Meu nome é Cláudio Pedro Barbosa Adão, conhecido também como Manteiga. Eu nasci aos 7 dias do mês de novembro de 1948, na capital, São Paulo, no bairro da Bela Vista. O meu pai chamava-se Rosalino Adão, a minha mãe era Maria Anésia Barbosa, eram de Minas. Ele veio pra São Paulo pra buscar...Continuar leitura
Meu nome é Cláudio Pedro Barbosa Adão, conhecido também como Manteiga. Eu nasci aos 7 dias do mês de novembro de 1948, na capital, São Paulo, no bairro da Bela Vista.
O meu pai chamava-se Rosalino Adão, a minha mãe era Maria Anésia Barbosa, eram de Minas. Ele veio pra São Paulo pra buscar uma perspectiva melhor de vida, porque em Minas é aquela vida de roça, aquela vida agrária e tal, então ele veio pra São Paulo pra buscar um pouco mais de uma perspectiva melhor de vida. Então a grande maioria vinha nesse sentido porque em Minas trabalhava no meio rural, lá a situação era meio ruim. Então ele veio aqui pra São Paulo pra buscar um outro horizonte de vida.
Depois veio a minha mãe e tal, eles eram da mesma cidade, os dois eram de Santa Rita do Sapucaí. Eu tenho uma irmã por parte de mãe, Maria Aparecida Barbosa. Minha mãe era uma pessoa muito dócil, muito batalhadora, muito guerreira, com a idade de cinco anos, ia trabalhar, ela me levava, muito protetora, apesar daquele momento, daquela dificuldade que ela tinha, mas era muito uma mãezona, muito dócil, muito batalhadora, ela trabalhou muito. Ela trabalhava de doméstica nas casas, aquelas coisas todas. O meu pai também era uma pessoa muito dócil, muito educada, ele queria que os filhos estudassem, aquela coisa toda, era muito de pegar no pé, era muito de falar, o exemplo dele era de falar. Me ensinou muito dessa coisa da leitura. O meu pai trabalhava no jornal O Estado de São Paulo de entregador, saía quatro horas da manhã, entregava o jornal até mais ou menos umas sete horas, depois das sete horas ele ia pra outro trabalho.
Eu tinha intenção de estudar, eu falei: “Pô, eu quero cursar uma faculdade”, então fiz o primário, aí depois não deu, eu tinha que trabalhar aos 14 anos, trabalhar pra ajudar e tal, e aquela coisa de faculdade, também tinha a admissão. Eu fiz, tanto o ginásio como o segundo grau eu fiz no supletivo, naquela época tinha supletivo, eu falei: “Pô, eu quero encarar uma faculdade”, mas não dá, hoje está um pouco mais, um pouco mais de condições, não dá. Você começa a fazer aqueles cursos e tal, tem um pouco dessa frustração toda, porque não houve essa possibilidade de cursar uma faculdade, então faz um curso técnico ali, outro ali, não dá pra trabalhar porque você tinha que ter estágio.
Então, a princípio foi aquela mudança de ambiente, eu tinha um tratamento quando morava com a minha mãe e depois eu venho pra outra casa com a minha tia, então foi um ambiente diferente, com mais gente, com mais pessoas. Então esse choque das pessoas já, ali na minha tia, com mais gente, era um ambiente mais de comunidade, onde se repartia, tinha que ter a repartição pela dificuldade, então a calça que não servia pra um ia pra outro, um brinquedo. Então foi esse processo, depois eu fui me adaptando. O bairro, na época, humilde, rua de terra, como todo o bairro em formação, a gente foi um dos pioneiros lá, com mais algumas famílias, que não tinha nada, coisa de 70 anos atrás quase. Por exemplo, eu lembro que a minha prima ia trabalhar, então naquela época você ia trabalhar onde tinha muito trabalho, ela trabalhava ali do lado do Brás, Penha, as pessoas iam de caminhão, a condução era muito precária, chegava a ir até em caminhão, até pau de arara, as mulheres subiam no caminhão e tal, tinha escada, ia trabalhar às vezes de caminhão, era escasso. Havia muito espaço pra você brincar, a escola era perto de casa, brincava muita brincadeira na rua, muito aquela brincadeira de pião, de bola, muita bola, chamava um negócio de mãe da rua, as pessoas ficavam de um lado, outro do outro, fazia uma faixa na rua e um grupo de lá tinha que atrair o grupo de cá, com uma perna só, a pessoa pulava.
Eu lembro que no primeiro dia que eu fui na escola, eu tinha sete anos, entrava aquela época com sete anos, eu estava com um lápis, eu até lembro hoje, caderno, um caderninho e um lápis e aquela resistência de ir na escola. Aquela coisa,era uma coisa meio nova, estranha: “Pô, vou largar minhas amizades, minhas brincadeiras”, e a escola era perto, acho que não dava, de casa, ainda tem essa, na época era escola de madeira, hoje a escola voltou com o mesmo nome, mas não dá, acho que não dá 50 metros de casa ela. E a minha tia me levou até a porta da escola: “Vai, fulano”, eu chorando: “Vai, fulano, vai na escola”, fui pra escola
Eu pensava em estudar, me formar, não tinha uma coisa de se formar em que, mas me formar, estudar, porque através do estudo eu poderia estar, na época, sendo alguma coisa, me formar. Teve uma época que eu tive uma oportunidade, mas por conta do meu documento, que ainda não estava legalizado, aquela época tinha Vasp, tinha uma empresa que pegava menores, pra poder iniciar nesse processo, mas não deu, porque nessa época eu ainda não tinha o nome do meu pai, deu um problema, isso também eu fiquei meio chateado, né, então perdi essa oportunidade. O documento só tinha o nome da mãe, aquela época, não sei, preconceito, o pessoal: “Ah, qual é o seu pai? Não sei o que, precisa do nome do pai também”, sabe, aquele jeito. Então por conta disso não deu certo, que era na Vasp, tinha iniciação pra garotos, pra fazer um curso de estagiário, ia aprender, então não deu por conta disso, que os documentos, durante um período, só tinha o nome da minha mãe. Depois, com o tempo, o meu pai reconheceu e tal e eu, eu passei a chamar o sobrenome do meu pai.
Eu 12 anos nós mudamos pra Brasilândia, voltamos, ia fazer 19 anos, ficamos na Brasilândia quase nove anos. Foi um processo também difícil, porque era uma região que estava acabando de sair, contando aqui, é quase 50 atrás, o bairro, uma região mais distante. Minha tia adoeceu também, teve problema do coração, deu uma desestruturada. Depois, o meu pai veio a casar com uma outra companheira. Eu tinha 16, e eu fiquei morando na casa com os meus primos. Eu não quis ir morar com ele. Eu só trabalhava, quando eu vim pro Dalila novamente, com 18 pra 19 anos, eu comecei a fazer o supletivo, eu falei: “Pô, preciso terminar, fazer o ginásio”. Comecei a fazer o ginásio, supletivo, depois eu fiz o colegial, mas antes, na Brasilândia, eu só trabalhava. Eu comecei a trabalhar com 14 anos, porque tinha uma colega minha que era vizinha e precisava de um garoto pra campanha política, porque era uma indústria plástica, então precisava de um garoto pra estar imprimindo, botava uma cédula, imprimia a fotografia do candidato e tal. Terminei esse trabalho político, entrei na empresa, já me registraram, eu fiz 14 anos, tirei meu documento, minha carteira de menor e fui trabalhar nessa empresa como office boy, trabalhei dois anos.
Foi na década quase de 70, mudamos pra Vila Dalila, justamente já conhecia esse pessoal, que de infância já tive, de frequentar essas coisas que eles faziam, excursão pra Santos, o baile, tinha esse baile, costumavam dar baile, esses bailes de nostalgia, que na época não era nostalgia, nostalgia é agora, frequentava muito esses bailes. Criamos uma relação de montar uma escola de samba. Então a gente junto com o Brandão, que foi o percussor disso, a gente foi um dos fundadores, e de lá pra cá a gente não parou, diminuiu agora. Inclusive eu passei por várias instâncias do samba, eu fui diretor de harmonia, saí na bateria, diretor cultural e por último, agora, eu fui presidente durante seis anos, saí o ano passado e agora eu sou só conselheiro, faço parte só do conselho da escola de samba.
A história foi: “Vamos formar?”, “Vamos”, “Como é que vai chamar?”, teve vários nomes, não sei se era Itaquera, Falcão do Morro, teve uns dois, três nomes, Falcão do Morro, não sei o que, não sei o que. Mas depois ficou Flor de Vila Dalila, parece que soava legal, Flor de Vila Dalila. Naquela época a gente ensaiava na rua, hoje não, você tem som, a gente ia pra rua. Depois ia um político, gostou e tal, procurar espaço, ele falou: “Pô”, então tinha um espaço lá que antes era uma lagoa, era uma lagoa e tal, foi aterrado ali, ele arrumou esse espaço pra nós. Depois, com esse espaço, veio documentado, a gente tem a documentação do espaço, quer dizer, é um documento de comodato, então a gente está lá nesse espaço há quase uns 30 anos.
O primeiro desfile era na São João, eu lembro que no primeiro ano a gente foi desclassificado.
A escola Flor da Dalila nasceu em 73. Aí fundamos lá junto com uns amigos lá, fundamos essa escola de samba, que hoje existe já há 41 anos. Quem fazia as fantasias eram as costureiras, um pouco mais simples, costureiras que faziam, tinha um pessoal de aderecista, que o tecido, aí é aplicar as coisas em cima do tecido, a gente mesmo que fazia. A gente mesmo fazia os instrumentos, eu lembro do próprio Brandão, eu lembro na época, que foi um dos percussores, os instrumentos, nós mesmos construíamos os instrumentos, era de couro, né, você tinha que botar o couro dentro d’água, pra depois deixar secar.
A minha esposa, ela nasceu também na Vila Dalila. A gente ia em bailinhos, ela ia também, então dentro desse processo dos bailinhos, foi pintando um clima, um olhava, o outro olhava, as amizades também ajudaram um pouco nisso: “Fulano parece que, ô, fulana, fulano parece que está de olho em você”. Aquela coisa depois de falar com o pai, o pai dela é meio conservador, aquela coisa toda.
Ela chama Margarida. Nós namoramos mais ou menos, junto, entre namoro e noivado deu sete anos, quase seis, sete anos, namoramos e tal, resolvemos ficar noivos e tal, depois mais três anos: “Vamos casar, né?”. Porque com o advento também que eu perdi o meu pai, meu pai faleceu em 79, eu casei em 80. Eu tenho um casal, Cláudio e Cláudia, então eu procurei, essa coisa muito deles, o fator da educação, como, sabe, se preparar já, então é o que eu digo, a gente começa a dar um viés do caminho, então com os meus filhos aconteceu muito isso, aprender a ler. Eu venho de uma família religiosa, família mineira e tal, mineiro é muito religioso.
Na escola de samba, naquela época ainda tinha um trabalho mais voluntário, eu trabalhava, naquela época, se eu não me engano, acho que eu trabalhava no Açúcar União, eu trabalhei na Companhia do Açúcar União, mas eu já trabalhava. Então a escola era um gosto que a gente tinha, mas não era, não, era tudo voluntariado. Ultimamente, eu quero cuidar mais dessa coisa do cultural, do social. Seria em forma de projeto, porque lá atrás nós já temos, fizemos parceria através do nosso diretor cultural, que é o Paulo, que é um professor, a gente fez muita parceria, parceria, por exemplo, com a Faculdade de Belas Artes, com a Unicid. Então nós temos uma biblioteca e temos uma brinquedoteca, inclusive essa brinquedoteca, grande parte do material que cedeu pra nós foi a Faculdade de Belas Artes.
Eu tenho intenção também de criar uma biblioteca temática, que fora essa coisa de ser biblioteca normal, tratar de dois temas, que é o carnaval, falar sobre o samba paulista, o carnaval paulista, que tem uma outra vertente, que Geraldo Filme, Osvaldinho da Cuíca e tantos outros baluartes aqui de São Paulo batalharam muito nisso. Hoje o carnaval, por conta desse mercantilismo todo que tem, você tem tempo pra desfilar, não faz mais aqueles enredos contando história e tal, hoje, inclusive até pra buscar patrocínio, às vezes você faz patrocínio, o enredo é o próprio patrocinador seu. Então a escola tem que se adequar, por isso que ela tem que buscar recurso pra dar conta disso.
Eu tenho minha barraca com a minha esposa, no Trianon, que a gente vende acarajé. A barraca a gente conheceu numa militância política que a gente tinha. Então formamos na época, acho que foi 1990, naquela época eu trabalhava, saí do correio em 91, 90, 91. A gente tinha um movimento cultural negro, que era muito alinhado com o PT, o Partido dos Trabalhadores, na época, né, então a gente foi: “O que você sabe fazer?”, “Vou fazer acarajé então”, minha esposa: “Pô, então vamos”. Pegamos uma outra pessoa que foi dando dica e tinha muitos eventos que a gente fazia no bairro, de movimento negro e tal, e começou, a gente foi aprendendo, a minha esposa, fortalecendo, fortalecendo, mas originou-se daí, dessa militância política que a gente tinha, desses espaços que a gente ia mostrar o trabalho da gente e tal. Começou daí e a coisa foi indo, foi indo, já faz mais de 20 anos que estamos no Trianon.
Por exemplo, a princípio era mais esporádico, quando tinha alguma coisa assim, desses eventos que a gente fazia, em bairro e tal, depois a gente foi começou a ter muitas feiras, assim, de praças, a gente foi convidado a participar, a gente foi participando. Trabalhava umas duas ou três vezes por semana, a gente tinha uma barraca ali, outra barraca aqui e a coisa foi fortalecendo, trabalhamos em vários lugares, paralelo a essa militância política. Depois surgiu essa oportunidade no Trianon.
Eu entrei pra União, eu acho que eu tinha 18 anos, tinha 18, fiquei até uns 20, depois, em 76, é, no ano de 76. Na União eu era ajudante geral, que era companhia de açúcar, trabalhava na usina de açúcar, ensacar açúcar, era mais ou menos nesse sentido, era mais um trabalho de ajudante geral, a gente fazia de tudo um pouco. Quando eu entrei nos Correios, em 76, já era mais específico, eu era carteiro, depois de carteiro, eu fiz curso, passei a monitor, trabalhei um pouco também como supervisor, fiz o curso, comecei como supervisor postal também. Mas nesse período também começou a rolar uma militância, porque a gente sempre teve essa coisa de desigualdade, de batalhar em cima da desigualdade, e nos Correios começou isso através dessa batalha, dessa luta sindical, reunindo com as pessoas e tal, era associação e depois, tinha que fazer associação pra depois fazer o sindicato. Então militei muito tempo dentro do PT, a minha veia ainda é aquela veia mesmo de transformação, de coisa do social, com umas certas observações, que a coisa está muito perversa. Eu saí de lá foi em 91. Eu me aposentei como autônomo.Recolher