Trabalho nos Correios há 11 anos, faço distribuição externa e nesses anos todos de rua é constante a briga e a esquiva contra os cães. Não descobrimos o motivo ainda, mas eles nos odeiam. Tem uns que a gente aponta na esquina e eles já começam a latir. Muitos moradores já sabem que estamos...Continuar leitura
Trabalho nos Correios há 11 anos, faço distribuição externa e nesses anos todos de rua é constante a briga e a esquiva contra os cães. Não descobrimos o motivo ainda, mas eles nos odeiam. Tem uns que a gente aponta na esquina e eles já começam a latir. Muitos moradores já sabem que estamos chegando, pois eles avisam.
Mas, dentre todos eles, tive o privilégio de encontrar dois, mãe e filho que ao invés de me atacarem, criaram um vínculo impressionante comigo, de carinho, proteção e amizade.
Lessy e Luís, esses são os nomes deles, moram na Rua Ananatuba número 375, num distrito em que eu entregava cartas. No começo, quando eu chegava perto eles queriam avançar e começavam a latir, mas com o passar do tempo, como me viam todos os dias lá, começavam a me seguir. Os dois me seguiam o distrito inteirinho, torno de 3 horas e pouco, pois os encontravam na primeira rua que eu entregava, que era a que eles moravam também, TODOS os dias.
No começo eu não ligava muito, tentava espantá-los, mandava embora, mas eles insistiam em me seguir, até que virou rotina e aquilo virou uma amizade tremenda. Eles me viam de longe e corriam ao meu encontro, começavam a pular em mim, me lamber e me sujar, pois viviam na rua em frente a casa onde moravam, fuçando lixos, carniças, etc... aí vinham me lamber (eca). Voltava pros Correios todo dia cheirando a cachorro. Mas eu não ligava, eles me acompanhavam, podia estar sol, ou estar chovendo, todos os dias. Quando eu passava e eles estavam trancados no quintal, faziam um escândalo, choravam, puxavam o portão, porque queriam sair pra me acompanhar. A Lessy era menorzinha e conseguia passar pelas grades, mas o Luiz não. Mas a maioria das vezes os donos acabavam soltando e ele corria me alcançar.
Todos os moradores já me conheciam e se admiravam com nossa amizade, pois os dois não tinham boa fama pela vizinhança, pelo fato de atacar e correr atras de quem passava. O pessoal falava que eu andava escoltada, eram meus guarda costas. Mas na verdade eles não me protegiam muito não, quando aparecia algum cachorro maior q eles, eles se escondiam atrás de mim, para eu os proteger.
O mais incrível é um fato que ocorria sempre que eu passava pela rua Fiorindo Pastre. Na altura do número 76 sempre tinha uns cães que corriam atrás deles e sempre acabava em briga, quando não conseguiam escapar, eram obrigados a voltarem embora. Até que um dia descobriram que, se subissem um escadão que tinha um pouco antes, conseguiriam cortar caminho pela rua de cima e me encontrar no final daquela rua em que os cães ficavam.
Achava impressionante pois eles já sabiam que iam ser atacados e me deixavam ir sozinha e subiam o escadão e ficavam lá na esquina me esperando, e enganava os outros cães. Os dois
andavam todos os dias o distrito inteirinho comigo. Eu parava no ponto de ônibus, bem longe de onde eles moravam, embarcava, eles ficavam na porta me olhando, e depois retornavam.
Foi assim por quase um ano, até eu sair de lá em dezembro. Todos os outros carteiros que me substituíram me relataram que eles chegavam até avançar neles. Senti muita saudade e confesso que fiquei muito triste. Senti falta dos meus amigos, meus fiéis amigos que, fizesse chuva, ou fizesse sol, no frio ou no calor, estavam sempre comigo, me acompanhando, cuidando de mim. É por isso que eu digo que para toda regra há uma exceção... Eles eram a exceção na minha vida.Recolher