frente e quebrar a cara. É mais uma experiência. Mas muita gente na época: “Ah, se fosse você sairia nessas _________, não só pela sua idade, como o risco que você vai correr.” Não, vou correr o risco. Não importa. Eu gosto do que faço, não vou abrir mão. A não ser que seja convidada a sair, mas senão, não. Então isso foi doloroso porque houve muita gente, assim, muito boa, profissionais bons saindo exatamente por isso, porque não sabiam o que ia acontecer. Então acabaram optando por pedir para ser beneficiado pelo incentivo, que na época teve. O último foi 1997 mesmo e já tinha tido alguns antes, então esse processo foi doloroso. Pós-privatização, eu diria que foi pior. Depois da última (DDE?), para a nossa área, ela ficou tão esvaziada, que foi bastante... Foi complicado. Os últimos meses de 1997, outubro, novembro e dezembro de 1997, foram bastante complicados, emocionalmente falando. Nosso superintendente também saiu numa dessas (DDE?). Então nós ficamos, assim, com uma pessoa que ficou temporariamente até que viesse um novo coordenador e onde, quando a área foi reestruturada, tal. Então foi tudo novo. Veio uma pessoa de fora que não era da Vale, com uma visão diferente. Foi uma experiência muito boa, até que foi uma experiência nova e boa. Não foi ruim não. Na verdade, a vinda das pessoas de fora [foi] muito bom para nós. Trouxe muita troca, trouxe uma visão diferente, não só da Vale, a visão que eles tinham lá de fora da gente, como, muita coisa boa. Houve uma troca muito boa, como há até hoje, né? Hoje, a gente vê com olhos diferentes a vinda de um profissional de fora. Eu acho que ele sempre soma muito. Na época era, não era comum, né? Então era até visto um pouco mais... E, normalmente, eram cargos mais altos que vinham de fora; Geralmente um diretor, uma pessoa de nível mais alto. Não era comum. Já nos últimos anos, não tinha mais concurso. A Vale há muito tempo deixou de ter, né? Nem sei quando foi o último que ela teve. Mas... Então, quer dizer... Na verdade, acabei passando por esse período, que não foi muito bom emocionalmente. Em 1998 foi meio turbulento porque a estrutura estava acontecendo. Aí depois ela passou a ter uma vida com um foco diferente, mas aí voltou, vamos dizer assim, a normalidade. Mas era um grupo bem pequeno. Nos últimos, diria, nos últimos 14 meses ou mais um pouquinho, é que aí houve já uma segunda, uma outra mudança. Foi a segunda reestruturação pós-privatização, que é como está o formato que está até hoje, que eu acho que agora, agora para frente, a tendência é essa mesmo, né? A cada ano ou a cada período há uma nova mudança para que haja adaptações às necessidades e às metas que se queiram atingir. Então acho que dependendo muito das ______ que a Vale determina para ela, a área vai se amoldando a isso. Hoje, a comunicação, eu sinto que ela tem uma importância bastante grande. Ela teve um momento lá atrás que foi assim. Depois teve um momento de, que ela hibernou um pouquinho, né? E hoje não. Eu acho que hoje ela voltou a ter uma importância muito grande porque o próprio mundo dá mais importância à comunicação, tal. A única experiência negativa que eu acho que eu tive nesse período e não foi só eu, eu acho que aí... Eu acho que foi... Eu me arriscaria [a] dizer que a empresa sofreu, foi que a gente perdeu um pouco da memória da Vale, por questões até de... Talvez de, não sei se eu poderia dizer que fosse planejamento. A gente não conseguiu, talvez, um planejamento adequado para não perder todas as histórias. Como as pessoas saíram meio que de sopetão, algumas, né, e não tínhamos bancos de dados na época, vamos dizer assim, bons. Então muita informação se perdeu, que foi embora com essas pessoas. Algumas áreas conseguiram manter as suas memórias passadas, mas eu acho que a maioria perdeu muita coisa.
P/1 – E assim, você até já tocou... Do seu ponto de vista, qual seria a importância da área de comunicação, tanto para dentro da empresa como para fora? Você está falando que é uma área que, ultimamente, tem ganhado muita visibilidade. Seu ponto de vista.
R – Meu ponto de vista é que hoje você não consegue viver sem se comunicar. Então hoje, uma empresa que não tem uma boa área de comunicação, ela não consegue mostrar o que ela faz, ela não consegue entender o que o público alvo gostaria de receber. Então hoje, eu acho fundamental... Eu nem digo isso porque... Eu acho que isso não é só para Vale. Eu acho que isso, eu falo em termos gerais, hoje é de extrema importância que você tenha um, esse canal muito bem estruturado, muito aberto, muito transparente. Na minha visão, esse trabalho tem que ser sempre muito transparente. Você tem que passar confiabilidade, principalmente isso, para você, vamos dizer assim: para você ter crédito, acreditar realmente numa empresa, ela tem que fazer uma comunicação bastante transparente. Ela tem que mostrar isso através dos recursos que ela tem de comunicação. Então acho que está sendo importante para a Vale. Eu vejo que a nossa... O escalão mais alto da empresa hoje, eu acho que dá importância a isso. Eles têm preocupação com a imagem da Vale. A gente não pode esquecer que... É claro que sempre depende de onde você quer chegar, o que você quer, mas se você quer ter um reconhecimento, seja ele nacional ou internacional, não é só pelo produto, que se fosse por isso, nós não precisaríamos de trabalhar tanto a imagem. Mas não é só isso. Não adianta você só ser bom no seu negócio, você tem [que] ser bom, você tem que ser responsável socialmente, você tem que valorizar as coisas do local que extrai os seus produtos. E você tem que mostrar isso também para a sociedade. Eu noto que a Vale, ela sempre fez muita coisa para a sociedade, mas ela pouco falava disso, por questões de orientação, de política mesmo. Eu acho que não era hábito. Eu não posso falar disso porque não conheço quais as regras daqueles anos lá atrás para isso. Não sei qual era o objetivo exatamente do governo quando participava com a maioria na não divulgação das coisas que a Vale fazia, mas eu acho que a Vale, ela sempre fez muita coisa pela sociedade, só que não aparecia, não... Isso não ficava muito claro. Hoje a gente consegue mostrar um pouquinho melhor. Eu acho que ainda falta, a gente ainda não conseguiu atingir, talvez, o ideal, mas está se trabalhando muito nisso, de tentar mostrar o que realmente ela faz em relação... É que aqui no Rio, como a gente não tem uma comunidade de influência tão grande, nossa área de atuação, na verdade, não é aqui; Então isso é muito mais forte nas áreas operacionais. Então eu imagino que [se] você falar da Vale do Rio Doce no Rio de Janeiro, você vai encontrar muita gente que vai falar: “O quê? Varig?” Quando você fala: “Trabalho na Vale.” “Na Varig?” Mas se você falar isso em Itabira, se você falar isso em Vitória, eu tenho certeza de que a imagem é uma outra muito diferente. Mesmo no Norte, se você conversar não só em Maranhão, quanto em Belém, se você falar na Vale é um peso diferente do daqui do Rio, daqui em São Paulo. Então eu acho que a comunicação tem contribuído muito nesses últimos anos para essa mudança, vamos dizer, de imagem da empresa. Acho que ela vem contribuindo e ainda acho que ela tem bastante coisa que ela pode ainda contribuir.
P/1 – Próprio conceito de responsabilidade social é um conceito mais recente, né, de capitalizar isso para a imagem da empresa. Isso não era comum há uns tempos atrás.
R – Mas eu acho que a Vale sempre fez isso. Ela, talvez, ela não tenha, ela não fizesse com tanta, vamos dizer, no volume que hoje ela se propõe, mas eu acho que ela sempre fez isso. Tem vários projetos que a Vale sempre desenvolveu, que já eram de responsabilidade social, só que não tinha esse nome, e que não havia necessidade de ficar fazendo propaganda. Hoje a gente mostra mais o que faz, mas eu acho que ela faz muita coisa hoje. Mas isso já é... Eu não diria que “Ah, a primeira vez que a Vale está fazendo isso.” Não. Eu acho que ela já fazia, ela já contribuía bem com várias regiões. Só que hoje ela faz isso, talvez, até melhor, com um trabalho mais dedicado, mais pontual. A comunicação tem sido uma ferramenta muito importante nessa hora. Eu vejo um trabalho que é desenvolvido pela nossa área. Tem um segmento da nossa área que é desenvolvimento social, que é um trabalho muito bonito que é feito junto com a fundação e que tem, assim, embora seja um pouco recente esse trabalho, esse novo projeto, mas ele já traz alguns resultados bastante satisfatórios. E, assim, a gente se sente orgulhoso de pensar que a Vale está fazendo alguma coisa e que agora a gente pode até mostrar mais, através da propaganda, mostrando: “Olha, fizemos isso, tal.” E como esse governo é acentuadamente de responsabilidade social, eu tenho impressão de que ela vai trabalhar até de forma mais confortável, que eu acho que também é o futuro do próprio país. Eu tenho impressão que todas as empresas, agora para frente, elas têm que abrir os olhos. Eu me lembro que, algum tempo atrás, eu sempre observei muito as propagandas do Boticário, não fazendo a propaganda do produto, mas que era uma coisa interessante quando falava do meio ambiente. Já era uma coisa que me chamava atenção, que isso não é de agora. Então isso é muito importante e eu sempre achei até estranho: “Poxa, a gente faz também tanta coisa, mas por que a gente não pode... Não divulga da mesma forma?” Mas devia lá ter seus motivos para isso não acontecer.
P/1 – E tem algum projeto em particular que te sensibiliza da Vale? Essa questão do Boticário...
R – Eu acho que o fato de você... Por exemplo, as comunidades da região de Carajás: quando você valoriza aquilo que os índios fazem, que a gente traz, até às vezes compra para presentear a grupos. Isso eu acho que é uma coisa que você está trazendo isso para, você está não só mostrando aquilo que nós temos hoje de tão lá longe, que nem nós aqui conhecemos. A gente tem alguns produtos feitos com material de lá. Área de comunicação tem isso e é muito interessante. Um projeto que eu acho que vai ter muito sucesso, que está começando, é esse projeto que está sendo desenvolvido com a fundação junto às escolas. É uma novidade ainda, não poderia falar grande coisa para vocês até por desconhecimento e também porque não sei em que ponto está o projeto para que se possa estar conversando sobre isso. Mas eu noto que na parte de meio ambiente, eu acho que... Dizer assim: “Não, mas não é verdade que ela não polui.” Não. A gente tem que ser realista. Ela faz isso mesmo. Se não fosse ela, outra faria. Quem tivesse que explorar estaria fazendo isso. Só que, ao mesmo tempo, ela também recupera e isso, às vezes, não tem o reconhecimento que eu acho que deveria ter; Nessa hora eu visto muito a camisa da Vale. Eu acho que a Vale, pode ser que ela ainda, ela tem muita coisa para fazer, mas ela sempre fez muita coisa. Ela nunca deixou. Eu pelo menos, na minha visão, ela nunca deixou, assim, tão... Vamos dizer assim: “Ah, deixou de lado isso.” Não, não. Todas as vezes... Ela, até cumprir com todas as exigências da _______ etc. Então acho que ela cuida dessa parte de meio ambiente. Não sou técnica para dizer se é a melhor forma de cuidar, mas na minha visão eu acho que ela cuida. Ela não está deixando isso de lado não.
P/1 – Tem alguma coisa marcante, algum fato marcante dentro da Vale que você queira lembrar?
R – Olha, eu noto o seguinte, que eu não gostaria de deixar de dizer. A área de comunicação da Vale, ela tem uma característica que eu vejo que é um pouquinho diferente das outras. Eu não quero dizer com isso que as outras não tenham, vamos dizer assim, que os grupos não sejam tão amigos, não tenham... Eu não sei como diria isso, mas existe uma relação muito boa com o grupo da comunicação. Eu acredito que nas outras áreas exista, mas não com tanta afinidade, com tanta cumplicidade, com tanta... Vamos dizer: tem muita amizade entre o grupo da Comunicação. É uma coisa, assim, que... Por exemplo, ficou famoso o encontro, uma festa que é característica da Comunicação, que é a Festa dos Bem Chegados, que esse nome foi o João Lara [que] batizou essa festa. Ele [e] Cristina Rosas são os dois grandes responsáveis por essa festa acontecer todos os anos e é uma das festas mais concorridas da Vale. Todo mundo quer participar. Por quê? Porque realmente é uma festa que cujo o nome é exatamente isso. É Festa dos Bens Chegados. Todas as áreas são muito bem chegadas. Então isso daí é uma característica que eu vejo na comunicação. Eu não saberia te dizer que, [se] tem uma outra área que seja tão, assim, receptiva quanto a nossa. Se é característica do comunicador, talvez. Mas isso é uma coisa bastante marcante nesse lado... Esse lado, assim, amigo, esse lado festivo que, às vezes,... Sabe, a comunicação não é tão pesada. Ela consegue mesmo na toda turbulência, ela consegue fazer com que o dia a dia seja mais leve. Eu não diria assim: “Nossa senhora! Entrei na Vale, me aborreci o dia inteiro.” Não, não tem muito disso. É claro que a gente tem problemas como todas as áreas, mas na Comunicação, a gente sente um clima mais leve, sabe? Eu acho que é o próprio perfil dos profissionais da área, de saber lidar, ter jogo de cintura para lidar com as situações críticas de forma mais suave, não tão desesperada. Quer dizer, é lógico comparar a nossa área com uma área que trabalha com ações, com mercado [que] deve ser muito diferente. Mas eu tenho muito boa impressão da nossa área. Embora eu goste da Vale como um todo, eu gosto muito da área de Comunicação. Me sinto bastante... Acho que foi um privilégio trabalhar esse tempo todo nessa área. Me sinto, assim... Já foi gratificante esses anos todos aqui. Claro que eu pretendo me aposentar, mas como eu não tenho características de saudosismo, não tenho essa história de: “Ah, eu queria...” Não, não tem isso. Claro que eu vou inventar um projeto novo lá pela frente, mas sei que no fundo vou sentir muita saudade da conivência com esse grupo aqui.
P/1 – Aproveitando o gancho, você tem algum sonho que você queira ainda concretizar?
R – Profissionalmente não. Não pretendo, assim, começar nada novo. Como sonho eu tenho isso nessa área social que eu quero me dedicar a algum projeto. Eu já fiz isso, eu fazia isso quando eu estava... Esse tempo que eu fiquei parada, eu aproveitei e me engajei num grupo em Niterói e fiz bastante trabalho comunitário. Gostei muito. Foi uma coisa que me trouxe bastante satisfação, então eu gostaria de voltar a contribuir. Se não for com esse grupo, com um grupo que... Com certeza, vou encontrar um grupo que eu possa fazer isso. Isso é uma coisa que eu quero, eu tenho vontade. Assim, eu acho que tem... Até com o fato de ter tido muita experiência aqui em muitas áreas, em muitas coisas, muitos projetos que eu vi acontecer na Vale. Acompanhei, embora às vezes [tenha] participado, mas eu acho que posso contribuir com alguma coisa em projetos sociais lá fora. Quer dizer, não tenho, assim, intenção de pensar num novo trabalho, mas... Remunerado, nada disso, mas eu quero... Assim, quero tentar desenvolver um projeto social onde eu possa realizar esse lado aí que fica meio que... Na verdade, a gente fica se achando, assim, devedor, né? Já que eu tive o privilégio de não ser, de ser uma pessoa que pude viver relativamente bem financeiramente, nunca tive grandes necessidades, então eu acho que está na hora de eu contribuir, de eu devolver um pouquinho aí a sociedade.
P/1 – Além do trabalho, o que você faz nas tuas horas de lazer?
R – Olha, atualmente, eu estou com um probleminha de família, que eu não tenho tido no último ano. Eu não tenho tido muito, muito tempo para me dedicar às outras coisas que eu gosto. Mas hora de lazer para mim é o quê? Praia que eu adoro. Adoro, adoro praia, mas eu faço além de praia. Eu não só gosto muito de leitura, como... Eu moro em casa e tem jardim, então eu adoro mexer em jardim. Gosto muito disso. Não tenho, assim, não sou muito de sair para, vamos dizer assim, já tive uma época de sair para clubes, tal. Hoje em dia não. E no último ano é que eu tenho tido menos tempo. Então, mas, na verdade, os finais de semanas meus têm sido mais até de recuperação de tempo, até com a família, porque como atualmente sobra pouco tempo durante a semana para você sentar, conversar... Tem coisas que a gente só consegue resolver em final de semana. Então, os finais de semana, embora não tenha muito lazer, é mais para essa complementação.
P/1 – Então a gente vai se encaminhar para a finalização da nossa conversa. Queria te perguntar o que você acha desse projeto Vale Memória, que a Vale está fazendo esse projeto contando a sua história, mas através dos depoimentos orais. E o que você acha de ter dado o seu depoimento?
R – Eu acho que isso veio para, vamos dizer assim, veio para cobrir aquela lacuna que eu estava dizendo que a Vale tinha perdido muito, quando ela perdeu algumas pessoas que não tinham como deixar a memória por escrito. Então eu acho que esse projeto está resgatando [isso]. Não sei se vai conseguir resgatar no todo, que eu não sei se vocês conseguem ter contato com todas as pessoas que, talvez, vocês quisessem ou pudessem. Mas eu acho que isso vai contribuir muito para... Esse projeto vem para trazer isso que eu senti que se perdeu um pouco. Não sei o tamanho, qual tamanho que terá o projeto, mas acredito que isso vem para, vamos, assim, dizer, para não deixar a Vale sem memória. Para esse período todo não ficar perdido mesmo. Eu não sei hoje quais são as pessoas. Não sei ainda o que vocês têm projeto para frente, quanto tempo isso ainda vai acontecer, mas acredito que foi uma ideia maravilhosa ter se pensado nesse tipo de projeto. Acho que [se] todas as empresas tivessem uma ideia dessas... Não, porque muitas vezes você ter documentos é diferente de você ter depoimentos, onde tem, no fundo, um pouquinho do que a pessoa sente. Um documento é um documento; Ele só diz as coisas, mas ele não consegue fazer você sentir grande coisa. Quando você fala ou lembra determinadas coisas, você, de alguma forma, você deixa uma sensação, um sentimento, alguma coisa assim.
P/1 – A gente queria te agradecer a tua participação.
R – Eu é que agradeço a participação. Muito obrigada.
[Fim do depoimento]Recolher