Minha mãe era uma pessoa muito rigorosa com a gente. Sair pra rezar com ela era o único passeio que a gente tinha. Então era chegar na casa do povo e rezar o terço, cantar as músicas de Nossa Senhora. Meu pai era lavrador, tinha um terreno e minha mãe era costureira. Na casa eram seis filhos....Continuar leitura
Minha mãe era uma pessoa muito rigorosa com a gente. Sair pra rezar com ela era o único passeio que a gente tinha. Então era chegar na casa do povo e rezar o terço, cantar as músicas de Nossa Senhora.
Meu pai era lavrador, tinha um terreno e minha mãe era costureira. Na casa eram seis filhos. Era uma casa de estuque, de palha, de chão, eu lembro. Tinha só um quarto. Banheiro não existia, a gente ia pros matos. Banho era de bacia, que antigamente mornava a água, botava na bacia e tomava o banho.
E escola também era outra coisa: eu ia com sacolinha na mãe, o caderno, o lápis. Não tinha quadro, a professora escrevia no nosso caderno. Na época eu não sabia nada, eu era criança e ali embaixo do que ela escrevia a gente ia escrevendo o que ela passava. Quando a minha professora passava, eu decorava tudinho. Eu estudava em casa e eu decorava tudinho para levar para responder no outro dia no questionário. Naquele tempo existia questionário. Eu tinha sete anos, estudava e depois da escola ia pra roça catar café. Quando eu tinha dezesseis anos me chamaram para fazer um curso para dar aula para as crianças. Eu fui. Fui, fiz o curso na Prefeitura e comecei a dar aula. Comecei a dar aulas e de vez em quando eles me chamavam para ter alguma palestra, curso também, e assim eu continuei. Eu dei aula 12 anos, entre Prefeitura e Estado. Três anos pela Prefeitura e três anos pelo Estado. Só que depois mudou: muitas pessoas iam estudar para ser professor, lá em Vitória e já não tinha mais lugar pra mim porque eu não tinha os estudos completos. Foi melhor eu sair. Saí e nunca mais dei aula.
Casei. Meu marido trabalhava na roça. Eu também fui pra roça, fazia muita farinha pro nosso sustento. A gente vivia daquilo que colhia. Fui mãe de nove filhos, tudo escadinha. Foi agora que fiz curso de pintura, então eu sei pintar um pouco nos tecidos. E comecei a fazer as bolsas que a gente vende, eu e outras mulheres. Aí formamos esse grupo de confecção*, que foi tudo na base do pulso firme. Mas eu posso dizer que estou satisfeita, muito satisfeita porque eu nunca na minha vida imaginava que um dia podia acontecer isso que está acontecendo comigo, com a gente aqui. Eu gosto daqui por quê? Porque é um divertimento, a gente passa a conhecer as pessoas e as pessoas conhecerem a gente, porque quando a gente convive é que você vai conhecer as pessoas. Isso aqui ensina a gente como a gente deve viver junto, com o povo.Recolher