Plano Anual de Atividades 2013
Projeto Nestlé - Ouvir o outro compartilhando valores – Pronac 128976
Depoimento de Wagner Nones Bertonha
Entrevistado por Tereza Ruiz
Cordeirópolis 19/08/14
Entrevista NCV_HV_50
Realização Museu da Pessoa
Transcrito por Ana Carolina Ruiz
P/1 – Então primei...Continuar leitura
Plano Anual de Atividades 2013
Projeto Nestlé - Ouvir o outro compartilhando valores – Pronac 128976
Depoimento de Wagner Nones Bertonha
Entrevistado por Tereza Ruiz
Cordeirópolis 19/08/14
Entrevista NCV_HV_50
Realização Museu da Pessoa
Transcrito por Ana Carolina Ruiz
P/1 – Então primeiro, Wagner, eu vou pedir pra você dizer pra gente o seu nome completo, data e local de nascimento.
R – Certo. Posso falar?
P/1 – Pode falar.
R – Sou o Wagner Nones Bertonha. Nasci no dia seis de fevereiro de 1979. Sou do Paraná, natural do Paraná.
P/1 – A cidade?
R – Cidade de Lupionópolis.
P/1 – Agora o nome completo do seu pai, da sua mãe e a data e local de nascimento se você lembrar.
R – Da minha mãe é Cleusa Nones Bertonha, também natural do Paraná, cidade de Lupionópolis. Do meu pai José Segala Bertonha, também natural e nascido de lá, a data de nascimento eu não lembro.
P/1 – E o que os seus pais faziam ou fazem profissionalmente?
R – Hoje meu pai é aposentado, mas antes sempre trabalhou no sítio, mexeu com lavoura, mexia com roça, plantava agricultura. E minha mãe sempre foi dona de casa dando um apoio na família, ajudando-o, criando a gente que somos eu e mais duas irmãs na família. E hoje são aposentados, moram na cidade, já não trabalham mais.
P/1 – Qual que é o nome das suas irmãs?
R – Das minhas irmãs a mais velha Valdirene Nones Bertonha. A mais nova é Silmara Nones Bertonha também, e eu no meio.
P/1 – E o seu pai você falou que ele trabalhava com agricultura assim, com que tipo de cultura?
R – Na época ele plantava, na época aí de 1979, 1980, sempre plantou algodão, plantou milho, soja, trigo. Porque na época ali da região do Paraná é muito produtiva essa área de grãos ali, a região de Maringá, Londrina, que é a nossa região, então é o norte do Paraná. Então sempre trabalhou com isso aí. Mexeu com gado também na parte leiteira, muito tempo também, aí hoje já não tá na atividade mais.
P/1 – Vocês moravam numa zona assim rural?
R – Morava numa zona rural na época, né? Moramos, praticamente fomos criados lá, eu mesmo fiquei até os 16 anos lá, depois eles continuaram um bom tempo ainda, sempre na zona rural, no sítio, na chácara, sempre envolvido ali com zona rural.
P/1 – E aí esse local que é esse sítio, a chácara, era de vocês ou pertencia a outra pessoa e vocês trabalhavam?
R – Não. Na época pertencia a outra pessoa, que meu pai na época era funcionário, era empregado, né? Trabalhava, mas também plantava ali no sítio mesmo ali do dono, do patrão no caso, mas não era, na época não era nosso. Aí depois, alguns anos depois, a gente comprou o sítio lá também, aí trabalhava só que nessa época já mexia só com gado leiteiro. Só mexia na área mesmo da pecuária nessa época.
P/1 – Mas aí era de vocês?
R – É. Nesse ano, a gente foi no ano de 1997, foi quando a gente comprou esse sítio, aí já era nosso. Mexia só com leite, né? Agropecuária ali. Aí já era nosso na época.
P/1 – Tinha um nome esse sítio de vocês?
R – Tinha. Sítio São José, na época. Eu lembro até hoje, foi em nome ao meu pai, né, José é o nome dele, claro, aí era esse nome aí, Sítio São José, na época. Aí depois vendemos também, paramos de mexer com isso aí, voltamos pra cidade, aposentaram-se depois e tal, aí parou com a atividade.
P/1 – E, Wagner, quando você era criança, conta um pouco como é que era, que memória você tem da casa em que você morava, do lugar em que você morava, a região.
R – Olha, a gente morou em alguns lugares, alguns sítios ali. Eu lembro a gente era muito pequeno, mexia com gado, pequenininho, estudava na escola e também depois ali, até meio ruim falar isso aí, que eu não fui muito habilidoso...
P/1 – Mas a casa assim você lembra? Como que era a casa que vocês viviam.
R – Ah, lembro. Na época a gente morou em algumas casas de alvenaria, outras até, como se fala, de madeira na época. Tinha muito aquela época ali feita de madeira tal, mas eram casas boas. Era no sítio, uma casinha bem confortável, um lugar bem bacana, perto da cidade também.
P/1 – E como é que era o sítio assim, o espaço?
R – Não entendi.
P/1 – Como é que era o sítio em que você viveu quando era criança?
R – O sítio na época era bem bacana, a gente gostava muito, criado ali, nascido ali, criado ali. É um lugar bom, a gente pescava, a gente brincava, a gente matava passarinho de estilingue, aquela fase de criança ali, né? Meu pai na época até aí trabalhava com gado, trabalhava com roça e tudo mais, mas era uma vidinha bem bacana, bem simples, bem humilde ali, mas bem bacana.
P/1 – Você ajudava seu pai nas tarefas assim da roça?
R – Ajudava. Até mesmo comecei muito cedo. Eu comecei a ir, na época eu até me lembro, recordo certinho como se fosse hoje, até na época quando comecei a trabalhar com ele eu tinha cinco anos de idade. Montava cavalo, ajudava a tocar o gado, acompanhava-o de manhã na ordenha tirar leite, trabalhava na roça ali com ele. Não fazia nada, mas ficava no meio ali. Então até eu comecei muito cedo com ele ali, mas foi uma vida bem de criança, uma adolescência, foi bem bacana. Deixa muita saudade na época, como diz o pessoal, da roça, né? Mas uma vidinha bem bacana, boa.
P/1 – Você falou de algumas coisas que vocês faziam pra se divertir, pescava. Conta um pouco quais que eram as brincadeiras da infância. Do que você brincava?
R – Naquela época a gente não tinha a tecnologia que tem hoje. Tem um celular, tem um computador igual as crianças de hoje têm. A gente na época lá era muita criança ali, tinha vizinhos perto ali, juntava aquela molecada final de semana pra brincar. A gente brincava ali no sítio, andava a cavalo, pescava, ia pros rios, pras lagoas. Então a gente não tinha assim essa tecnologia hoje, ter um celular, um computador igual tem hoje. A gente era tudo muito simples na época, mas era uma vidinha bem bacana, boa ali.
P/1 – Jogava bola?
R – Jogava bola no sítio, fazia bola de pano. Naquela época aquela coisa bem louca de criança ali. Caçava, pescava, fazia tudo isso aí.
P/1 – Fazia bola de pano como?
R – Ah, juntava um saquinho lá, sabe? Bolinha de pano, um saquinho, fazia uma bolinha ali, amarrava com barbante, tornava-se uma bola. Aí saía chutando pra frente ali, brincando, jogava... Quem é mais antigo aí da minha época sabe, jogava bets e tal, jogava um negócio de petequinha ali. Tinha várias brincadeiras bem bacanas naquela época nossa ali.
P/1 – Brinquedo você tinha?
R – Não. Nunca fui de brincar, assim negócio de brinquedo, de caminhãozinho essas coisas não. Era mesmo uma bolinha ali, uma coisinha bem básica.
P/1 – Mais de rua assim, uma coisa mais de...
R – Mais de rua ali. Mas não tinha esse negócio de brinquedo na época, não. Nunca fui assim, esse negócio de brinquedo aí.
P/1 – Tá certo. E aí escola, você começou a frequentar você tinha que idade, Wagner?
R – Olha, eu comecei com seis anos de idade. Na época lá no Paraná ali falava prezinho, né? Entrava no pré, aí comecei a estudar, fui estudando na época ali, fui pro pré e tal, aí fui subindo. Estudei até que eu terminei o primeiro grau ali depois também parei. Aí eu fui trabalhar fora. A gente depois mudou pra cidade, meu pai depois voltou pro sítio de novo, retornou pro sítio, aí eu já não voltei mais. Depois 16 anos eu fui pra cidade, comecei a morar fora até hoje, depois me envolvi com caminhão, a começar a viajar, trabalhar, morar fora. Sempre morei fora. E estamos aí até hoje.
P/1 – E da escola quais são as primeiras lembranças que você tem?
R – Olha, as primeiras lembranças as amizades. Ficou muita amizade bacana na época, as professoras. Estudar, na época até gostava um pouco de estudar, de estar no meio do pessoal ali. Até mesmo nas brincadeiras de jogar burquinha lá, não sei se muitos lembram aí, com certeza tem muita gente que lembra que é dessa época aí. Mas ficou bastante lembrança boa também na época aí. Foi muito bom.
P/1 – O que é burquinha?
R – Tem umas burquinhas de vidro assim, sabe? Jogava ali. Não sei se alguém lembra. Então a gente levava, enchia os bolsos quando era criança, levava pra escola os bolsos cheios. Se levava dez, jogava valendo, talvez voltava com 20, de repente você não voltava com nenhuma embora, aí você tinha que jogar de novo pra ganhar. Aquelas brincadeirinhas de criança, né?
P/1 – E essa primeira escola que você começou a frequentar com seis anos você lembra como é que era assim a estrutura da escola, se era pequena, grande?
R – Lembro. Quando eu vou lá até hoje eu lembro. É a escola Machado de Assis. Hoje lá indo pra lá ainda existe também. Ela expandiu mais, aumentou mais, ficou bem mais evoluída na tecnologia também. Lembro bem, mas antes quando eu comecei tinha algumas classes de alvenaria, tinha uma parte onde até mesmo eu comecei a estudar que era de madeira, que era o prezinho, prezinho um, prezinho dois. Mas eu tenho bastante recordação, era um lugar bem bacana, onde eu comecei a estudar, né? É uma coisa ali que acho que você nunca esquece. É um começo de vida ali, vamos dizer assim.
P/1 – Era uma escola rural, ou não?
R – Era. Era toda murada.
P/1 – Rural. Era rural?
R – Não. Essa é já urbana. Não era rural na época. A gente morava no sítio, mas aí tinha todo aquele deslocamento do ônibus passar, pegar a gente, levar pra cidade e tal, aquela coisa toda. Mas já era urbano. Não era rural.
P/1 – E você teve alguma professora marcante, Wagner?
R – Olha, até inclusive eu a vi a pouco tempo. Senti, a professora Edemilda. Foi professora na época acho que de matemática, se eu não lembro, se eu recordo bem. Ela foi uma das melhores professoras. Muito boazinha, a gente era meio bagunceiro também, mas eu me lembro dela até hoje, é muito minha amiga hoje. Inclusive agora alguns meses atrás eu a encontrei. Ela lembrou ainda de mim, tudo, mas essa foi a mais marcante da história, foi ela. Professora Edemilda.
P/1 – Por que ela foi marcante?
R – Porque ela era uma das melhores, muito boazinha, tratava a gente bem, a gente era um pouquinho bagunceiro na época na sala de aula, mas ela sempre contornava a situação, boazinha e tal. Então ela foi das professoras que ficou na história, que marcou muito a minha adolescência, a minha juventude ali na época, né? Então recordo bem até hoje aí. Inclusive ela mora até perto de casa lá, uns dois bairros pra baixo. Mas é marcante. Foi bacana aquela época com ela da escola.
P/1 – Você lembra se quando você era pequeno você tinha um sonho de ser alguma coisa quando crescesse assim? Você falava: “Quero ser tal coisa quando crescer”?
R – Olha, na época, quando eu era ainda vamos dizer acho que uns sete, oito, nove anos, como a gente morava no sítio, igual eu te disse, na época a gente até falava, não falava assim carreta, caminhão, a gente morava no sítio lá, a gente falava jamanta, tal, ainda quero dirigir um negócio desse e tal. Aquele sonho de criança, aquela coisa toda. Aí tinha sim, tinha vontade de um dia ser caminhoneiro, motorista, até mesmo trabalhar com ônibus. Nessa área do transporte rodoviário. Mas tinha sim. Tinha esse sonho quando era criança.
P/1 – Então você foi trabalhar com o que você sonhava ser desde pequeno.
R – Como eu posso dizer? Hoje eu falo pros meus amigos, hoje eu sou um cara realizado. Tudo que eu tive vontade de fazer eu consegui fazer, realizei algum sonho que eu tive, principalmente na época quando eu comecei com 18 anos, quando foi que eu tirei minha primeira habilitação. Na verdade eu comecei a viajar na cidade de Londrina no Paraná também. Foi a primeira cidade ali que eu fui embora na época, foi ali que eu consegui meu primeiro trabalho de motorista. De lá pra cá, 97, 98 quando foi isso aí, acho que foi isso, até hoje estamos aí na atividade de motorista, viajando, não parei mais e estamos aí.
P/1 – Deu certo.
R – Deu certo.
P/1 – E nessa fase, depois vou conversar um pouco sobre esse primeiro trabalho como que foi, de motorista, mas voltando um pouquinho, queria saber nessa fase de infância ainda como é que eram as refeições na sua casa. Quem que cozinhava, o que vocês comiam?
R – Olha, na época sempre foi minha mãe, claro. Ela que fazia as refeições, a gente comia superbem, na época tinha muita fartura, naquela época no sítio ali. Era fruta, meu pai mexia com leitaria, então tinha muito queijo, muito doce, em geral. Tinha de tudo. Graças a Deus a gente viveu uma infância, vamos dizer assim, bem. Bem mesmo, em termos de comer bem, viver bem, ter uma vida bacana. Tenho uma recordação boa. Então o lugar que a gente morava era muito rico de frutas, como eu te disse aí meu pai mexia com leite, então tinha muito doce, minha mãe fazia muito doce, sempre foi ela que fazia tudo isso aí pra gente. Não tinha, como se diz, comprar nada negócio de doce hoje. Não. Era tudo feito ali na roça, no sítio mesmo, era uma coisa gostosa, assim dizer. Muita coisa boa ali que fica na lembrança até hoje ainda. Até inclusive até hoje ainda ela faz um docinho de leite, um queijinho e tal pra recordar aqueles velhos tempos ali, mas uma coisa bacana.
P/1 – Você tinha algum prato favorito?
R – Olha, que eu lembro eu era fã de doce de leite, como doce no caso. E na época eu gostava muito de arroz doce. Minha mãe fazia um arroz doce na época lá sensacional ali. Agora, prato preferido pra comer assim como comida mesmo sempre foi carne. Salada e carne foi indispensável a vida toda. Desde pequenininho ela fala e conta que qualquer coisa eu pedia carne. Era muito bom, é bom até hoje.
P/1 – E café vocês consumiam na sua casa? Tinham o hábito de tomar café?
R – Olha, eu desde criança nunca tomei café, mas sim, meu pai, a minha mãe até inclusive a cada cinco minutos eles tomam um cafezinho, vão lá e... Não vive sem o café. Minhas irmãs também, as duas, né? Mas o fato eles gostam muito, muito mesmo de tomar café. Eu não, desde criança nunca tomei e não tomo até hoje.
P/1 – Você lembra como é que era preparado o café na tua casa?
R – Olha, na época eu lembro assim, tenho muita recordação. Minha mãe, na época não existia esses coadorzinhos que tem hoje Walita, descartável, né? Acho que descartável, eu nem sei que eu nunca uso isso. Na época eles faziam uns coadores de pano, compravam uns panos no mercado, na loja, não sei lá, de algodão, alguma coisa assim, eu não entendo bem, aí fazia o coador naquilo ali, coadinho na roça, disse que era um café mais gostoso e tal, mais caipira. Mas eu lembro, lembro tudinho disso aí. Uma bela duma infância ali. E que até na época eu gostava muito, usava um pouquinho de café e tomava muito leite. Enchia aqueles canecões, até eu era meio fortinho, sempre fui meio gordinho, mas tem a história bacana aí.
P/1 – Comia bem.
R – Comia bem. Olha que era bem fortinho viu. Até hoje. Comia bem demais.
P/1 – Wagner, quando você terminou o primário, você falou que você fez até o primário, né? Durante todo o primário eu queria que você me contasse assim como que era o seu cotidiano. Você ajudava o seu pai e ia pra escola? Como é que era o seu dia a dia assim na infância durante o primário? Trabalhava e estudava? Como é que era isso?
R – Trabalhava e estudava. Eu levantava de manhã na época, seis, sete da manhã, pegava o ônibus, ia pra escola, voltava, retornava pra casa em média aí meio dia e meio, uma hora da tarde, que era pertinho ali e tal. Aí quando chegava fazia as tarefinhas da escola naquela época ali, fazia muito em casa, depois ia trabalhar, ia ajudar. Na época tinha o gado, cuidar do gado, depois na época da roça também cuidar, ajudar a cuidar da roça com ele. Ele começou a educar a gente muito cedo, tanto na roça como na lida do gado, essa coisa toda aí. A gente começou a trabalhar muito cedo ali, eu como homem na família, o único da família ali, aí eu comecei muito cedo ali. De lá pra cá foi até eu sair de casa com 16 anos, mas atividade do dia a dia ali sim. Todo dia trabalhava. Estudava de manhã e trabalhava a tarde, essa era a rotina da semana. Era todo o dia assim.
P/1 – E nessa fase assim de infância você se lembra de alguma história marcante? Sabe, uma coisa que tenha ficado na memória até hoje, um episódio, um acontecimento, uma história.
R – Ah, eu não vou dizer uma coisa tão marcante, mas uma coisa que lembro muito na época era meu finado avô. A gente pescava muito, era eu e o meu pai, todo o final de semana ali era sagrado, no sábado ou no domingo à tarde ali depois do almoço a gente descia pra lagoa, pro rio lá, tinha muito rio perto ali. A gente gostava muito de pescar, meu finado avô, né? Italianão e tal. E era muito, gostava demais de pescar, ele, o meu pai, isso é uma coisa que lembro muito, né? Eu tinha bastante amizade, era bem apegado ao meu avô aí. É uma coisa que me marca muito, do passado é uma coisa que eu sempre me lembro disso aí.
P/1 – Como que era o nome do seu avô?
R – Meu vô era José Antônio Bertonha. Antônio Bertonha.
P/1 – Antônio Bertonha.
R – Antônio Bertonha. José é meu pai. Então faleceu aí há alguns anos, mas sempre tava ali conosco, uma pessoa bacana, gostava muito dele aí. Uma coisa que sempre lembro. Uma coisa que acho que mais me marcou na época de infância foi isso aí, aquelas belas pescarias que a gente tinha de criança pequeno ali.
P/1 – Conta um pouco pra gente como é que era, com o que vocês pescavam, que tipo de peixe vocês pescavam.
R – Olha, na época lá a gente pescava, usava muito aquela isca de minhoca, né? A famosa minhoca que todo mundo fala e conhece aí. E a gente pescava no rio, pescava muita traíra, pescava lambari pra quem conhece, de tudo no rio. Bagrinho ali que falava, chorãozinho. Usava sempre aquela isquinha da minhoca mesmo ali, de varinha, não pescava de molinete que na época acho que quase nem existia ainda, eram poucos, né? Pescava de varinha ali. Era uma pescaria que a gente fazia ali final de semana, aquela coisa bem bacana ali.
P/1 – E a vara de pesca vocês mesmos que faziam ou não? Comprava pronta?
R – Algumas vezes a gente fazia, tinha lá os bambus lá, não sei dizer o nome daquelas varas hoje lá, mas a gente fazia outras a gente comprava já prontinha ali na cidade pra pescar ali. Pescava lambarizinho, aqueles peixinhos do rio pequeno ali, mas era uma coisa gostosa de fazer ali.
P/1 – Depois levava pra casa e preparava o peixe?
R – Com certeza. Depois chegava à noite, levava embora, preparava-o. Quando não já fazia na janta aquele peixinho fresco ali ou depois de repente só no outro dia mesmo no almoço, de repente chegava tarde ali, à noite, já cansado, já tinha outra coisa pronta, aí a gente não limpava o peixe, guardava ali e fazia no outro dia, né? Congelava ele ali. Mas era bacana. Saudade aí.
P/1 – Você falou que o seu avô era italiano, né? Você sabe qual que é a origem da tua família?
R – Ele conta assim que meu finado avô, no caso aí o pai dele, quando veio pro Brasil ele veio direto da Itália. Aí o teve aqui no Brasil, criaram-se aqui, teve meu pai, veio de geração pra geração. Então todos eles, tanto da família da minha mãe quanto do meu pai são todos italianos. Até, inclusive, meu finado avô também, seu Luís, que é o pai da minha mãe, o finado avô, ele rezava muito a missa em italiano e tal, falava italiano, era bem... O pai dele também veio de lá, era bem assim, fala muito italiano, né?
P/1 – Rezava a missa em italiano? Como é que era isso?
R – Mas não vou saber te falar italiano, mas...
P/1 – Não, não, mas assim, tinha uma missa mesmo ou as orações...
R – As orações em italiano também. Aí fazia umas missas na época lá, não sei se era junto com o padre, não sei detalhar que eu era muito criança, aí até minha mãe conta que ele também rezava. Nas orações dele falava tudo italiano na época. Até a minha mãe que era criança na época, era uma família grande e nem entendia nada, porque tudo italiano, a gente aqui no Brasil, claro que não ia conseguir entender muita coisa.
P/1 – Você sabe por que eles vieram pro Brasil? Eles contavam a história?
R – Eu nunca tive a curiosidade de perguntar pra ela e saber o porquê. Isso aí não tem nem como responder agora, mas o pai dele, tataravô lá atrás vieram pro Brasil eu acredito, acredito eu que na época por causa da plantação de café, né? O norte do Paraná, na época foi pra onde eles vieram, que era o forte do café ali. Italiano sempre gostou de plantar isso aí, eu acredito que seja por isso, agricultura na época, por causa do café, rendia um bom dinheiro na época, às vezes era arrendatário, tal, aquelas coisas todas. Eu acredito que seja por causa do café na época.
P/1 – Wagner, você falou que você estudou até a quarta série, o quarto ano primário, foi isso?
R – Isso.
P/1 – Eu queria saber como é que foi assim, quando você parou pra estudar como é que foi essa decisão? Você parou pra trabalhar? Você mudou de trabalho? Como é que foi isso assim?
R – Na época eu parei assim, uma que eu nunca fui fã de estudar muito. Não gostava muito, confesso eu. Também por causa do trabalho, morava no sítio, aí começou a crescer, começou a aumentar a carga de trabalho, mais responsabilidade. Aí depois também foi esse sonho que eu tinha de ser motorista, tornou-se pior ainda porque não tinha como eu ficar em casa mais, ficava muito fora, começava a viajar. Então não tinha como unir as duas coisas, de trabalhar e ao mesmo tempo estudar, que é essa profissão nossa hoje aí. Aí foi quando eu decidi parar de vez na época, acho que foi em 1997, 1998, foi quando eu tive a primeira habilitação que deu certo que eu fui pra Londrina, arrumei um trabalho, comecei a viajar. Foi quando eu parei de estudar. Tive que optar pelo trabalho e parar de estudar na época, aí não deu mais.
P/1 – Mas você fez mais um pouquinho então depois do primário?
R – Fiz. Aí depois eu parei de viajar uma época, fiquei mais dois, três anos, dei um tempo de estrada e voltei a estudar de novo. Fiz até acho que na sexta, sétima, oitava. Aí foi o primeiro grau que falava lá pra gente na época, né? Terminei, voltei pra estrada de novo, aí não parei mais. Aí não voltei, estou na atividade até hoje e não estudei mais.
P/1 – E nessa época, antes de você se tornar motorista, que você trabalhava com o seu pai no sítio.
R – Isso. No sítio.
P/1 – Você ganhava algum salário?
R – Ganhava. Que a gente na época aí foi cuidar de uma fazenda depois também, quando me formei, completei os 18 anos ali. Antes já trabalhava antes com ele, já ganhava, depois passou a ser registrado na fazenda, aí comecei a trabalhar com ele também. Sempre foi registrado, sempre trabalhava junto, tinha um salário, uma renda fixa na época e de lá pra cá não paramos mais.
P/1 – Você lembra o que você fez com os seus primeiro salários assim? Se você comprou alguma coisa que você queria, o que você fez com esse dinheiro?
R – Olha, alguma coisa que eu queria eu vou dizer assim, eu não sei, eu não lembro bem, mas era roupa, era coisa do dia a dia, né? Ali calçado, roupa, essas coisas. Não ganhava tão bem na época aí também, o salário não era aquelas grandes coisas, a gente não tinha também aquela certa ambição. Depois com o tempo o que eu consegui depois foi um carro. Logo, né, adolescente 18, 19 anos ali tal foi quando eu comprei o meu primeiro carro ali. Foi o que eu comecei a fazer com o dinheiro que eu ganhei, alguns anos bem recente ali de trabalho.
P/1 – Qual que era esse carro, o primeiro carro que você comprou?
R – Olha, eu lembro até hoje, foi em 1998 pra 1999. Foi um Voyage 87. Lembro até hoje. Um verdinho e tal. Foi o meu primeiro carro. Até fiquei todo feliz, o primeiro carro ali e tal. Meu primeiro carro foi esse Voyage.
P/1 – Foi a primeira coisa grande assim que você comprou?
R – É. Vamos dizer assim, foi uma primeira conquista que eu tive, vindo lá de baixo, tal, trabalhando fora depois, aí consegui juntar o dinheiro, comprei esse carro, foi uma primeira conquista de vida ali.
P/1 – Wagner, nessa mudança assim da infância pra adolescência, que você já tá... Quando você entra na adolescência, o que muda na sua vida assim em termos de lazer, de amizade? Tem alguma mudança nesse sentido? Tem um momento que você começa a sair, vai a festas, mudam as amizades?
R – Ah tem. Aí é uma grande mudança de vida. Depois que se torna ali, vamos dizer, dono do nariz como todo mundo diz ali, com os 18 anos agora você começa a frequentar lugares que talvez a família não deixava por motivo de você ser menor e tal. Muda muita coisa, comecei a frequentar muitos lugares, festa que eu sempre gostei. Depois comecei a morar fora, morar sozinho, então tem uma mudança até mesmo de amizade, você faz muita amizade diferente, amizade nova. Nesse caso nosso de todos os lugares do Brasil aí. Muda, muda muita coisa na vida.
P/1 – E aí antes de começar a viajar e sair da sua casa você frequentava festa, baile, ou festa da comunidade, da igreja?
R – Frequentava. Frequentava muito na época. A gente morava ali na cidade pequena ali na região nossa ali. Então frequentava muito festinha, baile, aniversário no final de semana, festa em fazenda, até mesmo em cidade, festa de aniversário de amigo de escola, de amigos. Era menos, né, a frequência assim em festa, mas frequentava sim. Aí depois que ultrapassou idade dos 18, 19 anos aí comecei a colocar assim, criar uma asinha, né? Morar sozinho e tal, aí tudo muda.
P/1 – E estas festas que você tá mencionando antes dos 18, antes de você sair de casa, como é que eram essas festas? O que tocava? O que vocês faziam pra se divertir, quem que ia?
R – Na época eu saía ali com os amigos. Minhas duas imãs eram ainda pequenas ali, eu não saía muito de casa, repreendia um pouco, mas ali na época tocava muita música dance. Ali no norte do Paraná tinha muito som eletrônico, essas coisas ali e tal. Até hoje tem, mas é bem menos, né? Mas aí tinha os amigos do sítio, outros da cidade, reunia final de semana ali, quando não voltava pousava nas casas deles. Tinha os bailes, tinha clube lá na época, tem até hoje. Então a gente reunia os amigos ali e ia pra essas festas que hoje fala baladinha, tal, mudou tudo o nome aí. Mas saía muito em final de semana aí.
P/1 – Você gostava de ouvir música?
R – Eu gostava e gosto até hoje. Sou fã. Sempre gostei, gosto muito. Sempre gostei desde criança também.
P/1 – Nessa fase de infância e adolescência o que você gostava de ouvir?
R – Olha, eu gostava de quase tudo um pouco. Então eu gostava, até mesmo hoje gosto muito de sertanejo, mas na época eu gostava muito, tinha música eletrônica na época, era o forte da nossa região lá, gostava muito, gosto até hoje. E hoje também a gente ouve praticamente quase tudo um pouco, mas o forte é música sertaneja, que é o forte nosso ali da região do Paraná ali, mas de tudo um pouquinho.
P/1 – E de música sertaneja você gosta do que assim? Tem uma dupla preferida ou um cantor preferido?
R – Não vou dizer que tem uma preferida que são vários cantores bons hoje, a música sertaneja. Eu gosto muito do universitário, sertanejo aí. Não aquelas raízes, aquela violona louca também que já não faz muito o meu forte, mas o sertanejo universitário sim, gosto muito até hoje. E uma dupla preferida hoje que eu adoro muito ali é o Jads e Jadson, né? Que é o pessoal ali do Paraná também que tá explodindo aí, o sertanejo universitário que eu gosto muito. É uma das duplas que eu tenho aí e gosto.
P/1 – Tem uma canção assim preferida, você tem?
R – Olha, tem várias dele. Tem É o Jeitinho Carinhoso, tem outra que eu não lembro o nome aqui, bem conhecida ali também, mas não to recordando agora de momento, mas tem bastante coisa boa.
P/1 – E nessa fase também assim de adolescência e juventude na parte mais amorosa teve alguém marcante assim? Um primeiro amor, uma primeira paixão?
R – Não. Pra mim nessa época não teve, não. Não teve nenhuma namoradinha, uma coisa que marcou, não. Teve lá assim umas namoradinhas, mas não teve nada marcante que deixou assim nossa, saudade daquela época. Não. Não teve. Pra mim não teve.
P/1 – E aí essa decisão de se tornar motorista, Wagner, como é que foi? Conta um pouco pra gente assim em que momento que você decidiu “não, não vou mais trabalhar na roça, o que eu quero fazer é dirigir”? Como é que foi essa decisão? Em que momento que você tomou?
R – Olha, eu acho que foi assim, foi quando logo eu me formei, fiz 18 anos, tirei habilitação e tal, primeira CNH, aí via meus amigos na estrada, tinha aquela coisa de ser motorista um dia: “Nossa, trabalhar com um caminhãozão desse, viajar conhecer o mundo”. Aí tinha aquela ilusão: “Nossa, o cara ganha bem”. Sabe? Tinha aquela ambição pelo dinheiro e também pela vontade de ser um motorista, conhecer e viajar o mundo. Aí começou acho que por aí, logo quando eu era pequeno. Eu olhava, falei: “Um dia quero trabalhar com aquilo ali. Carreta, caminhão alguma coisa assim”. Depois que a gente cresceu, teve a chance, foi logo quando eu fui pra Londrina, aí surgiu a primeira oportunidade de trabalhar lá com caminhão, aí comecei. De lá pra cá expandiu, aí não parei mais.
P/1 – E essa primeira oportunidade em Londrina como é que surgiu? Onde que você começou a trabalhar? Como é que surgiu esse emprego?
R – Olha, isso foi tudo inclusive na época que eu estava em Presidente Prudente, entorno de São Paulo ali, trabalhava numa firma ali. Aí eu fiquei alguns anos ali. Decidi voltar pro Paraná em Londrina, aí tem amigos meus lá, parente, tem um primo que na verdade é muito irmão meu. Ele que no caso conseguiu um trabalho pra mim. Trabalhando em Prudente na época, já tava saindo, ele falou: “Você quer voltar pro Paraná? Tem um trabalho. Você queria ser motorista, tal, tem uma oportunidade pra você aqui”. Aí saí na época de Presidente Prudente, voltei pra Londrina no Paraná, foi quando eu comecei a viajar até mesmo na época eu trabalhava com um concorrente da Nestlé, que é o sorvete aí, não vou nem citar nome. Aí comecei a viajar o Paraná ali, fazer alguma parte do sul ali, da região de Santa Catarina. Foi o meu primeiro trabalho como motorista e viajar ali. De lá pra cá eu expandi, eu não parei mais.
P/1 – E como é que foi, em Presidente Prudente você trabalhava com o quê?
R – Lá eu trabalhava de auxiliar de expedição numa fábrica de... Fábrica não. Num depósito de remédio farmacêutico na época ali, que era um ex-patrão do meu pai e tal. Até depois foi um patrão meu também e ele tinha uma empresa ali, convidou-me na época, ele foi meu primeiro trabalho acho que na cidade grande, foi quando eu fui pro Paraná que eu te contei a história aí do caminhão. Daí pra frente não parei mais.
P/1 – E essa experiência em Londrina que foi a primeira, né, como... Profissionalmente como motorista.
R – Profissionalmente como motorista foi.
P/1 – Como é que foi, Wagner? Conta um pouco pra gente como é que foi esse início, o que você achou, como é que você se sentiu na época.
R – Olha, eu sempre assim, sempre tive coragem pra tudo. Nunca tive medo: “Ah, eu vou, será que vai dar?”. Não. Não tem esse meio termo, ou vai ou não vai. Então na época quando surgiu essa oportunidade aí como motorista no caso aí, fui pra lá, claro, foi difícil pra mim? Foi. No começo não conhecia muito a região, o estado ali, né? Muito novo pra mim, é novidade. Aí fui pra lá, encarei, tive as dificuldades, mas não desisti também, fui até o fim e não parei mais e to aí até hoje.
P/1 – Era só Paraná que você fazia na época? (interrupção) Então só retomando, Wagner, esse primeiro emprego em Londrina você fazia a região do Paraná, é isso?
R – Fazia. Fazia a região do Paraná ali, na época o norte do Paraná inteiro, não completo. Aí depois começamos a fazer sul, que a empresa era do sul lá na época, mas fazia ali praticamente só o norte do Paraná ali, que é na região nossa de Londrina ali.
P/1 – E aí nesse começo assim de profissão você se lembra de alguma coisa que você tenha vivido que tenha ficado marcado assim pra você? Uma experiência assim na estrada.
R – Não. Eu acho que não teve assim uma coisa que marcou muito, não, porque eu sempre tive força de vontade ali, queria ser motorista e tal, então tirei de letra. Claro que fica certa saudade, que era um emprego mais tranquilo, ficava mais em casa todo dia, saía de manhã, voltava a noite, quando não voltava no outro dia. Era uma excelente de uma empresa também. Uma coisa de repente não é que marcou, mas ficou um pouquinho de saudade, umas amizades, tinha umas amizades bacanas, uma empresa pequena, conhecia todo mundo. Mas foi uma coisa bem legal, pelo meu primeiro trabalho ali profissionalmente em viajar, deixou uma pequena lembrança assim, mas não é aquela coisa toda, sabe? Uma coisa boa.
P/1 – Mas você lembra assim de pensar quais que são os desafios, quais que são as dificuldades da profissão, da vida na estrada?
R – Até hoje.
P/1 – E aí quais são? Como é que é isso?
R – Hoje tem muito. Hoje no ramo nosso de transporte rodoviário tem muita dificuldade em termos de roubo, de dificuldade até mesmo pro caminhoneiro se deslocar, tem muitas rodovias ruins. Pra pousar em lugares hoje, que tem lugar muito perigoso, até mesmo na vida pessoal ele, vamos dizer assim, pra você comer, pra você tomar um banho. Tem uma série de coisa aí que é meio complicado ainda hoje aqui no Brasil. Não é fácil, não.
P/1 – E você, na sua experiência assim profissional, você viveu alguma situação difícil já na estrada?
R – Ah, não vou dizer difícil, mas a gente passa algum apuro aí, vamos dizer fora de hora, de repente rodar até tarde. Porque hoje não, porque tem a lei que a gente não pode rodar mais. Até mesmo a empresa não permite fora de horário mais, mas já passei alguma dificuldade já. Algum susto, ser seguido aí de repente por bandido, eu não sei o que tá atrás da gente. Em dormir em lugar e o pessoal costuma mexer. Já fui... Não vou dizer que já fui roubado, mas já mexeram no caminhão a noite. Tem alguma coisinha assim que é complicado na estrada. Tem várias dificuldades, sabe?
P/1 – Tem alguma história assim, algum episódio que tenha sido mais marcante dessas pequenas dificuldades?
R – Não. Eu acho que marcantes, marcantes que eu já vivi até hoje aí nesse trabalho nosso não tem assim nada que seja marcante, não. Pra mim até hoje não.
P/1 – Tudo você encarou com tranquilidade.
R – Encarei com tranquilidade, naturalidade e graças a Deus deu tudo certo até hoje, não tive dificuldade nenhuma. Claro, tem certa dificuldade, mas não que seja aquela dificuldade pra ficar marcado, nossa, não consegui. Não. Graças a Deus deu tudo certo. Até hoje...
P/1 – Mas às vezes até alguma coisa que você superou e aprendeu alguma coisa. Não tem?
R – Ah sim, né? No dia a dia você aprende muito. Você aprende muito com as pessoas, com a estrada, com pessoas diferentes de outro estado, igual a gente viajava o Brasil inteiro aí. Tem muita coisa pra você aprender e você nunca deixa de aprender. Sempre você tá aprendendo mais, inovando. Tem bastante coisa ainda pra gente correr atrás e aprender mais ainda, que a gente nunca para, né?
P/1 – Você se lembra de algum episódio de aprendizado, uma situação que você tenha vivido que você tenha aprendido alguma coisa?
R – Não.
P/1 – Um desafio de trabalho, uma experiência nova ou alguém que você tenha conhecido na estrada de repente.
R – Não. Eu acho que eu não tive essa experiência assim de coisas novas, não. Claro que foi uma novidade quando eu comecei. Claro que tudo é novidade, mas nada que ficou marcante que seja uma coisa assim tão de dizer: “Nossa, que coisa”. Não. Acho que não teve, não. Pra mim até hoje não teve nada disso, não.
P/1 – E como é que é o cotidiano assim da vida na estrada? Conta um pouco pra gente?
R – É aquele dia a dia meu, né? No caso agora aí largando de viajar um pouco a gente fica aí 20, 30 dias fora de casa, longe da família, longe de amigos, de festa, de lazer. A sua vida pessoal se torna um pouco meio privada, né? Fica meio mais pra empresa, mais pro trabalho que uma vida pessoal sua fica mais restrita ali, você já tem menos tempo mesmo pra você, né? Mas é aquele dia a dia, levantar de manha, trabalhar o dia todo, para a noite, de manhã continua de novo. É sábado, é domingo, é feriado, é aquela vida meio rotineira ali. A gente para uma vez por mês, fica três, quatro dias em casa, mas é uma vida bem corrida, bem, bem difícil, viu?
P/1 – E essas questões que você mencionou pra gente assim comer, tomar um banho, dormir. Como é que vocês resolvem isso no dia a dia de trabalho?
R – Você tem que tentar se encaixar nisso aí, vamos dizer, resolver não tem como resolver, os lugares que você para são meio complicados, os banheiros têm falta de estrutura, de higiene mesmo, são coisas bem difíceis. Hoje pra você tomar um banho custa caro, pra você dormir tem lugares que você não pode dormir que é só mesmo o cliente que abastece que pode dormir. De repente você dorme em lugares perigosos aí igual acontece muito que tem. É uma vida meio complicada pro motorista hoje na estrada, sabe? É difícil. Passa poucas e boas aí, mas você tem que se adaptar e é o nosso Brasil esse trabalho do dia a dia, não muda, até agora não mudou. Infelizmente é isso aí um pouquinho que o motorista vive hoje.
P/1 – E como é que você sabe que lugares você pode parar? Isso já é uma coisa que já tem mapeado assim?
R – Já. Hoje inclusive pela Nestlé e pela transportadora nossa já tem tudo mapeado, já tem os pontos, você sai com uma relação de postos por onde você vai passar, onde você é permitido pernoitar, dormir, parar lugar seguro, onde não é seguro. Tem uma série de informações que eles passam pra você, até mesmo pela Nestlé, onde você pode, onde você não pode. Então hoje você tenta se enquadrar, fazer um planejamento de viagem, onde é menos perigoso, o horário que você vai passar, onde você vai passar. Você tem que fazer aquele planejamento de viagem hoje pra não dar problema.
P/1 – Pra fazer essas paradas tem um tanto de horas, de tantas em tantas horas vocês tem que parar, como é que é isso?
R – É. Por lei seria, né? Como surgiu aí o ano passado aquela coisa toda de rodar quatro horas, para meia, mais quatro horas, para meia. Mas inclusive não tá dando muito certo por enquanto ainda, mas tem uma quantidade de horas. Inclusive pra nós aqui na empresa hoje praticamente libera cinco da manhã, você tá liberado a rodar até dez da noite. Você tem que pernoitar as nove horas, descansar de nove a dez, 11 horas. Também eles não exigem se você quiser parar você pode parar antes. Você pode rodar assim, roda cem quilômetros, 200 quilômetros você pode parar, descansar, dar uma esticada. Tem uma série também de benefícios pro motorista aí hoje.
P/1 – E na empresa que você... Bom, você começou a trabalhar você falou com 18 anos, né?
R – Dezoito.
P/1 – Como motorista e de lá, desse momento até hoje, você não parou mais.
R – Não. Sempre na atividade como motorista.
P/1 – E nessa empresa que você tá hoje você começou a trabalhar faz quanto tempo?
R – Já fez oito anos, está indo pro nono ano agora. Vai pra nove anos.
P/1 – E como é que você começou assim? Você recebeu uma proposta? Foi procurar? Conta pra gente como é que você começou a trabalhar.
R – Não. Aqui foi assim, a gente tava na época lá no Paraná trabalhando lá e teve um amigo nosso de lá, um amigo foi puxando o outro. Tinha um amigo nosso de lá que conseguiu entrar na empresa hoje, um exemplo, aí depois no ano seguinte trouxe um amigo e foi trazendo, amigo por amigo foi puxando. Conversava com o encarregado, falou: “Tenho um amigo bom.” “Traz”. Chegava o outro: “Tenho outro amigo bom.” “Traz”. Inclusive eu entrei por uma amizade, que tinha um amigo que trabalhava lá, na época ele saiu, veio pra cá através do amigo dele, depois também surgiu uma oportunidade, chamou-me, a gente veio pra cá, trabalhamos aí na época acho que quatro anos juntos. Eles que abriram a porta pra mim foram tudo embora, eu continuei e to aqui até hoje.
P/1 – Qual que é a empresa que você trabalha hoje
R – Hoje é a Transzape. Transportadora Transzape hoje.
P/1 – E qual que é o trabalho que você faz na Transzape, que você fez durante todos esses anos como... Que agora você vai mudar, né? Mas antes dessa mudança esse trabalho que você tem feito todos esses anos como motorista, qual que é o trabalho?
R – Antes dessa mudança que eu tive agora era como motorista. Era transportar, que a gente trabalha praticamente exclusivo pra Nestlé, só transporta os produtos da Nestlé. A gente fazia aqui... A gente faz o Brasil todo, não tem como falar fazia aqui, fazia ali. Não tem lugar. Onde existe Nestlé cliente a gente tá dentro. Então sempre transportava e sempre estamos transportando produto da Nestlé sempre. A gente vai pro norte, pro sul, todos os estados do Brasil e sempre foi como motorista, transportar o produto deles aí e agora que eu dei essa parada, mas até ontem tava na atividade aí transportando os produtos aí.
P/1 – E aí essa atividade de transportar, de fazer o transporte dos produtos, como é que é o cotidiano assim de trabalho?
R – O cotidiano de trabalho é assim, a gente carregava na fábrica lá em Araçatuba, inclusive a gente carrega até hoje a de lá, é norte, é sul, é nordeste, aqui em Cordeirópolis hoje. Então tem horário, tem rota, é tudo agendado pra você carregar, pra você descarregar, é tudo dentro das normas, tem velocidade, tem uma série de coisas pra você cumprir, mas o cotidiano do dia é tranquilo, uma coisa que dá pra você fazer, encaixar no dia a dia sem problema nenhum.
P/1 – E você falou que você viaja o Brasil inteiro, né? Viajou o Brasil inteiro.
R – Sim.
P/1 – E dos lugares que você conheceu teve alguma coisa assim marcante também de região, de paisagem, de pessoas, de cultura? Que são lugares muito diferentes, né?
R – Diferente. Cada estado é uma cultura diferente, no Brasil inteiro são várias culturas diferentes hoje aí. Eu acho que uma coisa que foi mais marcante, uma coisa
bacana seria o sul hoje, Santa Catarina, acho que um dos estados litoral ali mais bonito que eu achei e outro que deixa muita saudade que eu ia muito antigamente lá alguns anos atrás ali é Fortaleza no Ceará. Paisagens lindas, lugar coisa de cinema, praia, a cidade, a cultura do povo. Uma coisa bem bacana. São dois lugares que pra mim se tivesse que morar lá hoje são dois lugares que eu escolheria pra morar, tanto Fortaleza no Ceará quanto ali em Florianópolis, Joinville pra baixo ali, Santa Catarina. Dois estados bem bacanas aí no Brasil que eu conheci.
P/1 – E nessas viagens dá pra fazer amizade também, Wagner? Você conhece bastante gente?
R – Dá. Você faz muita amizade até mesmo com próprio motorista que você para num posto, você para pra almoçar, pra jantar, pra dormir. Até mesmo frentista, gerente do posto, lanchonete, você sempre tá fazendo amizade com as pessoas ali. Fiz muita amizade, tenho muita amizade, onde eu passar hoje ficou uma bela amizade aí.
P/1 – Tem gente que você via frequentemente?
R – Tem. Tinha e tem. Tem bastantes amigos nossos que trabalharam com a gente aqui, algumas outras empresas que eu trabalhei na época também lá do sul. A gente se encontrava muito, de repente no caso tem alguns deles que fazem Nestlé também, então a gente se encontrava aqui, de repente se encontrava lá, norte, sul, de repente tava no mesmo cliente. Ali você se encontrava ali ou até mesmo a coincidência de você parar num posto à noite pra dormir, na hora do descanso, aconteceu dele chegar ali a gente se encontrar, ficar ali, dormir, jantar ali. Sabe, se encontra assim independente da distância e do estado, a localidade, sempre acontece de você encontrar um amigo, uma pessoa que você tem amizade.
P/1 – E essa pernoite você faz no próprio caminhão, é isso?
R – Sim. O pernoite você para no posto, você... Praticamente o caminhão, a boleia do caminhão como eles dizem, é a sua casa. Tem a cama, tem tudo ali, ali você dorme, toma um banho no posto, janta na lanchonete ali e tal e você vai pernoitar mesmo no caminhão ali. É o tempo todo praticamente 24 horas dentro do caminhão. É ali que você reside ali.
P/1 – E aí vocês saem com bagagem, mala?
R – Sai. Sai. Ali você tem que sair preparado, levar roupa, levar tudo que você usa no dia a dia. Você também tem, muitos deles têm caixa de cozinha onde você prepara o alimento, as refeições ali, almoço, janta, o que for ali e é a sua casa. O seu mundo é aquilo ali, é o caminhão. Um pedacinho de você no mundo ali. É ali que você reside, ali que você viaja, ali que você dorme, o tempo todo é ali.
P/1 – E na boleia do caminhão assim você costuma levar coisas pessoais assim, alguma coisa de proteção?
R – Não. Coisa de proteção não diria assim que é uma coisa mais pesada. Não. Mas coisas pessoais sempre carreguei meu computador, levava ali, tinha televisão, celular, essas coisas pessoais do dia a dia. Eram as coisas mais pessoais que eu tinha que levar ali fora a roupa, essas coisas nossas, né?
P/1 – E fotografia, alguma lembrança de família, alguma coisa assim?
R – Só mesmo o celular. Levava as fotos ali. Do restante, foto em papel, outras coisas assim, não.
P/1 – Nem um terço, nada assim religioso?
R – Eu sempre fui da religião católica a vida toda, tinha, no meu caminhão tinha. Nunca deixei de ter um tercinho ali no para-brisa, colocadinho ali no volante. Sempre tinha ali uma imagem da Nossa Senhora da Aparecida. Isso aí sempre carregava comigo ali. Que na estrada é o que eu sempre digo, quem pode olhar por você só é Deus, mais ninguém. É você e Deus e acabou.
P/1 – E é muito solitário, Wagner? Como é que é o dia a dia?
R – Olha, é solitário. Eu até costumo dizer pros colega que é um preparo psicológico. Se você não tiver uma cabeça, for bem concentrado, você tem que estar preparado pra isso, porque as pessoas falam assim: “Ah, eu quero ser motorista”. Não é você querer ser, você tem que gostar. Se você não gostar você não fica. Por quê? Como se diz, é uma vida solitária, você não tem amigos... Quer dizer, amigos você tem, mas não é relacionado igual você ter um amigo na sua cidade. É diferente. Você o vê hoje, fica 15, 20 dias, um mês, dois meses sem ver aquele amigo seu. Então praticamente não é bem amigo, mas é uma vida bastante solitária, sim. Você tá sempre no mundo, tá praticamente sempre sozinho, longe da família quem é casado, longe de pai, de mãe, de irmãos. É uma vida bastante solitária assim, é uma coisa que mexe, abala bem o psicológico. Portanto hoje tem muitos motoristas aí que vivem estressados, outros usam algumas coisas diferentes por motivo de quê? Solidão, longe da família, longe de casa. É meio complicado, então por isso que eu falo, tem que gostar, não é só querer. Se não gostar não adianta entrar que não vai permanecer na profissão.
P/1 – E como é que você faz assim no dia a dia essa coisa de estar muito tempo sozinho pra distrair, pra abstrair a cabeça, ouve música, tem alguma coisa que te ajude assim no...
R – Olha, hoje tem essas redes sociais aí. Hoje você tem um Whatsapp, você tem uma internet. Eu sou um cara que gosto de ouvir muita música, praticamente eu levanto de manhã, ligo o rádio, é o dia todo, pra você dar uma relaxada psicologicamente. Então isso é o que faz você distrair um pouco, perder aquele pensamento fixo na família porque tá longe de casa. Então você tem que se envolver com alguma coisa ali. Aí você mantém contato sempre por telefone com a família, tal, amigos ali. Isso é o que faz você distrair um pouco aquela tensão do dia a dia. Saudade, a distância de casa, aquela coisa toda.
P/1 – Você tem televisão você falou também, né?
R – É. Eu tinha, né? Mas tinha, tinha televisão, tinha som, meu caminhão tinha tudo. Era completão, tinha de tudo ali porque é a nossa casa, né, o único lazer que você tem, você paga uma internet, um celular, alguma coisa assim hoje. Então tinha sim. Meu caminhão tinha tudo.
P/1 – E o que você assistia de programa assim de TV?
R – Mais era à noite, né? Como diz, o motorista diz que não é noveleiro, é, é sim. Muita novela à noite um filminho, um DVD, essas coisas básicas do dia a dia porque você trabalha o dia todo, você chega à noite, vai tomar um banho, você vai jantar, você tá cansadão, vai bater aquele cansaço, então você não vai ficar muito tempo ligado ali em alguma coisa, televisão, um filme, mas é o que eu assistia, uma novelinha ali, um jornal pra estar mais ou menos informado o dia a dia e depois ia dormir, começar aquela nova rotina no outro dia de novo.
P/1 – E essa questão da família assim? Como é que é pra você lidar com a distância da família?
R – Olha, hoje a gente tá tão acostumado que saí muito cedo de casa, então pra mim hoje ficar 30, 40 dias não vou dizer que é normal, mas já da pra se acostumar que já são vários anos longe de casa, longe das pessoas que a gente gosta que é a família, pai, mãe, irmão e tudo mais. Dá pra tentar contornar a situação que é difícil? É. Chega uma hora que bate um aperto, uma vontade de estar em casa, um fim de semana, um feriado. É complicado, mas aí a gente já tá na profissão, é o que a gente queria, já tava preparado que você ia passar por isso, então você se enquadra bem e dá pra tirar de letra. Claro que vai bater um friozinho ficar longe de casa todo dia é complicado, mas tranquilo.
P/1 – E tua mãe, teu pai e suas irmãs, como é que eles lidaram com essa sua decisão?
R – Na época meu pai, a minha mãe deu muito apoio. Na família acho que nessas horas é tudo na base da pessoa. Meu pai deu a maior força, dava até ontem, hoje. Agora que eu parei de viajar mais ainda, só que depois de certo tempo e tal, acho que fica muito longe de casa, aquela distância, tal, vai menos em casa. Claro que ultimamente eles vinham pedindo pra eu parar, fala: “Arruma outra coisa mais perto de casa, para com essa vida de ficar longe”. Mas de começo, no começo alguns anos ali, deram muito apoio. Meu pai e a minha mãe apoiaram muito, era uma decisão minha, uma vontade que eu tinha de ser, então a família apoiou muito e, sabe, foi uma coisa bacana, uma coisa boa na época aí.
P/1 – Quantos anos você tem hoje de profissão?
R – Hoje acho que se juntar todas vai dar uns 12, 13 anos como motorista, na profissão mesmo. Que eu trabalhei algum tempo sem registro, mas como profissional hoje dá em média 12 a 13 anos viajando aí fora de casa no mundão.
P/1 – Bastante já. E aí me conta como é que foi essa decisão então de deixar de ser motorista e virar instrutor de direção, que é nesse momento que você tá, né?
R – Isso.
P/1 – Como é que surgiu isso? Como é que tá sendo essa transição?
R – Tá sendo até muito recente ainda que foi agora a partir da semana passada que me fizeram o convite. Tinha outro amigo nosso que era instrutor, muito amigo nosso também, que veio lá debaixo, era motorista. A empresa como ia fazer uma demissão, fazer umas mudanças na empresa, surgiu tirá-lo também que não tava dando certo, aí me ligaram e me convidaram. Fizeram a proposta se realmente eu queria, tal, isso que eu queria. Claro que eu aceitei, é uma coisa que eu to envolvido no meio, uma coisa que eu gosto de fazer, faço porque eu gosto. Aí surgiu essa oportunidade, peguei, to aí na atividade agora, mas foi uma decisão minha mesmo, né? Tive a chance da empresa que me abriu as portas pra esse novo cargo, esse novo trabalho na empresa, eu abracei sem dúvida, era uma coisa que eu queria também e estamos aí. Foi uma coisa boa.
P/1 – E o que é? Explica um pouco pra gente o que é a função de um instrutor de direção dentro da empresa. O que você faz? Quais que são as suas responsabilidades?
R – Hoje no meu cargo ali é o quê? É contratar o motorista, treinar o motorista, ensinar as rotas, como trabalhar com o caminhão, operar o caminhão, velocidade média, as rotas que ele tem que fazer, as paradas que ele tem que fazer, o sistema de rastreamento, quais os macros que ele tem que usar, o que ele tem que usar ali, como proceder no dia a dia e treiná-lo, deixá-lo praticamente se tornar um profissional a trabalhar no caminhão ali. Conhecer um pouco sobre o caminhão, sobre mecânica, sobre as estradas, o dia a dia, o que é a vida do motorista em cima daquele caminhão. Um pouco é tudo isso aí, que na verdade o negócio é contratar o motorista, treiná-lo se for preciso treiná-lo e colocar em atividade. É o que eu to fazendo hoje.
P/1 – E aí você não pega mais estrada, é isso?
R – Não. Eu só vou fazer o quê? Um percurso com eles, não que eu vou assumir a direção, vai ser ele, eu vou estar do lado ensinando-o. Mas igual antigamente, assumir, pegar e viajar, ficar fora não. Hoje já não to exercendo mais isso aí. Tem os lugares certos, os pontos fixos que são na empresa aqui hoje e na outra filial de Araçatuba que tem uma Nestlé lá, que são os pontos fortes de carregamento da empresa. Então fico uma semana aqui, uma semana lá, uma semana lá, outra semana aqui. Sempre acompanhando o pessoal fazendo treinamento, fazendo teste, contratando os motoristas. (interrupção)
P/1 – Então só retomando, Wagner, você tava falando da sua função hoje como instrutor de direção.
R – Direção.
P/1 – Você trabalha então mais fixo, né, e são dois lugares diferentes, é isso? Aqui em Cordeirópolis...
R – E Araçatuba. É que lá a gente tem, vamos dizer, uma filial pequena onde é feito nota, manifesto lá tal, aí eu fico uma semana aqui, acompanhando os motoristas aqui quando entram, fazer uma série de treinamento e tal. Aí depois a gente vai pra lá, vou em direção com eles, coloco na direção, vou ensinando como fazer, como operar. Aqueles que estão aprendendo, claro, que o profissional a gente praticamente não vai muito, mas aqueles que estão aprendendo a gente vai lá, acompanha-os no dia a dia, como carregar, como descarregar, como fazer nota, rota, horário, marcos de rastreamento, paradas, pontos de paradas, o que pode, o que não pode. Tá ali auxiliando o motorista, ensinar da maneira perfeita que a empresa pede pra fazer isso aí. Então esse é o meu trabalho, ensiná-los ali uma série de coisas.
P/1 – Você fica no centro de distribuição, é isso?
R – No caso lá é fábrica, né? Aqui eu fico na garagem que é aqui do lado, da Nestlé, que é um centro de distribuição. Lá, quando a gente vai pra lá, lá é a fábrica da Nestlé de Araçatuba. Então eu os acompanho lá dentro na área de carregamento, dos motoristas ali das carretas, aí eu to sempre os acompanhando ali, no dia a dia deles ali. Como fazer, o que pode, o que não pode, o que tem que fazer. Até mesmo na direção saindo dali como manobrar, como encostar, como carregar. É uma série de coisinhas tão simples, mas que você tem que estar ali no dia a dia acompanhando-os.
P/1 – Qual que é o produto? Que tipo de produtos vocês lidam na Nestlé, vocês carregam e qual é, se tem alguma especificidade assim pra lidar com esse tipo de produto? Porque imagino que mude dependendo de qual a carga?
R – Não, ali não diria assim qual porque são vários. Praticamente só não a área dos frios. Mas a linha seca das Nestlé são todos que a gente transporta. Aí lá tem o pessoal que amarra a carga, tem o pessoal que faz tudo. O motorista em si não rela a mão em nada no dia a dia ali. Em termos de carga só não puxa frios, o restante dos produtos a gente puxa em geral, todos eles, quanto biscoito, não sei se pode citar o nome dos produtos.
P/1 – Pode.
R – Creme de leite, leite condensado, é Nan, Nan I, Nan II, Nestogeno. Tem vários. Tem muitos produtos aí que a gente transporta praticamente 90%. A gente transporta todos eles.
P/1 – E tem um cuidado específico com essa carga? Eu digo assim, dependendo da carga que você tá transportando, o motorista tem que tomar um cuidado específico?
R – Tem. Tem que tomar porque tem cargas que podem avariar, pode amassar, danificar a carga e tem uma série de coisas que envolve seguradora, tal. Mas tem sim, mas independente disso tem o pessoal que já saí todo com stretch, amarrado, uma série de proteção pra carga não ter problema na viagem. Assim saindo da fábrica até chegar o ponto do CDI, Centro de Distribuição da Nestlé. Então de lá pra cá aí vai aquele excesso de velocidade, tem uma velocidade limitada pra você andar, tem que saber as condições da estrada, os pontos de parada. Tem uma série de coisas pra tomar cuidado com a carga também em termos de roubo, de acidente, em geral.
P/1 – Tem uma série de procedimentos então?
R – Tem uma série de procedimentos pra ser cumprida pra transportar o produto até chegar no destino final.
P/1 – Tá certo. Vou te perguntar agora sobre essa questão desses módulos de instrução que a Nestlé oferece no centro de distribuição, mas antes de falar disso queria saber se você tem filhos.
R – Não. Não tenho. Não tenho filhos. Sou solteiro, não tenho.
P/1 – Não tem? Tá bom. Senão eu ia te perguntar sobre nascimento e tal.
R – Não. Mas não tenho.
P/1 – Então não tem filhos, né?
R – Não.
P/1 – Então a gente pode conversar um pouco, queria saber qual que é o contato que você teve nesses anos que você transporta os produtos Nestlé com esse projeto do Safe Driving que são esses módulos de aulas, né?
R – Sim.
P/1 – São espécies de aulas em relação a segurança na direção. Conta um pouco pra gente o que é esse projeto, qual que foi o contato que você teve com o projeto.
R – O contato em si, o dia a dia a gente vê, acompanha, a gente faz vários treinamentos aqui, em todas as unidades, São Bernardo, Feira de Santana, Cordeirópolis, Araçatuba é o que a gente tá sempre, praticamente todas as semanas dentro delas, das unidades das fábricas. É um treinamento excelente pro motorista hoje em dia, pra ele acompanhar como que é feito, o que tem que fazer, o que não tem. Depois que você faz o cursinho, assiste ali, responde algumas questões, perguntas, você tem um certificado que você realmente passou por aquela etapa, aquele treinamento básico. É o que você vai usar no dia a dia na estrada. Uma série de procedimento ali, mas é uma coisa bacana. É um excelente negócio que a Nestlé no caso inventou pra fazer em benefício ao motorista, no dia a dia, na estrada, aqui dentro que são várias normas, o que tem que fazer, que no curso você também vê tudo, eles detalham tudinho ali o que pode, o que não pode. É uma coisa boa pro motorista hoje. É bom isso aí. Ajuda muito. Ajuda muito hoje.
P/1 – Ajuda em que sentido você acha?
R – De conhecimento, né, acredito eu. Que é o que você pode fazer, como operar, como você fazer um carregamento, como você se deslocar dentro mesmo do pátio da empresa em termos de nota, em geral, dentro aqui da área do CDI tudo. Ele te informa tudo o que pode, o que não pode. Então tem muitas pessoas que vêm pela primeira vez fazer um carregamento, uma descarga, uma visita e não tem nem noção do que se trata, aí você passando por esse procedimento de treinamento você fica bem mais apto a ver como que funciona o trabalho da Nestlé hoje.
P/1 – Como é que são esses módulos de treinamento assim, o que tem de conteúdo e como é que é o momento do treinamento mesmo? Conta um pouco pra gente. Vocês sentam ali no computador? Como é que funciona?
R – É, você senta, faz o cadastro ali, pega seus dados tal, você senta, vai abrir ali, tem uma página ali, ele vai abrir, vai ter umas questões, você vai ler, vai ter as alternativas, o que é certo, o que é errado pra você assinalar tal. Você lê as questões, no final ali das questões, são várias, você tem certa pontuação do que você acertou, do que você errou pra você ver o que é certo, o que é errado, mas tem um conteúdo bacana, são bastantes coisas interessantes. Desde lá da estrada até aqui, até mesmo chegando na sua casa, até uma série de coisas que ajuda muito.
P/1 – Mas que tipo assim? Dá uns exemplos mais concretos pra gente que não entende muito da profissão entender um pouco o que são esses conteúdos?
R – Os conteúdos que eles têm ali eu acho assim, que é o meu ponto de vista, é onde você para, onde você dorme, que tipo de carga você tá transportando, o risco que ela te oferece, o que pode fazer, o que não pode, como você chegar numa empresa, o que você pode fazer com os produtos da Nestlé em termos de carregamento, descarregamento. Então eu acho que é isso aí, é uma coisa que muitos não tinham certo conhecimento que olhando e vendo, assistindo vídeo, lendo, respondendo as questões ali são coisas que de repente você nem imaginava que existiam e ali você vê que tem, e são coisas que você também tem que cumprir ali. Então são bastantes coisas interessantes ali.
P/1 – Você fez esses módulos alguns?
R – Fiz. Eu fiz acho que uns oito. Das que tinha eu acho que eu fiz todos. Não sei se saiu algum outro depois, mas praticamente quando eu chegava aqui nas unidades como Feira de Santana, Cordeirópolis, Araçatuba, que a gente frequenta mais, sempre eles estavam lá com essa van fazendo essa série de treinamento, essas coisas. A gente sempre fazia, principalmente eu acho que fiz quase todas. Tenho todas em casa, o certificado de todos eles.
P/1 – E você se lembra de algum exemplo de alguma coisa que você tenha aprendido em algum desses módulos? Às vezes alguma coisa que você não sabia ou que você não se lembrava.
R – Não. Porque o que passa ali e algumas coisas a gente que é mais velho um pouco assim em trabalho com a Nestlé, praticamente o que passa é o dia a dia nosso. Pra muitos é novidade, que tá começando, mas pra gente que já tá bem mais experiente trabalhando com eles já há vários anos, pra mim não teve assim nenhuma novidade o que eles passaram ali, já tava bem preparadamente ali. Já vê aquilo, vê no dia a dia, então não teve muita coisa, muita novidade, não.
P/1 – Mas você acha que pros motoristas mais novos traz alguma coisa de aprendizado?
R – Com certeza. Tem muito benefício que traz. Em termos de clima, viagem, paradas, coisas que a pessoa que tá começando agora não sabe nem pra onde tá indo, como fazer. Ajuda muito. Eu acho que pro motorista que tá começando agora, que não tem conhecimento com esse trabalho da Nestlé é muito bom. Ajuda muito.
P/1 – Normalmente quando vocês passam, os motoristas passam pelos centros de distribuição quanto tempo vocês ficam parados assim?
R – Varia. Tipo aqui você fica o máximo o quê? Tem que ver, porque é tudo carga agendada. Quando você sai da fábrica, vamos detalhar um pouquinho mais, quando você sai da fábrica pro centro de distribuição que é onde é feita a descarga, que no caso é aqui em Cordeirópolis hoje, você tem certo tempo de viagem pra você deslocar de lá pra cá. É uma quilometragem perto, uma média de seis a sete horas, mas que eles dão um pouquinho mais de tempo, oito, nove, dez, 11 horas de viagem de lá pra cá, porque tem velocidade, tem paradas, tem imprevisto da viagem. Então você costuma ficar aí oito, nove horas aqui dentro. De repente você chega e você fica uma hora só, já descarrega e vai embora. Tem vezes que você permanece mais tempo e tem vezes que menos tempo. Não tem um tempo definido certo pra você ficar dentro da unidade.
P/1 – Depende do que isso, esse tempo?
R – Isso aí depende de, como se diz, do fluxo de carga deles, das fábricas pra cá, pro centro de distribuição. De repente a operação deles aqui tá rápida, a outra vez tá lenta, tem espaço no estoque, outra hora não tem, aí tem que abrir espaço, tem que carregar algumas carretas pro cliente mandar embora pra abrir espaço pra descarregar as outras que estão vindo da fábrica. Então tem uma série de coisas aí. Aí, um leva tempo demais, outro chega rapidinho, outro chega no agendamento e descarrega, é uma coisa meio...
P/1 – Tem uma variação.
R – Uma variação, vamos dizer assim.
P/1 – E na questão desses treinamentos, Wagner, eu queria saber se você acha que eles auxiliam na questão de segurança do motorista e por que? Se eles têm alguma importância nesse aspecto de segurança mesmo.
R – Ah, ajuda muito, né, porque toda área aqui você tem que estar preparado. Você tem que estar de calça, sapato, você tem que usar um crachá, você tem que estar praticamente o tempo todo visível, que tem as faixas de pedestre, tem uma série de coisas que muitas empresas aí fora não tem isso aí. Então nesse curso explica tudo, detalha tudo, onde você pode passar, onde você pode ir, o que você pode usar aqui dentro, o lugar que você pode ir, o que você não pode. Então algumas empresas lá fora não têm nada disso e aqui nesse curso eles detalham tudo isso aí pro motorista que tá chegando aí pela primeira vez ou até mesmo que vem de vez em quando aí, frequenta mais a unidade. Então igual eu te disse, pro motorista ajuda muito isso aí aqui dentro.
P/1 – E na questão de segurança na estrada assim, também auxilia os treinamentos? Tem alguma temática que trate disso?
R – Tem. Tem porque aí eles passam ponto de parada, eles falam como tem que ser a viagem, como é a viagem, o tempo de parada do motorista, onde pode parar, lugar mais seguro, como ele tem que fazer na viagem. Como ele tem que, de repente, amarrar uma carga ou não amarrar a carga, como ele tem que transportar a carga. Tem uma série de fatores que explicam detalhadamente o que pode e o que não pode tanto pra segurança da carga, quanto do caminhão e do motorista. Então é uma coisa que é bacana. Eu particularmente aprovo isso aí. Portanto eu fiz praticamente todas até agora. Todos os módulos dele.
P/1 – Bacana. Eu vou encaminhar pras questões finais então, a gente tem duas questões de fechamento, vou te fazer três perguntas de fechamento. Antes de encaminhar eu queria saber se tem alguma coisa que a gente não tenha perguntado e eu você gostaria de falar. Qualquer coisa, gostaria de deixar registrado.
R – Não. Eu acho que nessa nossa conversa até agora eu acho que não restou nada assim que eu queria falar, não. Acho que o que eu pude falar, que tal, que eu quis falar eu falei a todo o momento. Acho que não ficou nada, não. Da minha parte não.
P/1 – Tá certo. Então pra gente terminar eu vou fazer três perguntas finais, a primeira delas é: qual que foi o maior desafio que você enfrentou na sua vida até hoje e como é que você superou esse desafio?
R – Vamos dizer assim, profissionalmente nesse trabalho meu eu acho que foi quando eu saí de casa, fui a primeira vez, não conhecia nada. Meti a cara no mundo, falei vou vencer, vou e vou até o fim, consegui e to aí. Eu acho que esse foi o meu maior desafio, ter saído pro mundo, vamos dizer assim, porque você criado ali naquele mundinho, de repente você sai pro Brasil inteiro. Pra quem nunca saiu, nunca viajou, não conheceu nada eu acho que essa aí foi a minha maior, não vou dizer dificuldade, mas foi a minha maior luta e eu consegui, acho que foi isso aí pra mim.
P/1 – Você lembra como é que você se sentiu?
R – Não vou mentir. Deu aquele friozinho na barriga, aquela coisa, falei: “Nossa, e agora? O que eu vou fazer?”. Não tem ninguém por mim, to longe de casa, não tem ninguém, não conheço ninguém, de repente tava aqui, a primeira vez já fui lá pro norte, pro sul, falei: “E agora?”. Mas com persistência e força de vontade toquei, fui, to aí até hoje, to vencendo. Eu acho que foi minha maior dificuldade, que realmente na verdade não foi, né? Por força de vontade não foi.
P/1 – Você estranhou alguma coisa? Você se lembra de ter achado alguma coisa especialmente estranha ou diferente? Porque naquela época nem celular não tinha, né, logo que você começou tinha já celular?
R – Tinha. Aqueles tijolões desse tamanho, aquela coisa, mas ainda era novidade, né? Você não tinha esse contato direto igual tem hoje, essa facilidade, essa tecnologia hoje. Tinha, mas tinha bem menos. Mas de estranhar, claro, estranha porque você tá longe da família, longe de todo mundo, culturas diferentes, pessoas diferentes, de estado pra estado muda muito, longe de casa. Dá aquele frio na barriga, você sente aquele certo medinho no começo? Sente. Dá uma balançada, você fala: “E agora? Eu vou ou eu não vou?”. Mas eu não tive, falei eu vou, é isso que eu queria e vou até o fim. E estamos aí.
P/1 – Você foi morar sozinho também nessa época que você começou a trabalhar como motorista?
R – Fui morar sozinho. Eu fui pra Londrina nessa época. Fui pra Londrina, morava sozinho, viajava só pertinho ali, norte do Paraná, né? Aí viajava sozinho, mas tinha parente ali, tenho até hoje, bastantes amigos, tinha os primos, tem um monte de parente lá. Então pra mim aquela época ali, ali foi mais fácil se adaptar porque tinha pessoas envolvidas da família ao meu lado ali, né? Mas aí depois que eu já saí pra fora dali, pra carreta, pro mundo, pra cá, aí já ficou um pouquinho mais assim medinho, mas também foi coisa que deu pra superar e tranquilo.
P/1 – Tá certo. Então a penúltima pergunta, quais que são seus sonhos hoje?
R – Olha, meus sonhos hoje não vou dizer que... Praticamente que eu tive, que eu tenho já foram praticamente realizados, que eu queria ser, ter algumas coisas, consegui, lutei, consegui. Claro que a gente quer mais, a gente não vai ficar parado no tempo, mas eu acho que o meu próximo sonho agora, sei lá, futuramente aí, como eu já queria dar uma parada de viajar, ficar mais perto de casa, aí depois eu quero construir uma família, que eu nunca casei, nada. Construir uma família e dar uma parada de ficar longe de casa porque eu acho que chega também. Já tá na hora. Eu acho que o meu objetivo agora é isso aí porque do restante, de trabalho, profissionalmente, o que eu quis fazer lutei pra chegar, consegui chegar, cheguei, to aí, acho que agora dar uma estabilizada e ficar tranquilo agora. Construir uma família e dar uma parada.
P/1 – Tá certo. E por fim então como é que foi contar a sua história?
R – A história foi assim uma coisa interessante, porque eu nunca tinha passado por isso, contar um pouco da minha vida desde criança até hoje. Foi uma coisa bacana, experiência legal, gostei muito e acho que é isso aí, né? Foi bom.
P/1 – Tá certo. Muito obrigada então, Wagner. A gente encerra aqui.
R – Nada. Agradeço vocês.
FINAL DA ENTREVISTARecolher