Plano Anual de Atividades 2013 – PRONAC 128.976
Depoimento de Maria Helenice Guerra
Entrevistada por Eliete Pereira
São Paulo, 10/04/2014
WHLP_HV003_Maria Helenice Guerra
Realização Museu da Pessoa
Transcrito por Claudia Lucena
MW Transcrições
P/1 – Bom dia.
R – Bom dia.
P/1 – Eu g...Continuar leitura
Plano Anual de Atividades 2013 – PRONAC 128.976
Depoimento de Maria Helenice Guerra
Entrevistada por Eliete Pereira
São Paulo, 10/04/2014
WHLP_HV003_Maria Helenice Guerra
Realização Museu da Pessoa
Transcrito por Claudia Lucena
MW Transcrições
P/1 – Bom dia.
R – Bom dia.
P/1 – Eu gostaria que você dissesse o seu nome completo, o local e a data de nascimento.
R – É Maria Helenice Guerra, 14 de março de 1965, nascida em Triunfo, Pernambuco.
P/1 – Qual o nome dos seus pais?
R – Doralice de Souza Lima e Jesus de Souza Guerra.
P/1 – O que eles faziam?
R – O meu pai é agricultor, a minha mãe do lar e o meu pai era dono de engenho, desde herança dos avós e depois ele ficou na agricultura.
P/1 – Sempre lá em Triunfo?
R – Sempre em Triunfo.
P/1 – Você teve irmãos?
R – Tenho.
P/1 – Quantos irmãos?
R – Tenho quatro mulheres, um filho biológico e um adotivo.
P/1 – Quatro mulheres.
R – E dois homens.
P/1 – Como você descreveria os seus pais, seu pai e sua mãe, como eles eram na infância?
R – Na minha infância, assim, eu sempre considerei eles pais muito jovens, com uma mente muito boa, criou os filhos com bastante educação e sempre dizendo o sim e o não, o que é certo e o que é errado. Então todos os filhos eles criaram, eu vejo eles, assim, como uns pais modernos, são vivos até hoje.
P/1 – Estão lá em Triunfo?
R – Tão em Triunfo, eles moram no Sítio Gavião, o nome do sítio dele é Sítio Gavião, no qual ele gosta muito de viver lá, e a gente sempre que pode vai lá visitar.
P/1 – Como foi a infância com os seus irmãos lá em Triunfo?
R – A nossa infância foi muito boa, já aprendemos a trabalhar, né, a educação nossa e hoje eu trabalho na alimentação, exatamente com o que eu aprendi, tinha o cultivo das lavouras, a gente colhia e também eu já ajudava a minha mãe a cuidar dos afazeres de casa, sempre acompanhada por ela.
P/1 – Você é a filha em qual posição?
R – Eu to no meio, tem duas mais velhas e duas mais novas.
P/1 – Qual o nome dos seus irmãos, na ordem de nascimento?
R – Os que ficaram vivos, tem o Antônio, que é o filho do meu pai e a minha mãe criou, o qual ele veio com sete anos de idade, aí nasceu a Cícera, a Cida, eu, a Helena e a Amélia, que é a Bel.
P/1 – Os seus pais, como era a relação? Eles ficavam mais em casa, ajudavam também na lavoura?
R – Ficava sempre em casa e tinha, assim, aquela regra, eu era quem mais trabalhava às vezes porque eu falava bastante, eu já fiz, era tudo dividido, tinha criação de gado, de ovelhas, então ficava as mulheres ajudando a minha mãe e quando precisava a gente também ia trabalhar na roça. Eu sei trabalhar até hoje com enxada, capinar, sei plantar com aquelas máquinas também, aquelas manual, eu também ia pra roça, a gente ajudava ele também, na colheita também a gente ajudava. E quando ficava mocinha, aí já começava a mudar, já não levava junto com os trabalhadores, já pagava trabalhadores e a gente trabalhava só com alimentação, ajudando a mãe.
P/1 – Em casa?
R – Em casa.
P/1 – E a escola?
R – A escola, a gente estudava, era um pouco difícil por quê? Chama o grupo, lá não era uma escola, chamava o grupo, e as professoras, o meu pai dava abrigo pra elas, elas ficavam na nossa casa e era bem rígida, considerada como se fosse uma segunda mãe, a gente considerava a professora como se fosse a segunda mãe. Quando tinha festa, eventos, sempre os pais acompanhavam, e a escola, era tudo muito importante, por mais que a gente teve uma vida boa, considerada lá no nordeste, eu costumo hoje dizer pras pessoas quando às vezes fala de: “Ah, eu quero uma mochila”, eu digo pras minhas irmãs: “Não deixe o seu filho fazer isso. Porque a gente, o meu pai comprava arroz, porque lá a gente, o arroz lá era como se fosse uma mistura na época, e aquela sacola plástica a gente guardava o ano inteiro pra usar, carregar nossos cadernos naquelas sacolinhas de arroz, sacola plástica, mas nunca deixava de estudar. Sempre ia junto com a professora, voltava e lá sempre estudava na parte da manhã.
P/1 – Então todos os seus irmãos também estudavam no grupo?
R – Todos, todos estudavam no grupo.
P/1 – Você fez até que série nesse grupo?
R – Nesse grupo era até o quarto ano, falava até o quarto ano, né, aí depois vinha, terminava, aí terminava, aí tinha que ir pra cidade, pra cidade a minha mãe não deixava a gente ir porque achava perigoso o caminhão e às vezes a pé, tinha que andar mais de uma hora e meia a pé pra poder conseguir um carro pra chegar na cidade.
P/1 – A cidade era Triunfo?
R – Triunfo, aí até a minha irmã Helena a gente não teve esse acesso aos estudos lá, a gente terminou de estudar em São Paulo, fazer os cursos, tudo aqui em São Paulo, porque lá, aí eu fui pra uma cidade vizinha, que chamava, já tinha, que lá a gente terminou os estudos. E a minha irmã, essa Amélia, ela terminou os estudos lá em Triunfo, já que a minha irmã morava lá.
P/1 – Agora, Nice, a sua família é de Triunfo, os pais, a origem deles?
R – Tudo de Triunfo, Pernambuco, só que foi do sítio.
P/1 – Tudo de Triunfo?
R – Toda a minha família.
P/1 – Você ficou até que idade em Triunfo?
R – Dezessete anos e dez meses, eu completei 18 anos aqui em São Paulo já.
P/1 – Por que você veio a São Paulo?
R – Eu vim a São Paulo pelo meu irmão.
P/1 – Qual irmão, o Antônio?
R – O Dito, o Antônio já morava aqui com a esposa, aí o meu irmão, o Dito, gostava de uma moça e a moça não queria namorar com ele, meu pai deu carro pra ele, moto, e do nada ele vendeu tudo, foi embora. A gente não passava nenhuma necessidade, foi embora e veio morar com esse meu irmão, só que quando chegamos aqui em São Paulo, ele veio na frente. Aí ele me, sempre mandava uma carta, era na época de carta, pedindo pra que eu viesse, que a gente sempre foi muito unido, pra que viesse ficar com ele, que ele queria levar uma vida sozinho, nós dois morando, sem ser com o meu irmão. Aí eu decidi um dia: “Eu vou”, o meu primo foi lá casar, que é meu primo por parte de mãe, e eu entrei num caminhão, subi dentro de um caminhão, do nada, sem necessidade, e vim pra ajudar esse meu irmão. Fiquei oito dias na estrada, fiquei cinco dias em São Bernardo do Campo, quando eu vim chegar aqui eu já tava cansada, parecia que São Paulo nunca, era enorme, não tinha, assim, conhecimento com nada.
P/1 – Qual foi a sua impressão chegando em São Paulo?
R – A minha impressão foi de um fim de mundo, mas eu tava decidida: “Eu vim pra ficar e vou ficar”, não foi fácil.
P/1 – E os seus pais, o que acharam?
R – Eles achavam sempre que tudo era muito bonito, eu sempre sorridente e sempre feliz, cheguei a passar muito apuro, muita dificuldade, mas sempre com aquilo: “Eu vou vencer e eu vou conseguir”.
P/1 – Você veio primeiro pra qual bairro aqui em São Paulo?
R – Eu vim pro Parque Santo Antônio.
P/1 – Por que o Dito morava lá?
R – Morava lá, aí nisso a minha cunhada...
P/1 – Como era esse bairro nessa época?
R – Esse bairro era um bairro muito perigoso, era subida do Cemitério São Luís e a gente ficava, eu ficava sempre imaginando uma coisa melhor em sonhos. O meu irmão, ele trabalhava de ajudante numa oficina e sempre ele dizia assim, passava um carro, a gente falava: “Nossa, um dia eu vou conseguir um carro desse”, eu falava: “Vamos sim, vamos” e ele trabalhando. Nisso dificultou um pouco porque a minha cunhada, eles viam um mundo melhor pra mim, hoje eu vejo assim, na época eu entendi que ela queria dificultar a nossa vinda pra cá.
P/1 – A esposa do?
R – Do Antônio. Mas, ao mesmo tempo, eu vi que ela tava querendo nos ajudar.
P/1 – Mas ela era de Pernambuco?
R – Era também, só que eles já tavam se organizando pra voltar, ele tava saindo da empresa na qual ele trabalhava e eles tavam querendo voltar, então ela fazia tudo pra dificultar a nossa vinda.
P/1 – Nice, como que a sua família chegou até São Paulo? Qual foi o primeiro que chegou?
R – O primeiro foi esse Antônio.
P/1 – Foi Antônio?
R – Foi.
P/1 – Foi por causa de trabalho?
R – Porque um primo veio trabalhar numa empresa chamada Rolamentos Fire.
P/2 – Volta desde o começo, o primeiro foi o Antônio.
R – O primeiro foi o Antônio porque um primo convidou, disse que era ótimo trabalhar aqui, aí o Antônio veio, ele voltou lá, casou com essa mulher, conheceu essa mulher e casou.
P/1 – O Antônio trabalhava com o que aqui?
R – Ele trabalhava Rolamentos Fire, uma empresa. Aí o meu irmão veio e ela tipo quis dificultar, que era melhor voltar, que lá a gente não passava necessidade, mas ele tava muito chateado que essa moça não queria namorar com ele, ele não queria voltar, tava muito desiludido, ele queria namorar com essa minha prima. Aí eu vim por conta disso, aí fiquei com ele, por mais difícil que foi eu sempre pensei: “A gente vai vencer”.
P/1 – O que era difícil, morar aqui em São Paulo, o início?
R – Difícil morar, o início, o mais difícil pra mim era as condições de não conhecer nada, é a mesma coisa de te deixar no escuro, eu não conhecia nada, mas eu tinha o meu saber de criança, que eu aprendi com a minha avó, a Maria, nunca esqueço da minha avó, essa aí vai ser eterna.
P/1 – Sua avó materna ou paterna?
R – Paterna, ela me ensinava assim, eu muito criança, eu com cinco anos de idade, ela dizia assim pra mim: “Maria, o aprender”, ela falava assim: “O aprender ninguém tira, é o saber, eu vou te ensinar a fazer tricô, crochê”. Ela fazia crochê, só que ela fazia a linha, pegava algodão e fazia a linha com o birro, isso eu nunca esqueço, e eu aprendi com ela a fazer o crochê e foi isso que em São Paulo fez eu ficar. Porque essa minha cunhada, ela tinha as duas, minhas duas sobrinhas, e eu fazia crochê, vestido de crochê e vendia pra ela, com esse dinheiro eu guardava, servia pra comprar alimentos, junto com o salário do meu irmão, que era pouco. Aí um dia eu falei pra ela: “Existe milagre? Existe e Deus sempre manda um anjo”, isso eu vou falar assim porque foi uma coisa real que aconteceu comigo. Eu fui uma vez com ela em Santo Amaro, aí na segunda vez eu fui com uma vizinha e ela sempre achava dificuldade: “Ai, não posso com criança pequena”, aí eu falei: “Eu vou sozinha procurar emprego”, eu não falei: “Eu vou procurar”, eu falei: “Eu vou arrumar um trabalho. Fui muito criticada por a vizinha: “Ah, as minhas filhas tem estudo, terminou os estudo e trabalha de doméstica, como você vai vir da roça e vai arrumar um emprego? Nem documento não tem”. E eu nem sabia como que era, eu chamava um livrinho, que era a profissional, eu falei: “Eu vou tirar meus documentos e vou”, eu vendi dois vestidos que eu fabriquei de crochê, guardei o dinheiro e fui pra Santo Amaro. Cheguei lá, não sei se era um ser humano ou quem era, eu sei que fui ajudada: “Ah, você tá procurando emprego?”, “To”, “Vamos ali”, aí fui, me ensinou aonde tirar carteira de trabalho, eu tirei. Aí falou: “Ó, tem uma empresa que tá pegando, vamos lá?”, eu falei: “Vamos”.
P/1 – Era uma pessoa, uma mulher?
R – Era uma moça, uma mulher dos cabelos pretos, ela era linda.
P/1 – Você lembra do nome dela?
R – Era Maria, o nome dela ela falou que era Maria, aí eu falei: “Ah, o meu é Maria também”, e eu não sabia como procurar trabalho.
P/1 – Você chegou aonde, no terminal?
R – Não, eu cheguei numa agência, escrito agência, só que eu não sabia nem como perguntar: “Eu quero trabalhar, mas do quê?”, eu não sabia o que era um auxiliar de produção, o que era um ajudante, nada. “Ah, o que você sabe fazer?”, “Eu sei fazer, se me ensinar eu faço qualquer coisa”, ela: “Vamos lá”.
P/1 – Nisso você tava com quantos anos?
R – Isso eu tava com 18 anos, foi, 18 anos, foi comecinho de abril, em março eu tinha completado 18, aí fui com ela, cheguei numa empresa chamada Sintaryc, ali na João Dias. Cheguei lá, ela falou: “Ó, tá admitindo, vamos trabalhar, tem a vaga, vamos”, eu fiz a ficha, ela fez a ficha, as duas foi aprovada, na segunda-feira eu cheguei, to procurando a Maria até hoje, a Maria não existia, não tinha ninguém entrado com o nome de Maria nessa empresa, eu era a única Maria. Aí eu falei, eu fiquei assim: “Sumiu a ficha, é um milagre, alguma coisa?”, trabalhei um ano nessa empresa.
P/1 – Qual o nome dessa empresa?
R – Sintaryc, aí era temporária.
P/1 – O que você fazia lá?
R – Eu trabalhava de operadora de máquina, eu trabalhava nas máquinas, trabalhava na embalagem, eu fazia de tudo nessa empresa.
P/1 – Era uma empresa de?
R – Ela trabalhava com veneno, com perfume, era aerossol, produtos de aerossol, era, e na época tinha uma burocracia, que aí eu não gostava, vim do nordeste, assim, a minha mãe criou a gente, não tinha contato com homem, ela cuidava, vigiava a gente 24 horas, tinha amizade com os priminhos. Mas ela sempre dizia: “Olha, homem, vocês não podem ficar perto de homem”, mas também não dizia o porquê, porque a criação deles não era igual hoje, falar tudo abertamente, mas elas não deixava a gente ter contato com homem. Então, quando eu cheguei em São Paulo, eu tinha só idade e tamanho, mas eu era inocente de tudo, então lá tinha uns chefes que eles diziam, as meninas diziam pra mim: “Tem que sair com o chefe senão não efetiva”. Eu falava: “Ai, eu não vou sair, não, minha mãe nunca deixou eu sair com ninguém, não, não vou sair, não”, mas eu nem sabia o que era sair com o chefe, então eu não fui efetivada nessa empresa.
P/1 – Então havia um assédio?
R – Era, era um assédio, e na época eu era tão inocente que não sabia e também não quis, não fiquei efetiva, trabalhei só temporário porque falava: “Ah, vamos sair”.
P/1 – Você ficou três meses então?
R – Noventa dias e a gente ia sempre renovando. Aí surgiu um outro emprego, aí eu falei: “Ah, eu vou lá”, que foi o Laboratório Dorsay, no qual eu fiquei uns seis anos, fui muito bem recebida.
P/1 – O que você fazia no laboratório?
R – Operadora de máquina.
P/1 – O que era o trabalho lá no laboratório, o que eles produziam?
R – Esse já é, lá é medicamento, fazia o Gelol, vários tipos de produto, Estomazil, vários produtos que a gente produzia lá.
P/1 – Qual era a sua rotina neste trabalho?
R – Eu ia de segunda a sexta, todos os dias, fazia sábado, domingo, se precisasse hora extra, eu trabalhava muito.
P/1 – O dia inteiro?
R – O dia inteiro, porque o meu objetivo era conseguir aquilo que eu vim, não precisava ter vindo pra São Paulo, mas já que eu vim, eu vim, eu falei: “Eu vou vencer, eu vou conseguir pelo menos uma casa pra morar e um carro pra andar”, sempre eu e meu irmão pensando assim. Aí do nada surgiu esse emprego, aí começamos a juntar um dinheiro e assim, do nada, a gente conseguiu comprar um carro, compramos um Maverick, era muito legal aquele Maverick. Só que, assim, o meu irmão era jovem, eu também, a gente não tinha uma cabeça muito, hoje eu penso, a gente fazia muita coisa errada, a gente andava à noite, ele dirigindo e eu e minhas amigas, a gente sentava no capô e ia andando. Inocente, né, porque hoje eu vejo, não, de uns tempos pra cá, não só hoje, quanta coisa errada a gente fazia, hoje a gente vê o jovem fazer isso e diz: “Olha, um vagabundo” e não era, porque na época a gente era totalmente inocente.
P/1 – Você chegou em São Paulo com 18 anos, e os namorados, você chegou a ter lá em Triunfo?
R – Lá eu tinha namorinho de infância, que era aquele namorado que dizia assim: “A gente tá namorando”.
P/1 – Mas você deixou alguma pessoa que você gostava muito lá?
R – Lá a gente gostava, o que, assim, o que a gente mais gostou um do outro, que nos separaram, foi o destino de São Paulo também, a mãe dele, a minha prima Helena, veio pra São Paulo e trouxe ele.
P/1 – Qual o nome dele?
R – O nome é Eronildo, só que é conhecido pro Niuniu, então a gente se gostava muito e a mãe dele trouxe ele embora. Tem até uma história interessante, que ele me deu um punhal, um punhalzinho pequeno, como ele veio embora acabou, eu entendi, acabou, aí eu fui e namorei com outro meu priminho, outro priminho.
P/1 – Isso onde, lá em Triunfo?
R – Em Triunfo, era, eu tinha uns 11, 12 anos, e ele veio embora e eu fiquei.
P/1 – Ele foi pra onde?
R – Ele foi pra São Bernardo do Campo, aqui, meus primos, a maioria, quase todos foi pra São Bernardo do Campo, e esse eu gostava muito dele, a gente se gostava muito. Aí ele veio pra São Paulo, ficou e eu fui, fiquei lá, depois em vim pra Santo Amaro e ele ficou em São Bernardo, só que a gente não tinha contato, a família nossa é assim, tem respeito, mas não tem contato, outro mora em São Bernardo e outros em Santo Amaro, é muito raro se ver. Ele casou, voltou e casou, hoje ele mora no nordeste.
P/1 – Ele voltou?
R – Voltou, casou, tem filhas.
P/1 – Mas ele casou com uma pessoa de lá?
R – De lá também, aí ele foi prefeito lá, de uma cidade pequena que tem lá chamada Santa Cruz, Jatiuca, e a gente não tem contato nenhum, a única, assim, de infância, que eu lembro assim, é esse.
P/1 – E em São Paulo?
R – Ah, em São Paulo foi muito difícil porque, como eu vim com aquela criação da minha mãe, tipo assim, ela fazia um vínculo, tipo: “O homem não pode se aproximar de você”, era muito difícil a criação dela, não era uma, era uma educação diferenciada, então a gente não sabia se o homem era bom ou era ruim. Aí com 18 anos, eu com 9 anos conheci um rapaz em Vaz de Lima, mas meu irmão não deixava a gente namorar, ele queria namorar comigo, mas meu irmão sempre impedia porque ele usava droga. E eu também nem tinha conhecimento, usava droga, pra mim era uma coisa normal, igual cigarro, aí depois eu fui entender: “Não, droga não é uma coisa boa, se fosse não fazia escondido”, aí também não fiquei com ele. Aí entrei nesse laboratório, nesse laboratório eu comecei trabalhar em um setor e o Daniel em outro, foi onde eu conheci o Daniel, namorei, noivei e casei, que é o pai do meu filho, do Danilo.
P/1 – Vocês casaram em que ano?
R – A gente casou em 87, no final de 87, em 88 nasceu o Danilo, em 89, fiquei grávida, aí nasceu o Danilo em 89.
P/1 – O Daniel era também do nordeste ou daqui de São Paulo?
R – Não, o Daniel é de São Paulo, ele é de São Paulo, nascido aqui em Itapecerica da Serra, aí esse foi o, não queria namorar, eu não tinha, assim, namorados por isso, porque eu achava sempre que o que minha mãe dizia tinha o porquê, só não era claro, ela só não dizia o porquê que não era pra gente ter a proximidade.
P/1 – Antes de você se casar você ia pra festas com o seu irmão?
R – Não, a gente só frequentava casa de família.
P/1 – Vocês só trabalhavam?
R – Trabalhava muito, ia na casa da minha tia Rosinha, que é em Piraporinha, a gente ia na casa dessa minha tia e, assim, fomos duas vezes em excursão na praia com uma mulher que trabalhava comigo, que o meu irmão casou com a irmã dela. Essa Zilda, aí através da Zilda, que trabalhava comigo na primeira empresa, que é a Santaryc, aí o meu irmão conheceu a Zefa e casou com ela, aí nós fomos duas vezes na praia. Mas era assim, aquele ônibus cheio de gente, levava comida, era tudo muito estranho, ficava lá, não ficava em nenhum lugar, ficava na praia mesmo.
P/1 – Vocês levavam comida e ficavam o dia inteiro?
R – Levava, ficava o dia inteiro na praia, chegava na madrugada, aí amanhecia o dia, ficava, farofeiro, né, que fala, e vinha embora, só.
P/1 – No mesmo dia, no final da tarde?
R – No mesmo dia, no final da tarde. Não era de balada, não era festa, de curtição, eu nunca fui assim.
P/1 – Você viu o mar a primeira vez aqui no Estado de São Paulo?
R – Foi no Estado de São Paulo, não conhecia.
P/1 – Você lembra da impressão que você teve?
R – Ah, eu lembro, assim, eu lembro e a impressão que eu tenho do mar é sempre muito estranha, desde o primeiro dia que eu vi até hoje, é muito estranha, eu tenho algo errado com o mar, porque sempre que eu vou ao mar eu sou tirada pelos bombeiros. Não tem limite e não é eu que queira, eu aprendi a nadar muito criança, mas se eu por o pé no mar, do nada eu bora nadando, quando eu vejo...
P/1 – Então você já quase se afogou?
R – Sempre os bombeiros me tira porque eu to muito fora, já muito distante, então isso é uma diferença, assim, com o mar, que fez com que eu não goste muito do mar, eu vou, passeio, mas não gosto mais de entrar. Depois que eu tive o meu filho não entrei nunca mais no mar porque eu acho estranho, ele já tem 25 anos, eu acho estranho porque sempre que eu tenho, eu entro no mar, quando eu me dou conta...
P/1 – Já tá longe.
R – Aí uma vez eu entrei em Santa Catarina porque ele entrou e eu vi tipo um negócio assim, parecia um bicho nadando perto dele, eu entrei rapidinho pra puxar ele do mar, em Santa Catarina.
P/1 – Ele tinha quantos anos?
R – Ele tava com 18 anos, rapaz, mas ele não sabia nadar, entendeu?
P/1 – Nice, e a escola, você retomou os estudos aqui em São Paulo?
R – Retomei.
P/1 – Você fez então já a sétima, você terminou até a quarta, né?
R – Isso, aí terminei.
P/1 – Aí você continuou até o ensino médio?
R – Aí fui fazer curso, comecei fazendo curso, curso, aí desse outro trabalho que eu estava, né, que eu te falei que eu saí.
P/1 – Você ficou seis anos no laboratório.
R – Isso, aí casei, tive que sair porque ou o marido ou a mulher ficava, porque lá não podia, tinha uma regra que não podia trabalhar marido e mulher, um tinha que sair, então eu saí, aí entrei na Natura.
P/1 – Como que você entrou na Natura? Você era consultora?
R – Não, eu trabalhei na produção mesmo de medicamento.
P/1 – Produção?
R – Isso, e a Natura foi onde eu, eu agradeço muito aquela empresa, todas, né, mas a Natura foi uma, assim, que me deu muita oportunidade de conhecimento, eu era uma pessoa, assim, muito caipira, da roça, né, bem da roça, sem conhecimento nenhum. E tudo eu achava, se você falasse: “Ó, faz isso”, eu fazia, eu achava que todo mundo a gente tinha que obedecer, eu vim, igual a minha mãe me ensinou: “Obedece todo mundo, senhora, senhor”, então eu aprendi isso e foi difícil. Aí na Natura me deu oportunidade de conhecimento, uma, lá eles ensinam você ser educado, você ser igual, igualdade, a Natura é uma empresa que deixa que você tenha igualdade com todos. Pra começo, os comerciais de lá, todos é feito pelos funcionários, não é contratado um ator, uma atriz, aquelas mulheres bonitas, aquelas senhoras, é funcionária, é sempre alguém de lá. O Cronos, o primeiro Cronos que fez fui eu que fiz o comercial, meu filho era pequeno, era o Cronos Mais, o Danilo era pequeno, quando ele me viu na TV até quebrou minha TV, era tão velhinha a minha TV, ele ainda quebrou porque mudava muito pra achar a mãe dele novamente. É uma história engraçada, que foi eu que fiz, e lá sempre, passava algum produto, e também conhecimento sobre sexo, tudo isso em aprendi na Natura, já muitas coisas que a gente precisava aprender. Mesmo depois de casada eu aprendi muito porque eles ensinam muito, tem muita palestra, muitas coisas, o aprendizado lá é assim.
P/1 – Você trabalhava em qual cargo lá na Natura?
R – Na Natura eu era auxiliar de embalagem, só que depois passei a operadora de máquina e aí cada um tomava conta de um setor porque eram muitas máquinas.
P/1 – Quanto tempo você ficou?
R – Eu fiquei cinco anos.
P/1 – Por que você saiu da Natura?
R – Eu saí da Natura porque eu precisava de um dinheiro pra investir, junto com o meu irmão, pra montar uma oficina.
P/1 – Uma oficina de quê?
R – Mecânica.
P/1 – Uma oficina mecânica?
R – Isso, aí eu acabei saindo, naquela época era muito fácil emprego, ah, saía de um, entrava no outro, aí saí de lá, entrei numa outra empresa, aí fiquei um ano.
P/1 – Empresa de quê?
R – Essa outra empresa, ela é plástico, trabalhava com injetoras de plástico, fazia boneca, fazia panela, fazia tudo que era coisas de plástico. Essa eu não gostei, era uma empresa de José de Abreu, era muito enrolado, eles atrasava pagamento, ninguém pode atrasar pagamento porque trabalhar, eu amo trabalhar, agora, se não pagou no dia certo, eu vim, fui embora. Aí nessa época eu saí e entrei nessa, no Laboratório Tortuga, onde fiquei 17 anos.
P/1 – O que fazia no laboratório?
R – Esse é produto agrário. Aí foi aí onde começou a minha história, que eu trabalhei, aí fiquei com problema de saúde, me afastei, fui pra previdência, onde eles acho que não serve mais, me demitiram.
P/1 – Mas o que você fazia lá, também embalagem?
R – Lá eu trabalhava como operadora de máquina e sempre todos os serviços, como sempre, eles te dão um registro na carteira e o restante, o restante das coisas você faz, o chefe falta, você fica no lugar e assim eu fiquei.
P/1 – Assumindo outras atribuições?
R – Outras atribuições, outro tudo. Aí o bom do aprendizado, eu passei a fazer parte, chamava Projeto SOL, que é segurança, ordem e limpeza, que o Rios, que entrou na área de segurança, aí fiz parte do grêmio, comecei fazer parte do grêmio. Foi onde comecei a aprender muita coisa, fazer festas, eventos, chegamos a organizar eventos pra cinco mil pessoa, a Casa Davi, que eles também apóiam, que essa empresa, eles têm os projetos muito bacana, igual do HIV, são histórias muito bonita, que tem muito apoio, eles apóia muito.
P/1 – A empresa tinha um projeto social?
R – Tem um projeto social, aí esse a gente fazia os eventos dos grêmio, sempre fazendo festa, aí eu aprendi, me interessei mais ainda pela parte de alimentação, quando eu fiquei doente, que eles me demitiram.
P/1 – O que você teve, Nice?
R – Eu tive lesão no rotador do manguito, que é esse ombro, a perda foi de 50%, constatada pela previdência social.
P/1 – Nice, você tava comentando a sua lesão que você teve.
R – Isso, aí eu fui demitida em 2004, só que quando fui pro exame demissional eles colocara inapta, aí eu tive que retornar, aí mandaram um telegrama, né, pra que eu retornasse ao trabalho. Só que eu não retornei porque eu fui pra previdência, aí já fiquei afastada, isso, entre vai e volta eu fiquei sete anos afastada.
P/1 – Sete anos, mas você chegou a fazer algum tipo de trabalho?
R – Não, eu ficava afastada, não, nessa época que eu fiquei afastada eu ficava fazendo cursos.
P/1 – De quê?
R – Eu fiz todo tipo de curso, fiz culinarista, fiz de montagem de bufê, de coffee break, fiz de embalagem, embalagem de balões, eu sempre fazendo curso, porque a minha restrição, eu tenho como, esse braço não tem como levantar, o máximo é isso aqui, se começar a levantar mais dá uma tremedeira, aí o que eu posso fazer. Aí fiquei um ano e meio fazendo fisioterapia, a empresa também cortou convênio e as fisioterapia a gente faz em casa, igual eles ensinaram, tem que limpar todos os azulejos e todos os movimentos fazer assim e sempre carregar algum peso, porque deu, colou, deu capsulite adesiva, então.
P/1 – E a empresa não indenizou?
R – A empresa sempre deixando, achando que não é nada, não é nada, aí eu entrei na justiça, consegui, né, na justiça, pra que eles reparassem o dano, na previdência também o laudo foi favorável, 50% de perda. Que até o pessoal fala: “Quem olha pra você assim não imagina que você é doente. Que doença tem você?”, porque a lesão é no braço, o braço tá assim, não caiu o braço, porque aqui no Brasil você tem que perder uma peça pra poder dizer que é aleijado. Consegui, o único órgão que reconheceu de imediato foi a SPTrans, ela me deu a carteirinha de deficiente no primeiro mês, eu tenho essa carteirinha e to aguardando o resultado desse, do INSS, porque vai pra primeira, vai pra segunda, e a advogada tá vendo, mas foi a causa ganha. E a empresa, eu fui, passei lá também, aí veio um erro de digitação, voltou pra, em fevereiro, e até hoje to esperando a juíza consertar esse erro, um erro de escrita que eles tiveram lá, aí to aguardando aí. Enquanto isso eu não vou, não fiquei parada, aí comecei, com a ajuda do pessoal eu não paro de trabalhar, assim, no que eu posso, no meu limite, porque, igual mesmo o médico fala, fisioterapeuta falou pra mim: “Se você parar você vai aleijar, vai atrofiar de vez, então o que você puder vai fazendo”. Tipo assim, mexer uma comida, alguma coisa, eu não faço esforço repetitivo, eu tenho, assim, tipo que uma mordomia entre todos, mas eu não paro, aí comecei e, assim, aprender e ensinar pros demais.
P/1 – Nice, como que apareceu esse interesse pela culinária, já que você tava trabalhando desde então sempre na parte de embalagem?
R – Isso, sempre remunerada mensal.
P/1 – E não na área, vamos dizer, da culinária, da gastronomia. Como que surgiu esse seu interesse?
R – Bom, surgiu assim, a primeira vontade que eu tive de trabalhar com comida foi quando eu fiz, aprendi fazer com a minha cunhada um ovo de páscoa, aí levei pra empresa e vendi, todos que eu fazia eu vendia, eu falei: “Nossa, então é legal”, isso eu ainda tava, já quase nos últimos anos de sair da empresa.
P/1 – Do laboratório?
R – Do laboratório. Aí tudo que eu aprendia a fazer nos cursos que eu ia, tanto gratuito como pago, porque onde tem um curso eu vou, não tem distância nem horário, falou que é um curso, é um aprendizado, eu corro atrás mesmo.
P/1 – Curso voltado a doces, né?
R – Tudo voltado a doce, eu amo doce. Aí o primeiro curso que eu fiz foi um curso da ONU, porque tinha um padre aqui, Padre Juarez, muito bom, ele trazia muita coisa pro bairro, que esse bairro aqui era muito perigoso. Então aí o Padre Juarez trouxe um curso da ONU, que na escola, o meu filho era pequeno, estudava aqui no Samuel, ele falou: “Mãe, tão fazendo curso de fazer comida, vai lá”, aí eu fui, fui com ele lá, fiz a inscrição, e era um curso de salgado de seis meses. Então eu fiquei, fiz esse curso de seis meses pela ONU, recebi certificado, foi super bacana, em Itapecerica, num estádio, aquele estádio lotado, e a gente com aquele stand enorme e tudo produto fabricado pelas alunas mesmo, foi bem gratificante. Aí eu já comecei a me interessar, mesmo no laboratório, eu pensando de meu filho não ser empregado, ser patrão, eu sempre pensei isso, sempre tive um sonho, meu filho não pediu pra vir ao mundo, eu vou fazer o possível pra que ele nunca seja um empregado, ter que ta batendo cartão. Aí eu fiz esse curso pensando nele e ele, quando chovia forte, alguma coisa, eu levava ele, ele ficava na sala de aula, lá do cantinho, me esperando até 11 da noite, eu trabalhava até às cinco, chegava aqui seis e pouco e ia com ele pra esse curso.
P/1 – Nice, como você fazia pra trabalhar e cuidar do seu filho? Seu marido também trabalha, né?
R – O pai dele, eu era separada, eu separei, ele tinha cinco anos de idade, aí eu criei ele sozinha, com a ajuda de Deus e das famílias, e, assim, a criação que eu aprendi com a minha mãe eu passei pra ele, o que os meus pais me ensinaram eu passei pra ele. Criei ele na periferia, ele com dez anos de idade, com sete anos ele ainda mamava mamadeira, ele mesmo fazia a mamadeira dele, ele se arrumava, tomava banho e ia pra escola. E com dez anos ele já, eu já tinha, ele já ia no banco, pagava conta e fazia tudo, sempre de dentro de casa pra fora, com 17 anos e meio foi quando ele começou a ir na casa de um amiguinho, ir passear em algum lugar.
P/1 – Você tinha esse cuidado.
R – Administrava tudo isso de longe, sempre pedia pro vizinho.
P/1 – Então era o vizinho que olhava?
R – Olhava, era, e, assim, ele dentro de casa, aí comprei um microondas pra ele mesmo esquentar a comida dele, pra não mexer com fogão, sempre cuidei muito dele assim e sempre um vizinho cuidando e, graças a Deus, teve um bom resultado.
P/1 – Você sempre morou aqui então?
R – Eu vim pra aqui tem 20 anos, eu já morei em tudo quanto é lugar, morei em Parque Santo Antônio, eu morei no Vaz de Lima, tudo lugares considerados mais perigosos e de tráfico, de tudo, que o pessoal sempre falando, Jardim Lídia, ali tudo na região do Parque.
P/1 – Você escolhia esses lugares porque tavam próximos da família também?
R – É, era porque sempre tinha um parente perto, uma família, era casa de alguém indicado, que tivesse alguém que cuidasse dele pra mim. Aí eu chegava em casa, eu fazia crochê, tricô e sempre fazia comida, aí o que eu aprendia eu ia pondo em prática, aí aprendi a fazer o salgado, eu levava e vendia pras colegas de trabalho, e assim fui criando o meu filho. Aí quando foi, eu tinha ficado afastada e retornei ao trabalho, aí eles, eu vi que já não era mais a mesma coisa, eu não era aquela funcionária igual era antes, eu vi que eu ia ser demitida porque eu já não era, não tava mais adequada pros padrões que eles queria, aí eu resolvi começar a trabalhar. Aí minha irmã Isabel engravidou de um rapaz que eu nem conheci, não assumiu e eu fui ajudar ela, ela foi demitida também, aí eu falei: “E agora, o que que a gente vai fazer?”, aí foi onde comecei por em prática, aí eu falei: “Agora vou por em prática”. Eu no laboratório, aluguei um espaço que chama Pop Shop Santo Amaro, esse daí foi um dos lugares que ajudou muito a gente.
P/1 – Você comprou então uma...
R – Não, aluguei um espacinho quadrado de três metros, comprei um freezer usado, um balcão de refrigerado, e minha irmã começou a vender cocadinha no Brás, primeiro ela começou vender cocada numa cestinha, ficava com aquela criança. Eu falei: “Não, Bel, vamos alugar um espaço pra gente montar um comércio”, ah, fiquei toda empolgada, era um comércio, aí tinha as prateleiras, eu falei: “Vamos fazer”, aí ficava eu e o Danilo, o Danilo já fazia bolo, já fazia tudo, ajudava: “Vamos fazer”, a gente fazia, levava e colocava lá pra vender.
P/1 – O que vocês faziam?
R – Fazia bolo, cocada, fazia todo tipo de chocolate, bombom, trabalhava, o que vendia bastante lá eram os kits eróticos de chocolate, nossa, era uma novidade.
P/1 – Como que eram esses kits eróticos?
R – Os kits eróticos é a parte feminina e a masculina, só que em formato de chocolate, e lá a gente colocava nas caixinhas de papel e era fechado porque não podia, colocava lá fechado e encomendava. Os nossos clientes que deu, assim, a maior força era o pessoal da Santa Casa, tinha os médicos, aquelas enfermeiras, eram nossos clientes, aí eu falei: “Ah, então vai dar certo, se o público, né, a classe média alta gostou então vai dar certo”.
P/1 – Como vocês chegaram até eles?
R – A gente chegou porque essa minha irmã vendendo cocada naquela cestinha e na época não podia vender na rua, o pessoal tomava, a fiscalização, essas coisas, aí ela chegou e falou pra mim: “Ô, Nice, tá alugando uns boxes, vamos lá ver?”, aí nós fomos. Chegou lá, tinha o organizador que vendia, chamava Dalton, nossa, esse homem foi uma benção na nossa vida, ele nos ajudava em tudo, aí alugou e ajudou muito, incentivou e a gente acabou entrando assim, do nada.
P/1 – Mas isso lá no Pop Shop?
R – No Pop Shop.
P/1 – Como que esse pessoal do hospital chegou até vocês?
R – Porque é um galpão em frente à Santa Casa, aí lá vendia roupa, era assim, digamos, um Brás, que vende de tudo, tinha comida num box, no outro lado tinha CD, no outro lado tinha roupa e assim, tudo junto, box separado, mas vendia de tudo, aí foi assim que eles chegaram até nós pra comprar, ia visitar pra ver e começava a comprar ali, gostava do produto, ia vendendo.
P/1 – E a ideia do kit erótico, como surgiu, vocês viram em alguma revista, foi algum curso?
R – Eu fiz um curso de trufa e lá eu vi a forma erótica, eu falei: “Isso aqui deve vender bem”, aí já vendi bolos, vendi tudo, tudo o pessoal pede, porque uns pedem pra zoeira, outros pedem pra levar de presente, porque quando tem aquela pessoa no aniversário, sempre tá esperando um presente, quando vê aquela coisa, é um impacto que leva. Aí tem um pessoal de uma rede de supermercado que ela compra pra zoar, eles levaram numa churrascaria, chegou lá com aquele bolo, com aquele, aí vende em bolo, em tudo, aí foi legal. Aí quando, o meu filho levava, até então eu tinha tirado habilitação, só, mas...
P/1 – Você tinha carro?
R – Não, nós andava de perua, de ônibus, você não tem noção, chegava encomenda de bolo decorado, com rosas, que a gente trabalhou com as rosas, chama rosas vitorianas, é uma rosa, parece uma rosa natural, de chantilly, eu decorava esses bolos aqui, o meu filho pegava, subia, ia sentido contrário, pro final, pegava uma perua e ia pra Santo Amaro entregar, levava tudo. E aí foi, a gente foi começando a gerar uma renda legal, quando foi um dia, e eu bem tranquila, sabe, quando você tá, aí um dia ele foi levar um bolo, ele fez com o maior carinho o bolo, quando chegou lá o bolo passou pelo outro e caiu, perdeu esse bolo. Sabe, assim, uma mãe? Eu virei uma heroína, eu falei: “Não, não vou deixar meu filho passar mais por isso, vou fazer alguma coisa”, aí o dinheiro que eu tinha pego da previdência, eu tomei uma atitude, assim, né, de, tipo de desespero: “Ah, eu quero e eu vou fazer”. Tinha um leilão aqui na Guido Caloi, meu irmão foi lá fazer a visita junto com o Danilo, chegou lá, visitou, olhou os carros, tudo, achou bonito o Palio, na época um Palio do ano, era 2000, aí chegou lá, viu aquele carro, achou bonito, falou: “Vamos lá. Olha, eu gostei desse carro, vamos lá”. Aí fomos, na época tava com sete mil, é, seis mil e pouco, e vendeu a sete, acabei arrematando por sete, aí chegou lá, eu falei: “Vou comprar um carro”, peguei todo o meu dinheiro que eu tinha e fui lá no leilão, chegou lá, bati o olho, eu falei: “É esse o carro que eu quero”, Danilo tava com 17 anos e meio: “É esse que eu quero”. Arrematei o Palio, tinha eu e uma mulher no lance e eu arremetei, quando a gente vinha, eu entrei no carro do meu irmão, aí foi que veio o problema: “Você olhou o motor do carro? Você olhou, Niuniu?”, “Não” “Você olhou, tio?”, “Não”. Pensa o desespero, o único dinheiro que você tem, você compra o carro, não sabe nem se tinha motor, aí dei muita sorte, esse carro, assim, deu muita sorte pra nós.
P/1 – O carro era bom então?
R – O carro era bom, faltava poucas peças, aí o meu irmão mesmo arrumou, comprei umas peças, eu mesma, eu não fui, os despachantes, eu não fui atrás de despachante, eu fui no Detran umas cinco vezes, falta uma nota fiscal, falta isso, consegui, arrumei tudo e comprei o Palio. E agora pra dirigir, e pra dirigir esse carro?
P/1 – Você tinha carteira?
R – Tinha carteira, mas não tinha prática, não, o carro é meu, vou dirigir, só que, assim, eu sempre fui uma pessoa muito calma e nunca gostei, assim, de, eu acho assim, todo mundo passou por alguma coisa, você hoje pode ser uma jornalista, mas você um dia já foi uma estudante, tá entendendo? E eu sempre pensei assim, o motorista, ele um dia não soube passar, o que é a embreagem, não sabe nem o que é embreagem. Aí fui buscar, meu irmão levou o carro, tava na oficina, tava tudo bom: “Agora vamos embora”, quando eu venho com o carro, quem falou que eu conseguia, a embreagem, o carro não ia de jeito nenhum. O cara atravessou o carro: “Pô, não sabe dirigir, deixa o carro morrer”, eu falei: “Não, o carro só desligou”, bem calma, olhei pro motorista e falei: “Não, ele não morreu, ele só desligou, quando eu ligar ele vai ligar, tenha calma”, ligava e não conseguia sair. Meu irmão desceu, atravessou o carro dele, colocou, fez o carro funcionar, aí depois, com umas três, quatro vezes que eu peguei o carro eu consegui, consegui dirigir direitinho, mas aí também não fui sair por aí dizendo: “Eu dirijo”, fui numa auto-escola, peguei um capacitado, me ensinou, dei as voltas, andei, eu falei: “Agora eu posso andar”.
P/1 – Você andava por aqui?
R – Andava, fui lá, andava pra todo lugar, mas até hoje, eu já fui até o Recife dirigindo, mas eu sempre digo: “Ainda to aprendendo”, hoje eu dirijo, ainda to aprendendo. Aí comecei a dirigir, aí ficou super bacana, colocava as minhas coisas, ia lá levar no Pop Shop, me sentia assim, sabe, vitoriosa, eu falei: “Graças a Deus, eu consegui e vou conseguir mais”. Aí o meu filho tirou habilitação, logo em seguida, ele dirigiu uma vez só sem habilitação porque era muito bolo pra entregar e ele pediu o carro: “Ai, mãe, deixa eu ir lá”, já tinha deixado ele aprender numa auto escola, aí ele foi, entregou esse bolo, ficou todo feliz. Mas a gente trabalha, assim, com bastante cautela com tudo porque não é fácil criar um filho na periferia, ainda o meu filho é de cor escura, não é branco, aí tudo isso, a gente fica, os outros fica falando, é muita perseguição, aí: “Ah, o filho de fulano tem carro, mas não trabalha”. Tudo hoje a gente tem e ele hoje é um menino, assim, muito elogiado, não por ser meu filho, mas as atitudes dele são muito boas, trabalha.
P/1 – Sempre ajudando no negócio.
R – Sempre trabalha, porque assim, quando a gente faz uma encomenda sempre diz: “Ah, é a Dona Nice, é a Nice que faz” e na verdade é ele e o Igor, é o Danilo e o Igor que são realmente aqueles da mão na massa mesmo, que desenvolvem receita, que corre atrás, que decora, que faz bolo, faz tudo.
P/1 – Nice, quando você começou lá no Pop Shop vendendo cocada, os doces, era que ano mais ou menos?
R – Foi em 2000 e, por volta de 2003 mais ou menos.
P/1 – Aí o negócio foi crescendo.
R – Foi crescendo.
P/1 – Você começou a pegar encomendas pra bolo.
R – Isso, pra bolo, pra festa, aí do Pop Shop o que acontece? Começou a crescer, aí vinha encomenda, vinha encomenda, aí eu falei: “Olha, eu vou sair do aluguel”, aí na minha casa tem uma garagem, eu falei: “Ai, vamos montar na garagem”, aí meu marido muito, meu marido, assim, ajuda muito a gente nisso.
P/1 – O seu marido atual?
R – Que eu casei novamente, isso, aí eu casei.
P/1 – Você casou quando?
R – Tem 12 anos que eu casei, aí o Danilo já era um rapazinho já. Aí ele fez umas mesas que abre e à noite fecha pra por o carro, colocou prateleira, ficou muito bom, aí a gente mudou pra garagem de casa, aí compramos vitrine, aí ficou bem bonito.
P/1 – A sua casa é casa própria?
R – Minha casa é própria. Aí começamos a vender, vender e era tudo, assim, muito bom, aí quando foi uns três anos atrás, aí a minha amiga que trabalha com salgado, eu falei: “Olha, pra gente trabalhar com doces e salgados junto não dá”, aí essa Léo juntou-se comigo pra gente trabalhar junta, aí alugamos esse espaço.
P/1 – Aqui?
R – Aqui do lado, que é um salão aí do lado. Aí ela acabou que tem uma netinha, não dava pra ficar, mas foi aí aonde eu conheci o Consulado da Mulher, foi através dessa Léo, porque ela conheceu o Alessandro, viu escrito Consulado da Mulher e ela é aquela pessoa, assim, curiosa, tudo ela pergunta, ela é uma fofa. Aí ela perguntou o que significava, o Alessandro falou: “Olha, o Consulado da Mulher é um projeto social da Cônsul”, aí explicou tudo pra ela, ela falou: “Ah, eu tenho uma amiga que vai se encaixar perfeito”. Aí conversou comigo, aí marcou, foi quando o Alessandro veio conhecer.
P/1 – O Alessandro então veio aqui?
R – O Alessandro veio, aí conversamos, aí falou assim: “Ó, vamos fazer um, vamos conversar, vamos conversando, vamos ver o que pode fazer”, aí ele marcou um café, coffee break pra gente fazer, foi o primeiro coffee break.
P/1 – Onde?
R – Foi no Paraisópolis, entendeu, lá no Paraisópolis porque tem um empreendimento, chama Ambrosia, que também era assessorado pela Cônsul, aí, pra conhecer o nosso trabalho, ele contratou um coffee break com a gente, aí fomos fazer um coffee break lá. Na época foi até interessante, eu costumo dizer que do antes, do primeiro coffee pra hoje tem uma diferença muito grande, porque o primeiro coffee, esse lá, era muita gente, era uma palestra, foi um coffee bem bacana.
P/1 – Era um coffee pra uma palestra do Consulado?
R – Do Consulado, que eles iam fazer uma apresentação e a gente foi, fez esse coffee. Aí depois ele, pra pegar uma confiança no nosso trabalho, eu acho que, assim, pra conhecer, aí contratou um coffee que fomos fazer, eu costumo dizer pra eles que parecia um mendigo, gente, você não tem noção, levamos tanta sacola (risos), muita coisa, muita, sabe, assim.
P/1 – Quantas pessoas mais ou menos estavam nesse coffee?
R – Esse foi de 50 pessoas, era uma média de 50 pessoas, não era muita, mas a gente levou muita coisa.
P/1 – O que você prepararam, você lembra do menu? Nice, você tava comentando antes do primeiro coffee que vocês pegaram com o Consulado.
R – Aí nós chegamos lá, o Alessandro com o maior carinho, porque o Alessandro é muito detalhista, né, que é o meu assessor, ele desde o começo, e o Alessandro, ele procura deixar a gente à vontade, mas ao mesmo tempo fazer com que a gente entenda que é nós que tem que fazer. Aí aquele tanto de coisa, na hora a única ideia que eu tive foi de por embaixo da mesa, jogar tudo embaixo da mesa, colocar a toalha, ficou tudo lindo, perfeito.
P/1 – Vocês tavam com várias sacolas.
R – Várias sacolas, tinha as garrafas, umas garrafas negrona de café, não era feia, mas não era, assim, tão adequada pro um coffee pro porte que a gente serve, né, aí nesse caso deu tudo certo. Mas aí logo em seguida veio as doações, aí já não tinha mais os descartáveis, já doaram louças, os cristais, as garrafas, que são essas daqui, igual tá aqui, garrafas térmicas com inox, tudo bonito, aí melhorou.
P/1 – Quem doou foi o Consulado?
R – Tudo o Consulado doou. Aí também já veio a doação das bolsas térmicas, porque a gente também, tinha o conhecimento, mas não tinha as condições, não adianta você ter o conhecimento se você não tem as condições, se eu sei que eu tenho que levar refrigerado. O que que a gente fazia? Pra trabalhar com alimentação de qualidade a gente sempre trabalha com os salgados frios, porque eu mantenho congelado, chego no local, ela vai tá ambiente, então o risco de contaminação é bem menor.
P/1 – Vocês ganharam eletrodomésticos?
R – Ganhamos todos os eletrodomésticos, aí na época também, eu tinha uma geladeira, inclusive é essa geladeira, que nem pode tá aqui, que é de um concorrente, foi o meu marido que comprou, ela é doméstica, ela é de casa, e eles doaram os freezers, geladeira, que são essas geladeiras, inclusive tem essa ali que é de inox. A gente comprava frios fatiados, não sabe como é feita a higienização, foi doado também, a gente ganhou também um, esse cortador aí, o grande, ele foi uma doação da Petrobrás, que foi a Fundação Getúlio Vargas, que doou várias coisas também pra gente, fomos beneficiados por eles.
P/2 – Vamos voltar na parte da doação.
R – Então, aí começamos com as doações, fomos beneficiados pela Cônsul, o Consulado da Mulher doou freezer, geladeira, todas as louças, talheres, os copos de cristais, taças, jarras, tudo a gente ganhou pra ter um coffee bacana, as bandejas, tudo.
P/1 – Isso vocês que solicitaram ou eles, o Alessandro?
R – Não, o Alessandro.
P/1 – O Alessandro conseguiu o que vocês precisavam.
R – Isso, na assessoria ele observou que a gente necessitava desses, disso pra melhorar o nosso trabalho. Aí quando foi das próximas vezes que fomos, aí já foi um coffee, nossa, você nem imagina, aí fizemos coffee pra FIAP, que é um Faculdade de Engenharia da Lins de Vasconcelos, é assim, bem, foi um dos coffee muito importante, muito mesmo.
P/1 – Por que foi importante?
R – Foi importante porque, assim, quando você chega, dizer assim: “Eu fiz um coffee numa faculdade”, igual a gente fez pra FGV, pra Fundação Getúlio Vargas, pra FIAP, então, não pelas pessoas, é pelo nome, o nome que se leva, igual, eu fiz evento pra Record na UniÍtalo. Então, quer dizer, quando usa o nome tem um peso, isso tem, porque tem cliente que vem e fala assim: “Você faz salgado, você faz doce?” “Faz, tá aqui o meu docinho”, você põe num pratinho e dá, a pessoa come e gosta do produto, já outros não, gosta do nome, pra quem você serviu, quem é seu cliente. Já fiz pro Banco Itaú, já fiz pra várias empresas assim, aí nessa assessoria do Alessandro a gente ganhou, aí conhecemos a Fundação Getúlio Vargas, também é uma incubadora, que tem a Cristiana, o Zé Luis, que foram, nossa, excelente pra gente, teve muito aprendizado, muito.
P/1 – Eles também deram curso?
R – Eles também fizeram muita assessoria, inclusive a gente foi até o SENAC, que é aquele que eu havia comentado com vocês, onde eu aprendi que a mídia é importante, a Internet, mas às vezes também tem muitas coisas, muitos erros que a gente visualiza, entendeu? É um veículo importante, mas que a gente precisa, assim, eu mesmo, se eu publicar alguma coisa na Internet ou na mídia, eu vou publicar o que é meu, o que eu fiz, e que eu responda por ele e que seja correto, entendeu, porque eu acho que a gente tem que ser honesto. Aí ganhamos essas doações, ganhei fogão, ganhamos os carrinhos, também a gente carregava muitas sacolas na mão, eles doaram os carrinhos, que são super bacana.
P/1 – Esses carrinhos pra fazer a venda?
R – É tipo uma prancha, pra gente chegar até o local, um exemplo, quando a gente faz, tem alguns lugares que tem restrições de horário, igual no campi, é o centro administrativo da Whirlpool, a gente não tem como subir no elevador, depende do horário. Aí aqueles carrinhos vai fechado, aí chega lá, você abre ele, enche de coisa, fica bem tranquilo, evita carregar peso e também coloca tudo, fica bem organizado e também dá um conforto maior pra gente.
P/1 – Nice, falando de nome, de vocês ganharem nome a partir desses contatos aí, essa oportunidade de oferecer o produto de vocês pra essas empresas ou instituições, o nome do empreendimento de vocês, desde o início, do Pop Shop a agora?
R – O nosso sempre foi Doceria Diamante.
P/1 – Por que esse nome?
R – Esse nome escolhemos entre quatro nomes, ficamos em casa, eu, a Bel, o Danilo, o Igor, cada um falando um nome, aí o Danilo falou Diamante, aí todo mundo: “Por que Diamante?”, “É porque o diamante brilha pra todo lado, se você pegar um diamante, qualquer lado que você rodar ele vai brilhar”. Aí a gente escolheu Diamante, foi ver, realmente não tinha nenhuma Diamante por aí, ficou Diamante.
P/1 – Vocês registraram desde o início?
R – Desde o início é Doceria Diamante.
P/1 – Vocês tem personalidade jurídica, CNPJ?
R – Não, a gente ia fazer com a Diamante, aí foi onde surgiu que a gente precisava de CNPJ, aí abriu o MEI, só que quando, tem o Igor, que eu tenho um filho também, que esse meu filho, o Igor, ele veio com 16 anos pra mim, é, agora ele tem 25, os dois tem a mesma idade.
P/1 – Como que ele veio, o Igor?
R – O Igor, ele é primo do meu filho, do Danilo, então ele, é uma história bem bacana, quando era bebê ele era, vivia junto, no mesmo quintal, os dois primos.
P/1 – Ele era filho de quem?
R – Ele é filho do irmão do pai do Danilo, o irmão mais novo, aí nisso foi a mesma história praticamente que a minha, não deu certo os casamentos, nem os dele nem o meu, aí os dois ficaram separados, só que eu também amamentei o Igor quando era criança. Aí o destino separou, eu fui criar o Danilo pra um lado e a mãe dele criou ele pro outro, aí ele ficou com a avó, até dez anos com a mãe, de dez anos aos 16 ficou com a avó, dos 16, começou muito visitar o primo, que é o Danilo, e os dois se gostam muito.
P/1 – O Igor tem quantos anos?
R – O Igor tá com 25 também.
P/1 – Ah, eles têm a mesma idade.
R – É, um completa em janeiro, o outro, nove meses mais ou menos, aí eles se gostam muito, aí veio, acabou, vinha o fim de semana, vinha o fim de semana, aí começou ficar meio que, repetiu de ano lá na escola, eu falei: “Ó, então vem ficar aqui”, aí ele ficou com a gente. Eu tenho, assim, o mesmo amor por ele do Danilo, só que hoje, assim, na aparência, na sociedade onde anda, ele é o meu filho biológico, pela cor, em todo lugar, se chegar os dois, aí fala: “Ah, falei com seu filho”, entendeu. Eles se dão muito bem e também os dois trabalham junto, tem o mesmo, caminha junto, pro mesmo sentido.
P/1 – Os dois trabalham também na Doceria Diamante?
R – Os dois, aí foi quando foi pra abrir o registro do CNPJ, foram os dois, os dois foram juntos fazer, aí tinha que ter dois nomes, aí o Danilo colocou a razão social do dele Danilo Guerra, aí ficou a Padaria Danilo Guerra, aí o Igor Doceria Diamante, entendeu?
P/1 – Mas vocês têm uma padaria?
R – O registro do CNPJ é como padaria.
P/1 – É como padaria?
R – É padaria, entendeu.
P/1 – Você tava falando do Igor e do Danilo, seus filhos, qual a função que eles têm na Doceria Diamante?
R – O Igor, ele é mais a parte de comida, nossa, ele desenvolve vários tipos de comida, todas que ele faz é muito bem aceito, cada vez que ele manda uma novidade lá pra cafeteria aí vem os elogio, aí ele vai, desenvolve outro tipo de comida, e, assim...
P/1 – Quais, por exemplo?
R – A que o pessoal gostou muito, muito mesmo, que tem aquilo: “Ai, mas nesse local vai se vender”, o feijão preto, nossa, o feijão preto dele todos que vai vende, e também o filé de frango à parmegiana, e tem uma berinjela recheada que ele faz que, olha, essa é, essa também é muito elogio, muitas, todos, não tem uma que ele faz. E o Danilo é, assim, é mais a parte de confeitaria e salgados, eles vão bem em tudo, eu costumo dizer, o pessoal diz que é dom, não, é querer, porque eles, às vezes eles me surpreendem, tem coisas que eu acho que eles não sabem nem fazer, quando eu chego tá tudo feito. Às vezes eu viajo pra algum lugar e tem encomenda de bem casado, de tudo, ele faz e tira foto, você vê perfeito.
P/1 – Você tinha comentado com a gente antes de alguns produtos de vocês, né, criações da Diamante.
R – De desenvolvimento, isso.
P/1 – Você comentou de um doce.
R – A Barrinha Diamante.
P/1 – Que barrinha é essa?
R – Essa Barrinha Diamante começou assim, a cafeteria quem administrava era um grupo do Heliópolis, Sabor e Saúde, essa que hoje é na Berrini, é lá no Centro Administrativo, então precisava de outros grupos fornecer, porque a intenção do Consulado sempre foi montar uma rede de economia solidária. Cada um tem o seu empreendimento, mas precisava montar uma rede, pra montar uma rede teria que cada um fornecer um pro outro, pro mesmo lugar. Igual quando vai fazer coffee, a gente pega um produto de um, um produto de outro e monta um coffee, é a mesma coisa, ou os grandes eventos, a gente junta todo mundo, Baixada Santista, e faz um belo de um evento. E nesse caso precisava fornecer algum produto, aí tinha que fazer algum produto desenvolver um produto que fosse diferenciado, pra você ter um diferencial você tem que ter um produto teu, não adianta chegar na internet, pesquisar, ou ir ali no livro e dizer: “Eu vou fazer isso”. Como eu vou dizer que é meu produto? Aí eu fui, tinha alguns doces que eu já fazia, caramelizado, tinha algumas coisas, eu falei: “Ai, não, eu vou fazer um doce, que é pra um lugar nobre, eu vou por frutas nobres”,aí foi onde eu juntei o damasco, o cacau, nozes e a uva passa e fiz o doce, que é a Barrinha Diamante, e é um doce, assim, que todos que comem gostam, até hoje não houve uma restrição com esse doce. E também tem aquele truque da barrinha, ela é banhada no chocolate, só que quando ela não é banhada no chocolate as pessoas consomem mais, porque ela é, o sabor das frutas secas...
P/1 – Fica mais em evidência.
R – É, cada vez mais você como mais você quer comer, aí a gente coloca uma banhada com chocolate, é um docinho, uma barrinha bem bacana, e essa foi desenvolvida por nós mesmo.
P/1 – Por vocês?
R – Por nós. Aí bolo, a gente tem vários tipos de bolo, bolo, bolo, mas sempre onde você os bolos é as mesmas receitas, aí agora tem também, a gente desenvolve um bolo, eu desenvolvi um bolo de laranja. Porque os nossos bolos, os nossos trabalhos, a gente procura trabalhar com padronização, isso é uma meta da diamante e a gente tem isso assim, se alguém disser, você tiver uma reclamação pra fazer, é impossível porque é pesos e medida. Todos os bolos nossos, se você pedir um bolo de cenoura, os cem bolos de cenoura vai a mesma cor, porque é misturado toda a cenoura pra poder dar a mesma cor, aí nesse embalo da cenoura a gente fez o de laranja, o de limão e ontem o Igor desenvolveu esse de maçã. Esse é uma receita nova dele, porque as outras receitas são todas padrões, não sei se você chegou a experimentar, ele tem um diferencial, que não é aquele tanto de maçã, a gente faz mais pra diferenciar um pouco os nossos produtos.
P/1 – Nice, pra entender um pouco como que funciona a rede, né, que é aí assessorado pelo Consulado, vocês se reúnem pra fornecer os produtos ali pra determinados espaços, cafeterias, que você tava comentando aí da Berrini. Agora, como que é a questão da divisão dos lucros?
R – A rede de economia solidária é assim, cada um tem o seu empreendimento, alguns trabalham exclusivo só pra rede, outros não, eu já tinha a minha Doceria Diamante, então foi com a ajuda do Consulado, melhorou muito, muito, a gente de 99%, a gente, de melhoria em tudo, tanto pras vendas, posto de venda, pra tudo, hoje a gente tem contratos fechados com grandes empresas, igual a Covidien, a gente tem contrato com entrega de salada de frutas. E, assim, a rede, pra se chamar uma rede, porque era assim, cada um seu empreendimento, a Ambrosia fazia um café, ia só a Ambrosia, a Diamante ia fazer um café, ia só a Diamante, então o lucro da Diamante do café seria dividido entre nós. Agora não, é diferente, a rede tem os empreendimentos, hoje a cafeteria tá lá, eu to com a cafeteria administrando, tipo assim, entre aspas, eu tenho as pessoas que tá lá, só que lá pessoas que fornecem da Padre Leal Comissário, que é um empreendimento que também é assessorado, que é em São Bernardo do Campo, tem do Mulheres do Capão, também eles fornecem produtos pra nós, e tinha também uma companhia de Guarulhos, que é de Guarulhos também. Aí funciona assim, a divisão de lucro é feita, eu vou te dar um exemplo básico, a gente compra todo o material, a matéria prima, se eu gastei mil reais em matéria prima, eu vendi...
P/1 – Você tava explicando a divisão.
R – A divisão, a divisão é feita assim, hoje temos as pessoas que, eu vou falar da cafeteria, hoje está a Diamante com a cafeteria, né, as meninas, aí faz a compra, a gente faz as compra de frutas, verdura, legumes, toda a parte de alimentação, lá também vende comida e bebidas, tudo junto. Então é feita essa compra, aí lá tem as meninas que faz as vendas, quando é no final a gente tira todas as despesas e divide os lucros, o que sobrou é dividido, partes iguais, por horas trabalhadas.
P/1 – Com as atendentes então?
R – Com todas as atendentes e com a produção também.
P/1 – No caso lá na cafeteria quem tá dando esse suporte de produção é a Doceria Diamante?
R – É a Doceria Diamante, só que vários produtos da Doceria Diamante e também vem o produto de São Bernardo do Campo, aí o de São Bernardo do Campo, como vem, por exemplo, a Márcia manda cem salgados, ela vai passar o custo do salgado dela. Olha, eu te vendo, um exemplo, salgado a dois e 30, a gente vende a quatro e 30, porque esse dinheiro é o que gera a renda de pagar todas as pessoas, e a mesma coisa é do Capão, é outro empreendimento do Capão. Por quê? Por isso que é uma rede, porque todo mundo vende, todo mundo gera renda. E quando é evento grande, igual, tem brindes, a gente chegou a fazer dois mil e 500 lanches pra Mackenzie, que é uma faculdade que tem no centro, e aí é feito assim, a gente faz toda a compra, primeiro monta o cardápio, faz a compra e vem todos os empreendimentos. Aí vem as mulheres de São Bernardo, vem do Capão, vem de todos os lugar, se junta em um só local, um exemplo, se aqui é o melhor local de fazer a produção vem pra aqui, se é na Ambrosia, no dia acho que foi feito na Ambrosia, esses dois mil e 500 lanches, aí vendeu. Na época a gente gastou seis mil e pouco e foi vendido por 16 mil e 500, quer dizer, sete mil e pouco é dividido, é um exemplo que a gente dá da cafeteria, a gente vende 13 a 14 mil, gasta cinco, seis mil, o restante é dividido em partes iguais.
P/1 – Isso por mês?
R – Por mês, por horas trabalhadas. Como se faz a hora trabalhada?
P/1 – Como?
R – A hora trabalhada a gente faz assim, na hora que eu cheguei pra começar a fazer minha comida, eu marco aquela hora, até a hora que eu saí, que eu terminei de fazer a comida, lavei minha louça, sequei e guardei, congelei meu produto, eu vou embora, esse é a hora trabalhada.
P/1 – Vocês deixam lá então?
R – Aí terminei, um exemplo, fiz aqui minha comida, congelei, fiz, amanhã de manhã, duas vezes por semana vai o carro, aí todos os dias vai um carro até o metrô, aí as meninas põe nas térmicas, chega lá, desce do carro, vai no metrô e vai embora, chega na cafeteria, monta os carrinhos, monta as comidas, tudo e vende
P/1 – Esse carro de quem é?
R – Esse, é o meu marido, que ele vai pra empresa e dá esse carona pra elas, que também é um colaborador, ele não faz parte da rede, mas é um dos colaboradores, que ajuda muito, ele ajuda muito em tudo.
P/1 – Então a rede, vocês vão se comunicando.
R – Se comunicando e aí vai fazendo. Aí se tem um, por exemplo, vai ter um café, aí eu ligo pra um empreendimento e falo: “Olha, eu vou precisar de salgado, eu vou precisar disso”, aí ela liga, se vai ter, outro empreendimento vai atender, ele ligam: “Ó, vou precisar da Barrinha Diamante”, aí e assim vai vendendo, é assim que funciona a rede.
P/1 – Contabilizando os gastos é principalmente com a produção, por exemplo, telefone, vocês contabilizam esse gasto, essa gasolina?
R – Os telefones, é tudo, tudo, tudo contabilizado, por isso que a gente economiza assim, o meu marido se disponibiliza de dar uma carona, tá ótimo, porque aí as meninas já não tira aquele dinheiro da passagem, você entendeu? Ou tira uma porcentagem, ao invés de pagar pra lá paga pra ele pra pagar essa gasolina desse transporte que ele passa do trajeto dele. O telefone a gente faz assim, a comunicação é a rede que paga, eu coloco, por exemplo, dez reais no meu TIM e a Lana coloca dez no dela, com o dinheiro que é de todos, entra como custo, aí esse dinheiro tira de todos.
P/1 – Quem faz essa gestão econômica, é cada um que controla ou tem uma pessoa?
R – Todos cuida, todos cuida, por exemplo, a parte, lá na cafeteria a Lana, ela é a que mais fica na parte de, na contabilidade, o que entra, o que sai, ela faz o fechamento, todas tem que fazer, todas fazem, mas entre elas mesma, cada um tem aquele jeitinho: “Ai, eu gosto mais de fazer isso”. Aí cada um vai se adequando no trabalho, porque trabalha uma, uma trabalha, pra se adequar, eu acho que o melhor que se desenvolve, melhor em tal parte, pra agilizar, aí fica, mas lá todos sabem fazer igual, e lá é feito assim. E além dessa a gente tem a saída da pessoa, o controle, que entra um nove e meia e dali ela fica até uma e meia, duas horas lá, e de lá vai pra Empress, que é outra empresa que a gente também vende os nossos produtos, que fica na Juscelino Kubitscheck.
P/1 – Nice, toda essa mudança de trabalho em rede você aprendeu com o Consulado da Mulher?
R – Eu já tinha um pouco de aprendizado do curso que eu te falei, que eu tinha feito pela ONU, de salgado, que ele também foi um curso de cooperativismo, que eu aprendi como trabalhar com uma cooperativa, porque a ONU, ela incentiva muito o cooperativismo, como você trabalhar em cooperativa. Só que na época não deu certo porque eu ainda trabalhava no laboratório e as pessoas que se envolveram no projeto achou que deu muito dinheiro, sabe, quando entra dinheiro, você pensa: “Não, vou pegar só pra mim”, aí não deu certo por isso. Essa cooperativa que o padre trouxe não deu certo exatamente por isso, que é ao contrário dessa nossa do Consulado, porque que essa do Consulado todo o pessoal que entra ele já entra com o aprendizado adequado pro que é, sabendo que é uma, é bem claro. Não adianta você dizer: “Eu trabalhei 20 horas”, porque menos horas você fazer, o seu salário vai aumentar, você entendeu?
P/1 – Nice, o que mudou no seu empreendimento com o Consulado da Mulher?
R – Olha, pra ser bem sincera, mudou tudo, mudou tudo. Sabe por que mudou tudo? Porque mudou a parte de conhecimento, a geração de renda, assim, hoje a gente pode dizer assim: “Olha”, chega uma pessoa cheia de problema: “Ai, eu to precisando trabalhar, mas eu”, tem como a gente estender a mão pra essas pessoas. E, assim, entender o outro, foi muito bom por isso trabalhar em rede, e saber, assim, que a renda é muito importante, mas também a convivência, ela faz com seja, vale mais do que o dinheiro, porque hoje a gente tem uma equipe. Nossa, você vê a equipe de trabalho, é muito importante, parece, a pessoa costuma dizer que o Grupo Diamante é de família, sempre, um dia vocês vão ouvir por aí alguém falando: “É, mas o Grupo Diamante é de família” e não é só família. Família só tem o meu filho, o outro é marido, que me ajuda muito, não faz parte da rede, mas ele ajuda muito, o outro é o Igor, né, que é esse filho, que é o segundo filho, os outros tudo. Essa que você gostou da foto, todas essas meninas, igual essas aí, o pessoal acha que é família, tudo família, e a gente deixa que seja porque na verdade viramos uma família, não tem nenhum tipo de problema, de nada.
P/1 – Tem desafios nesse seu empreendimento?
R – Tem, tem muito desafio.
P/1 – Quais são os desafios?
R – Os desafios são enormes, são assim, ainda as pessoas às vezes, o coletivo, o ônibus coletivo, ele é um desafio pior que a gente tem, inclusive esses dias eu passei, assim, muito, porque a gente quer fazer com que a renda das pessoas aumente. Então, por esse motivo, a gente tenta a fazer algumas coisas, tipo assim, as meninas leva a térmica, outro dia a Lana saiu com a térmica tão pesada, ela e a outra, e as pessoas não ajuda, não ajuda dentro dos ônibus, ainda fica criticando: “Ah, isso aqui”, chama de camelô, ainda tem essas. Se a gente vai de carro tem as críticas de dizer: “Ah, mas como vocês trabalham com economia solidária, dizendo que cuida do meio ambiente e anda fumaçando aí com esse carro na rua?”, que a gente também fala isso. Às vezes eu vou fazer visita ao cliente, que ele quer contratar, quer não sei o que: “Como você chega até aqui?”, eu falo: “Hoje eu chego assim, porque antes eu andava de Mercedes, né, que é só os ônibus, de perua, hoje eu tenho, andava no carro de marido, de carona, hoje eu tenho o meu próprio carro, tenho minha própria moto, hoje nós temos como se locomover”. Mas eu não vou garantir pro meu cliente como eu vou chegar, eu chego de táxi, eu chego a pé, eu chego de moto, eu chego de ônibus, eu chego de uma maneira que seja confortável. Uma que a gente tem que ver, o nosso país precisa ser um país de sustentabilidade, seu eu for pensar, eu vou levar um café pra cinco pessoas, eu vou de carro? Não, vou por na térmica, vou por nas costas e vou levar, eu faço isso ainda hoje e muita gente ainda acha que, assim, que a gente podia andar pra todo lugar de carro, que não sei o que, não é assim. E hoje tenho tudo isso, eu agradeço muito ao Consulado, e a FGV também nos ajudou muito.
P/1 – Nice, você tava falando de sustentabilidade, qual outro tipo de prática que vocês têm, além do transporte?
R – Além do transporte de alimentos, a gente tem, por exemplo, a reaproveitação, a gente reaproveita, por exemplo, se eu vou comprar, eu compro uma hortaliça, eu não jogo fora as folhas, eu faço o pão, entendeu, eu faço um outro produto. E também, se a gente usa qualquer tipo de óleo, o óleo que eu trabalho eu forneço pra esse vizinho aqui, ele é meu parceiro, eu forneço o óleo pra ele, que ele trabalha aqui, tem um comércio aqui do lado, depois se vocês quiserem dar uma olhadinha, ele é super caprichoso, o apelido dele é Bozó. A gente fornece todo o óleo, tanto de casa, tudo o que sobra, se fez uma fritura, um pouquinho, a gente põe numa garrafa, ele transforma em sabão.
P/1 – Ele faz sabão então?
R – Ele transforma em sabão e ele também passa o sabão pra mim lavar meus panos de chão, a gente tem.
P/1 – Então já é uma rede.
R – Já é uma rede, é, os vizinhos, a gente tem esses cuidados também, procura não, sempre que a gente vai fazer algum produto, a gente começou: “Ah, porque não tem”, a gente tá se adequando muito a fornecimento de produto, a gente colocava num saquinho plástico, hoje a gente já não usa mais. Hoje o nosso brigadeiro, ele vai num papelzinho, só na forminha de papel e é colocado em caixas fechadas pra tá transportando de andar em andar nos carrinho, já não tem mais aquele saco plástico, porque o plástico acaba com o nosso ambiente.
P/1 – Nice, você passou então a gerar mais renda depois da assessoria do Consulado?
R – Com certeza.
P/1 – E a sua família?
R – Também, nós tudo.
P/1 – Todos dependem?
R – É, todos dependem.
P/1 – Fazendo um balanço, Nice, o que a atividade empreendedora mudou na sua vida?
R – Olha, a atividade empreendedora mudou muito, tudo, mudou tudo praticamente, hoje eu tenho, assim, hoje, digamos que a gente pode dizer, posso fazer uma viagem, posso ir num bom restaurante, hoje a gente tem esse, podemos dizer, temos esse luxo, né? Que antes a gente ficava pensando: “Vai chegar fim de mês, será que eu vou ter uma renda?”, hoje a gente já tem uma renda, que a gente tem uma venda direta, entendeu? Antes não, a gente ficava aqui esperando um cliente aparecer pra gente fazer uma venda, hoje não, hoje a gente até tá se dando o luxo de se esconder um pouco dos clientes, entendeu? Que tem cliente que a gente fica: “Ah, a gente vai atender, vamos atender sim, vamos atender”, mas fica, tipo assim, dando ainda um jeitinho, que ainda não dá pra ir porque não conseguiu mesmo, a ta fornecendo tudo isso, porque ta preparando muitas pessoas.
P/1 – Vocês têm muita demanda então?
R – Muita demanda.
P/1 – Se você não tivesse com um empreendimento hoje, a Doceria Diamante, o que você estaria fazendo? Você já imaginou essa situação?
R – Não, eu não imaginei, por quê? O meu filho, ele fez vários cursos voltado pra automobilística, né, automóveis, fez curso do SENAI, do SENAC, fez esses cursos assim, mas na verdade o que sempre eles gostaram mesmo foi de cozinhar, igual eu. Eu não me vejo fazendo outra coisa, a não ser no ramo de alimentação.
P/1 – Hoje qual é a sua função dentro da Doceria Diamante?
R – Hoje, dentro da Diamante, porque hoje eu to como coordenadora da rede, porque não era pra haver uma função dentro de uma rede de economia solidária, mas por conta, assim, de conhecimento, de algum, de algumas atitudes, a gente acabou chegando nesse ponto de dizer: “Olha, precisa de alguém pra tá coordenando isso”. É aquela pessoa que se, igual aconteceu num empreendimento da Ambrosia, um cliente que tava querendo uma coisa diferente, não tava chegando num acordo com esse empreendimento, aí o Cristiano do Consulado, ele pediu pra que eu fosse lá pra tentar, pra ver junto se a gente mudar alguma coisa pra que desse certo aquele empreendimento, a gente fechar o contrato. Eu fui, fiquei lá um mês e meio e a gente conseguiu, fechou o contrato, hoje já passa de um ano que essa escola tem um grupo assessorado pelo Consulado. Então aí, nesse caso de coordenador não devia existir porque todos somos donos do próprio negócio, aí o Cristiano pediu pra que eu fosse até essa escola pra junta a esse outro grupo, aí no caso ficaria Doceria Diamante e Ambrosia.
P/1 – Qual escola?
R – Na Escola Mater Vigário, fica na Saúde. Aí fiquei um mês e meio, escola de japonês, 32 anos trabalhando, produzindo a sua própria alimentação pras crianças, cento e poucas crianças, o ano passado tinha, não sei se aumentou, e lá faz toda a alimentação. Só que tinha muito: “Ai, não gostei disso, não gostei daquilo”, aí juntou a Diamante e a Ambrosia, vamos entrar, aí veio uma técnica em alimentação, a Kim, que é uma pessoa, assim, com uma experiência muito boa, nos ajudou muito. Aí juntou eu e ela, o conhecimento, a troca de conhecimento, a gente chegou num acordo de pesos e medidas, a qual todos os dias, se você chegar e disser: “Hoje eu vou tomar o meu café da manhã, vou tomar meu café da tarde”, você não poder dizer: “Hoje o café tá diferente”, porque é pesado e padronizado. Aí quando chegou nesse determinado tempo, aí já não havia mais necessidade da minha presença lá, então eu saí, assim que eu saí fui pra, que é essa outra, que é a cafeteria, que também passou por um outro processo. Aí fiquei lá e agora estamos lá fazendo esse, essa logística de chegar num acordo, de dizer: “Agora tá tudo perfeito”, aí fomos também já pra essa Empress, que é uma empresa que a gente também passa um carrinho solidário e é muito bem aceito.
P/1 – Como que é esse carrinho solidário?
R – O carrinho solidário, lá temos, eles nos ajudaram com uma copa, né, forneceram um espaço de uma copa coletiva, a Cônsul doou uma geladeira pra gente, que é uso exclusivo nosso, que até então a gente usava uma coletiva, o pessoal guardava os doces deles, as marmitas deles, e a gente colocava nossos produtos junto, fechadinho em tapeware, mas a gente não tinha uma garantia, assim, de dizer: “Isso é só nosso”. Aí a Cônsul doou uma geladeira, o Consulado da Mulher, chegou uma doação de uma geladeira, hoje a gente tem uma geladeira exclusiva nossa, guarda nossos produtos de bebidas e diário vai aqueles produtos diário, a salada de fruta, tem os pão de mel, brigadeiro, tudo. Lá as meninas chega à tarde, monta o carrinho com todos os doces, salada de fruta, bolo, aí uma vai, vai duas, sempre duas, uma que recebe o dinheiro, trabalha na parte financeira, e a outra que entrega os produto. E, assim, essa venda é muito boa, tem maquininha de cartão de crédito, hoje somos modernos, o Consulado deixou a gente muito moderno, tem: “Aceita cartão?”, “Sim, tá aqui a maquininha”, as meninas todas treinadas, elas são muito bonitas, as meninas, a equipe, você vê, é uma equipe de mulheres muito bonitas.
P/1 – Tem também a padronização da roupa?
R – Roupa, são tudo com camiseta branca, com o uniforme, o uniforme é escrito: “Rede de Economia Solidária”, tem o nome dos patrocinadores, quem nos, que é a Fundação Getúlio Vargas, a GESOL, tem todos, aí TCP, que é a incubadora, o Consulado, tem todos os nomes e tem o logotipo, é uma colherzinha, assim, uma colherzinha, bem lindo, depois eu mostro pra vocês, que eu acho que tem um por aí, é bem bacana o logo da gente.
P/1 – É um logo que foi...?
R – Aí esse logo foi criado por toda a rede.
P/1 – Você ajudou a criar?
R – Foi nós que criamos, aí GESOL, que a FGV conseguiu, que fez o logo pra gente, aí cada um deu a sua ideia e o que ganhou foi esse, que é bem bacana, que é um garfinho e uma colher e parece uma mãozinha assim. Aí o nome, todos chegou bem próximo, aí o meu e o da Keka mudou só uma palavra, que a Keka é uma empreendedora da Serra do Mar, que ela fica na... A história dela é uma história, assim, de superação, que um dia também se vocês pudessem contar, eu achar assim, que é linda a história da Keka, ela é uma mulher muito batalhadora e a história dela, ela anda até num barquinho, ela atravessa num barquinho.
P/1 – Onde que ela fica?
R – Cubatão, é uma história assim, ela é uma pessoa de uma vida, digamos assim, divina, é uma das pessoas que eu conheci, assim, que o Consulado, em todos, a Keka é uma pessoa, assim, que ela merece ser abraçada por todos, ela é uma pessoa que a superação dela é contagiante. Você conversar com ela, a história de vida, o que ela faz, ela conta as histórias, ela atravessa num barquinho, aí o barquinho quebra, ela tem que esperar porque não tem outra alternativa, sempre na hora certa, sempre com alegria, com uma alimentação maravilhosa.
P/1 – O que ela faz, a Keka?
R – A Keka, ela sempre trabalhou com a parte de alimentação, isso, aí quando a FGV, a gente fazia os nossos eventos.
P/1 – Faz salgado, doce?
R – Tudo, comida, faz tudo, é uma empreendedora de, uma coisa, assim, impressionante, muito, ela é uma fofa, a história da Keka é bacana. Então a gente ficou juntas por muito tempo e ainda continua, porque hoje a gente não faz muito evento junto porque ela já tá, montou a cozinha dela. A última vez que a gente se encontrou foi no clube do Banco do Brasil, que a FGV levou toda a rede, todos, todos, todos, que a gente se reuniu lá, aí ela fez um almoço maravilhoso e ela tava, mostrou as fotos da cozinha dela, que tinham montado a cozinha, que ela ia fornecer pra uma empresa aí. É aquele tempo que já começa, tipo, caminhou pro lado, porque aí ficou, a rede continua uma só, mas aí dividiu um pouco, tipo de São Paulo, porque pra atender São Paulo e São Bernardo às vezes não compensava muito, aí a Baixada Santista e a São Paulo, mas é uma rede só, quando precisa junta todas.
P/1 – Nice, vocês se reúnem anualmente?
R – Olha, a reunião da Diamante, da Cafeteria Diamante, é toda semana, toda sexta, a gente trabalha até as 14 horas, aí se reúne pra discutir, mesmo que é um grupo só, a gente discute os assunto, o que precisa, uma cobra da outra, os fornecedor, as vendedora cobra, os fornecedor cobra das vendedora, e sendo um grupo só, isso a gente faz e a cada 15 dias é a rede.
P/1 – A rede toda?
R – Toda.
P/1 – Mas a rede toda, qual é a regularidade de encontros, vocês tem algum encontro anual?
R – A cada 15 dias.
P/1 – Onde vocês se reúnem?
R – A gente se reúne, hoje a gente tá com a sala reservada, a sala 18, no andar 21, ali no Plaza Centenário, até junho tá reservada pra essas reuniões, toda sexta-feira a gente se reúne, a Diamante toda sexta, a Diamante toda sexta-feira e a rede a cada 15 dias.
P/1 – A cada 15 dias lá no Plaza Centenário. Quem forneceu esse espaço pra vocês?
R – É da Whirlpool, que é do Consulado da Mulher, esse espaço é, porque antes a gente fazia todas as reuniões na FGV, aí agora passou pro Consulado, pra lá.
P/1 – Vocês discutem o que nessas reuniões, tudo?
R – A gente discute tudo, por exemplo, discute cardápio, discute preço, o Alessandro e a Kelly, eles ensinam muito como a gente fazer as contas, porque a conta parece que nunca tem fim, a matemática é infinita, você aprende a contar de um jeito, ver o seu lucro, quanto que dá. Aí a gente faz tudo, por exemplo, a soma, você vai fornecer, por exemplo, você vai fornecer um doce, aí a gente vai saber, aí lá é feito na frente, é tudo muito transparente, não adianta você dizer que o seu brigadeiro vai custar cinco reais porque você tem que dizer pra mim quanto você gastou nele, você tá entendendo? Que todos tem que saber, aí você fala o custo da matéria prima, aí gastei, por exemplo, um real de matéria prima e gastei uma hora pra trabalhar, aí a gente soma quanto um ajudante de cozinha ganha, é uma média de salário de 900 reais. A gente divide aquilo, eles põe tudo divididinho pra você saber quantos minutos você gastou, quanto você gasta, quanto você ganha pra fazer um brigadeiro, aí junta aquele valor com a matéria prima, aí dá x, aí você sabe quanto você vai ter de lucro. Aí as meninas que vão vender lá vai comprar de você, né, só que elas também tem que ganhar, aí aquela margem de lucro, a gente tira os 13% que é da maquininha, que lá vende muito em cartão, e o restante você vai saber real o quanto você vai ganhar, todos sabem quanto ganha em cada produto que vende. Aí é discutido isso, é discutido padronização, qualidade, por isso que o Cristiano, ele achou adequado que tivesse um coordenador, pra ver isso, porque na rede hoje tem pessoas com muito conhecimento, eu considero todos iguais. Mas tem um diferencial no aprendizado a mim, a minha pessoa, os cursos, os aprendizados que eu tive, às vezes vai ajudar mais se eu tiver lado a lado, passando, acompanhando, aí sempre eu vou em algum lugar acompanhar, se necessário. Já tive a honra de ser convidada pra ir em Joinville, fiquei três dias, eu e Louise, que é uma educadora do Consulado também, é uma pessoa maravilhosa, nós ficamos três dias, que é num, também num espaço de Joinville do Consulado da Mulher, é um grupo assessorado.
P/1 – O que você fez lá?
R – Lá eu dei, até tem umas fotos, não sei se depois, se você quiser, porque, assim, tem só uma que eu vou poder mandar porque as outras tem as outras pessoas, por direito de imagem, né, a gente não pode publicar, mas tem eu ensinando a fazer a Barrinha Diamante, pra elas eu ensinei como fazer, foi bem bacana.
P/1 – Você multiplicou?
R – Foi, multipliquei, foi dentro de uma universidade, as pessoas, nossa, amaram, ficaram encantado, porque a cultura de lá é muito diferenciada. E Joinville também, Santa Catarina, tem uma história, que o meu marido, ele foi com uma empresa pra lá, junto com o amigo, e eu fiquei dois anos indo e voltando pra Santa Catarina, eu não gostava, eu ia, não trabalhava, que eu tava afastada, não podia trabalhar. Então eu ficava lá, e eu fui ser voluntária num asilo, eu tive dois anos, sou registrada como voluntária, cuidando de idosos lá, eu não gostava daquele lugar, eu disse uma palavra que foi abençoada, eu falei: “Eu só vou voltar um dia aqui se for a trabalho”, e o Consulado me deu essa oportunidade, eu fui a trabalho, foi muito bom.
P/1 – Nice, o que é importante pra você hoje, como um todo, Nice mulher, empreendedora?
R – Hoje o que eu acho, assim, que eu tenho muito importante é a família, a oportunidade que o Consulado deu pra eu ta com a minha família, de poder deitar e amanhecer do lado da minha família e dizendo: “É a minha família e o meu trabalho”, eu tenho muito a agradecer o Consulado.
P/1 – Quais são os seus sonhos hoje?
R – O meu sonho, um sonho que eu tenho, assim, e eu vou vencer, vou conseguir, junto com todos, com toda essa ajuda, e tudo o que eu puder e vou fazer, é ter um empreendimento próprio, um local próprio, aonde eu possa dizer, todos que chegar na minha porta dizendo: “Tem um trabalho?”, eu falar: “Tem”. Esse é o meu sonho e eu vou vencer, se eu não vencer os meus filhos vai, porque eles tão indo no mesmo caminho, esse é um sonho assim, que eu sempre digo: “Eu vou vencer. Aí eles costumam dizer assim: “E, velha”, fala que eu sou dinossauro: “Tá da idade de um dinossauro”, eu falo: “Eu vou viver igual minha avó, chegar perto dos cem ano igual o meu pai, trabalhando” e eu vou vencer.
P/1 – E os seus pais tão vivos?
R – Tão vivos, tão vivos, e assim, e eu sempre digo, quem quer já tem 50%, e eu, do que eu vim pra o que eu to hoje eu já me considero 100%, com a ajuda do Consulado eu já cheguei 100%, porque hoje, veja só o que a gente tem hoje, com todos esses equipamentos que a gente ganhou, com a coragem de trabalhar, com honestidade, eu tenho certeza que a gente vai chegar lá.
P/1 – Como foi contar a sua história, Nice?
R – Ah, eu achei ótimo, espero que muita gente veja, que, assim, agradecer muito, muito a todos e que Deus abençoe a todos que deu essa oportunidade, que alguém possa ver, porque, assim, é uma história que eu sempre, não escondo de ninguém. É uma história que eu gosto da minha história e, assim, eu fico muito feliz, e que Deus abençoe a pessoa que teve essa ideia, as pessoas que colaborou e a todos que vejam essa história, que tenham como exemplo, que a gente um dia consegue tudo aquilo que quer, por mais difícil que seja. E, assim, que as pessoas sejam solidário e humilde, a humildade é a coisa, eu acho, assim, que a palavra mais certa que existe, é a humildade, porque a pessoa sendo humilde chega, porque eu nunca imaginei que nós chegasse onde chegamos. Eu achava um pouco difícil você vir da roça, de um sítio, sem conhecimento de nada e hoje ser entrevistada pra o mundo inteiro, que eu tenho certeza que vai ver, eu acho bem bacana.
P/1 – Nice, em nome do Museu da Pessoa a gente agradece a sua participação, foi ótima a sua entrevista.
R – Ai, eu amei, obrigada a todos.
FINAL DA ENTREVISTARecolher