Projeto Memórias Companhia Vale do Rio Doce
Depoimento de Luís Costa e Silva
Entrevistado por: José Carlos Vilardaga (P/1) e Cláudia Resende (P/2)
Rio de Janeiro, 28/4/2000
Realização Museu da Pessoa
Código do depoente: CVRD 33
Transcrito por: Cláudia Resende
Revisado por: Fernando Martins
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Projeto Memórias Companhia Vale do Rio Doce
Depoimento de Luís Costa e Silva
Entrevistado por: José Carlos Vilardaga (P/1) e Cláudia Resende (P/2)
Rio de Janeiro, 28/4/2000
Realização Museu da Pessoa
Código do depoente: CVRD 33
Transcrito por: Cláudia Resende
Revisado por: Fernando Martins
P/1: Senhor Luiz, a gente vai começar, a primeira pergunta que a gente faz pro senhor dar seu nome completo, local de nascimento e data de nascimento.
R: Meu nome é Luiz Costa e Silva, nasci em 30 de julho de 1928 na cidade de Paraguaçu, Minas Gerais.
P/1: Os pais do senhor, nome deles?
R: O nome do meu pai era José da Costa e Silva e Judite da Silva Campos, é o nome deles.
P/1: Eles também eram de Paraguaçu?
R: Olha, não eram não, porque meu pai, como era comum na época, ele vinha de outra cidade nas imediações, Campanha, São Gonçalo, Machado e tal, mas ele se fixou em Paraguaçu, eu lembro-me que ele falava que foi na virada do século, foi exatamente em janeiro de 1900, que ele foi lá. Minha mãe, não, minha mãe nasceu em Paraguaçu e já era uma família que veio de fora mas se radicou em Paraguaçu e ela já nasceu em Paraguaçu.
P/1: A atividade que o pai do senhor exerceu na cidade, que tipo de trabalho ele teve?
R: Olha, a narração que eu tenho disso é tradição, porque ele contava que na infância dele, já na infância, nem estudar ele pode estudar muito porque ele se deslocava muito de uma cidade para outra, de uma região para outra, nem sempre ali tinha um professor primário na época. Mas, então, o pai dele, que seria meu bisavô, ele, bisavô nada, meu avô, ele era um homem já de alguma instrução, ele tinha feito um seminário até o quinto ou sexto ano já de seminário e também por razões de necessidade teve que interromper os estudos. Mas ele era um homem que já era considerado de letras, na época. Mas os filhos todos, só existiam dois homens que trabalhavam prá ajudar o sustento da pessoa, e trabalhavam com o serviço que tinha na época, que era o serviço de lavoura, certo? E as mulheres, elas foram casando com outras pessoas, mais ricas outros mais pobres, e a família foi se desenvolvendo em torno dessa forma de viver. Ele contava também que ele exerceu a atividade de lavoura, enxada mesmo, durante alguns anos, sempre se deslocando de uma cidade para outra, indo até pro Estado de São Paulo, naquele tempo ia a pé ou então ia com o cavalo, chegava lá vendia o cavalo, trabalhava, trabalhava, na volta comprava o cavalo outra vez, que ele tinha ficado com o arreio, né? Então, é esse tipo, esse estilo de vida que era da época, próprio da época, mas ele era bastante econômico, alguns até já chamava de pão duro, e ele então conseguiu amealhar algum dinheiro e foi ganhando nome de bom empregado, empregado de confiança tal, acabou sendo administrador de uma fazenda de uma pessoa importante lá em Paraguaçu e trabalhou 14 anos, saiu de lá com reservas pra comprar um pequeno sítio. Ele comprou um pequeno sítio dele, e a partir desse pequeno sítio ele fez o que era muito comum na época, negócio. A pessoa do interior faz negócio, chega vende um cavalo, troca uma égua por um arreio, troca dois arreios por um saco de batata, coisas assim, ele foi um negociante, conseguiu algum dinheiro, casou-se com minha mãe que já descendia de uma família de maior substrato social. O meu avô era farmacêutico, já tinha , imagina, ele era compositor, teatrólogo, ator, tal, era metido! Então ele deixou nome que ainda é até hoje, já quase cem anos depois, até hoje o nome dele ainda é citado lá como um teatrólogo. Mas, então, ela era de uma família já de maior destaque, então, eu nasci nesse ambiente, certamente a família dela não devia apoiar muito o casamento, porque era um pobretão com um família já de melhor estrato social, mas ele caiu nas graças de algum, do sogro, de alguns irmãos tal, e acabou se inserindo na família sem traumas. Nasci nisso, com esse ambiente, com a minha irmã, tenho uma irmã mais velha do que eu, e então eu vivi nesse ambiente, ambiente de cidade pequena, ambiente muito austero em que eram muito importante certos valores, valores de família, valores de obediência, valores de respeito aos mais velhos tal, aprendizado na escola também você levava muito a sério, não faltar, então tudo que era de uma vida do interior na ocasião. Mas, aos oito anos, a minha mãe veio a falecer, então eu fiquei órfão aos oitos anos e sem ter prá onde ir, né, porque meu pai nessa altura, a vida dele era em torno de negócios que eram feitos, ia no Triângulo Mineiro comprar um arroz, trazia arroz, vendia arroz, quer dizer então era um trabalho característico da ocasião, hoje não existe mais isso, hoje se tem os grandes cerealistas e os empórios. Naquele tempo não tinha isso, a pessoa comprava, trazia, vendia, mas, então, não tinha muito prá onde ir não. Então meu pai conseguiu de uma visita pastoral lá do Senhor Bispo, Guaxupé, Dom Hugo (Peçanha?) Araújo, me lembro bem o nome dele, então conseguiu que ele me aceitasse como um agregado no seminário, um interno, porque eles não tinham divisão de menores, quer dizer até tinha divisão de menores, mas talvez não tinha o maternal, porque eu era bem pequenininho, né? Então fiquei em Guaxupé de julho de 37 até dezembro de 38, fiquei lá no seminário, rezando, fazendo e acompanhando os maiores, né, Roberto Campos estudava lá nessa ocasião.
P/1: Roberto Campos?
R: É, estudava lá, logo ele saiu. Mas, então, fiquei neste seminário um ano e tanto, não era um primor de estabelecimento, de educandário, acho que não aprendi nada a não ser alguma oração e a primeira declinação em latim. Imagina, eu não sabia nada e já estava estudando latim e, depois, não, mas os padres, vamos fazer justiça, eles designavam um ou outro seminarista maior para me ensinar, então um me ensinava Aritmética, outro ensinava Linguagem, outro História do Brasil tal, eu ia aprendendo alguma coisa, mas sem fazer parte de um currículo normal, e no final de 38 então eu saí do seminário e fiquei em Paraguaçu, fiquei em Paraguaçu mais um ano, porque o tempo passou, mais um ano eu já tinha que fazer na época o que se chamava de exame de admissão prá entrar no ginásio, né? Hoje é diferente, é complementar, primeiro grau, segundo grau, mas então eu estudei um ano em Paraguaçu com professores particulares e no final do ano, então, eu prestei o exame para o quarto ano primário no Grupo Escolar, porque aí tinha que ser o oficial e então, dali, eu passei no curso primário e meu pai como tinha muita transação comercial, deste tipo que eu mencionei antes, entre Barretos, Uberaba, Araguari, (Tupaciguara?), aquelas cidades na época, então eu como tinha lá algum parente muito chegado em Barretos, eu fui internado no ginásio de Barretos.
P/1: Lá em Barretos?
R: É, foi em Barretos. Então eu estudei lá o primeiro e o segundo ano do ginásio, em Barretos, e na época era considerado um ginásio extremamente livre, eu tinha certas liberdades, era (comum?), era muito livre, não tinha aquela disciplina ferrenha que os colégios adotavam na ocasião. Estudei lá dois anos e, mas o meu pai achava que aquilo era livre demais, ele me visitava, essa família, minha prima, que eram meus primos também tinham bastante cuidado comigo, mas aí o papai achou melhor que eu fosse prá um lugar mais rigoroso e aí eu fui pra Campinas, estudar lá no Liceu Salesiano Nossa Senhora Auxiliadora, dos padres salesianos, e é um grande educandário, _______ estabelecimento, muito rigoroso, ensino muito bom, não tinha aquelas liberdades todas que a gente tinha em Barretos, lá a gente tinha saída uma vez por mês em fila, acompanhado e tal, era um negócio assim meio, meio, meio, meio piada na ocasião. Mas fiquei em Campinas, não era um aluno brilhante, não, eu tinha de, porque a minha base foi boa mas não foi tão boa quanto era necessário na época. Há um episódio aí que foi interessante porque eu estava já no quarto ano, no final, no meado do terceiro ano ginasial quando houve lá uma indisciplina muito grande que eu participei dela e aí levei um castigo, era um castigo de algumas, alguns dias, sete dias, oito dias no estudo, enquanto todo mundo estava no campo de futebol, nadando e tal, a gente ficava estudando, aí aconteceu uma coisa que foi muito bom prá mim, porque eu ficava naquele salão enorme de estudos, de estudo, e tinha, não, e de vez em quando aparecia lá um chefe de disciplina dava uma olhada pra ver se eu estava estudando mesmo ou tava dormindo, né? Então tinha que ler alguma coisa e eu, nessa ocasião, eu aprendi uma coisa que até então eu não sabia, que eu tinha uma memória auditiva muito boa, porque eu sozinho naquele salão imenso que dava prá 90, 100 alunos, eu sozinho ali, então eu comecei a conversar comigo, então eu comecei a ler alto, ler alto e questionar o assunto que eu estava lendo. Eu me lembro bem pegava a História da Civilização, aí eu questionava lá o Nabucodonosor e esses outros caras aí, e sabia, então eu, começou a surgir o resultado positivo porque eu que era o, sei lá, o trigésimo aluno em 35, comecei a ficar em 16, em 11 e tal, até que terminou o ano em quarto lugar, foi um sucesso. Foi um sucesso. Aí, no ano seguinte, então aí já entra o amor próprio, a emulação, essa coisa, então eu já estudava prá tirar uma boa classificação também, e aí eu comecei a ficar inteligente, né, eu comecei a estudar mais aquelas matérias que eu sentia mais dificuldade e fui então, passei o ano todo entre o terceiro e o primeiro lugar. Aprendi, aí eu descobri que eu tinha uma maneira de aprender, eu não podia estudar no silêncio, eu tinha que estudar falando, e eu usei esse método, apareceu por intuição e terminei o ginásio em Barretos e vim para Juiz de Fora. Eu fiquei em Juiz de Fora, quer ver, eu saí lá de Barretos, não, de Campinas, saí de Campinas e veio prá Juiz de Fora porque? Porque desde menininho meu pai dizia: "Meu filho vai ser um perito contador". É, era bonito falar perito contador era um cargo importante, né? Então, é, na época em Juiz de Fora tinha a Academia de Comércio que era famosa no Brasil inteiro, eram duas grandes academias no Brasil na ocasião, era a de Juiz de Fora e a Álvares Penteado em São Paulo, que já era muito famosa, e tinha uma outra em Sorocaba, se não me engano. E então eu fui prá Academia de Comércio e, interno ainda em Campinas, nessa altura eu já estava o quê? Eu já estava com 18 anos? Não, menos, é 1943, eu já estava com 15 anos. Então em Juiz de Fora eu consegui me destacar no curso de contador, até porque eu encontrei um colega também que era meio par comigo, gostava também de estudar, então nós estudávamos sempre juntos apesar de termos nossas carteiras diferentes, mas até no recreio a gente estudava e consegui fazer dois anos de contador muito bons, eu estava no final, nas férias de 1946 por aí, eu estava em Araçatuba, ou Guararapes, lá, visitar minha irmã, quando eu recebi um telefonema, olha que telefonema naquela época não era fácil pra você dar, não, a gente quando tinha que ligar, ficava às vezes tentando de 7 horas da manhã até 6 horas da tarde prá conseguir uma ligação. Então, aí eu tomei conhecimento que eu tinha que voltar imediatamente porque a Academia tinha comunicado que fechara o curso de contabilidade, o curso de contador.
P/2: No meio do curso?
R: No meio do curso e não tinha avisado pra ninguém! Avisaram durante as férias, foi uma medida tomada na calada da noite, né? Me avisaram, aí eu voltei, voltei prá Paraguaçu, de Paraguaçu eu voltei a Juiz de Fora, porque aí eu tinha que tentar, eu tinha um ou dois dias só pra confirmar a minha matrícula num outro estabelecimento. Então, duas grandes oportunidades só em Juiz de Fora, era o Instituto Granbery e a Escola Técnica de Comércio Machado Sobrinho que não tinha lá esses nomes. O Grambery, aí eu não podia ir pro Granbery era colégio protestante, isso na época pesava a beça, a gente não estudava em colégio metodista, de jeito nenhum, nem passava perto, passava do outro lado da rua. Então eu fui pro Machado Sobrinho e conclui o curso de contador no Machado Sobrinho, bem situado, bem colocado, e lá aprendi uma outra forma de convívio escolar, que foi no Machado Sobrinho, que já era um pessoal mais aberto, não era aquela mentalidade de colégio religioso. Terminei o curso no Machado Sobrinho e aí __________ "agora você vai trabalhar", então eu continuei os estudos fazendo Ciências Econômicas em Juiz de Fora, matriculei na faculdade lá de Ciências Econômicas que era, ela era no mesmo prédio que era da Academia de Comércio, mas era outra congregação. Eu estudei lá e me saí procurando emprego. Eu fiz um concurso prá Companhia Mineira de Eletricidade e me dei bem, era uma companhia muito organizada, aprendi, foi uma excelente escola de trabalho que eu tive, tinha disciplina, tinha uma estrutura de cargos e salários, então essa coisa foi me dando uma certa ordenação na cabeça, né? Eu comecei a ficar com a cabeça mais ordenada, padronizada e trabalhei lá enquanto fiz o curso de, enquanto fiz o curso de Ciências Econômicas. Ciências Econômicas ________ na época não existia regulamentação da profissão, a gente ainda estava brigando prá conseguir a regulamentação da profissão, porque ela era exercida ou por engenheiros, ou por contadores ou por qualquer outra pessoa que tinha pendor por aquilo. A gente vinha para o Rio de Janeiro, estudante, a gente se revezava, vinha dois e ficava aí em volta do Senado Federal, lá conversando com o relator da matéria tal, e finalmente saiu a regulamentação, saiu a regulamentação, eu ainda estudava quando saiu a regulamentação. E como eu estava para terminar o curso de Ciências Econômicas em Juiz de Fora, um amigo me viu na rua, falou: "Você quer ir para o Rio de Janeiro?". "Fazer o quê?" "Ah, trabalhar lá comigo, que o diretor vai sair, eu vou ser diretor." Aqueles papos furados de emprego, né, mas tinha emprego, né? E, então, eu falei prá ele: "Eu tenho que dar um aviso prévio na empresa em que eu trabalho, eu sou bem conceituado lá, eu não vou largar assim de repente." E eles exigiam, as empresas realmente exigiam o aviso prévio, não é como hoje que já fala: "Olha, pode ir embora desde já, passa aqui pra apanhar eu dinheiro." Mas, então, pedi demissão lá, me dispensaram a metade do aviso prévio, tá, uma homenagem ao bom empregado, tal, dispensaram a metade do aviso prévio e eu vim pro Rio de Janeiro. Não conhecia nada do Rio de Janeiro, não sabia onde era norte nem era sul, então eu vim para o Rio de Janeiro e já no dia seguinte eu fui trabalhar na Casa da Borracha. Era na época, a Casa da Borracha tinha uma importância relativa muito boa, e como eu não sabia vir do Leblon até a cidade, eu saí de madrugada do Leblon, né? Eu vi lá uma lotação "Estrada de Ferro - Leblon", deve ser esse, eu não sabia se ele tava indo pra Estrada de Ferro ou voltando, mas peguei, ele me ensinou que eu devia saltar lá na Sete de Setembro, seguir a pé até sair na Praça Tiradentes, aí achei o local de trabalho, lugar imundo! Um sobrado, me lembro bem que a hora que o Adalberto falou: "Oh, sua mesa vai ser essa." Eu passei o dedo na mesa assim, cheio de poeira, era da (Targon?), porque tinha uma fundição ao lado, Fundição (Heiner?), e quando eu abri a janela entrou aquele mundo de fumaça preta pra dentro, porque eles já começaram, já tinham acendido a caldeira, né, então aquela fumaça preta, foi um negócio. Prá você ter uma idéia a gente, tava muito quente, então não tinha ar refrigerado, não tinha nada, não tinha água gelada, não tinha nada, então eu pedia gelo num botequim perto, punha o gelo num prato e ligava um ventilador em cima do gelo prá refrescar (risos), então vinha aquilo, até acabar o gelo tava bem, só que vinha pó também, né, vinha aquela fumaça, então a camisa da gente ficava, fim do dia, toda, toda. Lugar horrível de trabalhar mas uma boa escola de trabalho também, aprendi muito lá e, principalmente, porque a gente não tinha muito interlocutor, o pessoal que trabalhava com a gente era de menor nível, então não tinha nada a aprender com eles, então tinha que me esforçar por conta própria e tal. Mas tinha um ou dois diretores que eram pessoas capacitadas, então, com eles eu aprendi alguma coisa. Até que aconteceu que chegou um momento que eu pensei "Bom, aonde que eu posso chegar nesta empresa?" Onde está o, a posição que era do Davi, falei "Ah, é uma posição que não me interessa, né?" Ser o Davi não me interessa, e eu comecei a responder a anúncio, comecei a responder a anúncio de emprego e tal, mandei prá muito laboratório, naquele tempo oferecia emprego, né, hoje não. Mas então, até que um dia eu vi um anúncio que tinha que procurar determinado lugar na Avenida Presidente Wilson e eu tinha que ir à cidade, bom, lá dentro da Casa da Borracha eu fiz carreira, eu comecei lá embaixo na máquina de contabilidade, tal, fui levando e cheguei a contador geral, procurador geral da Casa e gozava da confiança e estima dos diretores que eram boas pessoas. Então, um certo dia eu vim à Justiça do Trabalho para fazer, como representante da empresa, para fazer o pagamento da primeira parcela de uma quitação geral que a empresa estava pagando pra um empregado estável, vocês não sabem o que é estabilidade, aquilo era um horror, então, ele já tinha 20 anos de casa, estável, era 40 meses de indenização.
P/1: 40 meses?
R: 40 meses, depois inventaram o FGTS. Mas, então, fizeram um acordo e eu vim pagar a primeira prestação na Justiça do Trabalho. Feito o acordo na Justiça, marcou-se um dia, eu fui lá pagar a primeira prestação juntamente com o empregado que saía que era o Maurício. E, aí, eu tava com o anúncio na mão, eu fui, bom, me despedi dele: "Então, tá, mês que vem a gente se encontra aqui, no mesmo dia", tal, tudo certo, e aí eu fui até a Avenida Presidente Wilson, cheguei lá fui ser entrevistado. "O que que é isso aqui?" "Companhia Vale do Rio Doce." Eu tinha uma idéia da Vale do Rio Doce porque lá na firma a gente fornecia prá Vale do Rio Doce, então, eu tinha idéia que era uma companhia grande mas não sabia muito a respeito dela, não. Fui entrevistado, Max Alencar Araripe foi quem me entrevistou, e dessa entrevista me encaminharam, me encaminharam para o contador geral, Jamil, aí fui lá ser entrevistado pelo Jamil. O Jamil era um homem bem falante, tal, posudo, na época o cargo de contador geral era muito importante na Vale, a estrutura organizacional dela era diferente, muito diferente, e eu sei que ele acabou se impressionando com a minha entrevista, mas não fui admitido aí não, aí vai prá, perguntei: "Quanto que eu vou ganhar?" Era a metade do que eu ganhava! (risos) Aí também é demais, né? E, então, ele falou: "Você espera, fica esperando aí." Bom, isso foi em março de 64, por aí, "fica esperando", e uns 3 ou 4 ou 5 meses depois eu recebi um telegrama me indicando pra vir à PUC aqui prá fazer prova, e tive minha surpresa quando eu cheguei na prova, no dia marcado aí na PUC e tinha umas 30 ou 40 pessoas prá fazer o teste, tá bom. Eu, na época eu estava muito bem orientado e informado a respeito das modificações da legislação tributária do Brasil, tava começando a surgir o quadro tributário, tava mudando, surgindo aí o fundo de garantia, nem era fundo de garantia, era o FIT, fundo de indenização trabalhista, tal, então, eu estava bastante convicto de que eu tinha condição de fazer uma boa prova, mas e os outros que estavam ali? Tinha gente vindo de Belo Horizonte, uns já eram professores, bom, aí, primeira prova, primeiro dia de prova foi um, foi um teste psicotécnico, eu nunca tinha estado na frente de um psicotécnico, achei besteira aquilo, né, mas, fui fazer, desenhe uma árvore em que apareça galhos, era uma coisa assim, então, fiz e no outro sábado então era a prova de conhecimentos, falei "Ah, não vou passar nada, não, esse pessoal aí é tudo bamba." Tinha gente de Belo Horizonte, de vários lugares. Tinha um até que era, mais tarde eu soube porque, ele era, tava muito à vontade, tal, cumprimentando a gente, tal, com a mão fria, tal, e eu ali, suando, ali. E, é meu amigo hoje, mas então, na semana seguinte eu vim fazer o tal teste, e aí foi uma prova realmente difícil porque tinha, eram 90 questões e tinha uma hora e meia de tempo, então fiz, bom, um minuto cada uma, né, um minuto por pergunta, a gente vai correndo os olhos, saltando, tal, e respondi aquelas que a gente gastava só dez segundos e tal, tal, tal, e sobrou um tempo, então, prá fazer, então, as partes mais difíceis do teste e quando foi chegando os 90 minutos o, a empresa que tava fazendo a, lá, fazendo a prova, coordenando lá a prova, bom, "dentro de cinco minutos vai terminar." Bom, __________. Aí, quando chegou um certo ponto, eu ainda tinha muita coisa pra escrever, respondi todas as perguntas que eu podia responder, mas sendo que uma delas que era mais embaraçosa no fim (eu pus?), "não dá mais, não houve tempo", me lembro que eu botei isso aí. Mas, das 90 questões eu respondi 87. Bom, então eu não respondi, bom, e agora? Não vou ser, não vai dar, né, não fiz a prova, mas os outros também não tinham feito nada, teve gente que entregou com 15 minutos
porque não sabia e foi embora. E, passados então alguns meses, um mês, dois, me chamaram: "Bom, você passou, segundo lugar." Bom, segundo, fiquei muito satisfeito com o segundo lugar, aí, me perguntaram, (ele falou?), era uma das primeiras vezes que a Vale do Rio Doce tava fazendo concurso no Rio de Janeiro, porque antes era tudo sistema da indicação, da apresentação, tal. Aí, eles, "você foi o segundo lugar", como segundo lugar você tem direito, não tem direito de escolher pra onde você vai, ou auditoria ou nada, porque o primeiro lugar era contabilidade, eu falei: "Curiosidade", eu falei, "e quem é o primeiro colocado?" "Ah, fulano." Era o nome dele lá, eu já tinha visto ele lá dentro já, já tava trabalhando. Eu falei: "Ele já começou a trabalhar?" "Não, ele já trabalhava com contrato aqui." (risos) É, as coisas sempre foram iguais, né? E, então, mas eu não pude aceitar. Eu não pude aceitar assim de cara porque o que eles ofereciam prá gente era um salário de 254, vamos falar que era reais, porque era mil, mil reais, ou (nome de?) cruzeiro, eu não sei, e eu ganhava 518, quer dizer então, "eu não posso aceitar." "Não, mas acontece que vai haver uma reestruturação, aí você vai subir, tal, tal." "Não, eu só vou largar 14 anos de emprego prá vir prá cá se realmente eu tiver a segurança de que eu realmente estou admitido e ganhando no mínimo o que eu ganho lá." Aí, eu falei: "Olha, eu não aceito, vou, vou tomando as minhas providências prá dar o aviso prévio na empresa, já falei lá a muito tempo que eu vou sair mas, eu não posso entrar nessa aventura." Eu já nessa altura eu já tinha vários filhos, tal. Aí, cheguei na empresa outra, falei: "Olha, vamos ser honestos, eu não vou dar aviso prévio de 30 dias porque aviso prévio de 30 dias é prá uma relação formal de trabalho, a gente tem algo mais aí de amizade, mas eu vou sair." "Quanto é que você vai ganhar lá?" Aí, (risos), eu fiquei embaraçado. "Olha, certo, certo, é 400 mil reais, 400 mil cruzeiros." E, "bom, não, dobrado, 750 mil cruzeiros!" Aí entra aquela bobagem, aquele brio, né, se eu valia 700 eu já valia antes, então, (risos), e toquei pra frente as providências de arranjar um substituto, tal, eu mesmo mandei providenciar um substituto. Até que, finalmente, me chamaram prá Vale do Rio Doce e me deram um ultimato: "Olha, o salário pro cargo que você vai ocupar é 254 mil, agora, pela tabela de reestruturação que vai ser aprovada na Diretoria, no Conselho", não tinha Conselho não, era Diretoria, "você vai passar para 518", alguma coisa assim, aí eu bati o martelo mas, por muito tempo do que era a oferta que eu tinha lá.
P/1: Que tinha recebido lá.
R: Claro, bom, aí foi difícil pra sair da outra firma, inclusive eu gostava da firma, praticamente tudo lá andava, mais ou menos, vamos dizer, sob minha coordenação. Era de confiança, os dirigentes se afastavam, iam embora, viajavam, tal, quando voltavam sempre encontravam as coisas melhores do que eles deixaram, e então, mas finalmente eu consegui me liberar, consegui me liberar, e comecei, saí de lá num dia, vim trabalhar no outro na Vale do Rio Doce.
P/1: Saiu no dia seguinte?
R: E fiquei aí, foi uma decepção, de início foi uma decepção, porque há coisa que a gente só sente vivendo. Mais tarde eu encontrei a explicação de tudo.
A Vale do Rio Doce era a única vinha, naquela época, com um quadro de pessoal que era originário do serviço público e tinha sido cedido, pessoal que veio do Ministério da Fazenda, veio do Banco do Brasil, não tantos, mas principalmente do Ministério da Fazenda, Ministério do Interior, Ministério disso, Ministério daquilo, e aí, então havia realmente um ranço de serviço público da época, porque hoje serviço público é rançoso mas é muito menos do que na ocasião. E, então, aqueles hábitos, aquelas formas de trabalhar, aquela mentalidade de serviço público me fizeram um mal tremendo, no segundo dia eu pensei em largar aquilo tudo e voltar lá pro outro, (risos), tem uma curiosidade, eu não tenho minha carteira profissional baixada no primeiro serviço, nunca quiseram baixar minha carteira!
P/1: Não baixaram a carteira?
R: Não, não baixaram. Então, (riso) não baixaram por questão de, sei lá, de picardia também, né? (risos) Aí, eu pensei em voltar, mas fui agüentando, eu vi coisas que realmente me indignaram. Sabe, quanto à forma de trabalhar, mentalidade, "eu sou pago para atender à Vale e não ao fornecedor, tá atrasado ele que se vire, nós temos o nosso regulamento prá pagar 30 dias depois de apresentada a fatura! A fatura tava perdida aí dentro mas, não estava com, não contava com o carimbo de (ingresso?), deu o carimbo agora só daqui a 30 dias." Essas coisas me faziam um mal tremendo porque do outro lado eu tinha trabalhado como empresário e sabia o que que significava um atraso de
pagamento, uma coisa terrível, atrasa a folha de pagamento, atrasa. Mas, fui ficando, é só esse episodiozinho, um dia eu tava sentado, a mesa era mesa comprida, eu estava sentado, alguém me falou: "Olha, lá te chamando." Eu olhei na porta, e tava entreaberta, a porta que dava para o corredor, eu olho assim era o presidente da Casa da Borracha onde eu tinha trabalhado, ele era um italiano, aí eu fui lá: "Pois não?" Pensei que ele tivesse algum problema lá que iria, que quisesse que eu resolvesse. "Mas eu morro de vergonha, eu morro de tristeza de ver você trabalhando aí no meio desses militares!" "Que militares?" "No meio desses militares. Volta, você tem tudo lá, mas você é ingrato." Falou uma porção de coisas e aí o brio funciona: "Não, não, eu tô muito bem aqui." Isso foi lá uns 20 ou 25 minutos depois, "eu tô muito bem aqui."
P/1: O senhor no auge da insatisfação. (risos)
R: "Mas vai, nós nunca acreditamos, sua mesa tá lá, o lugar tá vago." Eu falei: "Olha, tá chegando o fim de ano, cuidado que vocês vão se dar mal." Porque aí é época de balanço, aquela coisa. Bom, e continuei então na Vale do Rio Doce, mas aí eu tomei conhecimento que, até eu coloquei isso no currículo, eu tomei conhecimento então que esse grupo de gente nova que estava entrando era um grupo que estava sendo chamado, entre aspas, de sangue novo, era o pessoal de sangue novo exatamente para cobrir aquela deficiência estrutural que ela tinha desse pessoal com ranço do serviço público e nenhum treinamento, porque o pessoal vem do serviço público, mas dá treinamento prá eles que eles aprendem. Resolveu não investir em treinamento nesse pessoal e admitir gente nova, então os que entraram em todos os ramos da Vale do Rio Doce, fosse em contabilidade, fosse em engenharia, fosse administrativo, todos eles que entraram nessa ocasião acabaram ganhando uma certa projeção porque os serviços novos que foram surgindo com a reestruturação da Vale do Rio Doce eles acabavam recaindo nas nossa responsabilidade e a gente tinha realmente um treinamento melhor prá desenvolver os trabalhos. Então, nessa época, então a Vale do Rio Doce estava começando o primeiro plano de expansão e, a partir daí, a Vale não parou de crescer, o primeiro plano de expansão realmente foi uma quebra de, uma quebra de inércia dentro da Vale e houve, então, uma mudança, surgiu o Porto de Tubarão, aí surgiu a duplicação da ferrovia, aí foi surgindo a diversificação e o incremento
nas operações externas e transações financeiras de vulto e, então, a gente foi subindo. Então aí foi galgando posição, você vê, eu entrei lá em 64 e em 66, em 66 eu já era o sub-contador, em 68 eu já era o contador geral, que era um cargo disputadíssimo dentro da Vale do Rio Doce porque, mas por causa da antiga estrutura, onde contador geral tinha uma posição relativa muito importante no organograma da empresa, depois baixaram a bola dele, ele ficou mais condizente com uma boa organização. Aí contador geral, de contador, aí tem uma porção de historinha que não interessa, né? (risos)
P/1: Mas quando o senhor a primeira vez era prá trabalhar na auditoria ou mudaram essa história?
R: Não, é pelo seguinte, eu sei onde é que você quer chegar. É o seguinte, é que o, quem tinha tirado o primeiro lugar, o (Sérgio?), o atendido, ele já era um amigo antigo da casa, já estava trabalhando lá e já ocupava o cargo dentro da contadoria, então, ele não foi o primeiro lugar, o primeiro lugar fui eu, entende? Mas aí como ele já ocupava o posto então ele ficou e me mandaram prá auditoria, mas na verdade quando eu entrei, quando eu realmente fui admitido, eu fiquei com o cargo de auditor porém trabalhando na contabilidade. Aí ficamos os dois, depois ele foi pra Belo Horizonte, tal, mas ele é amigo do rei (risos). É isso aí, essa história é comprida, dá livrinho se for contar. (PAUSA)
P/1: Eu só queria retomar uma dúvida que ficou desse período que o senhor mudou de cidade, morou, estudou e mudou pra várias cidades, não é? Como é que ficou a relação com a família, o senhor via o pai, final de semana, como é que era essa história, com a irmã?
R: Não, não, não. Na verdade, eu não tinha uma família montada, era só o meu pai, que ele borboleteava, ele visitava o filho e a filha. A irmã ficou em Araçatuba, na casa de uma tia e meu pai não casou novamente, e eu fiquei acompanhando meu pai por onde ele andava. Nas férias eu viajava com ele, daí eu conheço muita coisa do Brasil antes de ter começado a viajar a serviço. Mas, e ele vinha regularmente visitar a gente, então tava. Em Juiz de Fora quando eu deixei a Academia, interno, que eu passei para o externato e fui morar numa pensão ele vinha de dois em dois meses, porque as viagens eram muito dispendiosas em tempo e dinheiro, então a gente não ia nem em casa nas férias de meio ano, na metade do ano, porque eram 15 dias de férias, você gastava dois dias pra ir, dois dias pra voltar, ficava 11 dias lá, então não valia a pena, não compensa o gasto, né? E, então, a gente ficava, quem era interno ficava no colégio, quem não era ficava na pensão, certo? E ele vinha regularmente visitar. A minha irmã é curioso porque nós estamos separados já desde a idade de nove anos mas nós temos uma relação quase que semanal de conversa. Hoje é aniversário dela, então, de manhã a primeira coisa que eu fiz foi um telefonema prá ela, quer dizer, esse espírito de família foi preservado, você faz essa pergunta, foi preservado e aí eu tenho que tirar o chapéu pro papai porque ele escrevia uma vez por semana, eu escrevia pra ele uma vez por semana, respondia, se não respondia vinha de lá uma repreensão, e então foi mantido, essa, esse, essa unidade. Por outro lado eu tenho também um relacionamento sentimental grande com toda família porque na minha terra eu até digo vizinho é primo, vizinho já é primo, dali prá frente já é quase tudo irmão, então, é um negócio, então é isso, meu pai nos visitava regularmente.
P/1: E essas viagens com o seu pai, como é que eram?
R: Olha, eu viajava de todas as maneiras, eu nunca viajei em trem de primeira classe. A gente só viajava de trem, né? Ônibus era praticamente impossível andar no Brasil, as estradas muito ruins, então a gente viajava de trem de ferro, segunda classe. Mas, então, eu acompanhava ele ia fazer negócios em Uberaba. Então, em Uberaba tinha lá uma sobrinha tal, a gente ficava um, dois dias na casa dela, ele ia negociar em Goiás, tal, voltava. Então, é, durante as férias a gente viajava assim. Ou quando coincidia de ter um trabalho diferente, por exemplo, conduzir uma boiada lá de Araguari até Barretos, era, a boiada vinha a pé, pela estrada de ferro, não tinha esse negócio de trem, não, a gente vinha a pé, aí, eu vinha também. Vinha a tropa, né, aí a gente vem, e levava 6, 8 dias até, até chegar em Barretos. Isso aí é outro episódio, né? E em Barretos era que comandava o preço, hoje você ouve falar boi gordo, boi em pé, em Araçatuba, em não sei aonde, mas naquele tempo era Barretos, porque Barretos era onde tinha o Frigorífico Wilson e era o que tinha o maior abate diário de boi, naquela ocasião eles abatiam 1400, 1500 bois por dia e, então, aquilo era um movimento de entrar a boiada todos os dias. E então quem fazia a regulação de preços era o frigorífico, então, vinha aí alguém com uma boiada, conduzindo 400, 500 bois e o boi, quando tava chegando lá por perto "Ó, o inglês baixou o preço." E aí? Você tá com o boi no que chamava no corredor, o boi tava na estrada, você não pode parar o boi no caminho prá pastar, vai alugar a pastagem ao lado, porque ficava muito dispendioso, a margem não era uma margem grande. Então, a gente chegava, vinha até Barretos, em Barretos então sempre tinha aqueles agentes compradores, eram os ingleses mesmo que falavam bem português, eles compravam os bois por ali e a não pode esquecer que a gente estava em plena guerra, né, porque eu estou contando esse episódio das viagens a partir de 39, 40, quer dizer a guerra acabou em 45, 39 começou a guerra. Então, enquanto os navios puderam, enquanto os navios puderam navegar sem risco de torpedeamento (aí foi?), de repente ficou insustentável o transporte marítimo prá eles, principalmente comprar o boi, aí quando pára de comprar o boi foi um horror, imagina o que que acontece, tinha toda uma região que vivia em torno de boi, não tinha automóvel, não tinha caminhão porque era gasolina, a cota de gasolina que um caminhão tinha era de 30 litros por mês, você imagina um caminhão com 30 litros por mês, ele tinha que funcionar sempre na base do gasogênio, então tinha o gasogênio, a gasolina era só para as partidas, só prá dar a partida e para as ladeiras íngremes, então ali dava uma ajuda da gasolina e o gasogênio atrás fazendo fumaça e você subia. Era uma época difícil, entende, então quando o comprador cortava a compra, o boi ficava no corredor, e ficava emagrecendo, porque boi emagrece numa facilidade muito grande e engorda muito devagar, então as viagens eram assim. Não foram assim, não, eu acredito que ao longo desse tempo que eu fiquei encostado no papai eu devo ter feito umas seis ou sete viagens de Goiás até Barretos, lá de Araguari, Tupaciguara até Barretos, as viagens sempre iam até Barretos, né, porque era uma tropa, uma comitiva ia empurrando os bois prá. E menino o que que faz nisso aí? Ele corre atrás do boi que fugiu, o boi que escapou, bota ele de novo na linha, é isso o que a gente fazia, não ia viajar por viajar, a gente trabalhava, né, isso era trabalho de criança mesmo, ou ir lá na frente candeando, ______________, e os bois acompanhavam.
P/1: O senhor gostava dessas viagens?
R: A gente adora. Eu gostava muito, e não tivesse havido proibição eu teria continuado nisso, garoto sempre gosta disso, né? A gente adorava, mas o papai sempre dizia: "Tem que ser um perito contador." (risos)
P/1: Conta um pouco disso, porque essa coisa de perito contador, de onde que vem?
R: Eu não sei se é porque era bonito falar em perito contador (risos), devia ser bonito falar perito contador, e porque veja você, até hoje, mas naquele tempo as profissões mais procuradas eram médico, dentista, advogado, engenheiro e acabou. Aí perito contador não tinha essa diversificação de profissões que existe hoje, hoje tem psicólogo, tem isso, tem aquilo, toda uma variedade muito grande de carreiras. Então perito contador era isso. Porque o perito contador era um homem importante, em qualquer empresa tinha um perito contador, era aquele homem sentado lá na banca alta, boné de pala, tal, prá trabalhar contra a luz, deve ter sido alguma coisa assim, não era muito por avaliação não, mas era bonito, e era também talvez o que ele podia pagar, pagar os cursos, não tinha colégio público, colégio público era só o grupo escolar, então tem aí também um problema de recursos, a maioria da, os meus companheiros de cidade a maioria não estudou, porque lá não tinha um colégio, lá não tinha um ginásio, não tinha nada, quem queria estudar tinha que mandar seus filhos prá fora, e mandando pra fora tinha que ficar interno, tanto que proliferava no Brasil os colégios internos, era uma quantidade enorme de colégio interno, os externos até eram em número muito limitado em cada. Campinas, por exemplo, que eu estudei, eu me lembro bem desse número, em Campinas nós éramos 350 internos e 80 e poucos externos.
P/1: Tinham mais internos?
R: É. Mais interno que externo, porque os que estudavam em externato estudavam lá na cidade, o Ateneu Paulista, eram uns colégios assim que eram colégios conforme são os colégios hoje, mas o colégio que recebia alunos do interior, tinha que ser aluno do colégio interno, não existia tanta pensão, pensão existia mais pro nível superior, que aí tinha as repúblicas, essa coisa de estudante, mas prá ensino médio não existia república não. O ensino médio era ou tá em casa ou tá no colégio interno. É isso aí.
P/1: E quando o senhor prá Juiz de Fora aí o senhor morou em pensão?
R: Aí mudei de pensão, porque eram muito ruins as pensões, então a gente mudava sempre, finalmente eu cheguei a uma muito boa. A última que eu freqüentei era muito boa, da Dona Elvira, era um palacete, um palacete que foi alugado, mas antes disso eu corri muita pensãozinha ruim por lá.
P/2: Senhor Luiz e até terminar o curso de contador o senhor foi sustentado pelo seu pai, ou o senhor trabalhava junto?
R: Não, não, absolutamente sustentado. Observação, quando eu terminei o contador aí vai trabalhar, vai trabalhar, mas eu queria continuar, aí eu é que queria continuar estudando, ele achou que era bobagem fazer Economia. "Não, vem aqui prá Paraguaçu, nós vamos montar um comércio prá você." Eu já era perito contador, né? "Vamos montar um comércio aqui." Mas eu não aceitei essa idéia, até porque eu já tava namorando em Juiz de Fora, talvez se eu não tivesse namorando eu tivesse voltado prá Paraguaçu. Então eu fiquei em Juiz de Fora, fiz esse concurso lá prá Companhia Mineira de Eletricidade, engraçado, eu entrei ganhando uma porcaria, eu entrei ganhando 575 cruzeiro por mês, não tinha nem classe lá, era praticante de escrita era o nome dele, eu era contador formado já, praticante de escrita, depois eu fui prá praticante de escrita A, eu podia aumentar um bocadinho, e não cheguei a ser escriturário, porque tinha um quadro, uma estrutura de quadro de salário muito rígida, e, inclusive, mas aí eu fiz bonito nessa época porque eu, um praticante de escrita não pode substituir um, não podia substituir um escriturário A, só podia substituir um auxiliar, um coisa, então tinha uma hierarquia. Mas acontece que houve lá um momento de, houve um momento lá de desgoverno no trabalho, dois faltaram de uma vez, e trabalhava na contadoria, então, sempre tem um jeitinho, então descobriram que eu como praticante de escrita não podia substituir alguém de categoria maior dentro do serviço de consumidores onde eu trabalhava, mas podia substituir lá na outra, lá na outra. Era a mesma empresa, mas aí era compartimentado o negócio. Foi um negócio muito interessante porque aí eu acho até que eles nunca pensaram o que seria normal pensar hoje,
"não, nós não vamos pagar a substituição toda, paga só algum prá ele." Não, eu fui substituir e recebi todo o valor do ordenado dos que estavam afastados, então você veja, nessa época eu ganhava 600 e qualquer coisa e fui substituir alguém que ganhava 2040, que era fim de carreira, e eu recebi 2040 uns 4 ou 5 meses, fiquei rico. É, porque era muito dinheiro, e aí aquele disse me disse tremendo, né, mas acontece que eu era bom daquele serviço, então não tinha porque me substituir unicamente por esse detalhe da hierarquia, então fiquei lá muito tempo. Quando um dos empregados voltou, o outro saiu, também doente, por motivo grave e tal, e eu continuei muito tempo lá ganhando dinheiro, tanto que quando eu vim pro Rio eu estranhei porque eu vim pro Rio ganhando 2500 também e eu ganhava lá por ato de Deus, né, eu ganhava 2040, e vim prá cá com 2500. Aí depois então, depois quando eu fiquei definitivo aqui no Rio, a gente complementava os 2500 com trabalhos avulsos que a gente fazia fora. Nós trabalhávamos muitas e muitas horas por dia, tinha a hora extraordinária que eu ganhava, e aí eu comecei a trabalhar, a procurar serviço a noite, foi uma maneira de. Trabalhei no Jornal do Brasil, era um, já era um arremedo de terceirização ou um arremedo de mão-de-obra terceirizada, eu trabalhava no Jornal do Brasil, saía do serviço 6 e meia, mais ou menos, 7 horas eu estava no Jornal do Brasil, a noite, né? Aí ia lá para fazer a revisão de chapa, não existia a imprensa como ela é hoje, né, então já era muito evoluído mas tinha ___________ , ia sair naquelas chapas, chapa de estanho, de chumbo, montado dentro do quadrado, que lá onde saía, lá ia a diagramação e a paginação, e a diagramação, então, qual era o trabalho da gente? Era pegar o texto original e conferir a chapa, que era chapa de chumbo, brilhante, aquilo vinha quente, brilhante, do lado contrário, quer dizer, você lia o negativo (risos). É, a gente lia no negativo, (tanto que a gente era?) inteligente, punha um espelho, aparecia lá. Mas, então, a gente lia no negativo e quando você encontrava uma letrinha daquela que estava, que estivesse errada, então você fazia um pinguinho vermelho nela, uma tintazinha vermelha em cima daquela, fosse um espaçamento errado, fosse uma vírgula que estivesse faltando ou sobrando, então a gente punha um sinalzinho vermelho ali e já ia direto, então, para o revisor. Então o revisor olhava aquele trabalho que os contratados aí faziam e por volta de onze horas, mais ou menos, da noite já tinha acabado o trabalho, aí eles entravam rodando o jornal pra poder sair a tempo, de madrugada, prá fazer a distribuição. Mas a gente ganhava um dinheirinho bom nisso aí, né? Era um serviço garantido.
P/1: Como o senhor conseguiu esse trabalho?
R: Indicação. "Ah, vamos lá no Jornal do Brasil", então, "vamos lá", "sabe ler, sabe escrever?" Faz lá um testezinho de português, põe lá umas 10 ou 20 palavras difíceis, de sentido dúbio e tal, passou, entrava para. Era interessante, isso dava um dinheirinho bom. O Jornal do Brasil era aqui na Avenida Rio Branco.
P/2: E o senhor já estava casado nessa época?
R: Já, no finalzinho eu já estava casado, eu casei em 53, esse negócio aconteceu, aconteceu em 52, 53, 54, aí depois eu parei com esse tipo de trabalho. Aí entrei num outro tipo de trabalho autônomo, mas aí já num outro nível, né, entrei fazendo auditorias em empresas, empresas que tinham sido fiscalizadas pelo imposto de renda que fiscalizava mesmo, não era tanto como hoje. Então, eles recebiam aquelas notificações da fiscalização do imposto de renda para que corrigissem tal e tal aspecto, então a gente fazia esse trabalho de preparar, preparar as correções, sobre a responsabilidade de um escritório, eu não ia avulso, não, eu ia com um escritório. Então, era um trabalho também gratificante, viu? O escritório contratava o serviço em bloco e depois ele, então, dividia com os participantes, com uns mais, outros menos de acordo com o nível de trabalho que ele tinha executado. Bom.
P/1: E a vinda para o Rio, como é que foi conhecer o Rio, como é que foi essa sensação?
R: Eu nunca tinha vindo ao Rio, é, eu nunca tinha vindo ao Rio. Essa coisa aconteceu em Juiz de Fora, a gente saindo de uma missa, a missa das 10, eu atravessando a rua quando o Adalberto Ataíde de (Aquino?), o Adalberto tinha sido companheiro nosso de trabalho, de estudo em Juiz de Fora, ele me viu do outro lado, me chamou, eu fui, aí fez aquela pergunta: "Você quer ir pro Rio?" "Prá quê?" "Ah, ganhar, vai ter um sucesso, lá vai ter um progresso muito grande, o Diretor tá saindo aí eu vou ser Diretor e você fica como" "E quanto é? "Ah, 2500." Na substituição eu ganhava 2040, então não era tanta vantagem assim, mas, mordeu a mosca que era uma oportunidade de vir para o Rio, né? Eu tinha, então, a possibilidade de ter um endereço no Rio de Janeiro, o que seria mais tarde meu cunhado, ele era de Marinha, morava no Leblon, tinha um apartamento alugado no Leblon e foi embora para, foi transferido para (Ladário?), Base Naval de (Ladário?) em Mato Grosso, Corumbá, então, ele, naquela época no Rio de Janeiro não tinha apartamento para alugar, era a maior zona para conseguir alguma coisa, e quem tinha um apartamento, se fosse esvaziar durante 3, 4 meses, ele ficava pagando porque se ele saísse ele não conseguia outro, e, além do mais, a lei do inquilinato não permitia aumentos de aluguel, então, o sujeito que tinha um apartamentinho pagando 120 reais por mês, 120 cruzeiros por mês, ele ficava um ano fora mas pagando com o apartamento vazio, porque quando ele voltasse ele tinha garantido. Aí meu cunhado estava nessa situação, então, ele me ofereceu o apartamento dele no Leblon, estava fechado já, e então ele me ofereceu pra morar nesse apartamento, partilhava com ele um pouco o aluguel, não chegava a ser a metade, não. E ele me mandava o dinheiro eu pagava o aluguel aí prá ele. Agora, realmente o primeiro dia que eu cheguei no Rio de Janeiro até é fácil de dizer quando que foi, porque foi no dia da eleição que elegeu Getúlio Vargas, 3 de outubro de 50, é, 3 de outubro de 50, eu votei em Juiz de Fora, tinha sido mesário lá, era importante ser mesário numa sessão. Eu tinha sido mesário, vim para o Rio, peguei o ônibus, acho que tinha um ônibus lá 18 e qualquer coisa, e vim para o Rio, meio desarvorado, triste, né, porque vim sem saber prá onde que eu vim, sei lá prá onde que eu ia, não tinha a menor noção de Rio de Janeiro, vim na estação, desci na rodoviária que era na Praça Mauá, ali onde hoje é a Polícia Federal, e linha intermunicipais também é lá, hoje. Então cheguei lá "e agora?", verdadeira mudança de soldado, uma mala, um saco com as coisas que não cabiam dentro da mala, peguei um táxi e tinha que dar aquela do "sei tudo", né? "Quero ir pro Leblon." "Onde?" "Rua General Venâncio Flores." "Onde é que é isso?" _________________. Mas, então, cheguei, o apartamento (FIM DA FITA 1) fechado, achei o apartamento, o apartamento fechado há muito tempo, inclusive o vizinho de cima ele deu o alarme porque ele conhecia a família do meu futuro cunhado, ele vê uma pessoa estranha chegando ele, ele se interessou, desceu lá, eu expliquei pra ele o que era, entrei no apartamento e foi uma tristeza, viu, porque eu não tinha roupa de cama, não tinha nada, aquilo empoeirado prá todo lado. Mas, já nessa altura já era uma hora da madrugada, 4 e meia eu tava em pé, já, porque eu tinha muito medo de como é que eu ia chegar na cidade, né? _____________ Aí, quatro e meia eu levantei e não tinha água, era uma falta d'água nesse Rio de Janeiro, rapaz, um negócio, né? Então eu, de manhã tentei, só tinha uma agüinha no cano, lavou o rosto mais ou menos e cheguei lá vi, os lotações passavam tudo numa direção, "então deve ser prá lá", os que passam prá cá estão vazios, os que estão indo prá lá estão com gente, é gente que tá indo, né? Então, dei o sinal, e o lotação vinha, naquela época, ele vinha do Leblon até a cidade em pouco mais de 15 minutos, então, vinha voando realmente, olha, não tinha aterro do Flamengo, não tinha nada disso, era tudo aqui pela praia do Flamengo, era todo por ruas mesmo, não tinha avenidas de alta velocidade, não. Então vim, saltei lá na cidade, aí quando eu fui chegando lá no local onde eu ia trabalhar, Rua do Senado 12, aquele que eu falei lá, vizinho da Fundição (Heiner?), já o contador que tinha me convidado ele tava chegando também, era 6 e qualquer coisa, não me lembro. Primeiro dia meu foi de 6 da manhã às 10 da noite, cansado! (risos) Cheguei em casa não tinha água. Agora, depois eu aprendi uma coisa, que no Rio de Janeiro tinha uma casa de banho, ali na Avenida Passos tinha uma casa de banho, então você pagava 2 cruzeiros prá tomar um banho. Então você tinha, ganhava um chinelinho, uma toalhinha muito mixuruca, pequenininha, e um sabonetinho desse tamanho, então, você entrava lá, tomava seu banho, tinha tempo, não podia demorar mais que cinco minutos.
P/1: Tinha um tempo. Cinco minutos?
R: É, ele desligava lá, (risos) desligava, eram cinco minutos. Então, aí eu aprendi, sem água no Rio, que prá mim era mais fácil era ao sair do trabalho passava lá, tomava um banho, e ia para casa, né? E, nos dias de calor, quando a gente saía mais cedo, ou calor tremendo, ia ali para a Rua Senador Dantas, era onde era a Loteria Federal, então a sala de extração tinha lá umas 40, 50 poltronas e ar refrigerado, então a gente ficava ali, e dormia!(risos) Dormia porque a extração daquilo ali era uma extração curiosa porque eles pegavam essas meninas de orfanato, eles pagavam o orfanato, tal, e elas iam lá bonitinhas, uniformizadinha, ficar uma numa roleta, a outra na outra, tirando as bolinhas, aí caía a bolinha lá a menina: "25342", a outra: "2 mil cruzeiros." Então ia, e aquilo (risos), até que o sujeito chegava, falava "acabou" (risos), aí pegava o lotação e ia embora. Às vezes ia de bonde, tinha bonde no Largo da Carioca, ia de bonde pro Leblon. Mas vocês já tão me massacrando aí (risos).
P/2: Senhor Luís, o que que o senhor achou da cidade do Rio de Janeiro?
R: Olha, eu, nos primeiros dias eu me senti massacrado porque sempre vivi no interior e eu estranhei extremamente o clima, porque eu vinha de cidades frias, Juiz de Fora é uma cidade fria, onde eu nasci é uma cidade fria, Campinas também, nas épocas de frio, é uma cidade fria, então eu não, eu não me adaptava ao calor do Rio de Janeiro, eu me sentia às vezes até com a cabeça sem condição de pensar, sem condição de pensar, e até houve aí um episódio uma ocasião, eu já estava, já trabalhava aqui, um antigo patrão que eu tive em Juiz de Fora me pediu pra ir num escritório onde ele tinha uma sociedade aí para verificar determinado serviço, eu fui, aqui na Avenida Rio Branco, alí no obelisco e eu cheguei lá eu me lembro que eu não soube o que que eu ia, não é dizer que não soube, eu não tinha noção do que que eu, qual era o serviço que ele estava querendo, eu ainda tive que pedir uma ligação telefônica prá lá, e era difícil fazer essa ligação, e perguntei pra ele: "Doutor Francisco, o que é mesmo que o senhor quer?" "Mas eu já lhe expliquei ontem." "Pois é, mas eu não gravei." Aí ele teve, mas eu estava massacrado pelo calor, depois de algum, no início da minha passagem por aqui eu trabalhei muito, era trabalhar dia e noite, né? Chegava a fazer coisas incríveis, hoje diz que é bolinha é droga, eu comprava o (Pervitin?), que hoje é considerado psicotrópico aí, essa coisa, eu comprava o (Pervitin?), a farmácia vendia aquilo livremente, quando chegava lá prá meia-noite e tal, eu tomava uma bolinha daquela, a gente vai ficando esperto outra vez, dava prá trabalhar até 2, 3 horas da madrugada, tomava outra, ia até as 5, tinha ocasião assim de sexta-feira eu trabalhava de sexta até sábado a tarde direto, aí tinha que entrar com o (Pervitin?), né? Ficava meio, eu, foi um período muito difícil da minha vida, eu não reclamo dele, não, foi bom porque eu aprendi muita coisa nesse processo de trabalho que eu tive, aí tem uma série de coisas, a gente vai aprendendo malandragem de todo jeito, conviver com fiscal, com polícia, com não sei o quê, isso é um submundo danado, é. Mas você tinha perguntado, ah, foi você que perguntou. Eu achei, mas, depois de passado esse tempo eu comecei a me divertir, né, aí eu comecei a me divertir, eu ainda não era casado, os 3 anos primeiros que eu passei aqui no Rio de Janeiro tinha diversão, a gente sabia, ah, diversão era uma coisa um negócio meio bobo, mas de qualquer forma tinha muita boate por aí que a gente ia, tal, e o transporte era muito difícil, viu, eu sempre lembro que as pessoas não têm uma idéia porque. O Brasil nessa época tava vindo de um fim de guerra, e a guerra ela fez uma devastação, depois que ela terminou, uma devastação. Você imagina que nós não tínhamos uma frota de ônibus, não tínhamos uma frota de caminhão, não tínhamos uma frota de automóveis porque a, (PAUSA), o gasogênio acabou com a frota do Brasil, porque o gasogênio aquilo é fumaça pura, aquilo é vapor, não, é fumaça de carvão e estragava o motor dos carros, era uma frota realmente sucateada. Então, até chegar a ter uma outra frota que permitisse você se deslocar de ônibus e tal foi difícil, foi demorado, hoje a gente está falando mal das Vans, mas na ocasião eram os táxis que tinham, conseguia a autorização prá fazer o aumento da longarina, então eles colocavam no meio, entre o banco da frente e o de trás punha um banco no meio e fazia a tal lotada, hoje eles chamam, chamava lotação, não era lotada. Fazia uma lotação e viajava pra onde queria, passava Avenida Atlântica, passava no Flamengo, passava em todo lugar, não tinha roteiro, não tinha itinerário, tinha nada disso. Daí, isso foi institucionalizando, foi, foi indo até que chegou um ponto começaram a surgir os carrinhos bonitinhos, tal e surgiram os lotações que eram uma praga igual a Van hoje, porque hoje a Van é um absurdo você colocar uma Van ocupando um espaço de um ônibus, o espaço de manobra de um ônibus, com 14 pessoas, com oito pessoas dentro, então, os deslocamentos eram muito difíceis, era muito difícil, então, e não tinha nada aí que hoje a gente vai pra Barra, vai prá restaurante, aquilo, era tudo mais ou menos no centro ali da Atlântica, no meio, por aí, e a Cinelândia que era um ponto, hoje é um ponto de, de, de, não pode falar, né, que é minoria, é das minorias, mas hoje ali é um ponto de gay, né, na época não era só isso, não, era, tinha pessoa sem ser gay também (risos). Não pode falar, não, é minoria.
P/2: O senhor tinha o hábito de ir à praia?
R: Ia.
P/2: Só um minutinho, por favor. (PAUSA) Vamos acabar de rir. (PAUSA)
R: Então, você perguntou se eu ia à praia, ia. Quando eu morei no Leblon, a Rua General Venâncio Flores, onde eu morei, era dois quarteirões da praia, então a gente ia sempre à praia, é distração de pobre, tava começando na época o surf, tava começando na época, nem era surf, era uma prancha, a gente chamava de prancha, "tenho uma prancha e vou prá praia, levo uma prancha", e a gente freqüentava, depois começou a surgir o vôlei, as, como é que chama aquilo?
P/1: Frescobol, da raquete?
R: É, frescobol, isso veio surgindo, isso aí uma evolução, né? Mas eu ia bastante à praia, sim, gostava bem. Mineiro gosta de ver praia, né? (risos) Molha o dedo na água prá ver se é salgada mesmo. O que a gente chama marzão besta. (risos)
P/2: Senhor Luiz, e essas horas que o senhor trabalhava, às vezes virava a noite trabalhando, o senhor recebia por isso?
R: Não, eu recebia até que eu tive cargo de confiança, quando eu comecei a ter cargo de confiança era rigorosamente proibido porque o chefe tem condição de inventar um extraordinário, né? Então eu não recebia. Pagava pros outros, pros que não tinham cargo de chefia, mas a chefia não recebia nada. O que acontecia é que não existia o 13°, então quando chegava no final do ano, os dirigentes retribuíam, gratificavam mais, o 13° salário não existia mas muita firma pagava. Lá no fim do ano você recebia 1, 2, 3 salários de gratificação, até que em 1963, 62, 63 surgiu a gratificação de Natal que passou a ser chamada de 13° salário. Então através dessa gratificação é que as empresas retribuíam esse algo mais que o empregado dava, mas não pagava extra, não. Pagava extra aos que não tinham cargo de chefia.
P/2: E como é que foi, então, a entrada prá Vale do Rio Doce?
R: Não, Vale do Rio Doce, olha, de início, como eu falei aí, eu estranhei muito, achei muito ruim, mas um ano depois eu já estava convencido de que era, foi uma grande coisa que eu fiz entrar prá Vale do Rio Doce. Principalmente nesse aspecto de, de dinheiro, porque a Vale do Rio Doce era muito pontual, sempre foi muito pontual no pagamento dos salários, era meio generosa também nas gratificações, tinha 13°, tinha 14°, tal, umas coisas assim, e a pontualidade era fundamental na vida da gente porque quem tem cinco filhos precisa de ter o dinheiro no dia certo, né? Então eu achava a Vale do Rio Doce, gostava muito, e sempre dizia que enquanto eu trabalhava na iniciativa privada eu cheguei a ganhar mais do que na Vale do Rio Doce, mas eu não tinha condição de comprar um velocípede à vista, não tinha, não sobrava dinheiro, saía a metade do dinheiro, no dia dez tinha um vale, no dia 20 outro vale, chegava no fim do mês atrasava dez dias o pagamento, um negócio horrível. Mas, então, sob esse aspecto a Vale do Rio Doce me recompensou muito, e uma outra coisa que eu gostei muito na Vale do Rio Doce, logo de início, foi a interlocução, eu tinha interlocutores, eu aprendi, não com aqueles que estavam, eu aprendi com os novos que estavam chegando que vinham também trazendo bagagens de conhecimento, de experiência, trazidas de outras empresas. Então, essa entrada foi muito boa e eu também tive muito, eu e outros, eu não falo só por mim, a gente trabalhava muito mas tivemos progressos funcionais, isso era muito importante, honra seja feita, na Vale do Rio Doce não havia proteção, se o empregado tinha méritos, ele era escolhido e subia, realmente, porque a Vale do Rio Doce estava necessitada de competências, porque o programa de, os planos de expansão da Vale do Rio Doce eles cobriam todos os setores de atividades, fosse no transporte, fosse no planejamento, fosse na navegação, fosse no plantio de árvores, beneficiamento de madeira, então, ela exigia em cada uma dessas áreas ela exigia a especialização. Então entrava muita gente especializada e desse consórcio aí de cabeças, a gente aprendia muito, era uma empresa que precisava desesperadamente da comunicação interna entre os, as competências, vamos chamar assim, e começou então um processo de treinamento. A Vale do Rio Doce investiu muito em treinamento, muito mesmo em treinamento, depois ela teve vários programas de contratação de (PAUSA) como chamava? _______, era o pessoal de faculdade, que tava saindo da faculdade e a Vale então fazia contrato de um ano e, via de regra, quase todos ficaram.
P/1: Acabavam ficando?
R: É, acabavam ficando e ocupando logo cargos
P/2: Estagiários?
R: Estagiários. E ficavam um ano e depois de um ano, então, acabavam assumindo funções, hoje tem gente aposentando aí que entrou lá como trainee e cresceu. E dava muita oportunidade, viajava-se muito pro exterior, aprendia muita coisa lá fora, recebia muitos estrangeiros aqui, a Vale tinha uma contratação muito grande de firmas de prestação de serviço, não existia as especializações no Brasil, então vinha engenheiros, vinham técnicos de toda natureza, de mineração, tinha programa de formação de técnico lá fora, então ia pra França, ia pros Estados Unidos, ia pro Japão. Então, esse lado da Vale do Rio Doce nem sempre ele é muito divulgado, mas ele foi importantíssimo na Vale do Rio Doce. A Vale do Rio Doce, eu garanto, hoje já não sei tanto, mas até a época em que eu andei por lá, era um celeiro de competências. A Vale do Rio Doce era uma empresa competente. E é, ela é competente, tanto que mudou, passou a ser uma empresa privatizada mas eles não tiveram problema com a qualidade do pessoal, claro que eles tiveram problema com a quantidade de pessoal e prosseguiram um programa que já tinha começado muito antes da privatização de ir fazendo a redução dos quadros. A Vale do Rio Doce, meu Deus, ela tinha 26.000 empregados eu quando saí de lá, eu saí e voltei, depois de um contrato, mas a Vale já estava com 15.000 e atualmente está com 11, e parece que vai baixar de 11 ainda, quer dizer, nisso aí tem um avanço tecnológico que substitui a mão-de-obra, não há dúvida que a informatização da empresa realmente foi decisiva e eliminou a mão-de-obra realmente enorme. Foi desemprego, porque se pensar em Brasil gerou um desemprego muito grande, mas termos da empresa aumentou a eficiência dela, porque muita gente atrapalha também, né? (risos) Mas ela foi uma empresa que, prá mim, ela, no meu caso especial, ela me gratificou muito porque eu tive o meu trabalho correspondido em termos de progressos funcionais, em termos de promoções e em termos também de conceituação, né, porque isso é importante, a gente trabalhar em uma empresa e ser notado, é importante, todos nós temos essa pontinha de vaidade, você quer ser reconhecido, todo mundo quer ser reconhecido. Então a Vale do Rio Doce, nesse ponto, ela, na época, ela foi nota dez, ela realmente, e não era só eu não, qualquer outro que tivesse se destacado tinha tido seu mérito. Agora, evidentemente, que quem trabalha tem que ter também, além da qualificação profissional, tem que ter uma qualificação pessoal, moral, uma formação própria que, basta a pessoa ver que um contrato de trabalho não é uma proposta de presente pro empregado, é uma proposta de trabalho que deve ser remunerado e deve ser recompensado além da remuneração, isso a Vale do Rio Doce fez bem. Agora, aquele tipo de empregado que entra numa empresa pensando no horário de sair, pensando no dia do pagamento, pensando na promoção e ficando insatisfeito quando essas coisas não acontecem na periodicidade que ele espera, ele começa a produzir mal, isso realmente tem que ser eliminado, tem que ser eliminado porque esse é um elemento nocivo, ele contamina os outros também, né? Então, mas a Vale do Rio Doce ela tinha nesse processo de seleção, eu chamo isso de processo de seleção natural porque ela nem fazia avaliação, ela começou a fazer avaliação de pessoal muito mais recentemente, porque era um processo quase que visual, né? É. Eu me lembro que o primeiro elemento, aliás a primeira chefia na Vale do Rio Doce que introduziu o sistema de fazer a avaliação, quando saiu a avaliação, praticou a avaliação da seguinte forma: eu entregava o, pra cada um dos empregados que estavam para ser avaliados, dava prá ele "põe a lápis aí o que que você acha que você é." Depois que ele punha "então vamos discutir prá ver se é isso mesmo." Então fazia essa avaliação cara a cara, isso é muito importante porque o empregado não só ele fica sabendo a opinião do chefe sobre aquilo que ele acha, pensa que é e não é, como o chefe também muitas vezes corrige a sua visão de determinado empregado ou até sabe explicar porque que ele não, porque que ele não procede de acordo com os padrões esperados. Então a Vale começou esse processo de avaliação muito mais recente, porque depois aí disso passa a avaliar também o gerente, porque não é só avaliar o empregado subalterno, põe o empregado para avaliar o chefe também (riso), isso aí dificilmente a gente passa (riso). Mas, então, depois ela se estruturou realmente, hoje ela tem uma administração de recursos humanos muito boa, já não premia conforme premiou na época que não tinha, é um descompasso histórico, a empresa não progrediu ao mesmo tempo em todas as suas atividades, mas, de uma maneira geral, a Vale do Rio Doce, a gente quando entrava na Vale do Rio Doce não pensava que fosse mais um emprego, a gente sempre pensava que era o último emprego.
P/1: O último emprego?
R: É, coisa de japonês. Japonês quando entra ele já tá preparando a missa de sétimo dia dele (risos), sabe que vai morrer ali. Então a Vale do Rio Doce fez isso e, ela também teve a sua recompensa porque a Vale do Rio Doce, veja só, uma empresa estatal ela tem uma diferença enorme da empresa privada, uma empresa estatal não tem patrão, quer dizer, o servidor ele trabalhava olhando o regulamento, as normas disciplinais internas e o estatuto, então ele não tem patrão e, lá em cima também, aí muda um pouco porque na diretoria a Vale sempre teve esse grande mérito, os diretores sempre foram empregados, lá não tinha diretor vindo da rua, vindo de fora, sempre eles eram empregados que foram guindados a essa condição de diretor, então o diretor era muito mais vulnerável do que o empregado, porque o diretor ele era nomeado, ele era eleito, entre aspas, pelo governo, pela União, então aí ele ficava sujeito realmente a políticas e indicações, enfim, uma série de atributos que não são aqueles exigidos do empregado, do empregado. Então o presidente, eu sempre brinquei na Vale do Rio Doce, porque eu cheguei a ver isso lá, o presidente da empresa ele é despedido por telefone, mas como é que ele é despedido por telefone? Não precisa o Presidente da República dizer prá ele, basta lá um Chefe de Gabinete lá dizer: "Olha, saiu aquela entrevista sua no jornal, o Presidente não gostou, não, do que você falou, o Presidente acha que, você falou mesmo?" "Falei", tal, "não, não foi bem assim que eu disse", tal, nesse momento pode procurar a bagagem, pegar a mala e ir embora porque ele já está despedido. Basta chegar um sinal de que o Ministro não gostou, que o Presidente ficou muito agastado com a, acabou, ele vai sair! Ele vai sair, porque ele cai da sua condição de autoridade e fica lá na sua condição também de empregado relapso ou malcriado, que tratou mal o chefe. Então, mas a Vale do Rio Doce então todo, tava falando, todos os projetos da Vale do Rio Doce nunca vieram do Governo para a Vale desenvolver, a Vale desenvolvia os projetos e levava para o Governo, para o Governo, que era o dono, ele tinha que aprovar, aprovar ou desaprovar, mas sempre foram gerados dentro da Vale do Rio Doce, as estratégias, as estratégias de negociação tudo isso era gerado dentro da Vale do Rio Doce, nunca veio do Ministério de Minas e Energia, um Ministério altamente incompetente no tocante a
P/1: À política mineral?
R: No tocante a negócios, negociação. Ele era muito competente quando vinha lá o Departamento Nacional de Produção Mineral, então eles tinham grandes engenheiros, grandes geólogos, engenheiro de minas, geólogo, tal, realmente era um ninho de competência mas também aprisionado a um Gabinete de Ministro, porque eles não tinham autonomia. Muitos anos mais tarde o Ministério de Minas e Energia criou a CPRM, Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais, que foi que fez uma varredura da potencialidade de minério do país, muito grande, através dos seus geólogos que era um quadro primoroso, e então, mas esse quadro tinha vindo do Departamento Nacional de Produção Mineral, veio de lá, e, mais tarde, a Vale do Rio Doce, que também não podia esperar, mais tarde não, antes, a Vale do Rio Doce que não podia esperar, ela criou a sua própria empresa de geologia que é a Docegeo, Companhia de Geologia
P/1: Rio Doce.
R: _________, esqueci o primeiro nome dela. Mas, então, a Docegeo cumpriu aquilo que a CPRM não cumpria. Na época a Vale do Rio Doce ia adotar uma estratégia que era escapar um pouco das garras da estatização porque não existia o que era chamado estatal de segundo nível, porque estatal de primeiro nível era a Vale do Rio Doce, então tinha: "Ah, bom, a Vale do Rio Doce está sujeita a todas essas coisas, mas a subsidiária não." Então a Docenave fazia o que queria, a Docegeo fazia o que queria, a Cenibra fazia o que queria, todo mundo fazia o que queria até que inventaram a (risos) de segundo grau. Quando começou, então, a empresa de segundo grau, a Docegeo começou a sofrer amputações, mutilações e o que for, mas a Docegeo é a responsável por uma gama de descobrimentos de ocorrências minerais no Brasil tremendo, praticamente todo o ouro do Brasil foi descoberto pela Docegeo, tem da CPRM também _______, o manganês pela Docegeo, bauxita pela Docegeo, então a Vale do Rio Doce ela aplicou nesse programa de investimentos em pesquisa muito dinheiro, e foi recompensada porque agora na privatização mesmo foi visto quantos negócios a Vale do Rio Doce tinha, e tiveram que ter uma, um tratamento diferente, uma avaliação diferente porque são descobertas de jazimentos que vão ultrapassar até o período de uma, o período de uma avaliação econômica. Você quando faz uma avaliação você olha um horizonte de 30 anos, mais do que 30 anos é eternidade, ninguém faz uma avaliação para os próximos 50 anos, você faz num horizonte de 30 anos, porque em 30 anos muda tudo, o equipamento já foi todo substituído, quer dizer, já tem outra tecnologia e, mas então o, a Vale através da Docegeo ela fez o levantamento, o reconhecimento da existência de uma enormidade de, tanto que compõe hoje o patrimônio da Vale, tanto que, não interessa a essa conversa, mas quando foi feita a privatização, os compradores, os novos controladores, eles acabaram tendo que aceitar uma exigência do Governo Brasileiro que foi de criar um tipo especial de participação do acionista, que eles chamam de, _______.
P/1: Golden share, não?
R: Não, não é a golden share, não. É outra, é, as debêntures participativas.
P/1: Ah, debêntures.
R: As debêntures participativas elas correspondem exatamente a esse algo mais que a empresa tem que vai , vai explorar daqui a 15 anos, 20 anos, 30 anos e que não puderam entrar na avaliação agora. Mas e a hora que começar a entrar, de repente uma mina de ouro que está hoje dimensionada para tantas toneladas, de repente ela aparece a ter muito mais do que aquilo que foi reconhecido, então, quem vai ficar com isso, o Steinbruch? Não, isso aí é do acionista, é do Governo, o subsolo é do Governo , o subsolo não é da, então essa debênture participativa é uma promessa de que se aparecer algo além daquilo que estava previsto, o acionista vai ter direito (FIM DA FITA II) a uma remuneração por aquele algo mais. Mais isso tudo acontece porque a Vale do Rio Doce tinha uma, um conhecimento grande e um conhecimento grande do subsolo do país, porque pesquisa é isso mesmo, você vai gasta, gasta, gasta em pesquisa, não encontra nada, mas, encontra o reconhecimento, o sinal e de repente ali, com uma tecnologia mais profunda, você acaba descobrindo um valor para aquele reconhecimento que foi feito, né? Mas isso não é da minha área, isso aí é papo furado.
P/1: O senhor tava comentando do, que na verdade, a Vale levava para o Ministério a política, era uma relação.
R: Ah, sem dúvida. Olha, eu vou contar um, um, isso é um sentimento interior, quando foi para inaugurar o Porto de Tubarão, eu sabia, eu era novo na empresa, mas eu sabia exatamente o que que foi feito com aquele, porque que saiu o Porto de Tubarão e a importância que ele tinha, a importância que ele tinha na economia do país, porque era o maior porto do mundo de minério, a importância que ele tinha na economia do país, participei do esforço de toda a empresa para honrar a construção de Tubarão, inaugurar no dia 31 de março de 1966, uma coisa assim, porque foi um acordo feito anos atrás com os japoneses, com data marcada de inauguração. Então isso é, não é qualquer um que agüenta isso não, você fazer com 2, 3 anos de antecedência e marcar a data da inauguração, uma quantidade enorme de equipamento importado, uma tecnologia importada, um negócio terrível. Pois bem, quando estavam fazendo a programação da inauguração de Tubarão, é, as festas, as festividades, aonde que ia ser dado o tiro de partida, aquela coisa, o startup ia ser por onde, e tal, e então surgiu uma pergunta no grupo que estava cuidando daquilo "convida-se o Presidente da República?" (risos) É, eu na época fui contra, eu achava um absurdo o Presidente da República ser convidado porque ele não fez nada (risos), a Vale do Rio Doce não tinha sentido a presença do Governo, a gente só sentia quando era presença negativa, porque presença positiva? Não tinha presença positiva. O Governo nunca pensou em construir Tubarão, a Vale do Rio Doce é que pensou, aliás Eliezer, pensou em construir Tubarão depois levou a proposta pro Governo, tanto é que, o Governo, o que que ele ia fazer, o Governo ele ia dar dinheiro pra aquilo? Não. Ia dar tecnologia? Não. Porque o Governo não pôs dinheiro nenhum dentro da Vale do Rio Doce, era tudo reinvestimento de lucros, tudo reinvestimento de lucro. Então era empréstimos externos, avalizados pelo Governo evidentemente, empréstimos externos e a
P/1: E o próprio lucro da empresa.
R: E o próprio lucro da empresa, reinvestimento de lucro. Então quando a gente ouve essa balela por aí, que a Vale do Rio Doce agora entrou uma nova mentalidade que tá dando lucro, distribuindo dinheiro pros seus acionistas, sai e não volta. Agora, o da Vale não, era um dinheiro que ele não ia com tanta generosidade prá mão do acionista, mas ficava na empresa e era reinvestido, era reinvestido. Todos os projetos da Vale do Rio Doce até 1985 e tal, era tudo dinheiro ou de captação do mercado, e o Governo só entrando com o, moeda podre (risos) e, ou então, era dinheiro de reinvestimento de lucros. Isso aí é, quando fizeram a história, não precisa também fazer a história porque já existe essa história escrita, é uma questão de achar onde tá, porque na verdade eu trabalhei nessa área de controle e contrato da Vale do Rio Doce dezenas de anos, na financeira dezenas de anos, eu não tenho lembrança de um lançamento de caixa assim "Recebido da União", recebe nada, pelo contrário ela até dispensava a União de pagamento, porque, questão de prazo, dava como recebido prá poder cumprir os prazos, entrada e saída ao mesmo tempo dá saldo zero, aconteceu muito na Vale do Rio Doce, mas muito. Então, o Governo, voltando aonde eu estava, é isso, a gente não reconhecia a presença do Governo nos projetos da Vale do Rio Doce. Reconhecia assim, já foi mais recente a coisa, 74, 75, já no Governo Geisel o, a Valesul, aqui no Rio de Janeiro, a Valesul foi um empreendimento que a Vale não queria entrar nele, não fazia muito sentido, não fazia muito sentido a Vale do Rio Doce participar na industrialização do alumínio no Rio de Janeiro, quando não era essa a vocação dela, não era uma vocação industrial, a vocação da Vale sempre foi uma vocação de mineração, então quando ela entrou foi para atender, foi para atender um desejo do Governo de que a Vale participasse, ele precisava estar bem com o Estado do Rio de Janeiro, o Lima Faria, Faria Lima e foi por essa razão que a Vale entrou. Agora teve prá sair disso muito tempo, muitas vezes ela teve pra sair, mas sempre fica preso a compromissos que o próprio Governo Federal tinha com outros acionistas externos, né, em manter. E a Vale, o nome da Vale é uma coisa muito importante, porque a Vale ela passou anos e anos e anos sem ter nenhum poder de comando na Valesul. Era sempre lá, ___________, a Vale do Rio Doce ela até não gostava de participar disso, era contra a vocação dela. Então muito poucos projetos, muito poucos projetos teve o apoio político ou técnico do Governo, político só no sentido que ele às vezes entrava com o aval, a garantia, sempre importante. E essa garantia não era tanto que o país garante, não é porque o país era o dono da Vale do Rio Doce, era uma participação enorme no capital, então, praticamente, quando tava emprestando pra Vale, tava emprestando pro Governo, então nada melhor do que ele garantir aquilo que ele tava tomando emprestado.
P/2: Senhor Luís, mas tinha um aspecto também assim, as estratégias, as decisões saiam da própria empresa, mas o Governo tinha que, que
R: Tinha que endossar, tinha que apoiar.
P/2: endossar, tinha que ter um trabalho ali também de convencimento.
R: Trabalho de convencimento. Quando tinha competência do lado de lá prá reconhecer isso era fácil, mas quando não tinha emperrava os processos.
P/1: O senhor lembra de processos que tenham emperrado?
R: Não, não tem, o processo que eu digo o empreendimento, né, os trâmites de uma, de implantação de um, implantação de um projeto. A Vale do Rio Doce é muito grande prá falar, tem muita coisa que a gente sabe porque estava perto, ouviu e aprendeu, né, prestou atenção na vida, quem não prestou nem sabe disso, é, a verdade é essa.
P/2: Mas tem algum caso em especial que o senhor se lembre, assim, que foi uma coisa que emperrou um pouco, que foi mais difícil, e foi necessária uma movimentação prá que aquilo fosse aprovado?
R: Não, o que é parte de um, Carajás, dentro de Carajás houve muita necessidade de apoio do Governo para, até para poder a Vale se representar bem perante o outro sócio que era a United State Steel, porque Carajás até é uma coisa interessante porque a Vale do Rio Doce, quando ela foi chamada a participar do Projeto Carajás, que não era dela, evidentemente que o Projeto era da United State Steel, ela que descobriu aquilo lá, mas o Governo entendeu que realmente era uma descoberta que mexia, ia mexer com a geografia do minério no mundo, ia mudar a escala do minério de ferro no mundo, porque existia uma quantidade bem grande de projetos de ferro no mundo inteiro que estava no início, estava em planejamento e que, com Carajás, eles seriam todos esquecidos e tornado impossíveis, então, mas a Vale então estava atrás desse, desse projeto, desse objetivo que era minério de ferro, o Governo trouxe a Vale do Rio Doce, o Governo trouxe a Vale do Rio Doce para a mesa de negociação com a United State Steel, então houve aí um apoio diplomático grande porque ninguém quer perder a metade do que gastou, né? Mas o Governo Brasileiro, então, deu esse apoio ao, a ele próprio porque a Vale do Rio Doce não entrou ali porque ela quis, ela entrou porque foi chamada a entrar porque ela é a maior empresa de mineração no país, mais capacitada. E, então, ela recebeu esse apoio forte do Governo para fazer a associação, em primeiro lugar foi fazer a associação com os americanos. Foi um parto difícil, na ocasião eu não digo que tomei parte, mas eu era Contador Geral da Companhia, então, por causa disso eu era muito chamado na sala de reuniões onde estava lá os representantes da United State Steel e os representantes da Vale do Rio Doce prá dar informações de natureza técnica, contábil, tributária e, então, a gente percebia que os negociadores americanos eles prá dar um passo atrás eles faziam muitas, muitas exigências, tanto que quando fez a associação ficou assim a Vale é majoritária mas não manda, ela era majoritária mas não mandava, na ocasião. Então, mas o, e depois quando foi prá sair, a United State Steel sair do projeto, que foi outro parto difícil, o Governo Brasileiro, através do Ministério de Minas e Energia, deu muita força na negociação já então nos Estados Unidos, porque, como é que sai de um projeto desse? Não queria nem entrar, depois que entrou como é que sai, como é que sai? Então, a Vale do Rio Doce comprou a parte dos americanos por 50 milhões de dólares líquido, quer dizer já deduzido o imposto de renda, eles também nunca achavam que a Vale do Rio Doce teria esse dinheiro prá comprar. Então marcou data prá pagar e pagou, 50 milhões de dólares no dia, na mão, foi dinheiro que estava depositado no exterior e a Vale tinha realmente essa reserva. Mas, essa saída do americano do projeto também ela contou, a Vale contou com um forte apoio dela para facilitar essas negociações, liga pro Banco Central para autorizar a transferência de capital, mas aí já é o processamento do fato, né? Mas, assim especificamente que você me perguntou que projeto teria emperrado por falta de ação, ah, de uma maneira geral quase todos tiveram alguma dificuldade, entende, mas não a dificuldade de uma intenção do Governo de obstacular, não, é a própria (morosidade?) da decisão, tá prá tomar uma decisão muda o Ministro, aí o outro vai querer estudar tudo de novo, então, não era realmente alguma coisa orquestrada, não, era realmente coisa que não funcionava. O Governo é muito mau sócio, muito mau, péssimo, ele é péssimo sócio, principalmente em empresa como a Vale do Rio Doce, e aquelas que não tinham dinheiro ainda era pior, porque veja, a Vale do Rio Doce ela andou pra trás durante muito tempo com as políticas de preço do Governo, porque quem eram os, por exemplo, quem eram os grandes compradores de minério de ferro aqui no Brasil? A Siderúrgica Nacional, a Usiminas, gente que, estatal, todas as duas eram estatal, a Usiminas era estatal, a Siderúrgica Nacional era estatal e a Vale do Rio Doce tinha que fornecer o minério prá eles sem receber, não eram três meses, não, um ano, um ano de fornecimento sem receber.
P/1: Sem receber nada?
R: E sem aumentar o preço, a inflação disparando, o dólar lá em cima e tal, e ela vendendo naquele precinho de banana. Então o Governo usou a Vale do Rio Doce prá fazer, então, a sua política econômica dos outros, das outras atividades dela. E veja você que isso foi, porque quando você fornece minério de ferro prá Siderúrgica Nacional, ou prá Usiminas, e não recebe dinheiro, essas entidades quando vendem esse minério de ferro para as montadoras de automóvel eles tão comprando um minério mais barato que não tá sendo pago à Vale do Rio Doce, quer dizer, então, a Vale do Rio Doce bancou o Governo muito tempo, e depois ela era acusada de incapaz, de deficiente, mas quem que é eficiente sem dinheiro, né? Então ela não podia, como é que ela vai aumentar uma linha de produção para fornecer prá Siderúrgica Nacional? É loucura, né, mas aí entra o Governo com o seu poder negativo, porque você é obrigado, é aquela coisa do telefonema: "Oi, você não tá fornecendo prá Siderúrgica Nacional, suspendeu o fornecimento? Que absurdo!" E o Ministro, tal, aí faz aquele envolvimento, faz aquele envolvimento e as, os embarques que estavam retidos começam a sair, vai entregar, né? Ah, a Siderúrgica Nacional devia à Docenave, porque que a Docenave é acionista da Siderúrgica Nacional? Porque a Siderúrgica Nacional devia à Docenave horrores. Então a Vale não era acionista da Siderúrgica Nacional, mas a Docenave era, porque a Docenave é quase 100% da Vale. Então essa dívida cruzada deu possibilidade à Vale do Rio Doce, como estatal que era, participar da desestatização, (riso) da desestatização, porque tinha crédito. Tinha crédito e tinha moeda podre também, quantidade aí, né, famosa moeda podre. É isso aí.
P/1: Senhor Luiz, é.
R: Não quer parar, não?
P/1: O senhor quer dar uma paradinha?
R: Heim? Não, não, quero não. Quero parar com tudo.
P/1: Senhor Luiz, o senhor comentou, logo que o senhor entrou na Vale, a respeito do Contador Geral, que era, tinha um caráter diferenciado dentro de uma estrutura, queria que o senhor explicitasse um pouco como é que era essa estrutura.
R: Não, é, a estrutura antiga, primitiva da Vale do Rio Doce ela era uma estrutura vertical, então lá tinha lá o presidente, que sempre foi de indicação direta do Presidente da República e tinha os Diretores, que não eram muitos não, o Diretor de Operação, Diretor Financeiro e tal, e embaixo deles, então, existiam os grandes órgãos, entre eles estava a Contadoria Geral. Porque a Contadoria Geral, na época, não existia um Departamento de Controle, uma Superintendência de Controle, era o próprio Contador Geral que exercia essa função de controller da Companhia. Então, ele era um homem poderoso porque todos os, as demais Superintendências, como no caso a Superintendência de Compras dependia muito do Contador Geral porque ele que, quase que por vontade dele ou por eficiência dele, é que foi efetuado o pagamento das compras, tal, então tinha, a Vale nem sempre tinha todo o dinheiro necessário, então tinha que fazer aquela composição de paga esse, não paga aquele e tal, e o Contador Geral com isso ele ganhava muito poder, mas ele se destacava, então, num processo administrativo e não num processo de controle, no controle era muito ruim, a Vale do Rio Doce era péssima, ela adotava o sistema de contabilização completamente anacrônico, que veio do serviço público, então você perguntava quanto é que tem a receber, a gente não sabia porque não tinha uma conta de contas a receber, não tinha, tinha títulos assim "Entidades estatais", não, "Entidades privadas, públicas, não sei o que, estatal, tanto", o que que é isso? Aí eles tinham (testado?) ali. E, então, eu tô dando um exemplo superficial, mas ela tinha em cada departamento ela tinha uma escrituração diferente, então, a mineração tinha um tipo de escrituração, a ferrovia tinha também um tipo de escrituração que já era padronizado, era o Plano de Contas Padronizado das Estradas de Ferro, ditado pelo Governo, e não dizia nada para um administrador, interessava muito pro Governo, receber aquelas informações sobre locomotivas, aquela coisa, o administrador quer saber quanto é que custou o transporte e quanto é que ele recebeu por esse transporte. A mina tinha, a administração tinha, então era uma bagunça generalizada que tinha que ser consolidada, então era consolidada no Rio de Janeiro, um caleidoscópio, um mapa.
P/1: confuso.
R: que não dava ao administrador nenhuma visão do ______, isso aí começou a ser mudado a partir de 64 quando então a Vale do Rio Doce ela começou o processo, aliás não foi em 64, antes de 64 ela já vinha fazendo essa reestruturação organizacional e criando, então, estrutura de, chamava-se Divisões Financeira, Divisão de Controle, Divisão de Desenvolvimento, Divisão disso, daquilo, e aí os contadores começaram a cair, porque a medida que você introduz um cara no meio você já derrubou ele um pouquinho, né? Então, a contabilidade da Vale ela deu um salto muito grande com essa reestruturação que foi, foi numa época do Eliezer, o Eliezer tinha sido Ministro de Minas e Energia em 1961, é, ele tinha sido Ministro de Minas e Energia e depois, ele era um Ministro nomeado pelo Governo João Goulart, ele foi Ministro, acumulando Presidente da Vale do Rio Doce e Ministro, e então ele teve a possibilidade, o Eliezer teve a possibilidade então de, como homem do Ministério, apoiar a Vale do Rio Doce nesse processo de privati, de reestruturação.
Contrataram uma firma,
Ecotec, e então o Eliezer contratou essa firma Ecotec, o dono da Ecotec era o Kafuri, um nome até
importante até hoje, o Kafuri e o implantador daquilo era o Antônio Dias Leite que era, mais tarde veio a ser Ministro. Antônio Dias Leite com uma equipe muito, muito competente, fez essa reestruturação estrutural e organizacional e nesse processo aquelas hierarquias que se mantinham da organização anterior, elas começaram a cair porque lhes faltava, realmente, até competência técnica prá se desenvolver dentro do novo, dentro desse novo perfil organizacional da Vale. E o contador, então, ele caiu, caiu de podre, ele foi substituído, foi designado para uma subsidiária que estava no papel, chamava-se Companhia Vatu, era Companhia Vale do Tubarão, é o que seria uma metalurgia em Minas Gerais que iria fornecer, iria fornecer chapas e coisas para a indústria automobilística, isso era ovo no bico da galinha, lá, lá atrás ainda. Então, esses contadores, esse contador foi afastado, era uma pessoa muito boa mas não dava mais prá essa função, trouxemos, trouxemos entre aspas porque eu era fichinha, então a Vale trouxe de Vitória um contador que era um contador local, Everton ______ Pinto, um bom administrador de trabalho, o Everton nesta ocasião, ele já morreu há 2, 3 anos atrás, mas o Everton nessa ocasião ele estabeleceu uma condição prá ele assumir a Contadoria que já era um órgão, então, subordinado à Superintendência do Controle que tinha estado antes, era só no papel, mas quando ela começou a exercer a função dela, o objetivo dela o Everton foi convidado a vir para ficar no lugar do, desse Jamil, e então o Everton estabeleceu algumas condições prá ele aceitar, uma delas era que ele queria carta branca, isso é todo chefe é "não, se me der carta branca eu tenho que botar gente pra fora", realmente não adiantava nada assumir com aquele pessoal todo é bastante ultrapassado que existia ali. E foi quando ele me procurou, Everton me procurou, e disse: "Olha, Costa eu tô convidado a ser o Contador Geral, eu só vou aceitar se você aceitar ser sub-contador." Eu falei: "Oh, Everton, tem um quadro de 50 contadores dentro da Vale do Rio Doce, você já pensou como é que vai ficar a minha orelha, vermelha de levar xingamento? Porque ninguém vai se conformar disso, esse pessoal está na expectativa de uma oportunidade." "Não mas acontece que se você não aceitar eu não vou aceitar." É chantagem, né, mas de qualquer forma. Ele então estabeleceu essa condição lá com o Superintendente que era o Doutor Pitella, não sei se ele vai fazer parte disso aqui.
P/1: É, já fez.
R: Hem?
P/1: Já fez, é.
R: É, então, cuidado com (risos)
P/1: Não devia ter falado (risos).
R: Mas, então, com o Doutor Pitella ele aceitou ser o Contador Geral, começou logo e então nós fizemos um programa de trabalho que era um programa meio penoso, era uma cirurgia com dor que a gente tinha que fazer. Então, na época, a Contadoria Geral dispunha de três setores, cada setor com quatro seções, então seriam três gerentes maiores, 12 menores e tinham outros empregados também. Na época a Vale do Rio Doce, ela era a mãe mesmo, ela não mandava ninguém embora, então a gente, quem quisesse ficar livre de um empregado tinha de fazer, colocá-lo à disposição lá na área administrativa, hoje recursos humanos, então fizemos um trabalho junto à área administrativa porque eles não tavam querendo receber mais ninguém porque as outras áreas todas já estavam fazendo seus processos de depuração e mandando prá área administrativa, então, mas nós fizemos um trabalho junto à área administrativa, nós vamos mandar todo esse pessoal vamos botar à disposição de vocês. Então, escolhemos quem, mentalmente lá, já conhecendo bem o currículo deles, nós escolhemos quais seriam os três novos chefes de setor, de seção, de setor, e quem seriam os 12 novos chefes de seção, então, aí num dia só, que não foi na sexta-feira, né, porque geralmente a gente faz isso na sexta-feira, né, mas não foi na sexta-feira, foi na segunda-feira. E tinha uma condição, tanto o Everton quanto eu nós tínhamos condição de executar qualquer serviço que existisse lá, se alguém não souber a gente vai lá ensinar, a gente sabia realizar o serviço, executar o serviço. Então nós chamamos, de início, os três chefes de setor, então, educadamente, falou: "Oh, a partir de hoje você não é mais chefe de setor, você vai voltar pra sua, pro seu cargo de carreira, não adianta protestar que é coisa decidida e vamos exigir que vocês prestem todo o apoio aos novos que vão chegar.
Se não quiser nós colocamos à disposição da divisão administrativa." Fizemos isso com os três e depois fizemos isso com os 12 chefes de seção, chamamos os 12, com os 12 lá: "A partir de agora vocês não são mais chefes de seção. Total apoio ao seu substituo", a mesma conversa, mas foi um negócio educado, não foi, só houve um ou outro lá que ameaçou que tinha um padrinho, não sei o que, mas não adiantou nada. Então nós substituímos, num dia só, três chefes de setor e 12 chefes de seção e botamos os novos lá, é tocar a barata voa, é, num grupo você toca a barata voa, "e agora, como é que eu vou fazer?" "Você vai fazer, você sabe." E, a partir da terça-feira então nós começamos a dar cobertura aos novos que estavam assumindo. E foi um processo meio traumático mas que, a gente fez isso até como um projeto com uma meta, a gente "olha, nós vamos nos transformar do órgão mais desacreditado da empresa no órgão mais acreditado. O que sair daqui tem que ser verdade." Porque cada um tinha uma verdade, né, porque a contabilidade não conhecia nada que prestasse, então nós introduzimos essas modificações e grandes modificações também no plano de trabalho que já era trazido, então, pela Ecotec, aquela firma Ecotec. E isso demorou um período de dois, três meses e a Contadoria realmente começou a ganhar conceito e tempos mais tarde o Everton, um ano mais tarde, ou dois, o Everton então foi transformado em Auditor Geral, ele foi para a Auditoria, criaram a Auditoria, porque a Auditoria da Vale era contratada, então foi criado o órgão mesmo da Auditoria interna e ele foi designado para ser o Auditor e, nessa ocasião eu fui ser o Contador Geral. Eu assumi o lugar do Everton e aí entrou num processo de, vai acabar (risos), aí (risos) entramos num processo de trazer gente, aí trouxemos as melhores competências, aí foi uma beleza.
P/1: No mercado, fora?
R: No mercado não, dentro da Companhia. De fora nós contratamos também mas na base do concurso. Eu hoje olho pra trás e vejo aqueles concursos, aquilo era uma barbaridade que a gente fazia com esse pessoal. Ali o concurso, acho que quem respondesse aquilo bonitinho mesmo tinha que ser era professor, é, era um negócio complicado, viu? Mas eles, trouxemos gente muito competente e uma das coisas que eu falei com todos eles que vieram de fora, pessoal era contabilistas bons dos departamentos, faltava a eles o que? Moldura, eles tinham conhecimento, sabiam, era uma boa pintura, faltava a moldura só de, então eu chamei todos eles, uma palestra com eles todos, falei: "Olha, só vai trabalhar comigo quem quiser o meu lugar, quem não quiser o meu lugar pode ir saindo." Não porque é verdade, você não pode eternizar num serviço, não, você apodrece nele, então só interessa a mim um sujeito que saiba mais do que eu, ele tem que saber mais do que eu e querer o meu lugar porque aí você fica liberado para ir para outro lugar, e foi o que aconteceu.
P/2: Senhor Luiz, desculpe, só um minuto. Não, porque.
R: Ainda não tá gravando, não?
P/1: Não tá gravando, esse pedacinho não tava?
(PAUSA)
P/2: _____________, não, tudo interessa, né?
R: Eu pensei que vocês estavam fazendo era a história da Vale, eu não.
P/2: A história da Vale mas
P/1: A história da Vale pelo seu prisma.
P/2: A história da Vale mas passando pela história de quem fez a história.
P/1: De quem fez a história da Vale.
R: Vocês vão se deliciar com Doutor Marinho.
P/1: O Doutor Marinho, ele foge da gente.
R: Mas ele vem.
P/1: Ele vem?
P/3: Vamos lá?
P/1: Bom, então a gente tava nessa parte que o senhor tinha comentado que nesse processo de transformação na contabilidade os profissionais foram encontrados dentro da própria Vale do Rio Doce?
R: Certamente. Depois nós fizemos concurso, né, vários concursos, a medida que, nós tínhamos uma meta, veja só, nesse período o Superintendente do Controle já era outro, era o Doutor França Pereira. A gente tinha, já tinha outra, tinha meta, uma das metas nossa era transformar a Área de Controle, que era, a Contabilidade era a maior unidade da Área de Controle, nós tínhamos um projeto de transformar o controle numa área de excelência, numa área de competência, então era, fazia parte do nosso projeto mesmo formar pessoas capacitadas o mais possível e cedê-las para outras empresas do sistema, a Docenave, a Docegeo, a Cenibra, Mineração Rio do Norte, qualquer empresa que pedisse socorro e quisesse uma pessoa com capacidade, com potencial a gente cedia um dos nossos. Porque isso tinha duas finalidades, primeiro porque a gente apostava na capacidade deles que eles iam prá lá e iam realmente também injetar lá alguma capacidade, e segundo melhorar o relacionamento porque a Vale do Rio Doce, durante muitos anos, ela criou as suas subsidiárias e coligadas de uma maneira muito livre, muito autônoma, então a comunicação delas com a sede era muito difícil, não era fluida, era um negócio trabalhoso, eles não admitiam qualquer orientação que partisse da Vale para a coligada ela era recebida como uma interferência, e não como um processo, a Vale não tinha experiência de, na verdade é isso, ela não tinha experiência de grupo, de conglomerado. Então esse projeto nós tínhamos e realmente cedemos muita gente que tinha entrado prá Contadoria Geral, treinado, se, disputado vaga dentro do controle, mas de repente surgiu a oportunidade de ir prá uma outra empresa do sistema, e a gente cedia com muito prazer, mesmo que fosse, a gente fica ______, né, você perder um elemento de boa capacitação, então isso era parte de um projeto, então entrou muita gente, nesse período, entrou muita gente com boa capacitação, a partir de concursos muito duros, muito rígidos que nós fazíamos, então gente muito boa, tem muitos que estão até lá como diretores, essa coisa, é, porque realmente você, você, você não pega gente ruim, soma e dá gente boa, não, dá gente mais ruim ainda, né, então esse foi um processo e que se estendeu por muitos anos, se estendeu por muitos anos. O Doutor França Pereira ele não era lá muito bem quisto, ele era Mister Pavão, era um sujeito meio arrogante, não era tanto assim não, era o jeitão dele. Ele, mas era uma pessoa super organizada, então, e ele cobrava da gente, aliás, ele cobrava das chefias, ele cobrava muito os resultados, então nós não fazíamos nada dentro da Contadoria Geral e dentro da Área de Controle, não fazíamos nada que não fosse objeto de um projeto que tinha nome, tinha objetivo, tinha prazo para terminar e tinha um coordenador, então todos os assuntos dentro da Contadoria tinha dono, tinha dono e o dono era responsável, ele era cobrado, então com isso nós pudemos desenvolver muita coisa, principalmente na área de registros contábeis, porque a Vale do Rio Doce, como eu disse aí uma certa hora, a Vale do Rio Doce era muito atrasada em registros contábeis, então esse grupo que eu tô memorizando aqui foi responsável pela informatização da Contadoria, numa época que não tinha informatização no Brasil, eu fui visitar aí uma fábrica em São Paulo, lá no Matarazzo, diz que era um paraíso de informatização, mas na realidade eles eram muito bem informatizados prá arrumar a carga dentro de containers, eles sabiam botar tantas caixinhas de macarrão assim uma empilhada em cima da outra, mas na matéria, em contabilidade eles só tinham contas a receber, nas contas a receber era realmente informatizado, o resto não, contabilidade era feita ainda na maquinizada, não era mecanizada. Então, nós introduzimos, e foi um trabalho, reputo, foi um trabalho muito bonito e que eu, a minha participação nisso era uma participação de Contador Geral, mas o pessoal que executou mesmo, José de Almeida Melo, (Enildo?) Carvalhinho, Hélcio Guerra, uma série de, Abelardo (Contini?), uma série de pessoas de grande capacitação que conseguiram, então, informatizar a Vale do Rio Doce, e olha que o sistema não era como hoje, não existiam os periféricos, o que existia era aqueles equipamentos monstros, aquele computador que ocupava uma sala dessa, e achava lindo, uma fita desse tamanho, "olha, aqui tem toda a contabilidade do ano", hoje você tem isso dentro de uma coisinha, né? Mas, então, nós conseguimos informatizar, a partir do momento que nós informatizamos aí pudemos fazer outros progressos, por exemplo, a Vale foi a primeira empresa do Brasil, na época, que teve o seu ativo imobilizado totalmente informatizado, então, agora, você não põe porcaria dentro do computador, se você botar porcaria vai sair porcaria, né? Então, nós tivemos um trabalho de depuração enorme, nós voltamos a 20, 30 anos atrás, é, quase que a fundação da Vale, eu me lembro que eu compulsei livros da criação da Vale do Rio Doce, nós voltamos ao, vamos chamar ao primeiro, à primeira compra da Vale do Rio Doce e fomos acompanhando cada uma daqueles itens até o momento em que ele foi baixado ou desapareceu, porque por falta de organização o bem acaba desaparecendo até do registro, fomos detectando todos os erros que foram praticados dos 25, 30 anos atrás, corrigindo e quando o imobilizado, o ativo imobilizado da Companhia estava em condições de ir para o computador, até quem fez essa apresentação à Diretoria fui eu, nós fizemos então uma apresentação muito grande prá explicar à Diretoria o que que estava sendo feito e quais eram as conseqüências, os desdobramentos administrativos que aquilo ia acarretar, por exemplo, havia erros grosseiros na, que foram detectados em anos e anos anteriores e que, por exemplo, a depreciação de um bem do ativo imobilizado ao invés de ser contabilizado como uma depreciação que vai diminuir o bem, ela foi contabilizada como uma reserva, e depois utilizada aquela reserva prá fazer aumento de capital, quer dizer, se aumentou, fez aumento de capital com o desgaste de equipamentos, digamos assim, como é que se corrige isso, né? Entende? Como é que corrige isso? Não tem jeito de corrigir, tem assim você, na época, com a legislação da época, você reapresentava aquilo à, hoje seria Receita Federal, à Receita Federal, mostra que você deduziu uma depreciação, depois capitalizou a depreciação, não pagou o imposto de renda, então, nós quantificamos tudo isso apresentamos à Diretoria, foi um trabalho realmente gigante, e não envolveu só esse pessoal do Rio, não, envolveu o Departamento, todo mundo, e aquilo que não pode realmente ser corrigido, que não tinha como corrigir, ou até nem foi identificado, foi um resíduo muito pequeno que nessa apresentação à Diretoria nós pedimos então que a Diretoria autorizasse aquilo ser levado a fundo perdido e encerrar o assunto, pra poder jogar no computador só o que prestasse. Então isso foi apresentado à Diretoria numa sessão de Diretoria vamos chamar de, entre aspas, memorável, não tinha nada de memorável mas ela foi específica para esse fim, obtida essa autorização nós, então, introduzimos no sistema o ativo imobilizado. Agora você imagina ativo imobilizado, quando a gente fala em ativo imobilizado na Companhia você tá falando em navio, você tá falando em rebocadores, você tá falando em locomotivas, você tá falando em guindaste, você tá falando de trilho, você tá falando de tudo! É, são dezenas de milhares de itens que foram pesquisados um a um, o que que foi comprado em moeda nacional, o que que foi comprado em moeda estrangeira, quanto era o dólar daquela data que foi comprado, isso foi um levantamento gigante. Depois de colocado isso no computador aí é sopa no mel, porque? Nós passamos a fazer a depreciação diretamente no computador, mês a mês, quer dizer não esperava o fim de ano pra você aplicar uma taxa de depreciação, ela ia sendo feita mês a mês, sendo feita mês a mês e caindo diretamente dentro do Centro de Custo onde ela devia, ela devia influir, então uma, uma depreciação digamos de locomotiva ela era feita automaticamente e caia dentro do Centro de Custos de Transporte, que devia receber a carga daquela depreciação, e assim foi feito com todos os outros itens. Esse foi um tipo de trabalho que a Vale pode desenvolver e atrás disso vem outras coisas, primeira, segunda fase de custos, eu na primeira fase de custos que era um negócio meio, meio primário, na época era muito adiantado mas era meio primário, passou-se para segunda fase de custos, terceira fase de custos, essa terceira fase de custos é aquela que já o contador não toma conhecimento dela, é a nível de presidência, né, é aquela que o japonês queria ficar atrás pra saber quanto é que era. Então esses progressos todos foram possíveis a partir dessa capacitação que foi feita na época, e tudo, quer dizer, teve, o momento em que nós esbarramos em Deus foi esse, foi no momento em que trocamos aquele grupo, trocamos aquele grupo, que era um grupo de pessoas excelentes, tem uns que são meus amigos até hoje, mas realmente eles estavam inadequados no lugar onde estavam, então, só um flashzinho aí sobre a coisa.
P/1: Senhor Silva, é, quer dizer, prá montar um trabalho desses, quer dizer, de mapear todo esse ativo, e tal, teve que mobilizar a Companhia toda, Itabira, minas, como é que era essa relação Rio de Janeiro, Itabira, esse?
R: A comunicação interna da Companhia sempre foi muito boa e a relação de dependência também era muito bem compreendida, então, vamos falar por exemplo Itabira, Itabira eu fui o que se credenciou a ir a Itabira prá passar pra eles o que que a gente tava procurando. Eu fui, reunimos lá o contador, os auxiliares de contador e dissemos o que que a gente pretendia, mostrava prá eles as excelências do que se tava pretendendo, o trabalho que ia caber a cada um, ninguém ia receber nada por causa disso, porque a Vale do Rio Doce não pagava extra, e então, então passava prá ele o que que a gente queria, conta por conta, item por item, e eles, aí envolvia na maioria das vezes uma busca em arquivo enorme, era você ir ao documento de compra, né? E, às vezes, documento da área de compra já tinha ido prá arquivo morto a muito tempo, então tinha que fuçar naquilo prá tirar e corrigir, foi, foi um trabalho com a participação muito grande das Contadorias de Obras, tanto que Obras era muito mais contabilidade de Obras em Curso, acabou ali já vira imóvel e, mas Contadoria das Minas, a Contadoria da Estrada, a Contadoria do Porto menos porque ele era mais novo então o porto já era novo aí, e as usinas de pelotização que também eram mais novas então elas já não tinham tantos erros, tanto passado errado. Mas houve uma mobilização muito grande, e aqui no Rio praticamente essa que centralizava esses dados retificados, ou a retificar, eles eram conduzidos pelo Melo, o Wander que acabou sendo Presidente da Vale, o Wander, o Hélcio Guerra, o Dino que Deus o tenha, já morreu, e então foi um trabalho bem feito e o pessoal aceitou bem, porque todo mundo gosta de fazer coisa boa, né? Então o que o pessoal não gosta é ficar repetindo nhen, nhen, nhen, nhen, nhen, nhen, se você chegar e colocar o empregado em brio ele trabalha, ele trabalha com satisfação, ele trabalha com satisfação. Foi um trabalho bonito esse da, ah, outro que nós fizemos foi a tal Reserva para o Desenvolvimento da Zona do Rio Doce, aquilo era uma zona! Aquilo era um negócio que cada um tinha um número diferente, nós também fizemos um trabalho semelhante com a Reserva e levamos à, levamos à Presidência da Companhia, reunião de Diretoria, apresentamos e fomos autorizados. A partir daí essa Reserva pode ser mais administrável, porque ela não era administrável, é um negócio que, é um desembolso que acontece em toda a área de influência da Vale do Rio Doce, adiantamento da Prefeitura, prá aí, aí tinha muita interferência política nisso, muito, coisa de político, né, quer uma ponte aqui, um pontilhão ali, prá e. E isso tudo era através dessa Reserva para o Desenvolvimento da Vale do Rio Doce, essa Reserva, mexi aqui, essa Reserva ela surgiu praticamente no decreto de constituição da Vale do Rio Doce, e um erro tremendo, a Reserva, a constituição da Vale do Rio Doce diz que dos lucros apurados 5% era prá constituir o Fundo de Reserva Legal, 30% ou 20% para constituir um Fundo de Reserva Geral, não me lembro mais o nome, Fundo de Investimento, alguma coisa assim, e depois tem lá, redação da lei, o restante, se houver, ora se você pega 100, tira 25, o restante se houver, tem que haver, pô, né? Então, o restante se houver será levado a uma conta para o desenvolvimento da Zona do Rio Doce, aquilo é, a Companhia estaria morta se ela tivesse seguido esse dispositivo da lei que criou ela, do estatuto, porque foi repetido no estatuto. Então, mas essa Reserva ela era um percentual, depois foi substituído passou a ser um percentual anualmente destacado dos lucros que ficava creditado para ser aplicado segundo um programa, que não tinha, segundo um programa na proporção de 70% para Minas Gerais, 30% para o Espírito Santo. Então, dentro desses 70, desses 30% eles também se subdividiam em valores reversíveis e valores irreversíveis, então tinha, não me lembro mais a proporção, mas não era tanta coisa, era alguma coisa como 10% para custeio, prá fundo perdido e o resto empréstimo para financiamento de projetos na Zona do Rio Doce e esse projeto, esse dinheiro emprestado com retorno, ele nem sempre voltava nas datas contratadas porque ele fica na administração de prefeito de interior, muda prefeito o outro não paga, essa coisa própria de política, né? Então, mas essa Reserva aí
havia um outro erro muito grande que ela ia virar uma bola de neve porque o dinheiro que você emprestava a uma Prefeitura, quando ele voltasse havia a corrente que dizia "não, emprestou, ajudou o desenvolvimento da Zona do Rio Doce acabou, volta para a caixa da Companhia." Não, o que fazia era o seguinte ia, pagava, voltava para a Reserva novamente, então foi estufando aquela coisa, aquilo ia virar um banco, é, ia virar um banco, agora esse trabalho então que nós fizemos foi um trabalho que pode sanear esse, esse item da contabilidade do patrimônio da Vale do Rio Doce e que mais tarde ele foi bastante modificado já na gestão do Presidente Fernando Reis, ele andou mudando muitos conceitos, agregou o Banco de Desenvolvimento do Espírito Santo e Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais como participantes, ou co-participantes do processo, então a Vale começou a se afastar do exame de projetos, aquela coisa e isso passava a ser dos bancos. Então o banco emprestava uma parte do dinheiro dele, uma parte do dinheiro da Vale do Rio Doce e o tomador do empréstimo uma parte dos seus recursos próprios, as prefeituras etc. Aí teve uma melhoria, e era sabido que quando fosse da privatização ia haver uma grita danada, né, porque isso é um instrumento de força, de poder do político, né, então na privatização houve grande dificuldade de negociar, negociar com os governadores e com os prefeitos, negociar uma forma de não extinguir esse Fundo, essa Reserva, porque? Porque as prefeituras, os partidos políticos eles dependem muito dos, do que com esse dinheiro as prefeituras podem executar, isso foi executado coisas incríveis, foi ______ estrada, foi, foi um, um, um, e foi muito dinheiro a fundo perdido que não devia ser fundo tão perdido assim mas foi. Então era, mas era um dinheiro que já não fazia falta prá Companhia porque ele já tinha sido segregado da Reserva e os políticos sempre, eles sempre quiseram ter acesso, direcionamento direto desses, desse Fundo. Isso não foi, não foi a frente, a Vale sempre combateu isso e quando entrou Carajás, quando entrou Carajás, aqui que a gente tinha 40 e poucas prefeituras em Minas foi transferido isso, esse desejo para o Pará, o Pará e o Maranhão querendo também o dinheiro, né, então, aí a Vale modificou, conseguiu uma modificação no estatuto e hoje esse dinheiro não é aplicado mais na mesma, com a mesma disciplina que era aplicado anteriormente. Eu até nem sei como é que foi, foi uma negociação difícil (risos), você imagina com o Governador do (FIM DA FITA III) Para que que não faz diante de 50 milhões de reais, é um negócio de doido. Mas, e não é só Pará, não, Maranhão também. Mas, então, esse Fundo também teve a ação, ação saneadora da contabilidade, e muitas outras coisas foram sendo estudadas, uma coisa boa vai puxando outra, não existe uma coisa ruim no meio de, uma coisa boa no meio de muita coisa ruim, não existe isso, tudo se nivela pelo pior que tem, ninguém nivela por cima, nivela por baixo, então a medida que você cresce embaixo, na base, você começa dar autenticidade a tudo mais que está em volta. E isso é uma história comprida, viu, da Reserva, é, eu me perco um pouco nesses detalhes, na época eu sabia bastante a respeito, mas hoje eu não sei muito mais, não me recordo bem da, sei que a Reserva não acabou, não vai acabar nunca, isso aí enquanto, enquanto, e veja só, enquanto o Governo tiver uma participação acionária na Vale, como ainda tem nas ações preferenciais e parte das ações ordinárias, então o Governo ele vai impedir que haja uma pilhagem em cima desse dinheiro, porque se deixar por conta do político, acaba, não tenha dúvida que acaba, esse, agora, fiquei sabendo alguma coisa dessa última Assembléia da Vale do Rio Doce, até o Governo foi de estranhar, pela primeira vez depois da privatização o Governo exerceu o direito de eleger um membro do Conselho Fiscal, foi anteontem aí, ele exerceu um membro do Conselho Fiscal, coisa que não existia antes, quer dizer, não existia, o Governo não se credenciou durante o processo de privatização e agora colocou, então, é sinal de que o Governo está um pouco atento a isso, né? É porque se deixar perde tudo, né? A gente fala só de político, não é só político não, empresário também.
P/1: Doutor Silva, e a participação, quer dizer, do senhor, por exemplo, com o Projeto Carajás, como é que foi essa participação, como é que ela surgiu? (PAUSA) (risos) Quero ir embora, quero ir embora.
R: Não, o Projeto Carajás ele, olha só, ele foi negociado de 68
69 e ele foi realmente transformado em, foi contido dentro de instrumento de negociação, dentro de instrumentos jurídicos em abril de 1970, mais precisamente 15 de abril de 70 foram assinados os cinco contratos que iriam regular toda a associação, é o contrato de pesquisa, o contrato construção, o contrato de vendas, o contrato de que, meu Deus, viabilidade, eram cinco contratos, então esses contratos, por esses contratos a Vale do Rio Doce tinha direito a ter alguns cargos dentro da estrutura, muito embora a, tinha direito a alguns cargos nessa estrutura mas, durante o processo de pesquisa, é, de pesquisa e estudo de viabilidade quem estava com o poder de mando, o poder, o comando era a Meridional, a Companhia Meridional de Mineração que era a subsidiária brasileira da US Steel. Então, então, no estatuto da Amazônia Mineração, que foi a empresa constituída para fazer a pesquisa, prá fazer a pesquisa não, era prá fazer, receber os resultados da pesquisa e fazer o estudo de viabilidade, ela nesse contrato a Amazônia Mineração dispunha de algumas diretorias, tinha o Presidentes, que era por indicação da Vale do Rio Doce, tinha o Diretor Administrativo que era indicação da Vale do Rio Doce, tinha o Diretor Financeiro que era indicação da Vale do Rio Doce, agora ficava então o controle jurídico, o controle jurídico e a operação que era praticamente a construção por conta da Meridional. Todo o trabalho físico ele era desenvolvido pela Companhia Meridional de Mineração, que contratava seus, na época nem contratava ninguém porque ninguém queria ir lá pro meio do mato, né, era um negócio terrível lá, então era empregados próprios, mão-de-obra própria, a Meridional então executava esses trabalhos, totalizava o valor desses gastos e a Vale do Rio Doce entrava com 50%, a Vale pagava 50% dos gastos. Como é que ela entrou? Na hora que ela entrou ela pagou à Meridional, United State Steel, ela pagou também 50% daquilo que a Meridional já havia aplicado na pesquisa, então a pesquisa começou em setembro de 67, a pesquisa, até abril de 1970, esse dinheiro que ela gastou a Vale do Rio Doce reembolsou 50%, após uma, após uma auditoria que foi feita, documento por documento, mês a mês, neste trabalho foi quando eu comecei a fazer parte da, da, da, vamos dizer, do métier aí de Carajás, eu era assessor do Doutor Lauro Marinho, era Diretor Financeiro da Amazônia Mineração. Então ele me designou para compor um grupo da Vale do Rio Doce que iria nos arquivos da Meridional e olhar cada um daqueles documentos, auditar cada um daqueles documentos, e, então, e o que a gente não aprovasse ele seria separado, seria glosado, não faria parte do reembolso. Acho que a Vale do Rio Doce, falta de experiência, falta até de autoridade porque a empresa estatal não mandava muito mesmo, como não manda, então fica cheio de escrúpulo que vai pagar sem ver, aquela coisa, então pagou pra ver e pagou mais do que devia porque na verdade a, era 12 milhões de dólares, alguma coisa que tinha que dividir em dois, nós auditamos, a comissão auditou esses documentos e realmente, você imagina, em 12 milhões de dólares, você tem um trabalho imenso pra ver e coisa, você glosar 7 mil dólares, não faz sentido, isso aí você paga sem ver e resolve. Mas ela comprou, digamos, os 50%. Nessa época, então, eu comecei a participar, ainda, eu ainda estava na Vale do Rio Doce somente, aí depois disso eu fui designado para ser assessor do Diretor Financeiro da Amazônia então dava mais tempo, ficava mais responsável pela manipulação de documento, essa coisa. A Vale pagou esses, a metade desses 12 milhões de reais e depois mensalmente vinha uma apresentação das contas do mês anterior mostrando quanto que havia gasto e a Vale do Rio Doce pontualmente depositava aquele dinheiro numa conta especial de liquidação que tinha com a Meridional, então aí eu comecei. Fiquei nisso durante muito tempo até que em 1973, 74, em 1974, setembro de 74 por aí eu deixei o cargo de Superintendente de Patrimônio na Vale do Rio Doce e fui designado prá ser o Diretor Administrativo, Diretor Administrativo só, mais tarde isso houve uma mudança, um (merger?) lá e Administrativo e Financeiro. Mas então eu fui designado para Diretor Administrativo da Amazônia Mineração. Amazônia Mineração era uma paper company, na verdade era uma paper company porque quem fazia o trabalho, quem fazia o trabalho de pesquisa era a Meridional, quem revisava e interferia diretamente nos projetos de engenharia, mas ainda a nível de escritório, era a Valuec, Valuec era uma composição de Vale e USC, United State Engineer and Company, era o Vale da Vale e o Uec da United State Steel. Então essa Valuec é que era a grande, ela era grande realmente um escritório potente, possante de projeto. Fora disso, então a Amza, ou Amazônia Mineração S.A., ela era um repositório desses dados que iam chegando mas ela não tinha nenhuma interferência operacional no processo, mais tarde a Valuec foi incorporada pela Amazônia, ela foi incorporada e aí foi quando terminou a pesquisa, quando terminou a pesquisa a Valuec foi incorporada à Amazônia, aí acontece aquele fenômeno que acontece em qualquer lugar até hoje, quando o menor engole o maior aí dá indigestão, né, porque a Amazônia era uma paper company e entra aquele monstro _______ que era a Valuec, entra prá ali, então cada um com seus departamentos, com seus engenheiros, com sua estrutura de pessoal, estrutura de transporte, estrutura de comunicações, então realmente foi uma aglomeração muito difícil de ser feita. Nessa época eu estava entrando, então, na Amazônia Mineração, agora porque que eu fui prá Amazônia, se é isso que você perguntou (risos), é, eu fui prá Amazônia por acaso, eu estava na, eu era Superintendente de Patrimônio, e também eu acho que fui prá lá por acaso porque de repente me designaram prá lá, era uma área que realmente eu não dominava muito, acabei aprendendo alguma coisa e quando eu estava achando que eu já ia brilhar lá na área de patrimônio eu fui designado prá ir prá Amazônia como Diretor Administrativo, então a explicação que mais tarde o Doutor Fernando Reis me deu, e mais tarde eu li na documentação realmente da época foi que quando houve uma negociação entre a United State Steel e a Vale do Rio Doce, negociação difícil e que terminou no Gabinete do Ministro de Minas e Energia, com muita dificuldade chegaram a um acordo sobre o comando do Projeto Carajás, que ele seria exercido pela Amazônia Mineração onde o Diretor de Operações, que era um homem de engenharia, o Diretor de Operações era da Meridional, o Diretor Jurídico era da Meridional, o Diretor de Controle era da Meridional, o Diretor Presidente era da Vale do Rio Doce, o Diretor Administrativo era da Vale do Rio Doce e tinha mais um Diretor que agora não, Engenharia, que era da Vale do Rio Doce. Então me confessou o Doutor Fernando Reis que, ___________, o que houve foi o seguinte no trajeto de volta do Ministério de Minas e Energia para o hotel foram recapitulando o que que tinha sido negociado lá: "Bom, então Presidente, é quem? Ah, Presidente é João Carlos Linhares, tá. Agora, Diretor de Operações", o outro falou: "Vai ser o Warren Hudson". Para isso é fulano, fulano e aí foi, disse o Roquette Reis: "Bom e prá Diretor Administrativo?", que era o diretor de compras, seria principalmente diretor de compras, o Roquette Reis não se lembrou de nome nenhum e o que ele lembrou foi o meu, ele falou: "Quem é que é na Vale que faz isso?" "Ah, o Costa e Silva." "Então é o Costa e Silva." Quer dizer, então, foi a origem da designação foi essa e no dia seguinte esses dirigentes da Meridional viajaram pros Estados Unidos e de lá mandaram uma correspondência confirmando tudo aquilo que tinha sido conversado e anotado na viagem deles lá, e aí veio o meu nome, então a Vale do Rio Doce, através do Roquette Reis se acharia muito desconfortável em mudar, né, mesmo que eu não quisesse porque eu cresci pra baixo, né, porque a remuneração lá de Diretor era muito menor do que a outra de, (risos) eles pagavam bem menos. Bom, mas isso são coisas que acontecem na vida da gente, então foi por isso que eu entrei lá prá, bom, aí depois, depois de estar dentro do Projeto Carajás aí realmente eu tive um ambiente muito bom, eu convivi muito bem com os americanos, não tive grandes problemas com eles e acabei até fazendo, mais tarde foi mudando a direção da Amazônia, começou a entrar político, como é que ele chamava, Fialho, Vicente Fialho foi Ministro aí, Vicente Fialho e tal, e aí houve algumas dificuldades de relacionamento desses dirigentes da Amazônia com a Vale do Rio Doce porque eles eram de indicação política estranha ao grupo, mas funcionou bem até que encerrada a fase de, encerrada a fase de estudo de viabilidade e o Projeto então foi considerado economicamente viável, nessa altura os americanos, o que que eles queriam, na verdade o que eles sempre quiseram foi o seguinte, ser donos da mina com a Vale do Rio Doce, podendo explorar as outras ocorrências que já estavam surgindo de bauxita, de manganês, ouro, que já estavam acontecendo mas que ainda exigia muito, muito investimento e o Governo Brasileiro faria o resto, construiria a estrada de ferro e o porto, e eles ficavam lá com o maná lá na mão, porque eles não podiam cumprir a primeira meta do Projeto. A primeira meta do Projeto, quando não se tinha ainda qual era a dimensão que viabilizaria o Projeto, qual era a exploração que ia viabilizar o Projeto era prá ser o seguinte a Vale do Rio Doce ficava com 50% da produção, a Meridional 50%, mas acontece que começou a se falar em 50 milhões de tonelada, prá viabilizar o Projeto, 50 milhões de toneladas prá viabilizar o Projeto exigiria a Meridional comprar 25 milhões, ela tinha as minas do (Oredoco?), tinha mina no Canadá, tinha mina nos Estados Unidos, como é que ela vai receber mais 25 milhões prá competir com quem? Com a Vale do Rio Doce que era a dona do mercado? Não tinha como. Então eles, quando, aí entrou o Governo apoiando a Vale do Rio Doce, porque aí o Governo bateu o pé e vetou totalmente qualquer conversa no sentido de investir, a Vale ou o Governo investir na ferrovia e no porto, tinha que ser a própria Vale do Rio Doce. E eles lá nos Estados Unidos tomaram a decisão de não colocar mais um centavo no Projeto. O Projeto teve parado algum tempo até que entrou essa negociação difícil e a, já foi em 77, a United State Steel saiu do Projeto e a Vale indenizou, 50 milhões foi o preço negociado, ficou então com todo o, com todo o Projeto prá ela. Nesta altura, em 77, eu ainda estava na Amazônia Mineração nessa fase de negociação, depois quando aí a Vale ficou dona totalmente do Projeto não tinha mais sentido você ter uma empresa Amazônia Mineração S.A., então a Amazônia foi vendida para uma empresa que eu esqueço o nome dela, uma paper company também, e liquidada lá e o Projeto foi todo incorporado à Vale do Rio Doce já com o nome de Sucar, Superintendência de Construção de Carajás. Nesta altura eu deixei de, deixei de estar na Sucar que não tinha sentido eu ficar na Sucar, porque aí
já era, já era um próprio departamento da Vale do Rio Doce onde eu estava, né? E eu vir prá cá como consultor não tinha sentido, então aí eu vim prá Vale do Rio Doce e fui designado Superintendente de Finanças na Vale do Rio Doce quando eu aposentei, então ficou de 79 a 83 como Superintendente de Finanças e a Amazônia se dilui dentro da Vale do Rio Doce com o nome de Superintendência de Construção de Carajás. É isso.
P/1: Senhor Luiz, e nesse período na Superintendência de Finanças a empresa, a Vale teve que se ajustar de alguma forma pra conseguir aí tocar o Projeto?
R: Não, nesse período aí que começaram então as grandes negociações do financiamento de Carajás, porque na época estava se falando aí em 3 bilhões de dólares, né, então para uma produção de 50 milhões de toneladas. Então a Vale tomou algumas medidas inteligentes, ela reduziu inicialmente para 35 milhões de toneladas, começando com 20 milhões de toneladas, e então a Vale começou a negociação porque nesse momento o Governo entrou também, se comprometendo a avalizar, então e uma grande negociação que era uma negociação simultânea, uma negociação em que entrava ao mesmo tempo os potenciais clientes japoneses, os potenciais clientes alemães, os potenciais clientes espanhóis e o Banco Mundial. Então todo esse grupo de prováveis negociadores do futuro tinha que concordar, uns concordar em comprometer-se a determinadas quantidades, enquanto não se comprometer a quantidade certa e fixa durante um certo número de anos não tinha como você fazer uma negociação, pedir empréstimo, vai pedir empréstimo que, o cara pode sair fora, então foram feitos acordos comerciais, acordos de comercialização com usinas japonesas, depois que fizeram as usinas japonesas, elas se comprometeram, se comprometeram se o Banco Mundial, tudo ficou assim, comprometo se o Banco Mundial aprovar, o Banco Mundial aprovar, o Banco Mundial assim eu aprovo se todos negociarem, então foi, é um trabalho de chinês aí, os alemães da mesma forma, os italianos também da mesma forma, então todo mundo se comprometeu, todo mundo se comprometeu, a partir desse compromisso que não era definitivo o estudo de viabilidade econômica foi tomando forma, foi tomando forma e as negociações dos empréstimos que viriam de cada um desses países, Banco de Tóquio, bônus do Japão, IBJ, IBJ, esses, negociações difíceis com esse banco, essas transações elas eram negociadas com muita dificuldade, saia a Vale do Rio Doce apresentando, fazendo apresentação dos projetos, apresentando, mostrando que o Projeto seria viável e obtendo confirmações daquelas promessas de compra, foi, foi, foi, isso levou algum tempo, isso não foi de 1978 até 1980, final de 82, em 82, no final de 82 então é que a União Européia, Mercado Comum Europeu que chamava, a União Européia então se comprometeu a financiar 400 milhões de dólares que era o que faltava. Aí o Banco Mundial, aí depois que todo mundo disse sim o Banco Mundial também, eu também, né, mas isso é um trabalho imenso, isso não é negociação de boca, isso envolve apresentação de projetos, de planilhas, de estudo, é um, e negociação também. Aí, então em 82, em 82 então fechou o último, fechou o último, último compromisso, foram as, o Banco Mundial emprestou o dinheiro, aliás a Vale não usou o dinheiro do Banco Mundial não, muito caro, e, parece que não, né, ela não usou não, ela, o Banco Mundial exigia coisas assim, por exemplo, ele emprestava desde que você assumisse o compromisso de dar 10 milhões de reais pros índios, tinha que apoiar Xikrin, não sei mais o que, esses índios que tinha lá na região, então tinha que apoiar o índio, tinha que apoiar o projeto de habitação popular, então a Vale do Rio Doce como é que sai disso, não, então eu não vou apoiar, eu dou o dinheiro para o Governo e o Governo aloca esse dinheiro lá na Fundação Nacional do Índio, quer dizer porque ela não, ainda mais índio prá tomar conta, não tinha problema, não tinha possibilidade. Então, mas esses compromissos todos foram assumidos com o Banco Mundial, foram assumidos e o Banco Mundial então aprovou o Projeto, o empréstimo, então fechou tudo, depois que fechou então veio só a parte de saque e a parte de saque exigia que a Vale do Rio Doce já tivesse aplicado capital próprio, aí foi quando ela jogou debênture no mercado, debênture conversível e tal, aí é toda uma outra história. Mas então nesse momento eu participei alguma coisa porque o Diretor Financeiro viajava muito, as negociações que tinham que ser desenvolvidas aqui no Brasil, mesmo com banco estrangeiro como era o caso do Bank (Anglo?) American, era negociado aqui, então aí eu participei dessas negociações aqui no Brasil, enquanto o Diretor Financeiro tava negociando lá fora, né? Foi assim que eu entrei pro Projeto Carajás.
P/1: E aí o senhor.
R: Mas vocês tão me puxando pela memória, esse troço, eu não lembro disso a mais de 10 anos, vocês tão me obrigando a falar agora. (risos)
P/2: O senhor ficou na Vale até que ano então?
R: Eu fiquei na Vale até março de 83, março de 83 eu me aposentei, sofri um acidente de, uma fratura de bacia, fiquei em casa mais ou menos 10 meses, depois eu trabalhei dois anos numa mineração de carvão, lá no Rio Grande do Sul, uma Companhia de mineração, Companhia de carvão, Companhia de Mineração Candiota, fiquei lá uns dois anos e aí a Vale do Rio Doce me convidou prá voltar à Vale do Rio Doce. Aí eu fiquei mais seis anos como, mas com contrato, aí o objetivo desse contrato era muito mais de dar treinamento ao pessoal que estava porque a Vale do Rio Doce, à medida que ela foi perdendo também aquele élan dos grandes, das grandes expansões, dos grandes projetos, ela também começou a baixar a necessidade de recursos humanos, pessoal muito capacitado foi saindo, um vai prá aqui, outro vai pra ali e tal, e os novos foram subindo. Aí a Vale sentiu a necessidade de colocar alguma pessoa com experiência, com um retrospecto da empresa prá ir dando treinamento prá esse pessoal. Eu fiz isso de uma forma, do meu modo, de uma forma indireta, porque esse negócio de sentar a pessoa prá treinar não tem sentido, né, isso é escola, então o que acontecia era o seguinte, eu estava à disposição de qualquer um, quem quisesse me chamava eu via o que que a pessoa ia fazer, via de regra eles sabiam fazer aquilo muito melhor do que eu, é, porque esse pessoal sai da universidade muito bom, só o que falta é viver, né, só falta viver, é um pessoal altamente capacitado, tá faltando uma palavra de confiança ao lado dele. Então, fiz isso, e dava assessoramento ao Diretor Financeiro, dei ao Presidente, ao Vice-Presidente, tal, e em 80, em 92 então eu saí, aí nessa altura já estava, já tava com outro grupo de dirigente, já tinha entrado outro grupo aí. Mas, eu então, eu trabalhando na Vale do Rio Doce eu estive na verdade de 64 a 83, 83, e depois de 86, de 86 a 92, foi esse o período que eu tive na Vale.
P/2: Quando o senhor sai em 92, o senhor volta a trabalhar em algum outro, em alguma outra empresa?
R: Não, eu trabalhei na Companhia Mineração Candiota.
P/2: Mas entre a primeira vez na Vale e a segunda, né?
R: É.
P/2: E depois da segunda vez?
R: Ah, não, aí eu fui pro ostracismo, né, aí o sujeito morre, né? Na segunda vez aí eu saí porque em 1985, juntamente com dois companheiros, o Valter Faria e o José Alves de Paula, nós lançamos uma idéia de criar uma associação do pessoal aposentado da Vale do Rio Doce, a Aposvale. Então nós criamos essa entidade que nasceu certa, ela nasceu sem, nós tínhamos alguns propósitos, algumas, alguns princípios, não depender nem da Vale nem da Valia, porque quando a gente começa a depender de favores você esmorece, tem que viver, dar o passo do tamanho da perna, então nós conseguimos partir de uma assembléia inicial de 99 pessoas e chegamos já até esse mês aqui com 10.300 associados, então cresceu bastante a Associação, e então nessa Associação praticamente fiquei nela todo o tempo, menos um certo período que eu, eu estava até na Vale do Rio Doce, eu não ocupei posição nessa Associação, chama Associação dos Contribuintes Assistidos da Vale e Aposvale. Então eu fui, fui o primeiro Diretor Presidente, mais tarde eu fui mais um período, depois eu passei pro Conselho, a organização foi reestruturando, mudando, depois voltei a ser Presidente, e ontem eu saí (risos). Não, ontem nós fizemos a posse, foi dada a posse do novo Presidente, que já estava conosco há nove anos, você tem que abrir lugar, você tem que abrir caminho prá, porque a gente não é eterno, já tá na reta final, na descendente, se você ainda se segura no cargo e quem, quem que vai trabalhar depois, quem que vai ocupar. Então o que era Diretor Secretário passa a ser , passou a ser Diretor Presidente e entramos com mais um de fora, ele era da Vale também, já entrou agora e tinha, já tinha mais um que nós tínhamos trazido o ano passado. Então ontem nós fizemos essa cerimônia, ontem não anteontem, foi feita essa cerimônia de posse desses novos dirigentes e eu saí dali e passei para o Conselho de Representantes. O Conselho tem, é um negócio mais macio, não tem aquele compromisso de ir lá todo dia, não, vou lá o dia que eu quiser e aí a gente está com um projetozinho de rever os estatutos pela quinta vez, porque estatuto é um negócio que você tem que mudar, à medida que a feição da sociedade vai mudando, tal, você tem que adaptar o estatuto, nunca descumprir, enquanto tiver valendo, cumpre, se não presta, muda, mas antes de mudar cumpre. Então a gente vai fazer um estudo, as coisas que a gente observou ao longo desses últimos quatro anos que já não podem continuar como estão e eu vou fazer parte dela, o Valter Faria, eu e novos também. A gente também passou a mesma, o mesmo, eu falei: "o grupo que fundou vai afundar agora, né?" (risos) Então eu tô deixando o cargo executivo e passando prá esse cargo de Secretário que é uma pedreira também, né, porque o Diretor, o Presidente do Conselho praticamente não trabalha. O Wander que foi Vice-presidente da Vale, tal, mas ele agora se uniu à gente. Ele foi um grande apoiador nos primeiros tempos, depois ele foi ser Vice-presidente da Vale, respondeu pela Presidência algum tempo, depois saiu foi pra Acesita, tal, aposentou e agora a gente convidou ele pra se juntar a nós, ele aceitou e é isso aí.
P/2: Como é que se cria uma associação de aposentados, quer dizer, eu pergunto no sentido seguinte é, faz-se contato com quem tá fora?
R: Acima de tudo eu acho que o sucesso de qualquer entidade dessa natureza depende muito da credibilidade dos seus lançadores, então tem que ser pessoas confiáveis, quer dizer aquela pessoa que o terceiro olha e fala: "Fulano assinou eu assino embaixo", quer dizer, não pode haver dúvida disso aí. Então o que que aconteceu? Eu me aposentei em 83, eu que tinha sido do Conselho de Curadores da Valia, muito tempo, notei o seguinte que quando eu me aposentei que eu entrei dentro da Valia prá buscar um esclarecimento, prá buscar ou levar uma pretensão, qualquer coisa, eu era jogado pro alto como qualquer outra pessoa, apesar de eu carregar prá ali um nome até de constituidor da Valia porque o Valter Faria e eu fizemos parte do grupo que lançou a Valia. Apesar da gente ter essa credencial a gente tinha dificuldade de andar lá dentro, de se locomover porque, é aquela, a gente sentia que a empresa não tinha, o associado, o aposentado não tinha representatividade dentro da empresa, era um, sei lá, um estorvo, porque o aposentado dentro de uma associação vira um estorvo, é prá, você vai querer é pedir coisas. Tudo bem, então, conversamos com o Valter Faria, o José Alves e eu: "Vamos, vamos criar uma associação?" "Olha, é trabalho, heim." "Não, tem que criar." Chegamos à conclusão que realmente o grupo de aposentados precisava de uma representação, de uma tribuna dentro da Fundação Valia, porque? A Fundação Valia não é da Vale, ela é de todo, a Vale contribui prá Fundação e nós também contribuímos, então, aquele, todo aquele monte que tem ali, aquele monte é para garantir a solvência dela ao longo do tempo e ir pagando a cada um. Então, nós achamos que, vamos experimentar, vamos tentar, aí fizemos um pequeno manifesto dizendo que tava na hora da gente se reunir, ter uma tribuna, ter alguém que verifique, estude todos os problemas coletivos e não ficar cada um procurando a sua sorte, e tal. Fizemos esse manifesto, a Vale deu, o Wander deu todo o apoio, naquele tempo dava pra juntar esse manifesto dentro do envelope de pagamento, mandamos pra todo mundo e as primeiras respostas eram de simpatia, o pessoal topava o negócio. Isso nós começamos a pensar isso em outubro de 84, então aí lançamos o segundo manifesto, dizendo: "Olha, então nós vamos, tendo em vista a boa receptividade, nós vamos lançar uma associação." Então, o que que fizemos? Reunimos as pessoas mais capacitadas e elaboramos um estatuto, um projeto de estatuto, olhamos o que que outras associações congêneres já tinha feito, procuramos ver o que que era adaptável a nós, e distribuímos cópias deste estatuto aí pra umas 30, 40 pessoas nas áreas, nas várias áreas de Minas, no Espírito Santo e pedimos opinião sobre aquela boneca de trabalho, vieram as opiniões, a gente aglutinou tudo isso, o José Alves é um monstro pra fazer um negócio desse, ele é extraordinariamente capaz e, então, feito isso, nós ainda usando a garupa do contracheque do pagamento, nós convidamos todo mundo para uma assembléia de constituição que seria na Docenave, no auditório da Docenave, janeiro de, janeiro de 85 e, realmente, nós tivemos uma aceitação muito grande, quando chegou no dia 25 de janeiro o auditório foi pequeno, tinha 99 pessoas, 9 é prá fazer, mas foi mesmo, 99 pessoas. Então fundamos a Associação, no dia seguinte nós saímos em campo para fazer os registros legais, fizemos os registros. Não tinha onde morar, não tinha sede, não tinha nada, quer dizer a sede provisória vai ser nas dependências da Valia, ela concordou com isso, né. Aí, feito essa divulgação então nós começamos o processo de coleta de interesses, saber quem mais queria. Constituímos uma diretoria provisória por 90 dias, essa diretoria tinha mais ou menos poder prá fazer tudo que necessário fosse. Nesses 90 dias, então, nós visitamos Vitória, visitamos Itabira, visitamos lá o porto, a pelotização, visitamos aqui no Rio de Janeiro e, então, divulgamos o mais que podíamos, então o que aconteceu foi que entre fevereiro de 85 e junho, quando terminou o prazo da diretoria provisória, nós já estávamos com mil e tantos associados interessados. Quanto é que vamos cobrar de cada um? É cinco reais, era o que se cobrou, uns achavam muito, outros achavam pouco, tal. Mas, então, quando foi em junho fizemos então uma assembléia de ratificação da Associação, o estatuto o que não aprovou naquele lançamento a gente mudou, submeteu à Assembléia, e botamos como norma o seguinte, não vamos pedir nada prá ninguém, vamos viver com nossas próprias forças porque você começa a depender de Valia, de Vale, doação, ih, isso. E tínhamos a nosso favor uma regra estatutária muito importante, todo trabalho dos dirigentes não é remunerado. Então você afugenta o picareta, o picareta que vem atrás de remuneração ele vai voltando, só trabalho ninguém quer, né? Então, e a Associação foi crescendo, crescendo quando foi chegando, mas sempre vivemos alugados, sala alugada, coisa, então a gente vivia apertadamente, então em 80 e, em 92, em 92 nós pegamos um terreno em comodato da Vale do Rio Doce, cento e, nunca gostei muito daquilo não mas era muito prá gente garantir um lugar, garantir um, mais tarde a gente compraria. Mas então a Vale nos cedeu em comodato e nós tivemos a audácia de construir uma sede em cima do troço em comodato, é um perigo, né, é fazer filho na mulher dos outros, né, porque você constrói aquilo ali e passa a ser dele, porque tudo que está em cima de alguma coisa em comodato é do comodante e não do comodatário. Então, mas, a partir daí nós, quando começaram a se, começou-se a falar na, numa possível privatização, começou a privatização da Usiminas e tal, começou a se falar numa possível privatização da Vale do Rio Doce então nós pensamos, "olha, tá na hora então da gente ficar o mais rápido possível independente", porque a gente pagava aluguel mas tava sempre confiando que algum dia se precisasse a Vale do Rio Doce ia ajudar a gente, mas nunca precisamos. Então nós constituímos uma reserva para aquisição de sedes próprias, então nós conseguimos essa, aumentamos a contribuição de 0,40% ao mês para 0,48, então esses oito décimos aí, ou oito centésimos aí foi formando uma reserva, e com essa reserva nós fomos adquirindo, então compramos a sede em Belo Horizonte, que é um andar inteiro lá na Avenida Amazonas, no Edifício Dantes, Itabira nós já tínhamos construído, Governador Valadares nós compramos um prédio da Valia, ela tava saindo de onde estava e nós compramos o prédio dela, aqui no Rio de Janeiro num, não vamos dizer num golpe de sorte não, num golpe de acaso nós ficamos sabendo que a Vale do Rio Doce estava pondo à venda o Centro de Treinamento dela já privatizada, compramos o Centro de Treinamento, que é um andar inteiro ali na Santa Luzia, esquina de Calógeras e Graça Aranha, e agora em dezembro nós compramos a última unidade que faltava foi em Vitória, nós compramos em Vitória um prediozinho lá de cinco andares, adaptamos ele. Então hoje nós estamos em sede própria em todas as regiões, em todas as regiões nós temos sede própria, agora o nosso, a nossa preocupação, o nosso projeto é levar isso para o Norte, porque a Vale do Rio Doce tá crescendo no Norte, daqui mais uns anos, 8, 10 anos lá vai ter tanto aposentado quanto por aqui, então nós vamos ter que já, já estamos constituindo um escritório de procuradoria em São Luís e daqui um pouco a gente tem que transformar aquilo num núcleo de, num núcleo bem feito e tal, e pegar uma sede também, então, é isso aí.
P/1: Como é que a Aposvale viu a privatização, participou disso?
R: Olha, a privatização. Veja só, a privatização é inevitável, por mais que você queira brigar contra isso é inevitável,
o que você pode fazer é melhorar o processo, melhorar o processo, evitar que algumas pilhagens que geralmente acontecem nessas ocasiões elas sejam efetivadas. Nós, então, sabíamos que muita coisa ia mudar, a Vale do Rio Doce ia estar perdendo toda aquela feição, aquela fisionomia de uma empresa paternalista, tal, a gente sabe disso, e, mas sabíamos também que muitas das coisas que a Valia executava porque ela era uma entidade muito vinculada à Valia, à Vale, ela iria passar isso pra outro, pra quem quisesse, toda a área social, toda a atividade social da Valia nós sabíamos que ela não encontraria apoio da nova administração da Vale do Rio Doce, a gente sabia disso perfeitamente, lugar de aposentado é longe daqui, não é ficar em volta da empresa, então nós fizemos convênio com a Valia e a Aposvale assumiu toda a atividade social que era antes desenvolvida pela Valia. A Valia fez um levantamento de quanto que ela gastava nisso e então nós temos um convênio anual que ela repassa para nós, mediante comprovação de aplicação, os recursos que ela antes gastava e nós ficamos com a atividade, e fazemos dentro das nossas dependências. Com isso a gente conseguiu trazer mais associados prá dentro da Valia, porque no interior o aposentado ele é muito segregado, o Rio de Janeiro oferece alternativas, isso aquilo é uma beleza e tal, mas no interior eles não têm muito o que fazer não, então eles se reúnem muito mais em torno da Aposvale do que outra coisa. Nós temos uma estatística recente em Itabira há uma média de 90 a 100 pessoas, por dia, que freqüenta a Aposvale, em Vitória outro tanto, em Valadares outro tanto, que é muito menor, Valadares então que é uma décima parte de Vitória, tem também 90 pessoas, 100 pessoas que freqüentam lá por dia. Atrás de quê? O associado aí do interior ele é muito mais fragilizado, muito mais dependente, então eles vão na Aposvale prá saber "eu sou obrigado a prestar, a fazer declaração de renda?", eles perguntam umas coisas assim, pois é, aqui não precisa perguntar isso, né, e se perguntar a gente xinga, mas em Valadares não, eles têm que perguntar, então eles vão prá dar um telefonema, dar um telefonema, vão prá perguntar como é que disca, como é que faz um interurbano, então esse tipo de coisa, essa coisa social a Aposvale dá, agora paralelamente a isso a Aposvale fica de olho nos direitos comprometidos no estatuto, fazer a, fazer o pagamento das suplementações em dia, se corretamente, então nós temos um mundo de processo contra a Valia, tem 40 e tantos processos judiciais, nós temos perto de 18 já em execução de sentença, quer dizer, a Valia também não dá colher de chá, não, ela se defende de todas as maneiras possíveis e usa todos os recursos possíveis juridicamente e a gente também, né, então, mas aí já ganhando. Até hoje o único que perdeu foi um que eu estou nele, mas já foi feito recurso ontem aí, mas apesar disso a gente tem um convívio muito bom com a Valia, porque a gente separa uma coisa e outra, uma coisa é você defender o seu direito, eu discuto com a Valia ela acha que não é, eu acho que é, quem é que que vai dirimir isso? A justiça. Vão prá justiça, quer dizer, o objetivo é esse não é um objetivo de tomar dinheiro da Valia, até porque é uma loucura, se você toma dinheiro ela acaba, né, então é sempre um ato de representação do aposentado e foi prá isso que nós fomos criados, né, nós fomos criados para defender o interesse do aposentado junto à Valia, CVRD, Secretaria da Previdência Complementar, junto ao INSS, e pra onde for. E é isso (risos).
P/1: Seu cotidiano hoje, como é Doutor Silva, seu cotidiano?
R: Hoje? Eu saía de casa ia prá Valia, não prá Valia não, prá Aposvale, ia prá Aposvale e lá eu dava expediente total, e aí é um problema muito sério, viu, porque, isso é normal em qualquer, qualquer organização, principalmente quando a pessoa é muito conhecida , o sujeito entra lá na Aposvale ele não quer falar com outro, quer falar com o Costa e Silva , quer dizer, e eu sempre tive esse método de trabalho de porta aberta, sempre trabalhei de porta aberta, nunca eu tive porta fechada, sempre trabalhei de porta aberta, então a pessoa se sente à vontade, entra lá, tal, fala, conversa, tal, tá ali me atrapalhando, tal, mas a gente tem tido um desempenho que agrada o associado, porque o aposentado ele é muito fragilizado, viu, eu tenho experiência aí terrível de gente que a gente conheceu gerentão, diretorzão, poderoso, depois entra lá fazendo pergunta boba, porque, veja só, hein, isso vai servir prá vocês mais tarde, a pessoa que aposenta e se ela já não tiver uma transição assegurada na saída ou se ela não retomar uma atividade, dentro de seis meses ela fica boba, fica boba, perde o assunto, perde a realidade das coisas, e começa a fazer perguntas de coisas que já se passaram, não tem mais nada, isso não adianta você perguntar isso hoje que isso acabou. Outros chegam adoecidos, a gente conhece aposentados que não são capazes de vir de Niterói ao Rio sozinho, tem que vir com uma sobrinha acompanhando, a tia, tal, não tão doente não, eles estão decrépitos mesmo, e não são idosos não, são idosos não, a inércia, a inatividade faz muito mal às pessoas, mas muito mal mesmo! E dá pena, entende, quando a gente, às vezes a gente lembra de pessoa, "puxa fulano podia nos ajudar, dá um telefonema pra ele", "ah, Costa, você sabe como é que é, eu já não saio mais de casa, eu fico aqui, na televisão, então até tô pensando em passar uma temporada em São Lourenço", não tem ninguém em condições de levantar, arregaçar as mangas e trabalhar. Aposentadoria é muito ruim sob esse aspecto, viu, tem que ter um projeto, além daquele aspecto emocional, porque você imagina, você trabalha numa empresa, que seja a Vale do Rio Doce ou qualquer outra empresa, você diariamente chega ali, de manhã, nove horas você chega, bom, vai acabar, (risos). Nove horas você chega, quando você chega no saguão você vê a pessoa, "olha ali, fulana tá grávida, eu não tinha visto. Olha, aquele lá, ele tava sumido, ah, tava de férias. Ah, aquele cara que eu não gosto", você não quer ver ele nunca na sua frente, ele tá ali. Então, mas isso tudo faz parte do seu cotidiano, do seu visual, aí você aposenta. No dia seguinte você tá proibido de entrar ali! E você não fez um bom relacionamento externo, geralmente a gente não vai nem em reunião de condomínio, não tem um relacionamento externo. Bom, então chega ali, aí já começa a entrar num processo de depressão e aí o que mais a gente encontra lá é o deprimido. (PAUSA)
R: Falei nada de Vale do Rio Doce, fala.
P/1: Perguntar pro senhor, senhor tem quantos filhos, netos?
R: Eu tenho cinco filhos, tão grandinhos, né, tem filho que nasceu em 54. São dois, são três homens e duas mulheres. Todos eles estão bem saudáveis, cada um deles lá tem uma penca de filho, me dá um total de, não, não tem penca de filho, não, tenho, netos diretos, netos diretos eu tenho seis, sete. Tem sete e tem os indiretos que são aqueles que adotaram, me adotaram como neto, né, o filho que já casa com mulher que tem filho, tal, eles acabam adotando a gente como neto, aí dá um total de 13, dá um total de 13. Fiquei viúvo em 1979, em 83 eu casei pela segunda vez, casei inclusive com uma mulher que trabalhava na Vale do Rio Doce, mas lá a gente até não namorava, não, foi depois mesmo, né. E, então, eu casei com ela em 83, 83 foi importante, aliás eu casei na cama porque eu tava com fratura de bacia e mudou a data que ia me casar porque o, lá o Juiz de Paz não podia fazer na data que tava marcado então ele antecipou um dia no casamento mas, casei deitado com um peso fazendo tração na perna, tração na perna, e quem tava presente ali era os meus filhos e o padrinho. E vamos por aí, o que que eu fiz na vida? Única coisa que eu fiz na vida que eu consegui juntar na vida foi um dinheiro que eu comprei uma propriedade que eu comprei em São Pedro da Aldeia, com o Fundo de Garantia, levantei o Fundo de Garantia e comprei, e me arrependo até hoje porque aquilo é grande demais, dá um trabalho, os filhos não querem mais ir lá, né, querem mas querem ir sozinhos, né, e quer levar companheiro, né. Mas é uma propriedade muito boa, é tudo que eu fiz na vida, e um automóvel que tá no estaleiro, aí. Só isso.
P/2: Quais são seus sonhos, senhor Luiz?
R: Olha, eu tenho uma idéia que é a seguinte, todos nós temos que ter diariamente um projeto na cabeça, mesmo que você esteja saindo pra ir à padaria, ir à padaria tem que ser um projeto, eu vou à padaria agora, você sai, caminha, vai à padaria, vai comprar o melhor pão que você puder, e voltar. Não é, aí, eu vou ali, se der eu vou, não, isso não pode ser, você tem que ter um projeto por dia, não pode começar o dia sem um projeto de vida. E eu ainda tenho algumas idéias, agora mesmo terminando esta parte executiva aí da Aposvale eu vou mudar um pouco o meu esquema de vida, porque até agora eu trabalhava aí de segunda a sexta, sábado eu ia pra São Pedro da Aldeia, agora eu espero que eu consiga fazer o seguinte, começar ir pra São Pedro da Aldeia na terça-feira, ficar terça, quarta e quinta, volto sexta, volto sexta. Aí eu vou passar o sábado e o domingo com a minha mulher aí, vou fazer o que ela quer, porque eu nunca fiz, né, é ir ao teatro, não sei o que, tal, prá lá, e na terça-feira volto pra São Pedro, quer dizer, então e lá eu pretendo desenvolver algumas coisas que eu tenho na cabeça lá, uns projetinhos de mudas, vender muda de planta, fim triste, viu? (riso)
P/2: Não é, não.
(risos)
R: Finzinho triste, você pensar o que que eu já fiz e o que que eu estou pensando em fazer agora é uma queda que, (risos).
P/1: O que é isso!
P/2: O senhor pode olhar por outra perspectiva.
R: Ah, pode, sem dúvida. Eu posso contar isso de outra forma todo mundo fica com inveja, né?
P/2: Exatamente (risos). Senhor Luiz, o que que o senhor achou, então, de ter participado do Projeto Memória da Vale, ter dado o seu depoimento?
R: Olha, eu estranhei foi o depoimento propriamente dito porque eu realmente nunca consegui captar que o depoimento fosse em torno da minha pessoa, eu falei relativamente pouco da Vale do Rio Doce, eu acho que outras pessoas que vieram, ou virão aqui, vão querer fazer o contrário, falar muito mais da Vale do que de si próprias, não?
P/2: Varia muito.
P/1: Na hora a gente torce. (risos)
R: Mas eu acho que é fundamental nesse tipo de trabalho que vocês estão fazendo porque há uma crença de que causo, como eles chamam, fazer causo, contar causo, o causo até realmente ajuda a formar a história, o folclore da Vale do Rio Doce, mas eu acho que o que vocês vão fazer aí é juntar as pontas depois do que eu falei com o que o outro falou, o que eu mesmo falei no começo, do que eu falei no fim e associar essas coisas todas dentro do perfil da Vale do Rio Doce, quer dizer a Vale do Rio Doce vai ficar desenhada em torno das suas pessoas ou como é que essas pessoas viram o momento em que estiveram aqui dentro, né? Porque eu posso ter visto muito diferente do outro que virá aqui amanhã, né, agora vocês é que vão ter a inteligência de tirar a média disso, porque cada um de nós fez uma Vale diferente.
P/2: Claro.
R: Cada um fez uma Vale diferente, eu tenho uma recordação excelente da Vale do Rio Doce. Não tive só bons momentos na Vale do Rio Doce mas eu, os
momentos que eu vivi lá dentro, eu tenho o hábito de prestar atenção na vida, então esses momentos me foram muito gratificantes. Eu não considero que eu passei pela vida, de jeito nenhum, eu não passei pela vida, eu vivi, realmente eu vivi. Tenho a convicção de que eu procurei ser útil e muitas vezes fui, fui útil, então esse passado de fazer ele é gratificante, eu não fico pensando "ah, se trabalhou tanto e não aconteceu nada", aconteceu, puxa, aconteceu porque se eu não tivesse feito tudo que fiz talvez eu não estivesse lamentando alguma coisa, não tenho nada a lamentar. As coisas que não me agradaram é porque elas estiveram além do meu limite de competência, todos nós temos um limite de competência. Eu acho muito bom esse trabalho, vocês ainda vão, eu espero que as pessoas que estão nominadas aí possam vir trazer também muitos, muitos subsídios prá vocês. O nome do Wanderlei Beisiegel tá aí?
P/2: Tá.
R: Wanderlei é um cara que tem coisa a beça pra falar, fala mole e tal, mas (risos) tem muita coisa boa prá prestar.
P/2: Muito obrigada, então, Senhor Luiz.
P/1: Muito obrigado, um prazer, foi ótimo.
P/2: Foi mesmo.
(FIM DA ENTREVISTA)
Dúvidas:
(Peçanha?)
(Tupaciguara?)
(comum?
(Targon?)
(Heiner?)
(eu pus?)
(ele falou?)
(nome de?)
(ingresso?)
(Sérgio?)
(aí foi?)
(tanto que a gente era?)
(Aquino?)
(Ladário?)
(Pervitin?)
(morosidade?)
(testado?)
(Enildo?)
(Contini?)
(Oredoco?)Recolher