Museu da Pessoa

Você vai indo e não tem como voltar

autoria: Museu da Pessoa personagem: José Sacido Barcia Neto

Plano Anual de Atividades 2013
Projeto Nestlé - Ouvir o outro compartilhando valores – Pronac 128976
Depoimento de José Sacido Barcia Neto
Entrevistado por Tereza Ruiz
São Lourenço, 09/06/2014
Realização Museu da Pessoa
Entrevista NCV_HV_24
Transcrito por Liliane Custódio
MW Transcrições




P/1 – Então primeiro, José, eu vou pedir pra você falar seu nome completo, data e local de nascimento.

R – Tá. Meu nome é José Sacido Barcia Neto, eu nasci em São Lourenço, em nove de fevereiro de 1957.

P/1 – Agora o nome completo dos seus pais e, se você lembrar, também data e local de nascimento.

R – Tá. Meu pai chamava-se José Sacido Barcia Filho, nasceu em Cambuquira, em 26 de julho de 1931. Minha mãe é Carmen Sabra Barcia, nasceu em Castelo, no Espírito Santo, em 13 de abril de 1933.

P/1 – Isso. Agora conta um pouquinho o que seus pais faziam.

R – Meus pais, eles são hoteleiros, já eram hoteleiros de raiz aqui em São Lourenço. Já herdaram os hotéis Guanabara e Universal, os hotéis da família, dos meus avós, seu José e dona Amélia, que também eram hoteleiros. Então a nossa família, ao todo, tá há 94 anos no ramo de hotelaria e restaurante. Então eles eram pessoas que tiveram a vida inteira dedicada ao negócio, dedicada à família. Eu tenho duas irmãs, Carmem e Rosane, as duas também se formaram, seguiram carreiras diferentes, e depois retornaram a São Lourenço, assim como eu, sendo que no momento, eu e Carmem Dolores, que é a segunda irmã, é que dirigimos as empresas. Então nós somos já a terceira geração de hoteleiros aqui em São Lourenço.

P/1 – E conta um pouco como eles eram, seu pai e sua mãe, assim, de temperamento. Como era o jeito deles?

R – Olha, a minha mãe ainda é uma pessoa viva, ainda com 82 anos, muito ativa, aquela empresária que sabe tudo, que negocia tudo, que decide. Meu pai já mais intelectual, era um homem de muitas ideias, foi vereador, foi presidente de partido político, presidente de várias entidades aqui no sul de Minas, então era um homem mais de intelecto, e minha mãe mais de ação. E nós fomos educados com um punho muito rigoroso da minha mãe e isso desenvolveu na gente a nossa personalidade. Então a gente tinha aqui duas maneiras de viver com a família: minha mãe dava o duro e meu pai passava a mão na cabeça. E com isso nós fomos nos educando ao longo dos anos.

P/1 – Tá certo. Conta um pouco então como era... Não, antes de perguntar isso, eu queria saber se... Você sabe qual a origem da sua família?

R – A minha família é espanhola, somos da Galícia. O meu bisavô, meu avô, eram galegos. E por parte de mãe, o meu bisavô e minha avó eram libaneses. Então uma mistura de espanhol com libanês, que só podia dar bom comerciante mesmo.

P/1 – E por que eles vieram para o Brasil? Você sabe?

R – Olha, meu avô veio mesmo em busca de oportunidades. A Espanha tava numa época muito difícil no início do século XX, lá na terra deles é uma região muito pobre, e ele então veio pra encontrar um irmão dele que tinha conseguido emprego no Rio de Janeiro e começou a vida como garçom, como cozinheiro. Posteriormente teve hotel, aí então desenvolveu seus negócios, foi dono de padaria em Ipanema, depois comprou hotel em São Lourenço. Teve a vida inteira dedicada ao comércio. Já o meu avô por parte... Minha avó por parte de mãe, foram os dois esteios da família, ela veio do Líbano, de Jandum. Então eles vieram para o Rio também. No caso lá havia uma questão também política, no Império Otomano, no final do século XIX, então havia muita guerra, muita fome, então meu bisavô optou por imigrar para o Brasil em busca de melhores condições de vida, mais segurança, inclusive. E desses dois blocos familiares nasceu a geração do meu pai e da minha mãe, da qual nós somos a continuidade hoje.

P/1 – Conta um pouco como era a casa em que você passou a infância. A casa, o bairro, a cidade.

R – São Lourenço era pequena, tinha sete, oito mil habitantes, todo mundo se conhecia, principalmente os hoteleiros, os turistas. Naquela época, o turista passava aqui 21 dias, 28 dias, então nós vivíamos junto com os turistas no período de alta temporada e com os funcionários, que nós crescemos e moramos dentro do hotel a vida toda. Então o nosso quarto era aqui, nós comíamos aqui, nós vivíamos dentro do hotel. Era uma vida muito tranquila. Nós íamos para as atividades escolares, depois vínhamos para o hotel, depois íamos pra aula de novo, depois voltávamos para o hotel. Então todo o nosso relacionamento, a nossa vida, girava em cima da vida do hotel, onde a gente vivia, a minha mãe, meu pai, meus avôs. E isso criou uma simpatia muito grande da gente com os turistas do Rio, de São Paulo, de Belo Horizonte, que vinham nos visitar, ficavam aqui vários dias. Formamos boas amizades com os nossos funcionários. Então assim, tem filho de funcionário que trabalha comigo, que era filho de funcionário do meu pai, do meu avô. Nós tivemos um garçom, o Sílvio, que trabalhou 55 anos conosco. Então é um momento marcante aqui. Tivemos empregados de 30, 40, 50 anos de casa. Então é meio que tudo uma grande família, sendo que todos se respeitam, porque minha mãe era muito rigorosa, e minha avó também impunha um ritmo muito rigoroso aqui dentro da empresa, que evidentemente era a nossa casa também.

P/1 – E o hotel naquela época era muito diferente do que é hoje em termos de estrutura, tal?

R – Muito. Muito diferente. O Hotel Universal, naquela época, tinha 84 quartos e acho que 12 apartamentos. Os banheiros eram no corredor, então a gente via aquelas pessoas de hobby indo para o banheiro coletivo. Na hora do jantar, todo mundo de paletó e gravata. Aqui no Hotel Guanabara, que é onde meus pais herdaram dos meus avôs, também. Então era muito diferente, as pessoas eram muito mais formais, cumpriam mais seus horários. As refeições tinham horário certo pra começar e acabar. Nós que éramos crianças, nós comíamos separados no (______?), que era um salão pra criança. Então a gente se sentia promovido quando a gente podia comer no salão grande com os nossos pais, até aí a gente era obrigado a comer com as crianças lá no (______?). Então são lembranças marcantes de uma cidade pequena, muito aconchegante, muito cosmopolita por conta dos visitantes. Não era aquela típica cidade de interior, porque vinha muita gente de fora. Mas sem dúvida alguma, um relacionamento muito próximo com os nossos funcionários, empregados, colaboradores e com os nossos hóspedes aqui na empresa.

P/1 – E como eram as refeições? Você mencionou essa coisa do salão separado para as crianças, como era a refeição nessa época? Quem cozinhava? Qual era a base da alimentação?

R – Aquela época era interessante, porque nós tínhamos café de sete às nove, almoço de 11 e meia a uma, lanche de três às quatro da tarde, jantar de seis e meia às oito e ceia às nove e meia. Então praticamente você passava o dia comendo. O turista passava o dia engordando aqui. E os passeios eram a cavalo, de charrete, no Parque das Águas. Então era muito diferente a maneira de se viver naquela época. A comida, o cardápio, era baseada mesmo na cozinha espanhola, na cozinha portuguesa, como é até hoje, e a mineira, mas os pratos eram mais pesados. A gente tinha naquela época... A gente comia aqui, por exemplo, cassoulet, dobradinha, nós comíamos rabada. Hoje em dia, os pratos são mais leves, mais peixe, mais frango. Então você nota uma mudança cultural na alimentação do povo brasileiro aqui no próprio hotel. O nosso cardápio foi mudando ao longo desses 50, 60 anos. Mas ainda guardamos alguns daqueles pratos que encantaram gerações. Por exemplo, o nosso chefe, o Zé Gonçalves, que tá com 94 anos, não trabalha mais, ele fazia mamadeira pra mim. Ele faz ovos nevados, que são aqueles ovos batidos com calda em cima, até hoje de vez em quando eu lembro de noite dos ovos nevados e tenho vontade de comer. O próprio pudim batido na mão é completamente diferente do pudim hoje feito com aromatizantes, na época era tudo feito individualmente. Então nós tínhamos toda essa ligação com a culinária, com a fazenda do hotel, que até hoje existe. Vinha o leite de manhã, vem a carne de porco, vêm as hortaliças. Hoje nós temos café, naquela época não tínhamos. E tudo isso era feito para o nosso hóspede. Então havia e ainda há hoje uma identidade muito grande, que a gente tenta manter passando já a empresa pra quarta geração, com quase cem anos de atividade.

P/1 – E essa fazenda, você disse que ainda existe, ela ainda produz para o hotel?

R – Produz. Essa fazenda, meu pai adquiriu em 1962 e até hoje ela produz e os nossos hóspedes vão lá passear a cavalo, ver a produção de hortaliça, produção de queijo. Fica a cinco quilômetros da cidade. Chama-se Fazenda Guanabara, em homenagem ao próprio Hotel Guanabara. Então é muito bonito. É uma atividade muito bacana.

P/1 – E vocês consumiam café no dia a dia?

R – Sim. O café sempre foi forte aqui na minha região. Café com leite. Carmo de Minas, na época, que fica a nove quilômetros daqui, era conhecida pelo leite, não pelo café. Hoje é um dos maiores exportadores de café do mundo. Então nós tínhamos aqui atividade no café da manhã, era imprescindível o café, após o almoço, e à tarde tínhamos um café com leite com pão e manteiga. E no jantar, o café. E a ceia à noite é que variava um pouco, algumas pessoas preferiam o chá, outros tomavam café com leite de novo, antes de dormir.

P/1 – E como era preparado o café? Você lembra?

R – Todo ele no fogão de lenha. Café de coador, coador de pano, daquele que a gente costura com agulha e linha. Então eu lembro até hoje, na cozinha, da fumaça do banho-maria, e me lembro do cafeteiro virando o coador pra tirar o pó cozido. Então é uma memória que até hoje vem a minha cabeça. Hoje são máquinas, são equipamentos, é muito diferente.

P/1 – Conta um pouco como eram as brincadeiras de infância. Do que vocês brincavam? Com quem você brincava?

R – Olha, aqui era interessante, porque a gente tinha dois pelotões de brincadeira: um na baixa temporada, que não tinha turista, o hotel ficava praticamente vazio, aí a gente juntava com os nossos colegas de escola, da rua, íamos brincar de guerra de mamona, íamos soltar pipa. A gente naquela época ia nadar no Rio Verde, que ainda dava pra nadar no Rio Verde aqui. Então nós tínhamos futebol, piorra, aquela piorra que você puxa, italiana.

P/1 – O que é a piorra?

R – A piorra é tipo assim um pião que você enrola no barbante e puxa, ela fica rodando. Então nós brincávamos muito assim no período de baixa temporada com os nossos colegas de São Lourenço. Chegava na alta temporada, vinha turista. Nós vivíamos do turismo, então todas as nossas famílias trabalhavam nos hotéis, nos restaurantes, enfim, nas atividades turísticas, então nessa época a gente brincava com os filhos dos turistas. E o que eles gostavam aqui? Eles vinham com brinquedos do Rio e São Paulo, brinquedos eletrônicos, espada, forte apache, mas o que eles gostavam não era isso que eles tinham, eles queriam ir pra rua pra brincar conosco de piorra, de guerra de mamona, de amarelinha, as meninas, de pular corda. Ou seja, o que eles gostavam era se juntar com a gente na rua. E nós, por outro lado, gostávamos de ver as novidades de brinquedos que eles traziam de fora.

P/1 – E quantos anos você tinha quando você começou a frequentar a escola, José?

R – Olha, eu ingressei na escola com cinco pra seis anos. Era uma escola chamada Escolinha da Vovó, da professora Noemia Goulart Ferreira. Essa escola não existe mais. Eu frequentei lá todo o primário, até o admissão, que na época existia o admissão, posteriormente você ingressava no ginásio. Então eu fiz os cinco primeiros anos de estudos meus na Escolinha da Vovó, de cinco, seis, sete, oito, nove e dez. Com 11 anos então eu fiz prova para o Colégio Militar em Belo Horizonte e pra lá ingressei no internato, onde segui minha vida.

P/1 – Descreva um pouco como era essa Escolinha da Vovó. Quais são as primeiras lembranças que você tem da escola?

R – Era uma escola assim, numa garagem. Você imagina uma garagem de carro. Nós éramos seis alunos: tínhamos a Regina, que é neta dos fundadores do Laticínios

Silvestrini, o famoso Laticínios do Miramar, que produz Cremelino, e um ramo da família fundou o Catupiry lá em São Paulo; a Lili, que hoje é contadora da prefeitura, trabalha comigo; o Lourenço, que mora em Brasília, que era também filho do dono da Concessionária Chevrolet; e a Maria Célia Jardim, que é filha do dono da rádio. Então nós éramos uma turminha pequena. E a minha primeira professora foi a dona Noemia Goulart. Era uma verdadeira avó pra gente aquela Escolinha da Vovó, nos agradava muito, mas era exigente nas letras. E principalmente a minha primeira professora de Matemática, que naquela época era uma professora só, mas nós tínhamos essa peculiaridade. A Laura Nery, que é a minha primeira professora, além da Noemia, ela dava Matemática, então ela cobrava muito da gente isso no começo, no comecinho do primário.

P/1 – E dessa fase assim de infância tem alguma história marcante, um causo que você sempre lembre?

R – Olha, tem uma interessante, que até meus colegas contam. Nós éramos muito bagunceiros, e tinha um colega meu, o Lourenço, que eu citei, que hoje mora em Brasília, o Lourenço era muito grande, muito maior que a gente, e o apelido dele era FNM. FNM era um caminhão da Fábrica Nacional de Motores, famoso na década de 50 e 60. E eu e ele vivíamos brigando no recreio. Um belo dia eu saí correndo e ele foi atropelado por um jipe de um batateiro chamado Rafael Leite, e na frente da escola. E contam os meus colegas que eu entrei gritando na escola que o FNM trombou no jipe.

P/1 – (risos).

R – (risos) Então os colegas contam lá da época que foi o menino caído lá e eu gritando que o FNM trombou no jipe.

P/1 – (risos) Suavizou.

R – Foi um fato interessante (risos). Suavizei. Com certeza.

P/1 – Bom, você fez o primário inteiro.

R – Isso.

P/1 – Depois você foi pra Belo Horizonte. Conte-me como foi essa mudança de escola e de cidade mesmo.

R – Foi muito difícil no começo. Eu queria ir para o colégio militar, era um sonho meu. Eu tinha visitado uma exposição que os alunos do colégio militar apresentavam o que era o colégio militar. Eu quis então fazer, fiz uma prova, me preparei, e aí fui para o internato, no Colégio Militar de Belo Horizonte. E lá efetivamente eu fiz o ginásio e o científico, portanto eu fiquei sete anos lá no colégio militar, concluí meus estudos lá, assim, dessa fase. Foi um período muito bom, um período muito difícil da minha vida, um colégio muito exigente, talvez um dos colégios mais difíceis de se ingressar e cursar até hoje no Brasil. Mas fui muito bem sucedido, sempre consegui as primeiras posições na minha turma, me desenvolvi muito fisicamente, porque lá tinha piscina, área de esporte, tínhamos, inclusive, equitação dentro do colégio militar, cavalos, posteriormente me apaixonei por essa atividade, acabei desenvolvendo-a ao longo da minha vida inteira. Então foi um momento que marcou. Realmente, o pilar da minha formação foi o Colégio Militar de Belo Horizonte, meus mestres, meus comandantes, meus chefes e as pessoas com quem eu me relacionei lá nesse longo período de sete anos.

P/1 – (corte no áudio).

R – Olha, a mudança foi muito difícil. Eu era filho de pais ricos e fui pra um colégio interno que todo mundo é igual, então é comunitário. Aquilo foi um choque pra mim. Então eu emagreci muito, tive muita dificuldade de me adaptar no começo, a ponto de um dia meu pai, que me levou, foi meu pai que me levou, minha mãe nesse ponto tava com o coração cortado, ele então me levou e eu ingressei. E um mês, um mês e meio depois, ele retornou com o meu avô pra me visitar, porque lá nós tínhamos aulas aos sábados e as visitas eram de mês em mês. E ele então me perguntou, me viu muito magro, meu avô ficou muito bravo, queria me tirar do colégio. Eu era o único neto homem dele, então ele tinha uma paixão por mim. Eu brinquei com ele, diz o meu pai que eu respondi que depois que eu saí jornal com o prefeito de São Lourenço, por ter passado no colégio militar, fui o único aluno, de uma geração inteira, que tinha passado naquela prova, que eu não voltaria nem morto, que ia aguentar aquilo lá até o final. E de fato eu acabei o curso muito bem sucedido e de lá segui minha carreira. Então o momento inicial foi muito marcante, muito difícil. Posteriormente, um ano, dois anos, eu me adaptei. E acho que a formação foi maravilhosa, um período maravilhoso da minha vida, que eu só recordo com alegria, com saudade, inclusive.

P/1 – Era internato só de meninos?

R – Meninos. Nós ficávamos lá no São Francisco, hoje o bairro tá todo ocupado. E no outro morro ficava o Santa Marcelina, das meninas. Então o passeio nosso, nós podíamos sair a cavalo pra passear em volta da Lagoa da Pampulha, então o nosso passeio era escapar pra ver as meninas com aquelas saias até na canela lá no Colégio Santa Marcelina, pelo lado de dentro. Então aquela era a nossa diversão naqueles anos lá no colégio militar, mas é marcante essa passagem lá.

P/1 – E durante o colégio militar, você tinha uma disciplina favorita, teve um professor marcante nessa fase?

R – Tive. Tive sim. O colégio militar é marcado por um ensino extremamente exigente. Na primeira fase, que foi no ginásio, me impressionou muito um dos meus professores, é o coronel Cleverson, ele era fluente em cinco idiomas, inclusive grego e latim, era oficial do Exército e professor do colégio militar. Naquela época existia o quadro de magistério, e esse quadro de magistério eram aqueles combatentes que passavam numa prova e passavam pra esse quadro de magistério do Exército. Eram verdadeiros mestres, preparadíssimos. Era um quadro muito sofisticado, inclusive, intelectualmente. E ele foi muito marcante na minha formação, inclusive na preparação de línguas, inglês, francês, preparação dos clássicos. Ao mesmo tempo em que ele era exigente, ele me levava pra sociedade hípica pra montar os meus cavalos, pra competir. Era meio que um paizão que eu tinha lá. E a ele eu sempre fui muito grato, à família, sua esposa Lúcia. O filho foi oficial do Exército depois também. Então eu tenho um carinho muito grande pelo coronel Cleverson nessa primeira fase. Na segunda fase, já no científico, bem mais maduro, marcou muito um dos nossos professores, também muito preparado, chamava-se Ulisses Carneiro. Ele lecionava nada menos que 15 disciplinas, inclusive Grego, Latim, Matemática, Geometria Descritiva e Analítica. Então, pra você ter ideia, no primeiro científico, nós já tínhamos Geometria Descritiva e já tínhamos Integração e Diferenciação no segundo científico do colégio militar. Então ele nos marcava pelo saber, pela maneira do grande mestre que ele era. Chamava-se Ulisses Carneiro, eu guardo sempre na memória esses dois grandes exemplos na minha vida.

P/1 – E nessa fase você já tava na adolescência. Você entrou na adolescência e passou toda a adolescência no colégio militar.

R – Isso.

P/1 – Como eram os momentos de lazer? Vocês tinham autorização pra sair de vez em quando? O que vocês faziam de lazer, passeio?

R – Interessante, que nos dois primeiros anos a gente era muito preso, só podia sair acompanhado com pai ou responsável. A partir do terceiro ano, nós já tínhamos uma liberdade maior, nós podíamos sair na cidade de Belo Horizonte, podíamos sair com o responsável ou não, e principalmente no científico, que nós já éramos maiores, nós já transitávamos sozinhos em toda Belo Horizonte. Eu acho que o que tinha de interessante naquela época é que Belo Horizonte tinha um milhão e meio de habitantes. Era uma cidade extremamente pacífica, com segurança, com conforto. Nós podíamos ir de um lugar ao outro da cidade sem risco nenhum. Então me marcou muito essa sensação de liberdade que eu tinha fora do colégio militar. Embora lá a disciplina fosse rígida, que era própria do ofício, mas fora eu tinha total liberdade de ir pra sociedade hípica montar os cavalos, competir, ir ao cinema, ir ao teatro numa fase que eu já estava mais adulto. Eu me lembro da Fernanda Montenegro com o Fernando Torres começando numa peça no Teatro Marília, lá em Belo Horizonte, eu vi, eu tinha 17 anos, já foi autorizado a ver. Chama-se “Computa, computador, computa”. Foi a primeira peça que eu vi falar de computador na minha vida, embora o enfoque da peça fosse menos glamoroso que o nome, interessante. Mas era muito agradável, muito gostoso de viver lá. Muito bom.

P/1 – Conte-me um pouco assim, mais em detalhes, que você mencionou cinema, vocês iam também a festas, a bares? Quais eram as diversões.

R – Naquela época, eu peguei os anos 70, então era... Discoteca, nem tinha, foi depois. Então, nossa, ainda era aquela boate, quando você conseguia ir, tradicional, os bailes no Automóvel Clube, na hípica, no Jaraguá. E os bailes no próprio colégio militar, que tinha lá festa junina, noite da poeira, tinha baile do final de ano, tinha baile do aniversário do colégio. Então havia uma vida na sociedade de Belo Horizonte. Então a gente vivia muito com... Baile de debutante tinha naquela época, a gente ia dançar com as meninas de debutante nos bailes. Então eu vivi um pouco daquele sonho dos anos 60, que perpassou nos anos 70, aquela coisa dos Anos Dourados. Belo Horizonte é muito conservadora, uma sociedade muito conservadora, não foi tão a fundo no progresso como Rio e São Paulo naquela ocasião, nós ficamos um pouquinho pra trás, então eu pude aproveitar um pouco dos anos 60 no meio dos anos 70 também, isso marcou muito.

P/1 – Como eram esses bailes? Descreve um pouco assim, como as pessoas se comportavam, como elas se vestiam, o que tocava.

R – Era interessante. As músicas deviam ser... O conjunto mais famoso lá, o conjunto era do Célio Balona, ele tocava Beatles, tocava Rolling Stones, tocava todo tipo de música. É que naquela época era relativamente novo, os Beatles estavam com oito anos de carreira naquela época. Então o que tinha de interessante nos bailes é que os meninos, normalmente, ficavam de um lado, as meninas do outro, e tinham os mais saídos, os mais avançadinhos, que iam tirar as meninas pra dançar, e as mães e os pais ficavam olhando. A calça era boca sino. Era aquela calça larga embaixo e apertada em cima. As cores eram mais vermelhas, umas cores mais puxadas pra época. Era meio que uma contestação dos Anos 60, que tava chegando lá a Belo Horizonte na época. E o que eu me lembro de marcante é que as meninas eram mais saídas do que nós dos colégios militares. As meninas do Santa Marcelina, do Santo Agostinho, dos outros colégios da capital, dos Teresianos, eram mais saídas. Então elas às vezes tomavam a iniciativa de tirar a gente pra dançar, até pra namorar, embora, evidentemente, que não houvesse naquela época a liberdade que se tem hoje.

P/1 – E nessa fase você teve assim um primeiro amor, uma paixão?

R – Tive. Tive. Interessante, lá no colégio militar, eu conheci uma prima de um colega meu, que hoje é almirante da Marinha, vice-almirante, e essa moça simpatizava comigo e eu com ela, só que eu não tomava iniciativa, que eu era tímido, aí não teve dúvida, um dia lá no baile do Jaraguá, ela me segurou, me deu um beijo, e começamos a namorar. Até hoje me lembro da Maria Helena, já é uma senhora hoje, de vez em quando conversamos e morremos de rir quando lembramos desse fato, desse passado.

P/1 – Vocês namoraram muito tempo?

R – Não. Um ano, um ano e pouquinho. Depois cada um seguiu seu rumo, seu destino. Mas foi marcante esse primeiro namoro, foi assim, uma mudança de paradigma, como se diz hoje.

P/1 – E como era o namoro de vocês na época? Assim, o que vocês faziam juntos?

R – Olha, normalmente era em casa de família, na casa da família dela, era no clube, na sociedade hípica. O máximo que a gente saía junto sem acompanhar era cinema. Então baile, uma boate, já tinha alguém que acompanhava a gente. Quatorze, 15, 16, 17 anos, ainda tinha gente que nos acompanhava. Então essa era a diferença, a gente conseguia namorar meio que escondido, não tinha tanta liberdade.

P/1 – E a faculdade? Quando você decidiu o que você ia fazer? Como foi essa decisão?

R – Na verdade, eu entrei o científico, digamos assim, sempre fui muito bom aluno e eu queria ser oficial do Exército, como de fato fui. Só que naquela época já havia, nos anos 73, 74, 75, boas oportunidades de intercâmbio. E eu então fiz um intercâmbio de cinco, seis meses nos Estados Unidos. Morei com uma família americana em Youngstown, no norte do estado de Nova Iorque, ali divisa com o Lago Ontário, divisa com o Canadá. E ali eu conheci outras oportunidades, visitei faculdades, universidades, dentro desse programa de intercâmbio. E aí eu fiquei muito balançado entre Engenharia, Engenharia Civil, que eu gostava, e seguir a carreira militar. Que como aluno do colégio militar e um dos primeiros de turma, eu tinha ingresso automático na Academia Militar, ou na Força Aérea, ou na Marinha. Então eu lembro que o meu último ano lá, que foi o terceiro ano do ensino médio, científico, foi muito difícil, eu fiquei muito na dúvida, tanto é que eu fiz vestibular e passei para as Engenharias, e ingressei na Academia Militar de Agulhas Negras em 76. Então foi um momento muito de dúvida. Só quando eu estava, efetivamente, na academia, que eu senti, no primeiro ano, que aquilo era a minha vocação, e aí eu segui em frente. Mas eu tive muitas dúvidas no científico, se eu ia ser engenheiro ou se eu ia ser oficial do Exército. Uma coisa eu sabia que não queria ser: médico. Eu preferia fazer o furo a costurar a pessoa (risos).

P/1 – E na academia, o que mudou na sua vida? Conta um pouco como era o cotidiano, quais foram as mudanças.

R – A academia é uma ruptura. A academia mesmo, pra quem já é aluno de colégio militar, da escola preparatória, é uma ruptura, é um modelo de vida completamente diferente. É uma escola de excelência, é uma das melhores academias militares do um mundo, ela se equipara a West Point, a Sandhurst, a Saint-Cyr. É superexigente, um ensino fundamental extremamente puxado, seja Química, Mecânica, Física, além das matérias militares. Então meu primeiro ano, eu ainda tive um fato curioso, foi a única turma que os dois anos do curso básico foram condensados em um único ano. Então nós tivemos todas as matérias de dois anos em um único ano. Antes da minha turma não era assim e depois também não foi assim. Então foi extremamente difícil, puxado. Nós emagrecemos... Eu lembro que em 40 dias, eu emagreci oito ou dez quilos. Então a gente começou, saindo do período inicial, a se dedicar aos estudos. A vida na academia é uma vida muito ativa, muito dinâmica. Resende também oferece à comunidade boas diversões, passeios. Mas aí também eu já era rapaz, já tinha meu carro, morava perto aqui, a duas horas de viagem. Então foi um momento muito bom na minha vida também. O primeiro ano do curso básico e depois os três anos que eu cursei o curso de cavalaria, eu sou oficial de cavalaria do Exército, e eu pude então montar os cavalos, jogar polo, além de especializar nas armas típicas das armas de cavalaria, que são os blindados, os mecanizados etc. Foi um período maravilhoso também, muito bom na minha vida.

P/1 – Explica um pouquinho como é a área de cavalaria assim, em termos gerais.

R – Olha, a cavalaria, todo mundo...

P/1 – Oficial de cavalaria, você falou?

R – Eu sou oficial de cavalaria. Todo mundo pensa que a cavalaria é cavalo. Sim, originalmente era cavalo, você vê isso em filmes. Mas já na minha época, o Exército Brasileiro vinha desmobilizando o cavalo como arma de combate. Então os cavalos já existiam apenas pra representação, pra desfiles, pra esportes. Na academia, o que nós aprendíamos mesmo eram os tanques, os carros de combates, os mecanizados, os helicópteros, que na doutrina que nós trabalhávamos na época já era a doutrina do Vietnã, que tinha sido testada na guerra do Vietnã. Então não era mais aquela da Segunda Guerra Mundial, que era mais antiga. Então a vida nossa era muito boa, porque nós tínhamos toda a alimentação lá, tínhamos café da manhã seis horas da manhã, formatura às sete, aulas até meio-dia, almoço de meio-dia a uma. Tinha uma hora que a gente adorava, chamava hora da tora, pra dormir de uma a uma e meia. Depois começavam aulas e atividades até cinco e meia, seis horas a gente era dispensado para o jantar, e à noite era pra estudo, pra ir ao cinema. Temos um cinema de mil lugares na academia, muito bom. Era pra sair em alguns dias da semana pra cidade de Resende, que nos era permitido. Então a gente tinha uma vida assim, morávamos em apartamentos de 12 no primeiro ano, e de seis a partir do segundo ano. Então era muito confortável, tínhamos nossas mesas de estudo, nossa cama beliche ou não. Então as alas da academia, de moradia, são muito boas, muito agradáveis, muito saudáveis também.

P/1 – E a programação desse cinema? Era um cinema interno, né? Você lembra assim, ou de um filme mais marcante?

R – Lembro. Lembro um filme marcante que eu vi lá, me lembro da Batalha de Argel, do Gillo Pontecorvo quando foi lançada. Era uma batalha na Casbah, que tava naquela guerra da independência da Argélia e me marcou muito. Marcou-me muito um show da Maria Alcina, da cantora, que deu um show pra... Tinha mil homens, todos do Estado maior, e meia dúzia de mulher com a Maria Alcina dançando. No final, ela desce, senta no colo do comandante, então aquilo pra nós foi o máximo. Lembro-me desse show da Maria Alcina, que foi muito bom, lembro-me também dos bang bangs, que eram muito comuns naquela época. Então tínhamos ali A Fera do Forte Bravo, que era aquele filme de forte apache, da cavalaria americana. Alguns filmes de guerra que a gente lembra também, como o Zulu, que era um filme interessante da guerra no sul da África, o exército inglês contra os zulus. Então eu gravo de memória bons momentos naquele cinema, na cantina também. Muito bom lá.

P/1 – Bacana. Você gostava de música?

R – Gosto. Gostava e gosto.

P/1 – Na época, você escutava o quê?

R – Na época, a gente gostava muito dos... Interessante que os cantores brasileiros estavam bombando. Eu sou daquela geração que o Milton Nascimento, que o Chico, que a Elis, que todos os cantores e compositores, Tom Jobim... Então cantava-se muita música brasileira lá. E não era por uma questão de nacionalismo, não, é porque agradava mesmo. E eu lembro bem do Nelson Gonçalves, do grande intérprete, ele gravou um disco dedicado a nós, cadetes do curso de cavalaria, era um disco de vinil. E os gaúchos tudo longe de casa, ficavam morrendo de saudade de casa, botavam aquelas baladas românticas, tal, e o Nelson Gonçalves. E um dia um colega meu, que hoje é coronel, chama-se Alaor Martho, teve até comigo, é coronel engenheiro, saiu gritando que ia quebrar o disco dos gaúchos, quase foi linchado, de tanto ouvir o mesmo disco do Nelson Gonçalves. Mas muito bonito, muito agradável. Elis Regina a gente ouvia muito, ouvíamos muito, na época, o Chico, bombando, Milton Nascimento também já com bastante... Raul Seixas também bombando. Então era muito típico daquele período nosso. Não havia esses grupos de rock que surgiram nos anos 80, já não estava mais na academia nessa época.

P/1 – E você tinha uma canção favorita, ou uma canção que tenha marcado a época?

R – Olha, na época, o que me marcou muito, por exemplo, eu gosto muito de Beatles, e também, aí voltando, nós ouvíamos muito Beatles, Rolling Stones, tudo isso. Abba, a gente ouvia muito Abba. Então as músicas dos Beatles eram as que pessoalmente me agradavam mais, Imagine, todas elas eu gostava muito.

P/1 – Quantos anos você ficou na academia? Quantos anos são de formação?

R – Quatro anos: um ano no curso básico e três na arma de cavalaria. Após isso, a gente é declarado aspirante oficial e segue a carreira pelo Brasil afora.

P/1 – E como foi quando você terminou o curso na academia? Pra onde você foi direcionado? O que você foi fazer profissionalmente?

R – Quando eu terminei o curso, eu escolhi uma unidade no Rio de Janeiro, que é uma unidade tradicional de cavalaria do Exército, chama-se Primeiro Regimento de Carros de Combate. Ele ficava ali na Avenida Brasil. Hoje todo mundo vê esse quartel, eu mesmo, tem dois tanques na frente, dois Leopard, mas na época... Hoje é CPOR, Centro de Preparação de Oficiais da Reserva. Na época era o Primeiro Regimento de Carros de Combate. E eu pra lá fui designado e fui servir como comandante do terceiro pelotão do segundo esquadrão de carros de combate do primeiro regimento na época. Então lá eu comecei minha vida militar como aspirante.

P/1 – E como era o cotidiano? Como era o cotidiano de trabalho? Conta um pouco.

R – Ah, agitado. Muito agitado. Eu peguei uma fase já muito agitada. Saí oficial em 79, então já peguei uma fase assim, bem agitada. Nós tínhamos no regimento formação de praças, formação de sargentos. Nós integrávamos uma brigada que era a Quinta Brigada de Cavalaria Blindada, é a única brigada do Exército Brasileiro blindada. A gente era muito deslocado pra demonstrações, pra manobras. Então nós não parávamos, era o dia inteiro em atividades, fim de semana também. Foi um período muito forte, muito profícuo de formação militar. Também nessa época eu conheci minha esposa, foi um namoro, comecei a namorar firme mesmo, acabei casando depois.

P/1 – Como vocês se conheceram? Conte.

R – Na verdade, eu conheci minha esposa... Ela é carioca, eu sou mineiro e morava no Rio. Nós morávamos, eu em Ipanema, ela no Leblon. No fim de ano eu viajei pra Europa numa excursão até a Casablanca, depois nós íamos para o Marrocos, e do Marrocos pra Grécia. E ela tava nessa excursão, e nós começamos a namorar ali. E quando voltamos para o Rio de Janeiro, nós engatamos o namoro e eu sou casado há 27 anos já com ela.

P/1 – Quantos anos você namoraram?

R – Nós namoramos cinco anos e somos casados há 27 anos, praticamente. Então foi um momento muito bonito, porque ela começou a participar da minha vida militar. Então ela ia às festas, às solenidades, aos eventos que a gente participava. Então foi um momento pessoal muito bom e profissional também no primeiro regimento de carro de combate.

P/1 – Como foi o casamento de vocês? Descreva um pouco pra gente onde foi, como foi.

R – Eu segui então morando no Rio, de lá eu servi em outras unidades, e o namoro engatou. Em 1986, eu já era capitão do Exército, nessa época era instrutor do curso de cavalaria do CPOR do Rio de Janeiro, ali bem na Quinta da Boa Vista, um quartel histórico ali, de onde saiu a tropa que proclamou a República. O cavalo do Marechal Deodoro da Fonseca foi puxado lá desse quartel que eu servi, ele montou, proclamou a República e depois levaram o cavalo de volta. Então é um quartel famoso no Exército Brasileiro. E a dona Cristiane, minha esposa, frequentava, montávamos a cavalo, aos sábados eu tinha lá uma escola para os meninos da APAE, que eu dava aula de equitação pra eles no sábado, e quando eu saí capitão, ela me deu uma prensa, falou: “Olha, você já foi transferido, já foi pra aqui, pra ali, nós vamos casar”. E nós casamos em dezembro de 86, eu já era capitão do Exército e moramos ainda alguns anos no Rio, tivemos depois um filho chamado Felipe, isso já é outra fase da vida.

P/1 – Mas conta do casamento. Vocês casaram na igreja?

R – Casamos.

P/1 – Como foi o casamento? Como tava enfeitada a igreja?

R – O casamento foi na PUC ali, na Pontifícia Universidade Católica, tem uma capela muito bonita e era o sonho da minha esposa casar ali, que ela sempre morou ali em volta. Então nós casamos em dezembro, na véspera do Natal, convidamos os amigos mais chegados, as famílias. Não foi um casamento grande, foi um casamento íntimo. Tínhamos lá umas 50 pessoas, depois fizemos uma festa no salão de festa da própria igreja, e seguimos de lua de mel pra Friburgo, lá para o Hotel dos Alpes, de um grande amigo meu italiano, já falecido, chamava-se Nicola, que nos recebeu lá para a lua de mel. E foi uma festa muito marcante, porque os meus colegas oficiais todos foram. E na saída da igreja, eles prestam uma homenagem com as espadas, chama-se teto de aço. Então você sai por dentro daquelas espadas cruzadas, então as fotos são muito bonitas, aparecem, é uma memória que a gente guarda pra vida inteira. Mas foi um momento muito bom.

P/1 – E vocês continuaram no Rio de Janeiro logo depois de casados? Como foi?

R – Sim. Eu continuei servindo no Rio de Janeiro até 89, portanto mais quase quatro anos de casado, como capitão. Então meu pai, que era o fundador... Herdou do meu avô e foi o fundador da empresa como ela é hoje, ele adoeceu. Ele então teve um derrame e não tínhamos na época quem dirigisse a empresa. Então nós fizemos uma reunião de família em 89 e eu então optei por passar pra reserva no Exército e vim dirigir os negócios da família. Então eu estou em São Lourenço efetivamente desde 1990. E quando eu cheguei aqui foi muito mais por um acidente do destino, que foi a doença do meu pai, do que uma opção, porque a minha opção era seguir a carreira militar.

P/1 – E como foi essa mudança pra você, essa volta pra São Lourenço, mudar de profissão?

R – Foi muito difícil. Era um desafio muito grande, porque eu nunca fui hoteleiro, eu nasci em hotel, fui criado até dez anos. Então eu fui muito mais tempo militar. Mas eu tinha aquele amor pelas empresas, pela fazenda, pelos funcionários, que, de certa forma, nós não teríamos quem tocasse isso pra frente. Então o que motivou muito a vinda foi continuar aquele esforço da família de quase 60, 70 anos, que eu queria que chegasse ao centenário, que eu espero que chegue dentro de seis ou sete anos. Então foi uma decisão difícil pra mim e pra minha esposa. Meu filho era pequenininho, era de colo, não sentiu muito, já praticamente foi criado em São Lourenço. Mas logo que cheguei aqui, assumi a direção das empresas e também a presidência do Sindicado de Hotéis, o qual meu pai tinha sido presidente. E aí acabei me envolvendo também com a comunidade. O Asilo São Vicente, meu pai era um dos fundadores, eu fui ser voluntário. A casa da creche da dona Genilda também, meu pai era voluntário, eu fui ser. Você vai se envolvendo, então sua vida começa a ficar cheia de coisas boas, embora às vezes difíceis, e você não vê o tempo passar. Então acho que isso me ajudou muito nessa adaptação. Eu vim de corpo e alma, de coração aberto, não vim com a saudade que eu tinha. Eu passei por cima da saudade, venci esse obstáculo naquele momento, por cima daquele ideal, e daí eu deslanchei minha vida aqui como administrador de empresas, que é o cargo que eu exerço até hoje, a par da condição de prefeito, que eu também tenho.

P/1 – Deixe-me voltar um pouquinho. Você falou que seu filho já era nascido quando vocês vieram pra cá.

R – Isso.

P/1 – Queria saber como foi o anúncio da gravidez, como foi a gravidez, como foi o nascimento do seu filho.

R – Olha, ele foi muito esperado, porque nós já namorávamos há cinco anos, eu já era capitão, a maior parte dos meus colegas já tinha filhos, já tinha casado como tenentes, todo mundo brincava com a gente, quando vinha, quando não vinha. Então com dois anos de casado, a gente optou por engravidar. Então foi uma decisão minha e da minha esposa, participou a mãe dela, que ela é filha única também, dona Lurdes, já é falecida, e nos deu um suporte muito grande em acompanhá-la, porque eu viajava muito, tinha muitas missões no Exército naquela época. Então eu consegui conciliar isso. A minha esposa é muito firme, muito forte também, muito independente, me ajudou muito. Então quando meu filho Felipe veio pra cá, ele era bebezinho, veio com meses pra cá, pra São Lourenço. Ele nasceu em 89, 21 de maio, e nós viemos no final de 89 pra cá.

P/1 – Você acompanhou o parto?

R – Acompanhei de fora (risos). Não tive coragem de entrar, não. Eu fiquei do lado de fora e fui tendo informação, foi uma grande amiga nossa, a madrinha dele, a doutora Cíntia, que é comadre da minha esposa, que fez o parto, então eles iam me dando a informação, mas eu fiquei do lado de fora.

P/1 – E você lembra a primeira vez que você viu ou segurou nos braços o seu filho qual foi sensação?

R – Ah, é marcante. Primeiro eu vi no berçário pelo lado de fora, logo que ele saiu, eu digo: “Esse menino não para quieto, não sei a quem ele puxou”. Ele gesticulava, movimentava, não era um bebê quieto. E a hora que segurei foi emocionante, já foi no quarto, num outro momento, na hora do primeiro mamar. Foi muito marcante. Foi emocionante. A sensação que eu guardo mais é de emoção.

P/1 – E como foi ser pai, José? O que mudou na sua vida?

R – Mudou que a gente começa a ter mais juízo. Eu que saltava de paraquedas, que pegava avião no Brasil inteiro, que não media algumas consequências. Era muito ousado, muito dinâmico, não tinha medo de nada, não tinha hora. Você começa a pensar: “Não, agora eu tenho uma criança pra cuidar”. Então passei a ser mais ponderado, mais cauteloso. Então acho que isso foi muito marcante pra mim. E fortaleceu muito os laços com a minha esposa, principalmente com a minha esposa, porque ela é filha única e ele acabou sendo filho único também, então eu sei da importância que eu tenho para os dois.

P/1 – Eu queria voltar um pouquinho. Eu vou retomar agora sua vida em São Lourenço, mas só uma coisa que ficou pra trás, eu queria saber como foi... Porque você atuou mesmo quando tava numa época... Exatamente na época da ditadura militar no Brasil.

R – Foi.

P/1 – Então era uma época bastante delicada pra estar... Eu queria que você me dissesse um pouco como foi essa experiência assim.

R – É uma experiência interessante. Que eu peguei o fim do regime militar. Eu saí oficial em 79, portanto eu peguei os quatro últimos anos do regime militar. Eu servi em unidades de elite, então eram unidades muito conscientes, os comandantes naquela época já eram comandantes... (troca de cartão).

P/1 – Então retomando, José, me conta um pouco como foi servir nesses últimos anos do regime militar.

R – Isso. Eu convivi mais, que eu saí oficial em 79, portanto eu convivi com o fim do regime militar, que se deu em 84, 85, a eleição do Presidente Tancredo Neves. Então o Governo que eu convivi foi o Governo do general Figueiredo. Naquela época, as unidades que eu servia no Rio eram unidades de elite, de ponta, então já havia uma consciência muito grande dos nossos comandantes, dos nossos chefes, de que era chegado o momento da abertura, o presidente tinha determinado isso, era o nosso comandante em chefe. Havia outro caso de pessoas, militares, que não concordavam com essa linha de ação. Mas onde eu servi, por onde eu transitei, os meus comandantes eram muito claros, que as armas que a nação nos colocava nas mãos eram pra defendê-la e que nós tínhamos que cumprir rigorosamente as leis, os regulamentos e as ordens. Então eu não tive diretamente nenhum problema. Todas as minhas missões foram cumpridas com muito zelo, com muito equilíbrio, porque os nossos chefes nos cobravam isso. A gente sabia que havia excesso em alguns outros locais, mas não nas unidades por onde eu passei. E o entendimento que eu tinha, a percepção, e aí é uma percepção minha, pessoal, é de que o General Figueiredo, que foi o último presidente militar, que era uma pessoa preparada, ao contrário do que se diz, foi o primeiro de turma em todos os cursos, era muito preparado, ele que... (troca de bateria).

P/1 – Então só retomando, você tava falando do que era a sua opinião pessoal em relação ao Figueiredo.

R – É. A minha opinião pessoal é muito diferente de várias que são abordadas aí na mídia de hoje. Porque o presidente era filho de exilado, o pai dele foi exilado, então ele era uma pessoa que entendia claramente a necessidade de que o governo tinha que transitar pra democracia. Ele tava lá por isso. Ele era o presidente encarregado disso. Ele tinha seus problemas familiares e de saúde que o abalaram muito nos últimos anos, mas o sentimento que nós tínhamos dos chefes esclarecidos do Exército é que tinha que acabar com o regime militar e implantar a democracia o mais rápido possível. Então eu discordo de algumas colocações que eu vejo hoje na mídia, porque eu vivi um lado desse momento que não aparece na imprensa de hoje, só se mostra aquele lado dos radicais. Mas 90%, 98% dos oficiais pensavam como eu penso, de que era o momento de democracia, de eleições diretas, que ela ia chegar, de distensão, e disso e daquilo. Não é o um, 2% que são destacados hoje na imprensa.

P/1 – Você teve algum momento delicado de enfrentamento com a população?

R – Não. Via de regra, a minha tropa é de cavalaria, eu fui instrutor de escolas também, eu não tinha contato direto com populações de rua. Eu participava das organizações das missões, segurança do Papa João Paulo II, eu participei, da visita do João Paulo, participei de jogos, que teve jogos militares da ocasião, que envolviam um grande número de pessoas, enfim. Mas não havia eu, pessoalmente, contato direto com a população.

P/1 – Antes de a gente voltar aqui pra São Lourenço, eu queria saber se teve algum fato nessa época de militar, algum fato marcante, alguma coisa que você tenha vivido que tenha sido também uma história importante.

R – A vida militar é marcante em tudo. No meu caso, eu tive assim, duas situações interessantes: uma foi quando eu tive um acidente com uma aeronave em Montes Claros, nós estávamos fazendo um trabalho de mapeamento das usinas, norte de Montes Claros, e um avião nosso, que era um regente daquele antigo, parece o Santos Dumont, bateu de frente numa torre, mas a hélice cortou o cabo de alta tensão e nós conseguimos pousar em Montes Claros, sobrevivemos. E o piloto, eu nunca mais tive contato com ele. Era um oficial do Exército e eu, e um piloto da Aeronáutica. Anos depois, eu estou aqui em São Lourenço, eu sou prefeito, fui procurado por um comandante da TAM que disse que tinha um amigo que ele não via há muitos anos, que tinha voado com ele e eles tinham batido numa torre de alta tensão. E ele então veio aqui no hotel me cumprimentar, sem saber que éramos eu e ele que tínhamos vivido aquele momento. Esse foi um momento marcante. Outro momento marcante que eu presenciei, pude presenciar no Rio, foi aquele grande comício das Diretas Já, de 84, na Candelária, na Rio Branco. Embora eu não estivesse envolvido diretamente nas atividades militares, eu estava no local e pude ver a emoção contagiante de lá, porque eu estava praticamente do lado do palanque. Então ouvi os discursos, tudo, aquele momento. Aquilo era efetivamente a única coisa que você tira da televisão hoje, pra quem viveu, a emoção daquilo, que até hoje você sente quando vê na televisão. Foram dois momentos: um político e um militar que eu tenho pra lembrar hoje.

P/1 – E esse momento das Diretas Já, você lembra como estavam as ruas, como as pessoas estavam, se elas levavam faixas?

R – Efetivamente emocionadas. É uma mobilização muito diferente da de hoje. Naquele tempo, a mobilização era calcada no ideal. A motivação era ideologia. Então as pessoas sabiam o que queriam, se empenhavam daquela forma. Hoje as manifestações, eu tenho visto algumas, estão sem foco, não se sabe bem o que quer. Então é completamente diferente. Por isso que hoje tem violência. E na época tinha uma manifestação gigantesca com o mínimo de violência.

P/1 – Então vamos voltar agora aqui pra esse momento seu de São Lourenço. Eu queria entender, primeiro tem essa história com a Nestlé, que você tava comentando comigo antes de a gente começar. Isso vem antes de você se tornar prefeito?

R – Isso.

P/1 – E como é essa associação, como se formou, como você começou a se envolver com isso?

R – Tá. Bom, eu cheguei aqui em 90, então em 90 eu fui presidente do Sindicado de Hotéis, meu pai já tinha sido, meu avô também. E me dediquei à vida empresarial, a fazer as empresas crescerem. E, realmente, em dez anos triplicamos o número de leitos, a empresa evoluiu muito. Durante esse período, em 1994, a empresa de águas, ela saiu do controle da Perrier Vittel e foi pra Nestlé. Nesse primeiro momento houve assim muita falta de informação entre os executivos que vinham da Europa despreparados, da Nestlé, com os que nós tínhamos ainda da Perrier, que eram os executivos mais românticos, mais antigos, se relacionavam com a comunidade. Os que vieram eram uns rapazes novos, muito frios. Isso gerou um atrito, de 94 a 98, 2000, terrível, da empresa com a comunidade. Quer dizer, que no momento eu fui levado para o olho do furacão por ser o presidente do Sindicato de Hotéis, e não efetivamente por ser hoteleiro. Então naquele primeiro momento, a relação foi de atrito, até porque a Nestlé também não tinha uma expertise de relacionamento com a comunidade, especialmente com o Parque das Águas, que é o coração da cidade, é a vida da cidade. Não é a fábrica que é a vida da cidade, é o Parque das Águas. Porque a fábrica tem 80 operários, o parque dá emprego pra três mil, quatro mil pessoas. Ou seja, então eles custaram a entender isso.

P/1 – Conte-me um pouco, você tá falando desse relacionamento com a comunidade, pra ficar mais claro pra gente, em que termos? Que questões isso...

R – A Perrier Vittel comprou o Parque aqui em 64, e até aí o Parque era de pessoas brasileiras, o Átila

_____00:58:38_____, que era um empresário brasileiro. Então o parque era meio que da comunidade. A Perrier Vittel tocava o parque, mas ela investia aqui, ela promovia festivais, ela participava. O executivo chefe morava aqui. Filial era Petrópolis, a Praia de Botafogo, onde tinha o escritório, era quase que uma filial. O presidente morava em São Lourenço, então era uma pessoa que vivia, tinha um relacionamento com a comunidade. Vem a Nestlé, rompe esse processo. Vem um executivo frio, de fora, mora no Rio, não vem aqui, quer resultado. E começou haver uma série de atritos oriundos da mudança de mentalidade: horários de fechamento do parque, de abertura, falta de sensibilidade de que é alta temporada e baixa temporada, cortar investimentos. E isso gerou um atrito muito grande com a cidade. E, num segundo momento, esses executivos assim inadvertidamente começaram a explorar a água sem os estudos técnicos necessários, além da conta que a comunidade entendia ser permitida. Isso gerou um atrito que foi parar na Europa, inclusive. E esse atrito então perpassou os anos 90, até 2000, 2002, 2003. Nesse momento, a Nestlé acorda, diz assim: “Opa, o negócio lá não é bem assim, tem alguma coisa errada”. E começou a nos ouvir através dos executivos da Nestlé Brasil, aí nem mais da Nestlé Waters. E nos manda pra cá um executivo italiano chamado Fúlvio Giambelli, ele hoje tá na Polônia, se não me engano, tá no Grupo Nestlé ainda. Esse italiano, mais sensível, veio pra cá, ficou aqui, andou na cidade, foi ao hospital, e entendeu, e disse: “Opa, gente, a comunidade tem razão no que ela tá pleiteando”. Em função desse trabalho do Fúlvio, a Nestlé Brasil, que tava levando paulada da mídia mundial por causa dessa briga com a comunidade, ela se engaja e vem dar uma cobertura mais próxima e nos manda um executivo chamado Marcelo Marques, que hoje trabalha ainda na Nestlé lá em São Paulo, e ele vem então morar em São Lourenço. E ao morar aqui com a esposa, com os filhos, ele vai passando pra direção da Nestlé a necessidade de um relacionamento próximo com a comunidade. E esse relacionamento chega mais recentemente, de uns sete, oito anos pra cá, com o Edson Ebizawa, que foi presidente. E ele então muito sensível monta esse grupo, Amigos do Parque, que hoje é um case de sucesso de relacionamento da empresa com a comunidade. Isso é um pout-pourri de tudo que aconteceu em quase 20 anos.

P/1 – E por que é formado esse grupo de Amigos do Parque? Qual a função dessa associação?

R – Esse grupo é um grupo informal. Ele foi formado de lojista do parque, de gente que caminha no parque. E não é um grupo do prefeito, de autoridades, é de amigos, de gente que tem paixão pelo parque. Casualmente, anos depois eu virei prefeito. Eu poderia não ter, nem eu ter sido prefeito. Então é um grupo informal, mas formal, com agenda, com horário, com dia de reunião. E nessas reuniões, nós traçamos os planos de trabalho para o semestre, para o ano. A partir daquele momento, desarma aquele ambiente de atrito com a comunidade e melhora muito o relacionamento da Nestlé com a comunidade. Esse é o valor compartilhado maior.

P/1 – E você fala... (corte no áudio). [...] se relaciona, está vinculada a que ações?

R – Olha, ações de natureza socioambientais, manutenção do parque, eventos e promoção das águas e do Parque das Águas no Brasil, a Nestlé nos ouve, divulgação da Água Mineral São Lourenço, nós somos ouvidos também, já sugerimos rótulos especiais com fotos da maria-fumaça, do Parque das Águas. Então a Nestlé... É meio que uma ouvidoria da Nestlé. Por outro lado, ali também a comunidade se compromete em cima do meio ambiente, do entorno do Parque das Águas, da regularização das questões de esgoto, de água. E como eu virei prefeito, eu segui rigorosamente aquela cartilha que nós tínhamos levantado mesmo quando os Amigos do Parque já existiam e eu não era prefeito.

P/1 – Vocês tinham um representante da Nestlé que participava dessas reuniões?

R – Tem. Vem a diretoria de São Paulo, normalmente o presidente de Nestlé Waters vem, vem todo o pessoal de marketing, vem jurídico. E ela tem a periodicidade de semestre. Esse ano, excepcionalmente, nós estamos fazendo duas. Fizemos uma pra receber o Settembri, que é o novo presidente um mês atrás, e vamos fazer uma amanhã, às 16 horas, pra definir o que vai ser feito até o final deste ano.

P/1 – E vocês sugerem eventos também?

R – Eventos, divulgação, obras no Parque das Águas. O próprio Entardecer das Águas, que é um evento dentro do parque, foi criado por um dos membros do Amigos do Parque, que é a dona Raquel Cohen. Então há todo um envolvimento da comunidade com o parque. Ou seja, a comunidade foi pra dentro do parque, não só pra visitar, foi pra participar da administração, opinando de maneira bastante franca com a Nestlé.

P/1 – Existe uma votação dessa agenda que vocês levam? Só pra entender um pouco como funciona. Ou não?

R – Não. Ela é feita a quatro mãos: a Nestlé Brasil, a Nestlé Waters, Amigos do Parque, e agora a prefeitura, depois que eu assumi. Que existem pontos da agenda, que depois que eu virei prefeito, eu posso ajudar. É o caso da estação de tratamento de esgoto, que é uma obra do PAC federal, enorme, de 25 milhões, que está sendo feita. Não é por causa do parque só, é por causa da cidade inteira, mas um dos motivadores foi tirar os esgotos dos mananciais que abastecem o Parque das Águas.

P/1 – Fazendo um balanço, quais foram as principais mudanças a partir do momento que se forma essa associação Amigos do Parque, que tem essa sensibilidade, que a Nestlé desenvolve essa sensibilidade pra comunidade, aproxima, estreita o relacionamento? Quais as principais mudanças que ocorrem na comunidade, no Parque das Águas?

R – Ocorre que o parque volta a ser visto como parte de São Lourenço, e não que é da Nestlé, que é da multinacional. Ele passa a ser visto como nosso parque, embora administrado muito bem pela Nestlé. Então a comunidade volta pra dentro do parque com caminhadas, com escolas participando dos programas científicos, com o Nutrir nas escolas, aí a Nestlé Brasil entrando nas escolas municipais e estaduais. Então há uma interação positiva do Parque das Águas com a comunidade. E isso vai arrastando a fábrica, que era visto como um monstro, que só tira a água de São Lourenço. Hoje ele é visto como parte desse processo de produção de água, que é importante pra população tomar água, conhecer a água, divulgar a Água São Lourenço, até porque a água é o bem maior do próximo século. Então, assim, isso foi muito educativo. As próprias visitas à fábrica, que era fechada, que era segredo industrial, hoje qualquer um pode agendar uma visita, entender como funciona. Virou uma coisa muito agradável, muito gostosa de se fazer.

P/1 – E qual a importância do Parque pra São Lourenço?

R – Ele é vital. Ele é o coração de São Lourenço, ele fica no meio da cidade, ele deu origem a todos os hotéis, a todo empreendimento turístico, toda a beleza da cidade, toda a cultura, todo esse sentimento que o são lourenciano tem com o parque. Ele não um parque Disney, construído. Veio o parque, e em volta dele que veio a cidade. Então é uma interação permanente espiritual, cultural, mental, com o Parque das Águas.

P/1 – Queria que você me contasse um pouco como é a sua entrada na política. Depois eu vou fazer uma pergunta sobre a relação do poder público com a Nestlé, mas queria primeiro que você contasse da sua trajetória pessoal. Como você vai se encaminhando pra essa vida política e como você chega até a prefeitura?

R – Bom, eu chego aqui e vou me envolvendo com tudo. Então asilo, creche, hospital. Meu pai já era uma pessoa de muita projeção, meu avô também, você vai meio que herdando os compromissos da família. E eu vou me envolvendo. E sou o presidente do sindicato na hora difícil, fundei uma ONG que se chama Viva São Lourenço Viva, que é uma ONG também que ajuda creche, ajuda entidade, constrói educandário, você vai se envolvendo. E em 2000, nós tivemos uma enchente pavorosa aqui, que cobriu o teto da portaria do Parque das Águas, acabou com a fábrica, foi um negócio horroroso. E nessa enchente me coube o papel... O prefeito ficou ilhado, da época, não tinha onde organizar, até pela minha experiência militar, organizar os resgates, enfim, aquele trabalho de recuperação da cidade. Então naquele momento, uma coisa que naturalmente vinha sendo uma liderança, uma liderança empresarial, social, um camarada alegre, bem disposto, de repente naquele momento vira um líder em crise. Então a chancela da minha liderança foi a enchente de 2000, foi um momento de grande crise.

P/1 – Conta um pouco como foi, José, antes de você continuar, essa enchente. Você presenciou? Você tava aqui em São Lourenço?

R – Presenciei.

P/1 – Conta como foi isso pra cidade, o que ocorreu aqui, no que isso impactou na cidade.

R – Foi um momento assim, nós tivemos um Ano Novo maravilhoso dia primeiro de janeiro de 2000, todo mundo alegre, os hotéis lotados, a cidade lotada, o réveillon, queima de fogos. No dia dois caiu uma tromba d’água, inundou todas as cidades da região. Inundou os hotéis do Centro, o Parque das Águas, a fábrica. Pra você ter ideia, os barcos de resgate saíam da porta aqui do hotel, saíam com o motor ligado. E aquilo foi um choque. Ninguém tava preparado pra uma tromba d’água daquela. Então naquele momento, essa enchente passou a ser assim... Praticamente as empresas todas tomaram um prejuízo brutal no meio da temporada de janeiro, que era um momento nobre. E nós não tínhamos tempo de esperar ajuda do governo federal, estadual, porque a ajuda demorava meses. Então nós nos unimos num grande mutirão. Gente rica, gente pobre limpando rua, acudindo quem necessitava, o Sindicato de Hotéis alugou tratores, você via dono de hotel comandando máquina, limpando o parque. Porque nossa meta era primeiro dia de Carnaval abrir o Parque das Águas. E nós limpamos o parque inteirinho e botamos naquele ano acho que dez ou 15 mil turistas no parque. Em 50 dias, mais ou menos, nós conseguimos concluir isso. Então aquilo foi um momento marcante, de um grande problema catastrófico, ambiental, que você tira daquilo uma... Você une a cidade em prol do objetivo de erguer. Nós abrimos todos os hotéis, abrimos todos os serviços e lotamos no Carnaval. E desse dinheiro do Carnaval é que a gente conseguiu aos poucos ir se recuperando, sendo que algumas empresas levaram quatro, cinco anos pra se recuperar dos prejuízos, porque tiveram 100% do seu prejuízo atingido pelas águas.

P/1 – E dessa força tarefa que vocês fizeram pra reerguer a cidade, você se lembra de alguma história marcante, que tenha sido diretamente com a população, enfim, alguma coisa?

R – A gente lembra. Tem muita. Eu me lembro de uma senhora que nós fomos pegar, ela tava gritando, ela não tinha perigo, ela tava num apartamento e tinha uma marquise, e o barco encostava na marquise. Ela era muito gorda, muito forte, tava o Geraldo, que era do INPS, que era o piloteiro do barco, eu e o recreador do hotel pra resgatá-la, que ela tava desesperada. Nós tínhamos levado comida, água, mas ela queria sair de casa de qualquer jeito. Eu olhei pra ela, falei para o Humberto, que era o recreador, falei: “Ela vai afundar o barco”, mas falei brincando. Quando nós encostamos o barco, ela não esperou, de desespero, e pulou no barco, e de fato afundou o barco. Nós tivemos que tirá-la nadando. A sorte que eram uns três metros e pouco de profundidade, a gente batia e a tirava. Nós tivemos que pedir outro barco. Esse foi um fato até cômico, que foi marcante aqui, que aconteceu pessoalmente comigo. Outro fato interessante, eu tenho... Hoje ele trabalha na prefeitura, o Luizão, ambientalista desses antigos e tal, e tem barco, resgatou muita gente, e tinha que resgatar um pessoal do outro lado do Rio Verde. Então eu falei com ele: “Não vamos lá, porque a correnteza tá muito forte e tal”. E nós entramos na correnteza e o barco girou, girou, nós não sabíamos se estávamos indo ou voltando. E o Luizão tinha bebido muita cachaça, ligou o barco: “Deixa comigo que eu sei pra onde eu to indo”. E voltou pra onde nós tínhamos começado. Esse é outro fato também. Nós estávamos indo pra Nossa Senhora de Luz e acabamos voltando para o Centro, porque o Luizão ficou tão desesperado e bebeu tanto que nós voltamos para o local de origem. Foram dois fatos curiosos dessa enchente.

P/1 – Perdeu o rumo (risos).

R – Perdeu o rumo mesmo.

P/1 – A gente pode retomar um pouco, você tava falando como isso foi um marco.

R – Foi.

P/1 – Pra você e pra carreira política mesmo.

R – Foi.

P/1 – Conte-me como se desenrolou a partir daí.

R – Eu acho que nesse momento aconteceu uma coisa interessante, em 2000 a sociedade, assim, o CDL, o sindicato, a associação comercial, prefeitura, acho que eles reconheceram, de certa forma, o meu esforço, o meu talento naquela ocasião, e me prestaram umas homenagens no final do ano. Foi o mérito empresarial, o mérito Hélio Costa, então esse momento meio que voltei ao meu tempo de militar. Além de prestar serviço, eu acabei sendo reconhecido. Mas eu nunca pensei em mexer com política, não. Eu não tinha essa ideia. A partir desse momento da enchente, São Lourenço entrou numa crise política muito grande. Os dois ex-prefeitos que disputavam a eleição, enfim, tiveram uma série de brigas e a cidade decaiu financeiramente, a prefeitura numa situação gravíssima. E não aparecia nenhuma liderança que pudesse desempatar a briga, era A ou B. E nesse momento, eu fui cobrado pela sociedade civil, as ONGs que fundamos, o sindicato, hotelaria, e houve um grande movimento realmente de pessoas cobrando uma posição nossa de ingressar na política, eu e um grupo político novo. E foi então que eu disputei a eleição pela primeira vez. Não era o que eu queria, mas você vai indo, você não tem como voltar. E de fato disputei a eleição em 2004, perdi, por mil votos, a eleição. Logo em seguida eu me candidatei a deputado estadual, fui primeiro suplente. E logo em seguida, dois anos depois, em 2008, fui eleito prefeito pela primeira vez, e reeleito em 2012.

P/1 – Você já era filiado a algum partido?

R – Ao PMDB e depois ao PSDB. Eu fui prefeito e sou prefeito pelo PSDB. Quando eu me filiei pela primeira vez, no PMDB, a minha vice que era do PSDB, depois nós trocamos, eu passei ao PSDB, que era o meu partido que eu gostaria de ter ingressado inicialmente, e sigo nele até hoje.

P/1 – Conte-me um pouco como é então essa vida política. Como é ser eleito prefeito? O que isso muda na sua vida?

R – Eleito prefeito muda tudo, porque, primeiro, você não passa a ter vida particular mais, você tem vida pública. Eu que tinha tido vida pública antes como militar, depois voltei a ter vida, de certa forma, privada como empresário, voltei a ter vida pública. Então você não tem mais dia, você não tem mais hora, você tem que estar disponível o tempo todo. Meu filho estranhou muito, ele tava na fase do final da adolescência, eu não tinha mais aquela disponibilidade pra ele, pra minha esposa, pra minha família, então isso foi um momento difícil. Mas, por outro lado, eu tinha o objetivo de ganhar a eleição e implantar aquele modelo de trabalho que a gente queria implantar em São Lourenço, e de fato implantamos, que era um choque de gestão, reestabelecer as contas, os investimentos públicos. Principalmente a questão ética na política era complicada, eu peguei pesado, sofri muito, levei muita pancada, mas conseguimos atingir os objetivos no primeiro mandato ainda. São Lourenço é a cidade no sul de Minas que mais cresce e mais investimentos públicos tem do governo estadual e federal. Quer dizer que nos deu um fôlego para com o dinheiro pouco da prefeitura a gente reorganizar a prefeitura, plano de carreira, plano de cargo e salário, novas leis tributárias pra reequilibrar o município.

P/1 – E a sensação de ser eleito, José? De pensar que a maioria das pessoas resolveu depositar a confiança delas em você? Assim, queria entender um pouco como você se sentiu, como foi quando saiu o resultado da eleição da primeira vez?

R – Olha, é emocionante, porque são milhares e milhares de pessoas. As minhas eleições nunca houve tanto movimento, explosão de alegria como houve aqui. Diz o pessoal que nunca houve tanto. Porque realmente as pessoas depositavam grandes esperanças, muitas das quais a gente nem consegue depois suprir, mas parte delas, graças a Deus, grande parte a gente conseguiu cumprir. Mas é emocionante. Aquele turbilhão de gente, gente te agarrando, gente te beijando, gente que você nunca viu falando com você, e arrasta você, punha em cima de carro, desce de carro. E o negócio foi tão tumultuado e, assim, a gente não planeja com muita antecedência, que quando deu um determinado horário: “Olha aqui, vamos rezar uma Ave Maria, um Pai Nosso, vamos todo mundo pra casa, senão vai ter morte aqui essa noite”. Porque ninguém parava. Na porta do parque milhares de pessoas, já tinha umas três horas de comemoração, eu parei tudo aquilo, para tudo, peguei o microfone: “Vamos rezar e vamos todo mundo pra casa descansar”. Isso foi marcante nessa eleição. Foi o encerramento.

P/1 – Foi no parque, a comemoração?

R – O final da caminhada... Foi caminhada, não foi carreata, não. Foi o Centro todo e terminou na porta do parque. As duas eleições. As duas vitórias que eu tive. Então foi muito bacana, foi muito emocionante. Minha esposa também ficou muito emocionada, minha mãe. Meu pai já era falecido, que ele gostava de política, minhas irmãs, enfim, aquele sentimento de que não é um obstáculo só superado, é um sentimento de que você vai enfrentar uma coisa mais difícil, mas que você tá com o comando na mão. Você tem a capacidade, você tem a condição de desenvolver aquilo tudo que você pregou no passado, principalmente na campanha.

P/1 – Eu queria que você falasse um pouco pra gente da relação do poder público então, da prefeitura com a Nestlé.

R – Bom, eu não tive problema, porque eu tinha essa característica, eu já vinha com esse relacionamento desde o período conflituoso, até o período de extensão pelos Amigos do Parque. Então o relacionamento que eu estabeleci logo de início com o Edson Ebizawa e com esse grupo que ainda dirige hoje a Nestlé, que é o Marcelo Marques, era o Laerte Dentini. O grupo que tá lá hoje na Nestlé Waters era o grupo muito de franqueza. Então chegávamos com muita franqueza e com muita antecedência e explicávamos tudo aquilo que a prefeitura pensava, e ajustávamos com o cronograma e com as possibilidades da empresa. E isso nos possibilitou um diálogo muito franco. Tão logo a gente conseguiu esse diálogo, nos seis primeiros meses, daí em diante nós não tivemos nenhum tipo de atrito. Por quê? Antes que ocorra o atrito, o Amigos do Parque tá lá pra distender esse ambiente de atrito. Então acho que esse é o ponto positivo principal.

P/1 – E os projetos e programas da Nestlé na cidade? Quais que passam por uma relação com a prefeitura? Se você puder dar um panorama pra gente.

R – Todos passam. O Nutrir, ele é da Nestlé Brasil, ele não é da Nestlé Waters, mas ele vem pra creche do município, seja ela creche ONG, seja ela creche do município. Os alunos do município vão pra dentro do parque ter educação ambiental. Então há todo um relacionamento na educação, na saúde. Nós temos um programa de caminhada do PSF no parque, de ginástica pra idosos. Na parte cultural, nós reformamos com verbas públicas a Ermida, que é a primeira igreja de 1890, que fica dentro do Parque das Águas. Então há todo um relacionamento na parte de infraestrutura, o deslocamento dos esgotos pra contornar o ribeirão que serve o Parque das Águas. Então o turismo é direto o relacionamento, com a medalha das águas, com o festival de inverno que a Nestlé patrocina via de regra. Então há todo um envolvimento. E o foro de debates é o Amigos do Parque, porque lá participa secretário de turismo, participa presidente do Convention Bureau, presidente do sindicado. Não são só o poder público e a Nestlé, é muito mais a sociedade civil e a Nestlé, e nós entramos como coadjuvantes desse processo.

P/1 – E como você acha que é essa relação entre o poder público, a Nestlé e a sociedade? O que você acha que traz de mudança, se você acha que traz mudança pra população? E quais mudanças são essas, quais benefícios?

R – Tá. O primeiro grande benefício é o Parque das Águas, ele é a essência da cidade de São Lourenço. É lá que se dá o turismo, é lá que se dá o forte da ação comercial. Só de a Nestlé manter o Parque das Águas e divulgar a venda da Água São Lourenço, ela já está trabalhando em parceria com a cidade. Então o produto Nestlé é São Lourenço, por isso a garrafa chama São Lourenço. Então não há como dissociar. Você pode produzir uma Água Suiá, é uma água boa, Indaiá, mas onde é? Ninguém quer saber. Não é em Belo Horizonte, nem em São Lourenço. Então a Água São Lourenço tem a sua marca, ela tem a sua condição. Ela é intrínseca com a criação da cidade. Então acho que o ponto mais importante que eu vejo desse programa são: essa relação de dar um belo serviço dentro do Parque das Águas e dentro do engarrafamento quando visitado e da divulgação forte. Isso é a essência do trabalho da Nestlé, o restante é coadjuvante, são os programas ambientais, programas sociais, programa de saúde, cultural, que a gente tem com a Nestlé.

P/1 – E essa questão da água do Parque das Águas, queria que você desenvolvesse só um pouco pra gente o que isso traz pra cidade: turismo, serviços, gera renda, gera emprego? Entender um pouco...

R – Olha, o mecanismo é muito até lógico.

P/1 – (risos).

R – (risos) São Lourenço vive hoje, 47% depende do turismo, do PIB, e 47% depende do parque. Isso são em torno de quatro mil empregos diretos na rede hoteleira, fora os do parque, fora os da fábrica. Outra questão é que o comércio, parte dele, 12, 13%, vive do turismo. Não é a Casas Bahia, não é a Lojas Cem que vendem pra todo mundo, é o comércio de artesanato, de produtos de natureza turística, o trem, as fazendas, enfim, os queijos, os doces, as malhas. Então todo esse trabalho é que fortalece efetivamente esse vínculo da Nestlé com a comunidade.

P/1 – Bacana. Eu vou encaminhar para as perguntas finais, mas antes das perguntas finais, queria saber se tem alguma coisa que a gente não tenha perguntado e que você gostaria de deixar registrado.

R – Eu acho que nós passamos por tudo. Foi muito bem conduzido por você. Eu to rouco, to numa situação difícil, mas foi muito bem conduzido. Não vejo pontos a destacar.

P/1 – Então a penúltima pergunta, que é: quais são seus sonhos hoje?

R – Bom, o maior sonho hoje, assim, tenho filho engenheiro, já trabalhando, fazendo pós-graduação, família estruturada, o meu maior sonho hoje é concluir a minha missão de prefeito em 2016, entregando, devolvendo à comunidade, que confiou em mim por oito anos, tudo aquilo que eu me comprometi nas minhas cartas-compromisso. Tanto é que todo dia eu vou lá a minha cabeceira e risco um item da minha carta-compromisso. O último posto de saúde reformado, a última escola construída. Então eu espero em 2016 ter a felicidade de dizer assim: “Cumpri minha missão”. E encaminhar uma cidade melhor, em melhores condições para os meus sucessores, às novas gerações que aqui virão. Esse é o grande sonho meu hoje. Já realizado como empresário, como militar, e praticamente realizado também realizado como prefeito.

P/1 – E, por fim, como foi contar a sua história? Como foi dar esse depoimento pra gente aqui hoje?

R – Olha, via de regra, eu falei de coisas que eu nem lembrava mais. Se você não tivesse me perguntado, eu não me lembraria. Então assim, eu não me preparei, efetivamente, pra essa entrevista porque eu queria que fosse uma coisa natural. Então foi muito bom, memórias muito bonitas vieram a minha cabeça, muito vivas, fatos marcantes, inclusive fazer jus ao presidente Figueiredo, que muita gente critica, mas que sempre foi de coração um democrata, fez de tudo naquela época final pra abertura do Brasil. Pouca gente vai... Vocês nunca vão ouvir um depoimento desses de quem viu de perto isso aí, inclusive ele. Até levo pancada, muita gente não concordar. Então foi um momento assim bom, muito agradável, muito gostoso, especialmente nessa tarde.

P/1 – Tá certo. Muito obrigada.

R – Eu que te agradeço.

P/1 – A gente encerra aqui então.

FINAL DA ENTREVISTA